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2. Direitos de Personalidade

2.3. Âmbito da tutela geral da personalidade

Retomando uma ideia que reputamos estruturante, e tendo em consideração, em especial, o artigo 70.º do Código Civil, é juscivilisticamente reconhecido ao “titular da personalidade humana” um feixe de verdadeiros poderes jurídicos de exigir dos demais sujeitos o respeito da sua personalidade, não lhe sendo apenas outorgados meros poderes jurídicos de pretensão ou simples expetativas jurídicas de respeito”149

, mas também o poder de se socorrer de medidas de proteção150, quando a sua esfera pessoal e/ou íntima seja efetivamente invadida por terceiros não autorizados. Ora, através desta norma prevê-se uma tutela geral dos direitos de personalidade, os chamados direitos essenciais do indivíduo –

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LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes; “A Protecção dos Dados Pessoais no Contrato de Trabalho” in A

Reforma do Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2004. 701 p. ISBN 972-32-1290-0. p. 126.

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LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes; “A Protecção dos Dados Pessoais no Contrato de Trabalho” in A

Reforma do Código do Trabalho, Coimbra Editora, 2004. 701 p. ISBN 972-32-1290-0. p. 126.

149 Em http://octalberto.no.sapo.pt [consulta em 09-01-2010] 150

Nomeadamente através de providências cautelares, nos termos dos art.ºs 381.º a 392.º do CPC, ou ainda da tramitação prevista nos art.ºs 1474.º a 1475.º deste diploma – que regula o processo de jurisdição voluntária dirigido à tutela da personalidade, do nome e da correspondência confidencial.

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direitos subjetivos absolutos cujo fundamento é a constituição de um mínimo necessário e imprescindível ao desenvolvimento e afirmação da personalidade e sem os quais os outros direitos subjetivos perderiam todo o interesse para a pessoa151. Acrescente-se ainda que, a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ilícita à sua personalidade. Contudo, a lei só protege as pessoas quando o receio a ofensas “for bastante sério” e dê fundamento à necessidade de tutela jurídica152.

Assim sendo, nas relações jurídicas emergentes da tutela geral da personalidade, os sujeitos devem abster-se de praticar atos que criem condições favoráveis ou preencham pressupostos necessários à ocorrência de lesões na personalidade de outrem ou que se traduzam em ameaças ou cominações de males futuros à personalidade alheia. E caso os sujeitos não observem tais deveres de abstenção quanto a causar prejuízo na personalidade de outrem, expõem-se a sanções jurídicas (quando não se verifiquem causas da exclusão da ilicitude e ocorram os demais pressupostos da aplicação dessas sanções)153.

Neste sentido, considera-se expressamente antijurídica a afirmação ou difusão de um facto capaz de prejudicar o bom nome, a honra, ou a vida privada de qualquer pessoa. Assim, é de pouca importância que o facto afirmado ou divulgado corresponda ou não à verdade, contando que seja suscetível, dadas as circunstâncias do caso, de diminuir a confiança na capacidade e na vontade da pessoa - por exemplo, para cumprir as suas obrigações ou reivindicar os seus direitos - ou de forma a abalar o prestígio de que a pessoa goze ou, ainda, do bom conceito em que a pessoa seja tida no seu meio social, ou onde exerça a sua atividade.

A ilicitude, no caso concreto, circunscreve-se à ausência de uma causa de justificação, justificando-se a aplicação do instituto da responsabilidade civil, tanto por danos patrimoniais como não patrimoniais, isto é, danos morais, o que corresponde à proteção de um direito reconhecido por lei como inviolável154, atendendo-se a todos os bens jurídicos da personalidade, embora não especificamente delimitados, desde que constituam manifestação da personalidade155.

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BOTELHO, João – Formulários Direitos da Personalidade. Malveira: Dikaion- Unipessoal, Lda, 172 p. ISBN 978-989-85552-13-6, p.45.

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ANTUNES, Ana Filipa Morais – Comentário aos artigos 70.º a 81.º do Código Civil (Direitos de

personalidade). Editora: Universidade Católica, outubro 2012, 317 p.. ISBN:978-972-54-0366-2, p.57.

153 Sobretudo os elementos culpa e nexo de causalidade 154

Neste sentido, e a título de exemplo, podemos consultar também o Código dos Direitos de Autor e dos Direitos Conexos – art.ºs 182.º, 209.º e 210.º.

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Tendo em conta a capacidade e liberdade de celebração contratual, no âmbito de uma relação laboral, e porque se trata aqui de uma tutela geral da personalidade, o Código Civil português prescreve, ao abrigo do artigo 67.º (capacidade jurídica), que “As pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em contrário”.

Assim, este diploma legal atribui capacidade jurídica e capacidade genérica de gozo a todas as pessoas desde o momento de aquisição da personalidade156. E com a expressão «salvo disposição legal em contrário», a norma pretende referir-se à personalidade como suscetibilidade genérica e abstrata de direitos e obrigações iguais para todos, mas no sentido em que esses direitos e obrigações podem variar de pessoa para pessoa (tendo em consideração que, na prática, existem pessoas com mais aptidão para a assunção de direitos e obrigações que outras; dar-se-á como exemplo condições sociais (em que tipo de sociedade se está inserido), culturais (qual o grau de habilitações académicas a ter em consideração), económicas (a situação financeira em causa) em que cada pessoa se encontre.

Ora, também o Código do trabalho, no seu art.º13.º, enuncia o princípio geral sobre a capacidade dos sujeitos para a celebração do contrato de trabalho, o que quer dizer que a norma pode abranger a capacidade de exercício e de gozo dos menores de dezasseis anos para o exercício da atividade laboral, observando-se determinados requisitos157.

Pelo exposto se conclui que a personalidade jurídica é inerente à capacidade jurídica, enquanto capacidade de gozo de direitos ou assunção de obrigações.

Dito isto, e ainda no âmbito e na capacidade de trabalho dos menores de dezasseis anos, regulado, em especial, na Regulamentação do Código de Trabalho, no Capítulo VII, Secção I, da Lei n.º35/2004, de 29 de Junho – Trabalho de Menores -, é estipulado, para esta idade etária, a possibilidade de efetuarem trabalhos leves, desde que verificados certos pressupostos, como por exemplo os enumerados no artigo 114.º deste diploma. No entanto, há também a verificar o enunciado no artigo 115.º e seguintes do diploma em causa, pois, “o empregador deve avaliar a natureza, o risco e o grau e duração da exposição do menor a determinadas atividades”158 159. Até porque o empregador não pode pôr em risco o normal

156 Embora, nesta matéria, alguma doutrina entre em contradição: por um lado, considera a existência de

personalidade jurídica desde o momento da conceção, e, por outro, a consideração da aquisição da personalidade jurídica a partir do “nascimento completo e com vida” – não nos competindo aqui tomar qualquer posição relativamente a estas opiniões.

157 Cf. art.ºs 68.º, 69.º e 70.º do CT – “Admissão de menor ao trabalho”-, ou seja, ter a idade mínima de 16 anos,

ou se tiver idade inferir a 16 anos, ter concluído a escolaridade obrigatória.

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REDINHA, Maria Regina- Código do trabalho e Repertório Juslaboral. Porto: Grupo editorial Vida Económica, Nov. 2006. 1243 p. ISBN: 978-972-788-200-7.Depósito Legal n.º251497/06, pp.387 a 391.

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desenvolvimento da personalidade física, psíquica e moral do menor, da sua educação e formação.

Assim, em termos gerais, estas disposições devem ler-se na esteira do artigo 70.º do Código Civil, que reconhece uma ampla tutela geral da personalidade a todas as pessoas jurídicas, menores ou maiores de idade, singulares ou coletivas, sendo todos sujeitos naturais, de relações jurídicas que podem por em causa os seus direitos de personalidade160, como atrás mencionado161.