• Nenhum resultado encontrado

Âmbito Material do Segredo de Justiça

No documento Segredo de justiça (páginas 50-53)

Segredo de Justiça

5.1. Âmbito Material do Segredo de Justiça

“O âmbito material do segredo de justiça abrange o conjunto de realidades sujeitas a segredo e os comportamentos proibidos em relação a essas realidades. Na lei processual, ficam sujeitos ao segredo de justiça a “ocorrência”, o “conteúdo” e os

“termos” dos actos processuais89

praticados durante a vigência do segredo (…),90

implicando essa regime as proibições de (a) “assistência à prática ou tomada de

87 MACHADO,J.BAPTISTA, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Livraria Almedina, Coimbra, 6.ª reimpressão,

1993, pp. 44 a 49 - teoria da força normativa dos factos.

88 Idem, ibidem, pp. 80 a 82.

89 “Será, pois, altura de lembrar a velha distinção de Luís Osório: «Actos do processo compreende tudo o que no processo se passa,

quer seja reduzido a escrito quer não, assim um auto de busca, a querela, a sentença, a inquirição de testemunhas, os debates». De uma outra perspectiva mais estática, os diversos actos que formam o processo constituem peças processuais, enquanto elementos de um todo. Assim é que, na literatura jurídica, é comum empregar esses dois vocábulos indiferentemente. «Documentos são todos os escritos juntos ao processo para aí desempenharem uma função de prova». A designação actos do processo abrange, por outro lado, a participação-crime e as medidas cautelares, como as referidas no art. 248.º e segs. do C.P.P.”, COSTA,ARTURRODRIGUES DA, Segredo de Justiça e Comunicação Social, Revista do Ministério Público, Ano 17, n.º 68, Outubro/Dezembro 1996, pp. 63 e 64. Ver também, mais pormenorizadamente, SILVA,GERMANOMARQUESDA, Curso de Processo Penal, II, Verbo, 2.ª edição revista e actualizada, 1999, pp. 12 a 20 e SANTOS,M.SIMASeHENRIQUES,M.LEAL, Código de Processo Penal Anotado, I Volume, Editora Reis dos Livros, 2.ª Edição, Reimpressão Actualizada, 2003, pp. 446 a 448 e 454 e 455.

90 Als. a) e b), n.º 8, do art. 86.º, do C.P.P.

São os “(…) factos que ditam as

normas”87? Ou, “(…) é a facti-species

jurídica que nos fornece o óculo pelo qual havemos de “in-speccionar” a realidade de

facto”88

50 conhecimento do conteúdo de acto processual a que não tenham o direito ou o dever de

assistir” (…)91

e de (b) “divulgação da ocorrência de acto processual ou dos seus

termos, independentemente do motivo que presidir a tal divulgação” (…)”92

.93

Contudo, “o âmbito material do tipo incriminador contido no art. 371.º, n.º 1 do

Código Penal é distinto, revelando-se mais limitado quanto à matéria da proibição”94.

“Por um lado, a proibição do art. 371.º, n.º 1 do Código Penal molda-se sobre a

revelação do “teor de actoprocessual”, o que abrange o seu conteúdo e, eventualmente,

os seus termos, mas não abrange seguramente a mera ocorrência95. A divulgação da

ocorrência de um acto processual é proibida pela lei do processo, mas não mereceu tutela penal por via do crime previsto no art. 371.º do Código Penal. Como a lei processual, por seu turno, não prevê qualquer consequência jurídica para tal facto, a divulgação da ocorrência de acto processual sujeito a segredo de justiça é isenta de

consequências penais sancionatórias”.96 Desta feita, “o segredo externo não inclui as

declarações sobre os próprios factos históricos conhecidos pelo depoente. Dito de outro modo, quem deponha no processo submetido a segredo externo não pode divulgar o acto processual em que participou, nem a sua realização nem o seu conteúdo (“dos seus termos”), isto é, as perguntas que lhe foram feitas e as respostas que deu. Mas esta pessoa pode falar publicamente sobre os factos históricos de que tem conhecimento,

pois a divulgação deste conhecimento não está abrangida pela proibição legal”97.

Porque, “com efeito, o direito Português não prevê a faculdade do MP impor o dever de silêncio sobre o conhecimento dos factos históricos, previsto no artigo 391- quinquies

do CPP Italiano, introduzido pela Lei n.º 397, de 7.12.2000”.98

Assim, “o âmbito objectivo do segredo não inclui as declarações de uma pessoa no sentido de que não participou em nenhum acto processual ou não foi visada por nenhum acto processual. Mas já inclui as declarações públicas no sentido de que esta ou aquela pergunta não lhe foi feita, esta ou aquela diligência não foi realizada na sua

91 Al. a), n.º 8, do art. 86.º, do C.P.P. 92 Al. b), n.º 8, do art. 86.º, do C.P.P.

93 PINTO,FREDERICODELACERDADACOSTA,Segredo de Justiça e Acesso ao Processo, Jornadas de Direito Processual

Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, Coimbra, 2004, p. 75.

94

Idem, ibidem, p. 75.

95 Idem,ibidem, p. 75 (apud Assim, MEDINADESEIÇA in FIGUEIREDODIAS (dir.). Comentário Conimbricense do Código

Penal. Tomo III, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, 650 (em anotação ao art. 371.º)).

96 Idem,ibidem, pp. 75 e 76.

97ALBUQUERQUE,PAULOPINTODE, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da

Convenção Europeia dos Direitos do Homem, Lisboa, Universidade Católica Editora, 2.ª edição, 2008, p. 242.

51 presença ou com a sua participação, ou determinada diligência não teve certo resultado. A expressão “independentemente do motivo que presidir a tal divulgação” no art. 86.º, n.º 8, al. b) visa precisamente evitar a divulgação do conteúdo do acto processual, mesmo quando ela se afigure necessária para a defesa da honra da pessoa, a segurança de pessoa e bens ou tranquilidade pública ou mesmo para a reposição da verdade, seja

ela a “verdade material” dos factos investigados, seja ela a “verdade processual”.”99

Pois, só a conduta descrita na al. b), do n.º 8, do art. 86.º, do Código de Processo Penal “é materialmente equivalente à conduta proibida pelo tipo penal do art. 371.º do Código Penal (e mesmo assim só na parte da “divulgação dos termos do acto processual”, já não

a mera divulgação da ocorrência do acto, como se referiu)”100

. Deste modo, concluímos que “existe, contudo, um elemento comum à regulação processual e à regulação substantiva do segredo de justiça que se deve destacar, porque em si mesmo constitui uma fronteira significativa do regime de segredo que está em vigor: apenas são objecto do segredo de justiça o teor, o conteúdo ou os termos de actos processuais, e não já o

facto histórico que deu origem ao processo e que constitui o seu objecto essencial101.

Este é anterior ao acto processual e pode ser livremente divulgado sem violação das

regras processuais ou substantivas do segredo de justiça”102. “Por outro lado, a conduta

penalmente proibida no art. 371.º traduz-se em (ilegitimamente) dar conhecimento, no todo ou em parte, do teor do acto processual reservado (isto é, sujeito a segredo de

justiça ou outro regime de reserva) (…)103”, ou a cujo decurso não for permitida a

assistência do público em geral, estes são os factos que realizam a previsão do tipo incriminador. Porém, será que uma conduta processualmente proibida fica fora do âmbito do tipo penal, como a que seja de tomar conhecimento do conteúdo de acto processual?

99 “O interessado deve nestes casos recorrer ao instrumento previsto no art. 86.º, n.º 13”, idem, ibidem, pp. 242 e 243.

100 PINTO,FREDERICODELACERDADACOSTA,Segredo de Justiça e Acesso ao Processo, Jornadas de Direito Processual

Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, Coimbra, 2004,p. 76.

101

Idem, ibidem, p. 76 (apud Neste sentido, em pormenor, MEDINADESEIÇA, Comentário Conimbricense III (cit. nt. 10), 650).

102 Idem,ibidem, p. 76. Neste sentido, ver também, Código de Processo Penal e a sua Interpretação Jurisprudencial, Doutrina e

Jurisprudência, 2.ª edição revista, atualizada e ampliada, Coordenação: ALBERTOSILVAFRANCO/RUISTOCO, Volume 1, Parte Constitucional, ALBERTO SILVA FRANCO/ CARLOS VICO MAÑAS/ LUIZ CARLOS BETANHO/ MAURÍCIO ZANOIDE DEMORAES/ SÉRGIO MAZINAMARTINS/ TATIANA VIGGIANI BICUDO, 1.ª edição: Setembro 1999; 2.ª tiragem: Fevereiro 2001 (Anterior à Reforma da Lei n.º 11.690/08), p. 1060.

52

5.2. Âmbito Subjectivo do Segredo de Justiça e Violação do Segredo de

No documento Segredo de justiça (páginas 50-53)