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ÔNUS DA PROVA DA JORNADA DE TRABALHO DO EMPREGADO

4 DURAÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO DO EMPREGADO DOMÉSTICO:

4.4 ÔNUS DA PROVA DA JORNADA DE TRABALHO DO EMPREGADO

A Lei 5.859 de 1972, que trata sobre a profissão do empregado doméstico, não traz nenhuma peculiaridade em relação ao ônus da prova nas ações trabalhistas destes. (BRASIL, 1972). Nem tampouco traz qualquer regra de regulamentação sobre o controle da jornada de trabalho, até porque a referida lei é anterior a implementação da Emenda Constitucional 72/2013 e antes dela não havia limite de jornada previsto em lei (BRASIL, 2013).

Contudo, os direitos dos domésticos presentes na Constituição Federal relativos à jornada de trabalho devem ser aplicados de imediato, assim de acordo com Cassar, deve ser utilizada a CLT, desde que se observada a compatibilidade, para dar efetividade a estes direitos (CASSAR, 2014).

A Consolidação das Leis do Trabalho dispõe que o ônus da prova cabe à parte que fizer as alegações. Desta maneira, pode se afirmar que a distribuição do ônus da prova neste diploma legal é estática (SCHIAVI, 2014a).

Nesta ótica, se o empregado doméstico pretende demandar o seu empregador pleiteando o pagamento de horas extras o ônus da prova incumbirá a este, pois alegação do fato é sua, devendo prova-lo. Além disso, trata-se de fato constitutivo de seu direito, o que se aplicando o artigo 333, I, do Código de Processo Civil, cabe a prova ao autor.

Malatesta ensina que o “ordinário se presume e o extraordinário deve ser provado” (MALATESTA apud MARTINS, 2012b, p.327). Logo, conforme Martins a jornada normal de trabalho de “8 horas diárias e 44 semanais” é ordinária e por isso será presumida. Já o labor “anormal”, que é trabalhar em horário superior a este limite é “extraordinário” e, portanto, incumbirá o ônus da prova ao empregado (MARTINS, 2014b, p.327).

Além disso, a maioria dos empregadores domésticos possui menos de 10 empregados, o que desobriga o controle do registro da jornada, conforme determina o parágrafo 2° do artigo 74 da Consolidação das Leis do Trabalho, in verbis:

Para os estabelecimentos de mais de dez trabalhadores será obrigatória a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções a serem expedidas pelo Ministério do Trabalho, devendo haver pré- assinalação do período de repouso (BRASIL, 1943).

Desta forma, como bem ensina Martins, não é possível a aplicação da Súmula 338, inciso I do Tribunal Superior do Trabalho, que determina que no caso da não

apresentação dos registros de ponto do empregado pelo empregador, se presumirá verdadeira a jornada pleiteada (MARTINS, 2014b).

Por conseguinte, considerando a aplicação do artigo 818 da CLT e artigo 333 do CPC, no caso do reclamado contestar a jornada de trabalho apresentada pelo reclamante em ação trabalhista, o ônus de prova-la será de quem alegou, ou seja, do empregado.

4.4.1 Possibilidade de inversão do ônus da prova

Sobre a possibilidade de inversão do ônus da prova no processo do trabalho a doutrina diverge.

No ponto de vista de Martins, não é possível a inversão do ônus da prova no processo do trabalho, pois não existe omissão na CLT sobre este tema e portanto não está autorizada a utilização do “direito processual comum”. O autor destaca, ainda, que também não pode ser empregado o artigo 6° do Código de Defesa do Consumidor (CDC) que autoriza a inversão do ônus da prova em prol da defesa do consumidor em determinados casos, pois a referida lei “é especial e não comum”, logo a sua aplicação no direito processual do trabalho não é permitida (MARTINS, 2014).

Já Schiavi entende ser possível a inversão, devido ao estado de “hipossuficiência do empregado” em certas demandas trabalhistas que o impedem de produzir provas do pleiteado ou torna muito difícil esta produção para ele (SCHIAVI, 2014a).

Schiavi defende, ainda, a aplicação do Código de Defesa do Consumidor para a inversão do ônus da prova em favor do empregado, argumentando que existe omissão na CLT e está de acordo com o “princípio do acesso à Justiça do trabalhador” (SCHIAVI, 2014a, p. 91).

Saraiva e Manfredini também compactuam do entendimento de ser possível a inversão do ônus da prova no processo do trabalho:

Com efeito, poderá o magistrado trabalhista, considerando a hipossuficiência do empregado, determinar, caso não existam outras provas nos autos suficientes à formação do convencimento acerca dos fatos alegados pelas partes, a inversão do ônus da prova. (SARAIVA; MANFREDINI, 2014, p. 406).

De acordo com Schiavi, “são requisitos para a inversão do ônus da prova no processo do trabalho: a faculdade do juiz e os alternativos hipossuficiência ou verossimilhanças das alegações” (SCHIAVI, 2014a, p. 92).

A respeito da faculdade do juiz de inverter ou não o onus probandi, Schiavi, afirma que esse pode aplicar a inversão de ofício. O autor alerta ainda, que só será necessária

a inversão “se não houver provas nos autos, ou seja, as partes não se desincumbiram do encargo probatório que lhes competia” (SCHIAVI, 2014a, p. 92).

Sobre a hipossuficiência do empregado, diz Pereira, que por força do “princípio da proteção” o empregado é considerado no direito do trabalho como a “parte mais fraca da relação jurídica”, e logo, hipossuficiente (PEREIRA, 2013, p.54). Reconhecendo-se, desta forma, a existência de uma desigualdade econômica entre o empregador e o empregado. Schiavi assevera, ainda, que a hipossuficiência não será apenas econômica, mas também é considerada a “dificuldade excessiva de se produzir a prova” (SCHIAVI, 2014a, p. 92).

Quanto à verossimilhança caberá ao juiz avaliar se as alegações da parte tem “aparência de verdade” (SCHIAVI, 2014a, p. 92).

A súmula 338 do Tribunal Superior do Trabalho trata em seu inciso I e III de situações em que o ônus da prova será atraído para o empregador, in verbis:

JORNADA DE TRABALHO. REGISTRO. ÔNUS DA PROVA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 234 e 306 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I - É ônus do empregador que conta com mais de 10 (dez) empregados o registro da jornada de trabalho na forma do art. 74, § 2º, da CLT. A não-apresentação injustificada dos controles de freqüência gera presunção relativa de veracidade da jornada de trabalho, a qual pode ser elidida por prova em contrário. (ex-Súmula nº 338 – alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)

[...]

III - Os cartões de ponto que demonstram horários de entrada e saída uniformes são inválidos como meio de prova, invertendo-se o ônus da prova, relativo às horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada da inicial se dele não se desincumbir. (ex-OJ nº 306 da SBDI-1- DJ 11.08.2003). (BRASIL, 2003). Desta maneira é clara a determinação de inversão do ônus da prova do inciso I da referida súmula, uma vez que a jornada de trabalho é alegada pelo reclamante e, portanto, pela regra geral da CLT, ele deveria provar. Todavia a Súmula excetua os casos em que a empresa é obrigada a manter registro de ponto, justamente por que é o empregador o mais apto a produzir esta prova.

No inciso III, a inversão é expressa, pois de acordo com Martins, “a orientação toma por base as máximas da experiência no sentido de que o empregado não marca o controle de ponto todos os dias no mesmo horário” (MARTINS, 2012b, p. 326).

No caso específico da prova da jornada de trabalho do empregado doméstico, Silva, afirma que sua “percepção inicial” é de que ônus da prova ficará a cargo do empregador por ser mais apto à produção da prova e devido à vulnerabilidade do obreiro doméstico. (SILVA, 2014). Assim, se o empregado não apresentar prova da jornada de trabalho que declinou na inicial, poderá o magistrado, na visão do autor, inverter o ônus da prova, para que o encargo probatório passe a ser do empregador.

Como mencionado anteriormente, Martins, é contrário a este entendimento, afirmando que não pode ocorrer a inversão, pois a distribuição do ônus no processo do trabalho é “estática”, sendo, desta forma, o ônus de provar horas extras, bem como intervalos que não foram concedidos é de quem alega, conforme determina o artigo 818 da CLT e 333 do Código de Processo Civil. (MARTINS, 2012b, p. 327).

4.4.2 Teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova

A Teoria dinâmica da distribuição do ônus da prova, segundo Peyrano “representa um deslocamento excepcional do ônus da prova, segundo as circunstâncias do caso, para aquele que esteja em melhores condições técnicas, profissionais, econômicas ou fáticas de produzi-la.” (PEYRANO, 2004, p. 21 apud AMBROSIO, 2013, p. 56).

Contudo, Ambrosio observa que a distribuição dinâmica é “excepcional” e só deve ser aplicada quando a distribuição do ônus prevista na legislação gera para a parte o encargo de produzir a “chamada probatio diabolica”, ou seja, aquela de produção “extremamente difícil ou impossível” (AMBROSIO, 2013, p. 56).

Schiavi alerta que a teoria em questão não pode ser confundida com a inversão do ônus da prova, uma vez que a distribuição dinâmica não necessita de “verossimilhança nas alegações”, pois se sustenta no princípio da aptidão da prova (SCHIAVI, 2014a, p. 97).

A jurisprudência, apesar de ainda tímida neste sentido, tem utilizado a teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova. Segue abaixo decisão do Tribunal Regional do Trabalho 2ª região (São Paulo):

HORAS EXTRAS. ÔNUS PROBATÓRIO. É do autor a prova dos fatos constitutivos do seu direito e da ré aquelas que comprovem os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito obreiro. Inteligência dos artigos 818 da CLT e 333 do CPC. Modernamente, a distribuição do ônus de prova é dinâmica, não

ficando limita ao disposto no artigo 818 da CLT, com o que tal ônus recairá sobre aquele que tem melhores condições de produzir a prova. Não comprovado

pelo reclamante suas alegações quanto à prestação de trabalho em "sobretempo", não procede sua pretensão. Recurso ordinário do autor ao qual se nega provimento. (SÃO PAULO, 2013, grifo nosso)

A análise de qual das parte terá melhores condições de produzir a prova será feita pelo juiz, que verificará se realmente uma delas encontra-se em posição de privilégio para produzi-la. Schiavi ressalta que não será um “arbítrio do juiz”, pois este deverá justificar juridicamente porque decidiu aplicar a teoria (SCHIAVI, 2014a, p. 97).

4.5 PROVA DA DURAÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO DO EMPREGADO