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A Avaliação de Escolas: uma proposta dialógica

Avaliar as escolas com rigor implica conhecer a natureza e configuração especiais que têm como instituições enraizadas numa determinada sociedade (…). Por outro lado, é imprescindível ter em conta o carácter único, irrepetível, dinâmico, pleno de valores e imprevisível de cada instituição escola

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Capítulo 3 – A Avaliação de Escolas: uma proposta

dialógica

3.1 – Contextualização

Em Portugal, a avaliação das escolas tem sido uma temática cada vez mais presente na agenda das políticas educativas. Esta crescente preocupação com a escola e todo o seu processo avaliativo prende-se com a importância que esta desempenha na transformação das práticas e como “lugar de desenvolvimento espontâneo da qualidade” (Thurler, 2000, citado por Alves, 2009: 97).

Segundo Alves (2009), o lugar de destaque dado à escola prende-se com o facto de se lhe reconhecer uma certa autonomia não apenas na gestão dos recursos humanos, mas também na organização do trabalho e na definição / adaptação do currículo. Então, segundo este autor, tem que se desenvolver uma avaliação baseada na “construção de sentidos”, ou seja, a avaliação tem de se constituir como um espaço de intersubjectividade, de negociação e de comunicação entre todos os agentes educativos (Alves, 2009: 99).

Tendo por base a Lei do Sistema de Avaliação da Educação e do Ensino Superior (Lei Nº 31/2002), podemos constatar que esta já pretende centrar as questões avaliativas na discussão da autoridade, ou seja, no jogo de dois autores consubstanciados na dicotomia avaliação externa/avaliação interna.

Assim, Alves (2009), propõe que o processo avaliativo das escolas (avaliação externa e avaliação interna) se desenvolva segundo uma tripla dimensão: dimensão da autoridade, dimensão metodológica e dimensão pragmática, que se passam a caracterizar:

- dimensão da autoridade (quem?) – pretende decidir sobre quem é o autor e o responsável pela iniciativa, pelo processo e pelo uso da avaliação;

- dimensão metodológica (como?) – pretende definir como se desenvolverá todo o processo de modelização, de construção de instrumentos e de recolha de informação; - dimensão pragmática (para quê?) – pretende inferir sobre a “utilidade” da avaliação tendo por base o carácter instrumental dos processos avaliativos e a sua importância na construção de juízos e representações (Alves, 2009: 100-101).

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A perspectiva dialógica pretende enfatizar a importância da participação e articulação entre todos os seus actores, bem como a construção de dispositivos de avaliação que estimulem lógicas de diálogo, negociação e de confronto de ideias e pontos de vista. Assim, Alves (2009: 102), considera:

Trata-se, finalmente, de tentar pensar a avaliação das escolas de outra maneira, o que, provavelmente, reclamará uma lógica de carácter inter–avaliativo, de confronto entre o interno e o externo, na negociação das perspectivas e na construção de sentido(s) num espaço inter-subjectivo.

É nossa convicção que a avaliação pode ser um instrumento decisivo no processo de melhoria e na implementação de estratégias de desenvolvimento e de mudança dos sistemas escolares. Consideramos que a avaliação deve ser participativa permitindo aquilatar a sua legitimidade e a adesão dos intervenientes. Os processos de avaliação participativa constituem-se em “aprendizagem social e, por isso, acrescentarão valor às instituições, aos seus trabalhos, programas ou projectos, reclamando, na condução do seu processo, momentos de recuo crítico e uma reflexão menos apaixonada das práticas, com explicitação das contradições ao nível das acções e das reacções” (Alves, 2009: 11).

Segundo Nóvoa (1992), “as escolas constituem uma territorialização espácio - cultural, onde se exprime o jogo dos actores educativos internos e externos; por isso, a sua análise só tem sentido se conseguirem mobilizar todas as dimensões pessoais, simbólicas e políticas da vida escolar, não reduzindo o pensamento e acção educativa a perspectivas técnicas, de gestão ou de eficácia stricto sensu” (Nóvoa, 1992: 16).

3.2 – Pensar a Avaliação de Escolas de outra forma:

perspectiva dialógica

Segundo Guerra (1995), qualquer processo avaliativo das escolas deve sustentar- se no diálogo entre todos os agentes educativos envolvidos nesse processo avaliativo. O diálogo surge assim, como uma dinâmica de análise de todas as opiniões e pontos de vista diferentes, sobre o que se pretende e o que se consegue na escola. A avaliação surge, segundo este autor, como uma “plataforma de participação” segundo a qual todos os participantes se envolvem activamente no processo de acção da escola e de toda a

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sociedade, interessada nos processos de educação que ocorrem dentro das escolas (Guerra, 1995: 104).

Considera-se que o conceito de escola como “comunidade” baseada no consenso, na convergência, na conformidade de interesses deverá dar lugar a um novo espaço de “diálogo” e de “construção” de todo o processo avaliativo e de melhoria das escolas.

De acordo com Alves (2009), uma perspectiva dialógica da avaliação, terá como base a concepção da escola que aceita como pressupostos a existência da disparidade de opiniões, de olhares e percepções diferentes, defendendo que o diálogo se constitui como uma instância de participação e de compromisso entre todos os intervenientes.

Segundo o mesmo autor, a avaliação (seja interna ou externa) deverá ter como finalidade a “construção de um olhar intersubjectivo que aumente a compreensão e, sobretudo, a melhoria das escolas”(Alves, 2009: 103). Assim, cada escola deverá definir as suas exigências de qualidade, a partir de uma planificação e regulamentação que dê coerência e dinamismo a todo o processo.

Alves (2009), considera que a dialogicidade dos processos avaliativos deverá contemplar três dimensões, a saber:

- dimensão da autoridade – pretende desenvolver a “profissionalização de um actor colectivo”, segundo uma lógica de “intersubjectividade” construída a partir da articulação entre a “avaliação externa” e a “avaliação interna”, entre o “eu” e o “outro”. Através desta metodologia, pretende-se reduzir no interior da escola os perigos quer do objectivismo normativo, quer do subjectivismo relativista;

- dimensão metodológica – defende uma processologia de referencialização pois considera que toda a metodologia de avaliação é, por natureza, um processo dialógico na “procura de referentes, na partilhas de informações, na explicitação de critérios e indicadores, na negociação das regras do jogo e, enfim, no enfoque na actividade dos próprios sujeitos” (Machado, 2003, citado por Alves, 2009: 105);

- dimensão pragmática – preconiza a “construção de sentidos” entre a escola e a sociedade. Através desta articulação escola - sociedade, pretende-se suscitar uma interacção mutuamente enriquecedora e, sobretudo, a definição e instrumentalização dos processos avaliativos no âmbito da melhoria e do sucesso das organizações escolares.

Apresenta-se de seguida uma figura que evidencia as três dimensões conceptuais propostas por Alves (2009), para a dialogicidade dos processos avaliativos.

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Figura 2: Dialogicidade dos processos avaliativos

Fonte: (Alves, 2009: 104)

Com a finalidade de concretizar o desenvolvimento e a operacionalização desta perspectiva dialógica da avaliação, Alves (2009), propõe um roteiro reflexivo, apresentado no Quadro 2. Segundo este autor, a resposta a cada um das questões presentes permitirá construir uma cultura de avaliação no sentido da regulação e desencadear uma gestão mais autónoma das escolas.

Pretende-se, que em cada escola, ocorra um processo de mudança construída colectiva e progressivamente. Nesse sentido, todos os agentes educativos que a constituem, possuem uma “margem de autonomia” que permitirá transformar a responsabilidade individual em responsabilidade colectiva.

Segundo o mesmo autor:

Este é um caminho exigente que tem como objectivo, quer o desenvolvimento das competências profissionais dos professores, quer a sua disponibilidade para analisar e dar a conhecer as suas práticas. Trata-se de uma postura formativa, que incentivará as escolas a diagnosticar os seus pontos fortes e fracos e a introduzir as modificações necessárias (Alves, 2009: 105). Autoridade: Quem? Intersubjectividade Interacção Interno/Externo Eu/outro

Pragmática: Para quê?

Uma construção de sentidos Interacção Escola/Meio Actores/sociedade Avaliação: Uma proposta Dialógica Metodologia: Como? Referencialização Interacção Auto/Hetero Quantitativo/qualitativo Interno/externo

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Quadro 3: Um roteiro reflexivo para a avaliação dialógica de escola

Espaço de posicionamento

Questões de partida Variáveis de avaliação Intenções 1. que é que se pretende com a avaliação? 1.1. Qual a “política” da escola?

1.2. Qual a finalidade principal da avaliação? Problemas “Técnicos” 2. Como arranjar formas de organização para a avaliação?

2.1.Qual o objectivo? 2.2.Com que instrumentos? 2.3.Quem avalia? 2.4.Quando se avalia? 2.5.Como divulgar a avaliação? Uso social 3. Para que servirá a avaliação? 3.1.A quem se destina a avaliação?

3.2.Qual a utilidade da avaliação?

Fonte: (Alves, 2009: 106)

De acordo com Sanches (2008), vivemos num tempo de incertezas, de expectativas, mas também de desafios para a escola, os professores, os alunos, os pais e encarregados de educação e a comunidade educativa.

É necessário que todo o processo de mudança seja articulado com bom senso, ponderação e visão no sentido de “contribuir para a dignificação, a autonomia e a (re)profissionalização dos professores, condição imprescindível para a melhoria da escola e da qualidade das aprendizagens dos alunos”(Sanches, 2008: 310).

Consideramos que a avaliação externa das escolas é necessária e deve contribuir para a mudança da organização escolar avaliada. Para que tal aconteça deverá existir, no nosso entender, uma forte cultura avaliativa no seu interior (o processo de avaliação (externa e interna

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deve ser equacionado como uma experiência enriquecedora e de mudança).

Segundo Guerra (2003), o processo de avaliação externa deve ser solicitado pela própria escola que, por sua vez, funcionará como patrocinador e participante. Assim, deve escolher no seu interior equipas que tenham a capacidade técnica e ética de analisar esses relatórios e posteriormente utilizar a informação neles contida para o processo de auto-avaliação institucional: o processo de auto-avaliação deve ser uma auto-reflexão e valorização, bem como promover a mudança necessária. Segundo o mesmo autor, a co-avaliação, isto é, a combinação do processo de avaliação externa e interna deve ser uma realidade instituída de forma responsável, articulada e envolvendo todos os agentes educativos (Guerra, 2003: 168-170).

No nosso entender a perspectiva dialógica da avaliação de escolas proposta por Alves (2009), poderá ser uma forte ferramenta de trabalho (recorrendo ao roteiro

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reflexivo para a avaliação dialógica de escolas – quadro 2: 47) para “o uso” da avaliação externa no processo de auto-avaliação e mudança/crescimento da organização escolar.

Consideramos que esta dialogicidade da avaliação (interna e externa) poderá desencadear no interior da escola um processo de mudança alicerçado na co- responsabilidade, partilha, questionamento e busca permanente do progresso e eficácia do serviço educativo prestado.

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