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3 – A contraposição Taylor X Ohno

No documento Uma releitura da subordinação (páginas 68-73)

Traçamos anteriormente um panorama do sistema taylorista de gerência científica da produção. Além disso, afirmamos, em linhas gerais, como se caracteriza o chamado modelo toyotista de organização do trabalho. Pretendemos, agora, fazer a inter-relação entre esses dois modelos, a fim de chegarmos ao ponto de investigação científica proposta nesse tópico: se há, de fato, uma diferença estrutural que oponha os modelos acima referidos de organização do trabalho e da produção.

76 CORREIA, Marcus Orione Gonçalves (org.). Curso de Direito do Trabalho. Volume 1. São Paulo: LTr, 2007. p. 37

Inicialmente cumpre estabelecermos a exata relação entre fordismo e taylorismo. Ainda que na literatura especializada ambos venham citados juntos, como adjetivação de um ou de outro, é certo que foram pensados por pessoas diferentes, em momentos – ainda que muito próximos – distintos.

Conforme já afirmamos anteriormente, Taylor pensou sua gerência científica para ser aplicada indiscriminadamente a todos os tipos de trabalho. Henry dord, por sua vez, formulou seu modelo inicialmente para a produção de veículos em série, com o objetivo de estabelecer um novo paradigma na produção de automóveis, o que o ajudou a popularizar o carro e tornar tão célebre sua indústria e seu método de produção.

Geraldo Augusto Pinto afirma: “Apesar de não ter citado Taylor, pelo menos em seu texto mais popular, intitulado Minha vida e minha obra, dord não deve tê-lo ignorado, como apontam algumas de suas ideias aí dispostas, ora refutando os ideais tayloristas, ora exaltando-os, indiretamente”.77 A observação dos métodos aplicados por dord não deixam

dúvidas quanto ao fato de que seu modelo de produção sofreu clara influência de Taylor, até porque, à época que dord iniciou seus experimentos, o taylorismo era o que havia de mais avançado em matéria de gerência científica do trabalho

Especificamente sobre a diferença entre Taylor e dord, o autor continua:

“Se a divisão de atividades entre vários trabalhadores, a elas limitados dentro de funções específicas, já estava bastante avançada na indústria com a expansão do sistema taylorista, a novidade introduzida por dord, com a linha de produção em série, foi a colocação do objeto de trabalho num mecanismo automático que percorresse todas as fases produtivas, sucessivamente, desde a primeira transformação da matéria-prima bruta até o estágio final (como o acabamento do produto, por exemplo). Ao longo dessa linha, as diversas atividades de trabalho aplicadas à transformação das matérias-primas ou insumos, foram distribuídas entre vários operários fixos em seus postos, após terem sido suas intervenções sub-divididas em tarefas cujo grau de complexidade foi elevado ao extremo da simplicidade”78

Porém, do ponto de vista do fordismo, mesmo essa diferença não é tão original .

77 PINTO, Geraldo Augusto. A organização do trabalho no século 20: taylorismo, fordismo e toyotismo. São Paulo: Expressão Popular, 2007. p. 41.

Nesse sentido o autor acentua:

“A divisão taylorista havia possibilitado que se distribuísse os trabalhadores e suas ferramentas efetivamente ao longo de uma linha, ao padronizar o trabalho em atividades cujas operações eram uniformizadas. Pode-se dizer, nesse sentido, que o sistema taylorista foi incorporado e desenvolvido pelos dispositivos organizacionais e tecnológicos fordistas, na medida em que, no lugar dos homens responsáveis pelo deslocamento dos materiais e objetos de trabalho, máquinas automáticas passaram a se encarregar por tal, suprindo o trabalho humano numa produção cuja cadência contínua impunha uma concentração dos movimentos dos trabalhadores somente dentro do raio de ação que efetivamente transformava as matérias-primas em produtos acabados”79

Nesse sentido, podemos auferir que o fordismo é uma espécie de taylorismo mecanizado, o que corrobora a opção pela nomenclatura fordismo/taylorismo para designar um determinado modelo de gerência e organização do trabalho e da produção. Uma implicação do taylorismo mecanizado é a criação de homens-máquina, trabalhadores que nada mais são do que uma peça em uma grande engrenagem de produção, tal qual celebrizado pelo grande Chaplin em seu filme “Tempos Modernos”.

A criação da figura do operário massa – que, de acordo com os desejos do seu empregador, pode se encaixar em qualquer área da produção, bem como ser remanejado para outras funções – é outra característica do fordismo/taylorismo. E esse modelo de organização do trabalho possui inúmeras implicações para a classe trabalhadora, todas elas passando, necessariamente, pelo incremento da alienação do trabalho e super exploração do trabalhador.

Pois bem. Traçado esse panorama e estabelecida a relação entre fordismo e taylorismo, podemos partir para a análise do modelo toyota de produção e sua relação com o modelo anterior. Ressalta-se que já tratamos, em momento precedente de nosso estudo, da crise do modelo fordista de produção até transição para o modelo toyotista, identificando, de maneira geral, os elementos que levaram à crise do fordismo e geraram a necessidade de um novo modelo de organização do trabalho.

Geraldo Augusto Pinto identifica as principais necessidades desse novo modelo

nascente:

“1. alta flexibilidade da produção, ou capacidade de produzir diferentes modelos de produtos num curto período de tempo, mantendo-se ou não a larga escala; 2. altos índices de qualidade nos produtos, o que reduziria inclusive custos de produção, em vista do baixo volume de retrabalho; 3. baixos preços finais, o que poderia ser obtido não apenas pela redução do re-trabalho e pela flexibilidade produtiva, mas através da manutenção de uma 'fábrica mínima', operando sempre com baixíssima capacidade ociosa, tanto em termos de equipamentos, quanto estoques e de efetivo de trabalhadores;

4. entrega rápida e precisa, com os pedidos sendo entregues no momento exato estipulado pelo cliente, na quantidade exata e com um controle de qualidade que lhe garantisse pronta utilização na maioria dos casos”80

Basicamente essas necessidades imprimiram o modelo toyota de produção: just in

time; produção sem estoques, através do sistema kanban; Círculos de Controle de

Qualidade (CCQ); fábrica enxuta; flexibilidade na produção; em suma, as diretrizes para o que posteriormente foi identificado dentro de uma lógica maior de acumulação flexível, conforme já fora apontado anteriormente.

Contudo, todas essas mudanças na forma de produzir não alteraram um dos postulados básicos do capitalismo: a exploração do trabalho. Ao contrário, aprofundaram- no. Ainda que identifiquemos mudanças substanciais na forma de produção de mercadorias – e aqui podemos identificar uma contraposição entre o fordismo/taylorismo e toyotismo – é certo que essas mudanças vieram no interesse do capital. Suas implicações sobre a classe trabalhadora nunca foram consentidas ou discutidas com os trabalhadores, mas sim impostas de cima para baixo, sempre objetivando o incremento da produção e o aumento dos lucros em detrimento das melhores condições de vida da classe que vive do trabalho.

Mesmo os consensos e as pretensas melhorias nas condições de trabalho foram forjadas. Patrícia Tuma Martins Bertolin, analisando a transformação na forma de organização da produção, traça o seguinte cenário:

“o panorama instaurado por essa Revolução da Tecnologia é mais ou menos o seguinte: salários achatados, ritmo frenético no ambiente de trabalho, rápido 80 Idem. p. 51.

crescimento do trabalho contingencial de meio período, desemprego tecnológico, aumento da disparidade de renda entre ricos e pobres e dramático encolhimento da classe média; tudo isso impondo um stress sem precedentes sobre a força de trabalho.”81

Augusto Pinto identifica o modelo toyotista como o modelo da “gerência por estresse”, no qual são estabelecidas metas para grupos de trabalhadores que tem no cumprimento dessas metas a responsabilidade por incremento de salários e, no limite, até mesmo por seus empregos. A criação de equipes de trabalho, através dos CCQs, cria uma falsa sensação de desalienação do trabalhador. Isso porque se o trabalhador se torna polivalente e conhece o funcionamento de sua equipe e das demais, parece que foi superado o paradigma alienante da esteira de produção fordista. Ocorre que essa sensação é ilusória e passageira, na medida em que o estresse gerado no trabalhador não supera o estranhamento do trabalho, até porque o processo produtivo é cada vez mais complexo e sequer se finaliza dentro de uma mesma indústria.

Percebe-se, assim, que esses mecanismos apenas transferem de maneira perversa os riscos da atividade econômica – inerente a atividade do empresário – ao trabalhador. Opera-se, assim, uma inversão inadmissível de condições, na medida em que o trabalhador, por todos os motivos já aqui enunciados, já está em situação de inferioridade perante seu patrão, não sendo correto que lhe seja impingida ainda mais essa responsabilidade. O mesmo autor já citado, em suas conclusões apresenta o seguinte:

“A evolução dessas técnicas de organização do trabalho ao longo desse período (séc. XX) é apenas uma dentre as muitas manifestações das lutas sociais travadas entre aqueles que dependem da venda de sua força de trabalho para sobreviver e aqueles que a compram no objetivo de acumular meios de produção e capital. Nesse sentido, deve-se ver a crise do taylorismo/fordismo frente ao avanço das organizações flexíveis, como o toyotismo, como um processo gestado dentro de uma conjuntura mais ampla, da qual faz parte a introdução das políticas neoliberais na atuação estatal, cujo principal atributo tem sido a renúncia a compensações sociais e à coletivização de direitos à totalidade da classe trabalhadora, nos contratos firmados com o empresariado”82

81 BERTOLIN, Patrícia Tuma Martins. A economia globalizada e seus efeitos sobre o Trabalho in: ARIENTE, Eduardo Altomare (coor.). dronteiras do Direito Contemporâneo. São Paulo: Casa Vida. Diretório Acadêmico João Mendes Jr. p. 57-73, 2002.

Podemos, assim, concluir que as mudanças na forma de organização do trabalho ao longo do século XX foram gestadas no seio do capital, sendo certo que as diferenças entre os modelos de produção podem ser consideradas pontuais, na medida em que possuem um objetivo maior, que é manter a acumulação de capital em detrimento de benefícios para a classe trabalhadora. A balança da luta de classes continua pendendo para um lado só.

No documento Uma releitura da subordinação (páginas 68-73)