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Este trabalho elegeu como objectivo a deformação permanente das misturas betuminosas, focando especificamente esta causa de formação de rodeiras. Em Portugal existem alguns insucessos relacionados com a formação de rodeiras por deformações permanentes excessivas ocorridas nas misturas betuminosas. A Figura 2.24 mostra um exemplo ocorrido no IC2 em Condeixa.

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Figura 2.5 - Rodeiras por deformação permanente das misturas betuminosas no IC2 Na Figura 2.5 é visível a rodeira de pequeno raio e as elevações laterais à rodeira que indicam que a sua origem está relacionada com a deformação permanente nas camadas betuminosas. Este troço de pavimento é muito solicitado pelo tráfego, uma vez que a circulação é bastante canalizada, faz-se a velocidades reduzidas e tem um considerável número de veículos pesados. Estes factores têm um peso crucial para a formação deste tipo de rodeiras.

A Figura 2.6 mostra uma vala realizada num pavimento em que a deformação permanente ocorrida nas camadas betuminosas superiores é nítida. Pode observar-se que nas camadas betuminosas inferiores e solo de fundação as deformações são praticamente insignificantes quando comparadas com as ocorridas no topo do pavimento.

O comportamento de uma mistura betuminosa depende das proporções relativas dos seus componentes e das propriedades destes. Assim, o comportamento das misturas betuminosas relativamente à deformação permanente depende dos seguintes factores (Pereira e Picado Santos, 2002):

ƒ propriedades dos seus constituintes (agregado, betume e possíveis aditivos);

ƒ composição da mistura betuminosa, isto é, das proporções de cada componente na mistura, bem como da compacidade e processo de compactação;

ƒ condições de serviço, como sejam, a temperatura (que afecta a viscosidade do betume), e as acções do tráfego (pressão dos pneus, tipo de rodado, distribuição lateral, etc).

Figura 2.6 - Pavimento flexível com deformação ocorrida à superfície devido à deformação permanente das misturas betuminosas (NCHRP, 2002)

A deformação permanente verificada numa camada betuminosa é o somatório de duas componentes. Por um lado a sobrecompactação (densificação) da camada, que provoca uma diminuição de vazios e um correspondente assentamento à superfície. Por outro lado, as deformações ocorridas por tensões de corte na camada betuminosa, devido aos efeitos das cargas do tráfego, que provocam essencialmente deformações a volume constante.

A contribuição de cada uma destas componentes depende de diversos factores, no entanto, o aparecimento de rodeiras por deformação permanente de misturas betuminosas resulta principalmente de deformações por corte (SHRP, 1994a). A contribuição relativa da deformação por corte é normalmente superior, especialmente em camadas betuminosas que apresentam valores elevados de deformação permanente. A densificação apenas apresenta uma contribuição relativa superior em pavimentos cuja compactação tenha sido insuficiente ou em pavimentos que apresentem valores de deformação permanente baixos (SHRP, 1994b). Devido a estes factores, a deformação permanente ocorre na zona do pavimento onde se verificam as maiores temperaturas e as maiores tensões de compressão e de corte, ou seja na parte superior dos pavimentos. Alguns autores referem que as deformações permanentes nas misturas betuminosas devido às cargas de tráfego ocorrem essencialmente nos 10 cm superiores do pavimento (SHRP, 1994b).

Existe uma diferença temporal entre a ocorrência da contribuição por deformação por corte e por densificação. A densificação ocorre durante a fase inicial de serviço do pavimento, em que o abaixamento que ocorre na zona de passagem dos rodados é superior às elevações que

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deformação permanente. Nesta fase verifica-se que a um abaixamento na zona dos rodados corresponde um crescimento nas elevações laterais com praticamente o mesmo volume. Pode considerar-se que esta fase se prolonga durante toda a vida do pavimento, no entanto a formação de rodeiras devido a deformações permanentes em misturas betuminosas ocorre mais rapidamente no início da vida útil do pavimento, quando o betume ainda é jovem e em condições climatéricas de temperaturas elevadas.

Outra questão importante é a deformação permanente ir aumentando com o número de carregamentos, isto é, a deformação permanente aumenta com a quantidade de rodados que solicitam o pavimento (SHRP, 1994a). No entanto, a evolução da deformação permanente com o número de carregamentos é não linear, como se pode observar na Figura 2.7.

Figura 2.7 - Aumento da deformação permanente com o número de carregamentos (Houben et

al., 1999)

A evolução da deformação permanente em camadas betuminosas apresenta três fases características (Zhou et al., 2004). Uma primeira fase em que o acréscimo de deformação por carregamento é elevado. Este comportamento deve-se à deformação verificada não ser só devido a deformação por tensões de corte mas também existir densificação na camada betuminosa. Esta densificação da mistura betuminosa aumenta a resistência à deformação permanente pois melhora os contactos entre os agregados. Esta densificação processa-se até a mistura ter resistência suficiente para suportar as cargas sem sofrer mais redução de volume, passando as deformações a ocorrer a volume constante.

Uma segunda fase em que o acréscimo de deformação permanente por carregamento é inferior ao da fase anterior e toma um valor quase constante. Nesta fase as deformações ocorrem a volume constante devido a tensões de corte. A deformação evolui de uma forma quase linear com o número de carregamentos durante esta fase.

Na terceira fase ocorre a designada rotura, em que o acréscimo de deformação por carregamento aumenta drasticamente entrando-se no domínio das grandes deformações por corte. Na Figura 2.8 representa-se a evolução típica da deformação permanente com a identificação das diferentes fases. Na prática é possível sob diversas condições que não ocorram uma ou mais fases.

Figura 2.8 - Fases da evolução da deformação permanente em misturas betuminosas (Feire, 2002)

Este comportamento das misturas betuminosas é passível de ser observado em pavimentos e em ensaios laboratoriais. Assim, as curvas de deformação de misturas betuminosas obtidas em ensaios laboratoriais apresentam um andamento semelhante ao representado na Figura 2.8. Pode dizer-se que são diversos os factores que influenciam a deformação permanente em camadas betuminosas:

ƒ Excesso de ligante - tende a funcionar como um lubrificante facilitando o movimento relativo entre as partículas;

ƒ Granulometria dos agregados - as misturas com agregados de maior dimensão e granulometria contínua apresentam melhor resistência à deformação permanente devido

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a se conseguir um melhor contacto entre as partículas do agregado, oferecendo assim uma maior resistência.

ƒ Agregados britados - as misturas com agregados britados são mais resistentes à deformação permanente do que as que utilizam agregados rolados, pois os agregados britados fornecem melhor resistência por atrito.

ƒ Compactação insuficiente - se a camada apresentar uma porosidade muito superior à que se irá verificar a longo prazo as cargas do tráfego irão produzir assentamentos indesejáveis. Um maior esforço de compactação leva a um maior contacto entre as partículas do agregado ficando estas orientadas de forma a resistirem mais.

ƒ Viscosidade do betume - o uso de betumes mais duros ou modificados aumenta a resistência à deformação permanente das misturas betuminosas.

Quando ocorre uma excessiva deformação permanente nas camadas betuminosas do pavimento é normal que isso aconteça nos primeiros anos de vida do pavimento, enquanto o betume é jovem, sendo por isso menos viscoso. Após o endurecimento do betume, devido à exposição a factores ambientais e por oxidação este apresenta maior viscosidade, tornando-se mais resistente à deformação permanente.

Para além das consequências óbvias que advêm do aparecimento de rodeiras por deformação permanente nas camadas betuminosas e que pode levar à saída de serviço do pavimento, acresce o facto deste fenómeno acontecer no princípio da vida útil deste. Assim, a percepção negativa dos utentes e as consequências para a administração poderão ser mais nefastas que as ocorridas devido a outro tipo de degradações que se manifestam passados mais anos de serviço. A caracterização das misturas betuminosa relativamente à sua resistência à deformação permanente assume-se assim de fundamental importância.