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A etapa do auge da Extensão Rural Oficial e o caso do Brasil

Olivo Dambrós

produção 12 como forma de integração da unidade, preconiza uma visão

3. Trajetória da Extensão Rural convencional: “principais etapas”

3.4 A etapa do auge da Extensão Rural Oficial e o caso do Brasil

Esta etapa ocorre entre os anos de 1960 e 1970 e corresponde ao clímax do processo de modernização e fortalecimento do modelo difusionista proposto para os países subdesenvolvidos, entre eles o Brasil (SÁNCHEZ DE PUERTA, 1990).

Figura 1 - Representativa do modelo de Extensão difusionista

Fonte: Bracagioli Neto (2004).

A Figura 1 representa o modelo metodológico adotado pela Extensão Rural neste período denominado “difusionista inovador” que negava o desenvolvimento endógeno das famílias e suas comunidades, fazendo crer que os valores de fora eram mais evoluídos. A figura sugere que os pensamentos são muito distintos entre o que o técnico está pensando e o que o agricultor realmente espera. A figura expressa ainda visões de mundo diferentes e desconectadas, limitando a capacidade do diálogo entre ambos e a construção social do conhecimento.

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O modelo consistia em levar as tecnologias indo além do modelo

clássico de simples repasse das estações experimentais. A proposta

metodológica consistia em difundir a tecnologia no sentido de que as famílias mudassem seus valores e comportamentos, acreditando nas novas ideias como forma de melhorar sua vida, mesmo que isso sugerisse a negação da história de seus ascendentes. A metodologia valorizava diferentes capacidades individuais para inovar e utilizava líderes comunitários (inovadores) para facilitar a entrada e o trabalho dos extensionistas (FONSECA, 1985, p. 132).

A assimilação da proposta de Extensão americana no Brasil foi de tal magnitude que, nesse período, considerava-se como consolidado esse modelo. A partir daí, teve início sua extensão para outras áreas estratégicas como pesquisa e ensino. Vários convênios foram sendo celebrados entre escolas brasileiras de agronomia (ESALQ, ENA - atual Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, UFRGS, UFV, UFPEL) e universidades americanas (OHIO, WISCONSIN, PURDUE, NORT CAROLINE), provocando uma reformulação radical das estruturas de ensino e pesquisa nas universidades brasileiras (PEREIRA; PEREIRA, 2010).

A partir destas parcerias, muitos profissionais, com destaque nas áreas de ensino e pesquisa, estudaram em Universidades Americanas como forma de garantir o padrão do modelo implantado no Brasil. Da mesma forma, muitos profissionais dos Estados Unidos passaram a atuar, como convidados, junto a Universidade Rural do Estado de Minas Gerais. Este intercâmbio fez com que a área de ciências agrárias passasse a sofrer uma forte influência americana nos processos tecnológicos químico- mecânicos, em detrimento das práticas biológicas vegetativas, influenciando, fortemente, na formação dos profissionais das ciências agrárias, agora, cada vez mais especializada, em vez de sistêmica.

Ao mesmo tempo em que ocorre a ―doutrinação‖ dos agrônomos e veterinários, surge o Sistema Brasileiro de Pesquisa Agropecuária. A

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criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), em 1974, vem acompanhada de uma proposta de geração e difusão, assentada na montagem de ―pacotes tecnológicos‖ por produtos (AGUIAR, 1986).

Entretanto, pesquisa e extensão atuaram como atividades diferentes, mesmo relacionadas nos processos de transferência de tecnologia. Na concepção da elite brasileira, a função da pesquisa era gerar conhecimentos e da Extensão Rural, transferir estes conhecimentos gerados em laboratórios aos agricultores e a estes o papel era de aplicar estas tecnologias prontas, nas suas propriedades. Como afirma Schmitz (2010), cada setor atuando de forma segmentada sem considerar se o conhecimento construído era realmente o conhecimento demandado pela família:

A pesquisa atuou, historicamente, de forma isolada e pouca vez ouviu a Extensão e muito menos conduziu suas pesquisas orientadas pelas demandas dos agricultores e suas organizações (SCHMITZ, 2010, p. 240).

A criação da Embrapa foi estratégica para sustentar o discurso científico utilizado para o crescimento do paradigma técnico-científico, vinculado à Revolução Verde. Entretanto, ao mesmo tempo em que supervalorizava os conhecimentos ―científicos‖, procurava desqualificar os agricultores como sujeitos capazes de produzir conhecimento.

A ciência, representada pelas recomendações dos serviços de Assistência Técnica, monopolizou o domínio dos conhecimentos. As recomendações técnicas passaram a ser vistas como verdades únicas, reforçando a ideia de que os agricultores são apenas receptores. Isto os fez perder, dia-a-dia, sua tradição cultural e histórica de produção de conhecimento, a qual, se mantida, poderia levá-los a uma maior autonomia (PEREIRA; PEREIRA, 2010).

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A padronização tecnológica passou a ter um papel fundamental na agricultura em todo mundo, apesar das grandes diversidades e características de cada local. Tratava-se de um modelo que refletia a expansão do capitalismo no campo, onde ―desenvolvimento‖ era concebido como crescimento econômico, industrialização e expansão dos mercados. No entanto, esse modelo da Revolução Verde não impôs somente a padronização técnica, mas também uma padronização nos aspectos socioeconômicos e políticos que provocaram grandes transformações de ordem organizacional e de gestão para os sistemas de produção agrícola.

Os resultados imediatos do modelo da Revolução Verde foram o aumento dos rendimentos físicos da terra, a produtividade do trabalho e a redução dos custos unitários de produção. Por influência desse modelo, as unidades de produção especializaram-se em poucos cultivos, substituindo o sistema tradicional de policultura-criação de animais. Os agricultores passaram a utilizar, cada vez mais, insumos industriais, produzindo prioritariamente para o mercado em vez da produção para o autoconsumo, considerando mais barato e prático comprar de fora.

E, por fim, como resultado da adoção desse modelo, houve substituição intensa de trabalho por capital, implicando numa concentração cada vez maior da produção. Através do uso da tecnologia ocorre a ―racionalização científica‖ das práticas agrícolas, em detrimento das experiências tradicionais que foram substituídas por condutas padronizadas, tanto na produção material, como na gestão das propriedades (FONSECA, 1985).