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A prática do skate na pista e a sociabilidade dos jovens

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Capitulo II – Corpo e juventude: apropriando-se da cidade

2.4. Com a palavra os jovens skatistas

2.4.2. Sistematização e análises das entrevistas com os jovens skatistas

2.4.2.3. A prática do skate na pista e a sociabilidade dos jovens

O terceiro tema ao qual se procura pesquisar entre os jovens skatistas relaciona- se a: Sobre a Pista de Skate (Acordos, dinâmicas, sociabilidade, etc.). Optou-se, através da metodologia utilizada para a análise e interpretação das respostas dos participantes, em distribuir o tema por aproximadamente quatro questões/perguntas norteadoras. Veja- se a seguir.

Relacionado à primeira pergunta ela procura saber: Como são as dinâmicas de uso da pista? Dentre as supostas categorias possíveis de serem analisadas destacam-se a presença de acordos, regras e o estabelecimento de um ambiente de respeito que paira sobre a pista, para que diferentes frequentadores skatistas possam fazer uso dela.

Esta reflexão fica clara ao se observar as falas de dois jovens skatistas participantes na pesquisa. O primeiro é Leonardo (ENTREVISTA, 2017) que quanto aos acordos estabelecidos para se usar a pista vai dizer que: “[...] eu tô na minha linha56,

enquanto que eu não errá a manobra eu não saio [...]”. O segundo é Pedro (ENTREVISTA, 2017) e sua fala corrobora com a do participante acima alegando que o uso da pista: “[...] é consensual [...], um vai manda manobra e tem que aguardar um tempo pros outros que ainda não foi podê andá [...]”.

Através do que foi relatado pelos dois participantes nota-se haver acordos e regras flexíveis que orientam o uso da pista. Contudo estas regras são válidas durante o tempo em que ali eles permanecem, porque pode ocorrer de em outro momento ao haver a presença de demais sujeitos, novos acordos coletivos possam ser estabelecidos, gerando novas formas de orientar a pratica e a vivência do skate na pista.

Isto ocorre pelo fato da multiplicidade de jovens que frequentam a pista, inclusive para a prática de outra vivência com o corpo em movimento tais como os patins, etc. Deste modo compreende-se que os sujeitos são reprodutores, mas ao mesmo

tempo produtores de sentidos e significados simbólicos, culturais, antropológicos, normativos e de convívio coletivo.

Completa-se o argumento com a reflexão de Rampazzo (2012), desenvolvida em pesquisa etnográfica sobre a prática do skate realizada por jovens. Assim, sobre a pista, suas dinâmicas de uso e acordos coletivos o autor vai sugerir que:

Por certo, pensar que todos os praticantes de skate assimilam homogeneamente ou se submetam a tais códigos sociais sem questioná- lo/subvertê-los, seria desconsiderar a diversidade que se faz presente na pista. Levando em conta os aspectos que observei na pista (códigos sociais, legitimidade, autoridade, [re]conhecimento e subversão), compreendo que a noção de jogo – Bourdieu (1983) –, em parte, contribui para a compreensão e a descrição da complexa relação na pista. Compreendo como um dos aspectos simbólicos o jogo na pista. Este é jogado por pessoas e grupos, que comungam minimamente de alguns códigos sociais do skate na pista. Sujeitos e grupos que se engajam em uma disputa pelos significados do skate que é praticado na pista (RAMPAZZO, 2012, p.62, grifos do autor).

No que se refere à segunda pergunta ela tem por objetivo descobrir o que se segue: Qualquer um pode usar a pista? Majoritariamente os participantes responderam que todos os jovens skatistas, enfim toda e qualquer pessoa que nos processos simbólicos dos acordos – sendo reprodutor e produtor de sentidos e novos significados (RAMPAZZO, 2012) –, desejar usar a pista, ela terá o direito para tal até porque a pista se configura em uma iniciativa do poder local, constituindo-se em política pública de esporte e lazer. Este pensamento fica bem explícito, claro por meio do argumento utilizado por uma das participantes, Jaqueline (ENTREVISTA, 2017) ao mencionar que: “Qualquer um, a pista é pública [...]”.

Acerca da terceira pergunta, subdividida em três, ela tenta identificar se: Há grupos? Como é o relacionamento entre os jovens skatistas de outros grupos ou skatistas independentes? Há preconceito em relação a gênero? De acordo com o que foi respondido podem-se identificar categorias de análise tais como as que afirmam a existência de grupos, a presença de skatistas independentes e o preconceito relativo ao gênero.

Dentre as respostas que se destacaram cabe apresentar a de Marcelo e a de Ingrid, pois demonstraram uma percepção singular dos fenômenos categorizados que não estiveram presentes nas demais. Marcelo (ENTREVISTA, 2017) destaca que: “[...] existem vários tipos de grupo [...] os gangsters [...], os [...] punk [...], só que é todo mundo unido [...]. Olha, por certa parte dos praticantes sim, [...] pra mim eh sô totalmente mente aberta, totalmente a favor que todo mundo pratique [...]”.

Na fala de Marcelo fica explícito que existem grupos com diferentes características, porém esta diferença não impede que haja uma espécie de consenso para que ambos usem a pista de skate. Dentre os grupos citados pelo participante estão os

gangsters e os punks. Para além de mera especulação vocabular, estas palavras

representam grupos com modos diferentes de ver e inserir-se no mundo, de se relacionar com o corpo esteticamente do ponto de vista das roupas que usam, das músicas que ouvem, do linguajar utilizado e da forma pela qual praticam o skate.

Os gangsters também denominados por Olic (2010) de skate-rap enfatizam: “[...] manobras de giro (ação [...] em que o skate gira em torno de seu próprio eixo para depois novamente se acoplar ao pé do skatista) e de borda (movimento em que o skatista desliza com o skate na beirada dos obstáculos)” (OLIC, 2010, p.23, grifos do autor). A seguir uma figura que representa a imagem de jovem adepto do skate-rap:

Figura 1: skate-rap.

Disponível em: <https://sempreskaters.wordpress.com/>. Acesso em: 31 de Julho de 2017.

Os punks que também são chamados por Olic (2010) de skate-punk acabam por dar sentido à vivência do skate por meio de um estilo de movimentos onde se: “[...] prioriza a velocidade e a agressividade em detrimento de uma técnica mais apurada [...]” (OLIC, 2010, p.22). Abaixo figura que apresenta imagem de jovem adepto do skate-

Figura 2: Skate-punk.

Disponível em: <http://teamrock.com/feature/2017-06-14/skate-or-die-how-skate-punk-took-over-the- world>.

Acesso em: 31 de Julho de 2017.

Já Ingrid (ENTREVISTA, 2017) deixa claro que: “[...] existe muitos grupos [...]. Alguns se dão bem, [...] já teve briga já em pista. Tem grupo que conversa, [...] mais geralmente fica isolado [...]. [...] um pouco só por causa que os meninos acha interessante uma menina gostá de skate [...]”.

Logo, a partir da fala de Ingrid observa-se que existem grupos que se dão bem uns com os outros, porém há grupos que não se dão tão bem assim, porque como ela relata já houve desentendimento, fato que gerou até mesmo brigas. E no que tange aos skatistas independentes nem sempre ocorre uma afluência entre eles e os grupos de skatistas.

Agora, um fator presente tanto na fala de Marcelo quanto na de Ingrid é a questão do preconceito de gênero na pista, preconceito este que parte dos indivíduos, jovens ou não que julgam que a prática do skate não deve ser vivenciada pelas jovens, pelo fato de ser uma atividade vinculada ao universo masculino. Por isto ressalta-se que o machismo ainda se faz latente, supostamente arraigado à formação sociocultural brasileira. No que se refere ao skate feminino um dos seus muitos desafios é romper com o preconceito de gênero (FIGUEIRA, 2008).

No que tange a quarta pergunta ela se dispôs, a saber, se: Há diferença entre a prática do skate na rua e na pista? Ao observar as respostas dadas pelos participantes percebe-se que em sua totalidade eles foram unânimes em relatar que existe completa diferença entre a forma que se pratica o skate na rua da maneira praticada na pista.

Como para esta pergunta pôde ser identificada a categoria de análise que relata haver diferença entre os dois estilos de se vivenciar o skate, optou-se por destacar e analisar a fala de Leonardo porque de acordo com ele na rua existe mais liberdade, uma vez que a cena urbana é ressignificada permitindo-os adequar o espaço rumo aos seus objetivos lúdicos, criando novas possibilidades de obstáculos que aumentam o grau de dificuldade da prática do skate e que na pista os obstáculos já se encontram prontos, ficando o skatista dependente unicamente do que a pista pode lhe oferecer naquele momento.

Veja-se nos dizeres de Leonardo (ENTREVISTA, 2017): “[...] na pista cê tem ali um caxote montado [...], na rua cê tem que tê a criatividade vê um gramado [...] pulo de flip [...], [...] eu acho que a prática na rua é mais difícil e bem diferente”.

Destaca-se também na fala do skatista o uso das palavras caxote – ou caixote – e

flip. Caixote na linguagem dos skatistas é um obstáculo que permite a execução de

diferentes tipos de manobras. Veja-se na figura abaixo que apresenta a imagem de skatista executando manobra sobre o caixote.

Figura 3: Caixote.

Disponível em: <http://stanleyhenrique.blogspot.com.br/2010/07/>. Acesso em: 31 de Julho de 2017.

Já a palavra flip no vocabulário dos skatistas é utilizada para denominar uma das múltiplas, inúmeras, variadas e incontáveis manobras – (OLIC, 2010) – existentes e praticadas pelos grupos juvenis skatistas e que são marcadas pela capacidade artística, inventiva e criativa do skatista a partir da experiência do corpo em movimento, deslizando-se pelo espaço sobre o skate.

Não é objetivo da pesquisa realizar total e completa descrição biomecânica e biodinâmica do movimento corporal, ao qual o skatista realiza com o seu corpo quando tenta, faz e acerta a manobra – o que se acredita empobrecer a riqueza da experiência estética, sensível, do momento em que o movimento tendo-o como linguagem, arte, é contemplado e admirado pelo público que o vê. Todavia, a cargo de efeitos didáticos e de estética usar-se-á figura que demonstra imagem da skatista realizando a manobra, fato que facilita e amplia a compreensão sobre o que é o flip. Veja-se a seguir.

Figura 4: Flip.

Disponível em: <http://qixmissy.com.br/skate/entrevista-juliana-lima/>. Acesso em: 31 de Julho de 2017.

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