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A TENDÊNCIA DE EXPANSÃO DA GERAÇÃO TERMELÉTRICA

PETRÓLEO 194Mt

4.4 A TENDÊNCIA DE EXPANSÃO DA GERAÇÃO TERMELÉTRICA

Para além das variações conjunturais, é possível afi rmar, pelos dados históricos apre- sentados na seção 3.1, que a geração termelétrica a combustíveis fósseis vem ganhan- do espaço na matriz elétrica brasileira. As principais causas dessa tendência, pelas aná- lises feitas pelo IEMA, são a redução da capacidade de armazenamento do sistema elétrico, os investimentos em novas unidades de geração termelétrica para garantir segurança de fornecimento de energia elétrica e períodos secos intensos. Além disso, cabe acrescentar o aumento da variabilidade da matriz elétrica brasileira e a recente movimentação no mercado de gás natural.

Diferente da maior parte dos países, o Brasil historicamente apresentou uma matriz elé trica renovável, muito em razão da majoritária participação da hidroeletricidade na geração de eletricidade. Para lidar com a variabilidade dos regimes de chuvas, o país estruturou seu sistema elé trico a partir de três pilares fundamentais: geração hidre- létrica com reservatório, complementação térmica e um sistema de transmissão de amplitude nacional e centralizado – o Sistema Interligado Nacional (SIN).

Porém, a exemplo do que ocorre em outros países, a confi guração do sistema elé trico brasileiro tem passado por signifi cativas mudanças nos últimos anos. A quase totalidade das hidrelétricas recentemente construídas, em obras e planejadas, é do tipo fi o d’água, sem reservatório de regularização, o que diminui a sua capacidade de suprir a energia elé trica nos períodos mais secos do ano (redução do fator de capacidade anual). Este é o caso das usinas hidrelétricas (UHE) de Santo Antônio, Jirau e Belo Monte.

Como visto, também se tem verifi cado uma grande expansão das chamadas fontes renováveis não despacháveis, como a eólica e a solar fotovoltaica. Tratam-se de fontes cuja disponibilidade de gerar energia depende diretamente das condições meteoroló- gicas, como a existência de ventos em condições ideais e de ausência de fatores que interfi ram na captação da radiação solar (como nebulosidade), impedindo o controle da geração de eletricidade por parte do ONS.

Essa progressiva mudança de perfi l da matriz elétrica tem imposto alguns desafi os. Primeiro, será preciso reforçar e aprimorar os modelos físicos e computacionais de previsão para que tenham condições de antecipar com maior acurácia as variações meteorológicas referentes, principalmente, aos regimes de chuva, vento e radiação. Segundo, será preciso ampliar e melhorar os sistemas de transmissão, para que seja possível tirar proveito do potencial de complementação existente entre as fontes ener- géticas do país. Por exemplo, verifi ca-se uma complementaridade sazonal entre a dispo- nibilidade do vento e o regime de chuvas. Ou seja, chove mais no verão (no subsistema Sudeste/Centro-Oeste) e venta mais no inverno e na primavera (no subsistema Nordes- te). Este fato tende a ser positivo, na medida em que reduz o impacto da crescente varia- bilidade da matriz elé trica como um todo, já que a geração eólica nos períodos de baixa pluviosidade pode reduzir a necessidade de aproveitamento da energia armazenada nos reservatórios. Preservados, estes acabam por ter melhores condições de prover energia, inclusive em situações de longos períodos de seca. O mesmo raciocínio vale para a ener- gia gerada por biomassa da cana, que se concentra entre maio e novembro, no período de menor pluviosidade, que acontece junto com o período de safra.

Terceiro, será preciso buscar alternativas que tragam fl exibilidade à matriz elétrica bra- sileira. Para tanto, o caminho é agregar ao sistema mais fontes fl exíveis, ou seja, aque- las que são capazes de rapidamente serem acionadas nos momentos de indisponibi- lidade do vento, da chuva e do sol. No caso brasileiro, as opções mais fl exíveis são as hidrelétricas com reservatório e as térmicas a gás natural.

Quarto, também será importante inserir alternativas de armazenamento. Fala-se tanto em baterias, as quais, contudo, não se vislumbram viáveis principalmente no curto pra- zo, quanto nos reservatórios das hidrelétricas.

De todo modo, as soluções de fl exibilidade que se têm evidenciado mais factíveis, pelo menos da perspectiva econômica, é o uso das usinas termelétricas utilizando combus- tíveis fósseis. Primeiro, como fontes de complementação nos casos de indisponibili- dade das renováveis não despacháveis, e, neste caso, fala-se particularmente, do gás natural. Segundo, como fontes a funcionarem na base do sistema, “liberando” as hidre- létricas com reservatório a assumirem um novo papel – o de modulação do sistema, ou seja, o de complementação nos casos de indisponibilidade das fontes renováveis não despacháveis. Fala-se neste caso de térmicas com níveis mais altos de infl exibilidade, como as a carvão.

Adicionalmente a esse fator, um outro motivo tem levado o IEMA a reforçar a percep- ção de uma tendência de aumento da participação da geração fóssil na matriz elétrica doméstica: a recente movimentação no mercado de gás natural.

No Brasil, a cadeia deste combustível foi desenvolvida e é praticamente dominada, em um monopólio de fato, pela Petrobras, sendo esta detentora de 81,2% da produ- ção em 2015 (ANP, 201625). Porém, por um conjunto de razões de ordem operacional,

econômica e política, a empresa está se desfazendo de seus ativos desse setor, numa sinalização de que o mercado de gás natural tende a se abrir a novos agentes e investi- dores. A questão é como atraí-los para um mercado ainda pouco desenvolvido, pouco estruturado e numa conjuntura de crise econômica e política (Romeiro, 2016)26.

25 ANP. Anuário estatístico brasileiro do petróleo, gás natural e biocombustíveis. Rio de Janeiro:

Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis, 2016. Disponível em: https://goo.gl/cfe9Ah

26 ROMEIRO, D.L. As indefi nições da indústria do gás no Brasil. In Impetro de 26/10/2016.

De fato, ao mesmo tempo em que o setor de gás natural apresenta um grande poten- cial ainda a ser explorado, muito em função do gás associado às reservas de petróleo do pré-sal, por outro lado, a infraestrutura da cadeia ainda precisa ser consolidada, com demandas quanto à expansão das etapas de processamento, transporte (dutos) e distribuição. Atrair o investimento privado nesse contexto requer uma sinalização de baixo risco, o que se traduz pela construção, por parte do governo, de um ambiente re- gulatório e de mercado favorável. A termoeletricidade entra nesse jogo como um vetor de demanda de gás que pode cumprir esse papel de alavancar um mercado estável e de baixo risco para o investimento.

O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) aprovou, em reunião realizada em dezembro de 2016, a Resolução 10/2016, a qual estabeleceu as diretrizes estratégicas para o desenho de novo mercado de gás natural, criando um Comitê Técnico para o Desenvolvimento da Indústria do Gás Natural no Brasil, com o objetivo de propor medidas que garantam a transição gradual e segura para a manutenção do adequado funcionamento do setor de gás natural e de avaliar a possibilidade de aceleração da transição. Foi explicitada como uma das diretrizes estratégicas a “promoção da integra-

ção entre os setores de gás natural e energia elé trica, buscando alocação equilibrada de riscos, adequação do modelo de suprimento de gás natural para a geração termelétrica e o planejamento integrado de gás-eletricidade” (art.2º, XVII).

Se a referida integração entre os setores de gás e energia elétrica avançar conforme as orientações dadas pelo CNPE, a tendência é que ocorram, por exemplo: (i) a pos- sibilidade de que as usinas térmicas operem na base do sistema de geração elé trica, funcionando como âncora para os investimentos no setor; (ii) as penalidades do setor elé trico poderem ser transferidas ao carregador em caso de falha no fornecimento de gás; e (iii) a revisão da exigência de demonstração imediata de lastro de gás para todo o período contratual no setor elé trico, o que impõe uma barreira à entrada de projetos de térmicas a gás.

Se essa é uma movimentação para valer ou uma aposta do governo atual, é cedo para afi rmar. Fato é que se deve fi car atento, dado seu potencial impacto quanto à confi gu- ração da matriz elétrica brasileira e as emissões de GEE.

4.5 MITIGAÇÃO DOS IMPACTOS AMBIENTAIS