• Nenhum resultado encontrado

Capítulo II – O ENSINO DA LEITURA NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E

3.2 Acionamento do contexto

Os contextos são um conjunto de parâmetros ambientais, sociais, culturais e individuais que ancoram, de modo implícito, determinado ato comunicativo materializado em texto. Dessa forma, para não incidir em leitura “inadequada” é necessário que o leitor conheça, além dos contextos socioculturais manifestados no texto, os elementos paratextuais, como autor, suporte, publicação e gênero textual. Essa adequação do contexto, como parte constitutiva da compreensão, torna a leitura um ato de interação entre leitor-texto-autor. Nesse sentido, o educador deve dar pistas para os educandos de forma que eles possam manter uma interlocução com o texto.

Em relação ao texto A menina que falava internetês (Anexo 1- texto 1),

Vocês conhecem Rosana Hermann? Já leram outros textos dela? gostam da forma ele escreve? Esta publicação é a original? Este tipo de narrativa representa que mundo textual? Qual é a finalidade dessa crônica?

Uma discussão, a partir dessas perguntas, além de propiciar a ampliação do conhecimento contextual do educando, leva-o a realizar uma leitura, a partir da dinâmica da interação proporcionada pelo contexto.

Ainda em relação ao acionamento de contexto, considerando o texto O espelho mágico, algumas questões iniciais que podem levar o leitor a interagir com o texto seriam:

Vocês conhecem Câmara Cascudo? Já leram outros textos dele? Gostam de suas histórias? De que forma ele escreve? Esta publicação é a original? Vocês conhecem outras versões deste conto publicadas em outros suportes? Este tipo de narrativa representa que mundo textual? Qual é a finalidade desse conto?

Por meio dessas indagações, o educador inicia um diálogo com os educandos e percebe o grau de conhecimento deles sobre elementos contextuais que contribuem para a compreensão. Com isso, a aula de leitura torna-se produtiva, posto que, ao conhecimento geral do leitor novas estratégias vão se instalando rumo

à construção de sentido do texto. Nesse processo inicial da compreensão, cabe ao mediador da leitura esclarecer o que for necessário, no intuito de ampliar o conhecimento de mundo dos educandos, conhecimento que se mostre adequado ao que foi questionado sobre os elementos paratextuais.

Se os leitores não têm informações para responder a esses questionamentos, cabe ao educador fazer algumas considerações sobre os elementos paratextuais. Informá-los, por exemplo, de que Luís da Câmara Cascudo foi um estudioso da cultura brasileira, folclorista e grande divulgador da cultura popular, gera expectativa no leitor sobre o texto, porque ele passa a conhecer um pouco daquilo que antes era desconhecido. Informá-los, ainda, de que o conto não está em sua versão original, mas foi compilado por Câmara Cascudo, sem perder de vista o estilo dos contos de tradição oral, desperta o leitor para o universo dos contos de tradição oral e, em torno disso, o leitor se aproxima do texto antes mesmo de proceder à sua leitura.

Portanto, procurar esclarecer esses pontos contribuem para a realização de leituras contextualizadas, tanto no âmbito cotextual, quanto no âmbito das pressuposições cognitivas do sujeito leitor. Essa prática interativa de leitura contribui para evolução do leitor passivo, ou seja, aquele leitor que tem uma visão ingênua de leitura, de decodificação de sinais gráficos, que não faz da leitura um ato de reconstrução de significados, para o leitor ativo. Este tipo de leitor, por sua vez, é colaborativo, faz inferências, antecipa informações não explícitas no texto, mobiliza e controla conhecimentos e esquemas mentais prévios adequados ao texto lido.

Depois da leitura, o educador pode solicitar aos educandos comentários sobre o texto com base na finalidade da leitura antes estabelecida. Nessa etapa, o mediador da leitura pode fazer perguntas aos educandos com o objetivo de levá-los a perceber relações contextuais. Essas perguntas podem ser:

Que tipo de pessoas os protagonistas desse conto representam? Que situações de nossas vidas são reveladas nesse conto, por meio das ações e dos comportamentos dos protagonistas? O que representa a ação do reino das formigas para o desfecho desse conto? Que contextos são revelados por meio da seleção lexical referida ao rapaz e à princesa?

As respostas a esses questionamentos exigem dos leitores o acionamento de conhecimento geral compartilhado socialmente. Se o texto mostra o que acontece no mundo encantado, como é o caso do conto O espelho mágico, é natural que os educandos, ao lê-lo, construam ou atualizem um complexo modelo mental baseado no modelo de mundo representado no conto. Esse processo de construção, porém, demanda conhecimento geral e social, por exemplo, sobre o poder absoluto do rei e sobre o comportamento das pessoas que vivem dentro e fora de um reinado, além de aspectos relacionados ao mundo encantado.

Vale ressaltar que a quantidade de conhecimento geral ativado depende do conhecimento do leitor, do ambiente onde a leitura é realizada, dos seus objetivos e do seu interesse. Assim, mesmo em termos de finalidade preestabelecida para a leitura, há muito processamento individual que se faz durante a leitura e que é impossível de ser previsto pelo educador por ser resultante de modelos de experiência geral ativados e aplicados em situações cotidianas do leitor. Daí a relevância de se tratar a compreensão do texto como um fenômeno circunstancial e polissêmico, em que a coerência do que se lê é estabelecida na interação leitor/texto resultante, sobretudo, de conexões contextuais e sociocognitivas.

Ao debater sobre a seleção lexical usada para nomear os personagens, o educador leva o educando a inferir modelos de contexto socialmente construídos. As nomeações o moço, o rapaz, o homem representam, no texto, um andarilho, um tipo de pessoa que não tem prestígio e faz parte da classe social desfavorecida. Esse efeito de sentido é revelado pela identificação do protagonista, como uma pessoa sem nome e reconhecido ora como rapaz, ora como moço. (No texto, essas palavras representam o universo discursivo para referir-se às pessoas simples.) Já o vocábulo princesa representa o oposto, ou seja, uma pessoa de muito prestígio, que faz parte da classe social alta, portanto tem poder para ditar as regras. Além disso, princesa simboliza, no texto, beleza, sensibilidade e compaixão, atributos dos protagonistas dos contos de fadas que envolvem princesas.

Como podemos perceber, o contexto é um componente fundamental para o entendimento do texto, por isso o educador deve explorá-lo durante o processo de compreensão, uma vez que amplia o conhecimento da própria leitura, na medida em que a identificação do contexto envolve diferentes procedimentos de leitura, adequados às diferentes situações sugeridas no texto.