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15 Categoria: características pessoais que influenciam nas relações de poder, na percepção

2.4 Administração

A Administração, por ser considerada um campo de aplicação de outras ciências (BORGES-ANDRADE; ZANELLI, 2004; ETZIONI, 1974), apresenta um corpo teórico

acerca dos fenômenos organizacionais construído por pesquisadores de diversas ciências: psicólogos, sociólogos, pedagogos, cientistas políticos, economistas, como pode ser observado ao se estudar a literatura da área. Também se observa que esses pesquisadores não se limitam a estudar um fenômeno organizacional a partir de um referencial teórico exclusivo de seu campo científico; recorrem a outros teóricos, de outras áreas científicas, para darem conta da explicação dos fenômenos organizacionais.

Em função deste contexto, parece não haver na Administração “uma” teoria sobre poder, ou uma definição de poder consensual, única. Pesquisa realizada nas Revistas de Administração de Empresas (RAE e RAE eletrônica) e de Administração Contemporânea (RAC), entre os anos de 1970 e 2005, quanto a artigos que versavam sobre poder, mostrou a diversidade de referenciais que são utilizados para discutir as relações de poder no ambiente organizacional. Por exemplo, Misoczky (2003) fez uso das formulações sobre Campo de Poder e Ação, do filósofo Bourdieu (1996), para compreender alguns processos organizacionais, dentre eles a mudança; Matos (1984) e Motta (1981) fizeram uso da teoria Foucaultiana para discutir o poder disciplinar das organizações sobre os trabalhadores; Paula (2003) utiliza as formulações filosóficas e psicanalíticas de Marcuse (1999) para analisar o gerenciamento do prazer e os efeitos das neuroses narcisistas nas organizações, abordando questões como a liderança narcisista e o assédio moral e sexual no trabalho; Faria (2001) discute a relação entre administração, poder e participação, no âmbito da delinqüência acadêmica, segundo a ótica do sociólogo Tragtenberg (1979); e Vargas (1998) usou a teoria das configurações de poder, proposta pelo economista e administrador Mintzberg (1983), para identificar os tipos de configurações que melhor representariam as relações de poder presentes na Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e investigou as relações existentes entre algumas variáveis sócio-demográficas e a percepção de poder que os empregados tinham da organização.

Essa diversidade de artigos, com referenciais teóricos diferenciados, parece demonstrar duas visões teóricas, no estudo do poder na Administração: uma visão mais funcionalista e outra mais crítica. A visão mais crítica, na teoria das organizações, tem sido, de acordo com Motta (2001) e Motta e Alcadipani (2004), um campo prolífero, em vários países, desde o final da década de 1960, com a quebra da hegemonia da perspectiva funcionalista. Os autores apresentam a existência atual de uma corrente teórica chamada de Critical Management Studies (CMS), que procura submeter a administração e as organizações ao crivo crítico. Dentre as teorias utilizadas por esta corrente, estão as teorias modernistas, de base marxista, teorias pós-estruturalistas, teorias feministas e, mais comumente, a teoria

foucaultiana (MOTTA e ALCADIPANI, 2004). Já a visão funcionalista, de acordo com Hardy e Clegg (2001), está preocupada em como o poder é distribuído na estrutura das organizações formais e como diversos grupos adquirem e mantêm um poder não concedido a eles, dentro dos formatos oficiais. Dentre alguns teóricos funcionalistas, estão os trabalhos de Thompson (1956), Crozier (1964), Bachrach e Baratz (1970), Pettigrew (1973), Pfeffer e Salancik (1974) e Mintzberg (1983) (HARDY; CLEGG, 2001).

A forma como é discutido o poder, nos livros de comportamento organizacional, parece coadunar com a visão funcionalista, no estudo do poder na administração. Para compor o embasamento teórico deste trabalho, sobre “poder nas organizações”, foram analisados capítulos sobre poder, retirados de livros de comportamento humano no trabalho. Interessante notar que nove dos quinze textos foram escritos por professores e/ou consultores de administração: Bowditch e Buono (1992), Daft (2003), Davis e Newstrom (1992), Dubrin (2003), Hardy e Clegg (2001), Hellriegel, Slocum e Woodman (2001), Robbins (1999), Schermerhorn Jr., Hunt e Osborn (1999) e Wagner III e Hollenbeck (1999).

A maioria dos livros consultados tem, como objetivo, a formação gerencial – oferecer um conhecimento, advindo de pesquisas, empíricas ou não, construído por estudiosos de diversas ciências, para que futuros ou atuais administradores possam compreender os fenômenos organizacionais e atuar de maneira eficiente – diminuindo custos e tempo e melhorando a qualidade dos produtos e serviços prestados. Dessa forma os autores dos livros, ao discutir o poder no ambiente organizacional, associam-no a cargos gerenciais, ao comportamento de liderança, ao comportamento político, a conflito e influência. As relações de poder são estudadas pelos autores dentro das organizações - em nível individual, grupal e organizacional, e fora das organizações – destas entre si e destas com o ambiente externo (comunidade, governo, clientes etc.). Os autores tratam, quase que exclusivamente, do exercício e do acúmulo do poder feito pelos indivíduos ou pelos grupos que já ocupam posições de comando sobre outros – supervisores, gerentes, administradores, líderes. Poucos autores falam do contrapoder - comportamento dos subordinados – e, quando é relatado, tem o objetivo de levar o comandante (chefe) a driblar a resistência dos subalternos para, com isso, atingir os propósitos organizacionais. Dentro deste exercício de poder, citam as táticas de influência que podem ser utilizadas com subordinados e superiores, para o alcance das metas organizacionais. E, por fim, alguns poucos autores falam do exercício de poder abusivo – assédio sexual e da ética no exercício do poder.

Mintzberg (1983), um dos autores incluído na visão funcionalista por Hardy e Clegg (2001), tem sido muito citado na Psicologia Organizacional e do Trabalho, no Brasil, para

estudar o poder organizacional. Para Moreira (1995) e Paz, Martins e Neiva (2004), a teoria de Mintzberg (1983) parece ser, até o momento, a mais adequada para compreender a realidade dinâmica das organizações, na sociedade contemporânea. Atualmente, as organizações constituem-se como estruturas altamente diferenciadas e complexas; funcionam em um intricado campo de influências e interesses, que são diversos e divergentes; e se transformam, continuamente, às vezes em velocidade vertiginosa. E a teoria de Mintzberg (1983), conforme as autoras supra-citadas, contempla este dinamismo ao retratar o poder como fenômeno pulsante, em permanente fluxo de concentração-difusão dentro das organizações e ao redor delas, buscando explicar o comportamento organizacional. Falcini (1993) também coloca que a tipologia organizacional, com base no poder, de Mintzberg (1983), localiza um maior número de dimensões do poder organizacional em comparação com outras tipologias existentes. Logo, o autor conclui que, se as idéias de Mintzberg (1983) não forem tomadas como visão de mundo, mas mantidas no status de estrutura referencial teórica, podem contribuir, em alto grau, para o entendimento de questões relativas ao poder que permeia as organizações (FALCINI, 1993).

Mintzberg (1983) ao teorizar sobre o poder nas organizações teve como objetivos: a) entender os elementos básicos do jogo do poder organizacional: os jogadores, os sistemas de influência, as metas e sistemas de metas; b) descrever as configurações básicas do poder organizacional; c) usar as configurações para entender o comportamento organizacional. Em sua obra, Mintzberg (1983, p. 22) parte da premissa de que “o comportamento nas organizações é um jogo de poder onde vários jogadores, chamados influenciadores, tentam controlar as decisões e ações organizacionais”. Esse autor entende o poder como a capacidade de afetar os resultados organizacionais, sendo que todos os membros internos da organização (desde os executivos de alto escalão até os operários da base hierárquica), bem como os membros externos à organização (clientes, fornecedores, os concorrentes, o governo dentre outros), possuem essa capacidade de influenciar. No entanto, tornar-se-á poderoso aquele influenciador que controlar e usar, com habilidade política, uma base de poder da qual a organização depende: controle de recursos, competência ou habilidade técnica, controle de um corpo de conhecimento crítico para a organização, prerrogativas legais da organização e acesso aos poderosos (ou habilidades políticas).

A combinação entre a atuação dos influenciadores internos e externos, nas suas respectivas coalizões, os meios e os sistemas de influência que utilizam para afetar os resultados organizacionais, os tipos de alianças internas e externas que são formadas e os sistemas de metas resultantes, determinam as configurações de poder, as quais foram

nomeadas por Mintzberg (1983) como Instrumento, Sistema Fechado, Autocracia, Missionária, Meritocracia e Arena Política. Os estudos das configurações de poder e das bases de poder, propostos por Mintzberg (1983), são alguns dos aspectos da sua teoria mais pesquisados pelos psicólogos brasileiros, por isso serão retomados nos próximos capítulos.

Outro aspecto de sua teoria, que também é pesquisado empiricamente pelos psicólogos brasileiros, são os jogos políticos, cujo fenômeno está ligado ao objetivo de estudo desta dissertação. Apesar de Mintzberg (1983) afirmar que o comportamento nas organizações é um jogo de poder, ele não categorizou os jogos de poder. Em sua teoria, o autor apresenta uma classificação dos “Jogos Políticos” usados pelos influenciadores internos, para resistir à autoridade, para conter a resistência à autoridade, para construir bases de poder, para derrotar rivais e para efetivar mudanças organizacionais. A categorização dos jogos políticos será apresentada no capítulo 4 deste trabalho.

Apesar de a teoria do poder organizacional de Mintzberg (1983) ser muito utilizada em pesquisas brasileiras, nos textos de comportamento humano no trabalho, analisados nesta dissertação, o autor ainda é pouco referenciado. Mintzberg é citado por Hardy e Clegg (2001) e Robbins (1999) em muitos momentos nos seus textos; no entanto, estes não se detêm em sua teoria, especificamente. Outros autores, Bowditch e Buono (1992), discorrem sobre pesquisa feita por Mintzberg, em 1973, não sobre poder, mas sobre papéis gerenciais.

Ao contrário de Mintzberg, Pfeffer (1981) tem sido muito referenciado nos livros de comportamento organizacional por diversos autores - Daft (2003), Dubrin (2003), Hardy e Clegg (2001), Robbins (1999), Shermerhorn Jr., Hunt e Osborn (1999) e Wagner III e Hollenbeck (1999) - para explicar o poder e a política organizacional. Dentre esses autores, Daft (2003) é o que mais utiliza a teoria de Pfeffer (1981) para explicar o poder nas organizações citando, principalmente, o conceito de poder e de política organizacional e as fontes horizontais de poder.

Daft (2003, p. 415) utiliza o conceito de poder de Pfeffer (1981) - “a capacidade para alcançar metas ou resultados desejados pelos detentores de poder”, para construir sua própria definição de poder – “a consecução de resultados desejados é a base da definição aqui utilizada: ‘poder’ é a capacidade de uma pessoa ou departamento, numa organização, de influenciar outras pessoas para a produção de resultados desejados”. Para diferenciar poder e política nas organizações, Daft (2003, p. 424) também cita o conceito de política de Pfeffer (1981) – “política significa atividade para adquirir, desenvolver e utilizar poder e outros recursos para obter o resultado preferido quando existe incerteza ou desacordo quanto às escolhas”.

Para finalizar, Daft (2003) afirma que todas as pessoas na organização podem exercer poder para alcançar resultados desejados, tanto no sentido vertical como horizontal. As fontes horizontais de poder dizem respeito às relações entre os departamentos, as quais não são definidas pela hierarquia e sim pelo controle de contingências estratégicas - “eventos e atividades tanto internas como externas a uma organização que são essenciais a consecução de metas organizacionais” (PFEFFER; SALANCIK, 1977 apud DAFT, 2003, p.419). De acordo com Daft (2003), a teoria das contingências estratégicas permite afirmar que um departamento, para ser cotado como poderoso, deverá controlar uma ou mais das seguintes fontes: possuir ou controlar algo que outro departamento deseja (dependência); controlar ou gerar recursos financeiros para a empresa; desenvolver atividades que sejam centrais para a produção final da organização; ser insubstituível na empresa e ter a capacidade de reduzir as incertezas críticas, ou seja, eventos imprevisíveis, que podem interferir nos resultados organizacionais.