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Desta feita, é possível afirmar que a pesquisa registrada neste primeiro capítulo aponta que a Gramática Tradicional Contemporânea é produto de uma construção a várias mãos, desenvolvida no fluxo de um longo tempo, cujo marco é a Grécia Antiga. Nessa acepção, afirma-se que a sua construção abarca diferentes fases, dentre elas, a latinista, referente ao desenvolvimento da Gramática da Palavra; a prescritiva, referente ao estabelecimento de políticas estatais para o ensino da norma de prestígio descrita pelos gramáticos; a histórica de que resulta a produção de Gramáticas Históricas e a descritiva, referente à incorporação de princípios científicos para a descrição da língua e não de uma dada norma e que irão contribuir na construção das gramáticas nacionais.

Ao longo desta investigação de caráter historiográfico observou-se em relação ao tratamento da língua, a não-cisão dos aspectos relacionados à sua estrutura e função. Ambas, foram tratadas pelos primeiros estudiosos e observadores da língua como indissociáveis – abarcando, dessa forma, aspectos relacionados à cultura, política, aos interesses econômicos, ideológicos, religiosos, etc. Assim sendo, a Gramática Tradicional, em sua gênese, não descreve a estrutura que qualifica a língua como sistema, mas sim o uso de prestígio, à medida que as gramáticas são consideradas como pertencentes à fala e não à escrita. Esse uso de prestígio é aquele referente à língua oficial: aquela que tem por fundamento a chamada “norma padrão” selecionada pelo critério do prestígio, ou seja, a norma dos “homens doutos”, antes da publicação de “Os Lusíadas”, por Camões. Após a produção e divulgação dessa obra literária, a norma oficial passa a incidir sobre os escritores portugueses de prestígio.

CAPÍTULO II

OS PRONOMES PESSOAIS PELA GRAMÁTICA DA FRASE DA

LÍNGUA PORTUGUESA

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2.1 Preliminares

Os estudiosos das civilizações que focalizam as produções dos chamados bens não materiais da cultura humana – saberes ou conhecimentos, idéias e ideais... – afirmam que, para melhor considerar tais produções, é importante diferenciar, sem dissociar, a concepção de Estado e de nação, visto serem estas dimensões complementares das sociedades humanas. O Estado sempre teve e tem por fundamento a autoridade e esta se configura como uma força que, fundada e fundamentada em ações de caráter político, tem o propósito de regular e centralizar os movimentos das sociedades que controlam. Nesse sentido, a força do poder estatal – seja ele imperial e/ou monárquico absolutista/democrático, bem como republicano – é exercida pelo grupo que está no poder e se sustenta pelo princípio da lealdade entre seus membros; pois é dessa lealdade que qualquer Estado vive e sobrevive até a atual contemporaneidade. A concepção de nação teve e tem por fundamento a busca ou conquista da liberdade e por isso a sua forca se qualifica como polêmica criadora da vida intelectual ou artística e, por essa razão, ela se inscreve na dinâmica da renovação que foi herdada do passado.

Nessa perspectiva, a gramática normativa ou tradicional contemporânea é, por um lado, produto da civilização greco-romana e arrasta consigo a cultura institucionalizada por aqueles estados imperiais, razão de ser da sua vertente prescritiva. Mas, por outro lado, ela também carrega consigo marcos dos processos de que resultaram a sua recontextualização para se adaptar a diferentes

nacionalidades e modelos de contextos inerentes a formações sócio-culturais diferenciadas como aquelas da Idade Média e Moderna. (cf. item 1.3 do capítulo I).

Registrou-se que os estudos referentes à dimensão sintática são desenvolvidos na Idade Média, estendendo-se para além dos fatos de concordância, propostos pelos gramáticos greco-latinos e, para tanto, elegeu-se a relação entre o nome e o verbo, como matriz fundadora dos estudos sintáticos. Constroem-se conteúdos frasais não reduzíveis àqueles das palavras que, articuladas pelas categorias sujeito predicado – matrizes categoriais da oração – são os seus elementos constitutivos. Passa-se, assim, a focalizar as estruturas dos elementos lexicais da língua, recortada pelo padrão escrito da chamada norma culta, quanto às suas funções frasais. Apesar da variação de uso dessas estruturas, observa-se que há regras finitas que facultam descrever as funções que elas exercem em tal dimensão e passa-se a descrever tais regras como aquelas responsáveis pelo “bom uso”.

Os fundamentos teóricos para se proceder a tal descrição estavam orientados pelo pressuposto referente aos modos de significar conceitos universais, coincidentes com os modos de ser e de conhecer, de que resulta a concepção de uma gramática Geral ou Universal e gramática particulares. A Gramática Geral teria como objeto de estudo o logus, isto é, os princípios gerais da razão humana que possibilitam compreender os modos de ordenação das idéias pelo exercício da fala e, nesse sentido, ela se configura como arcabouço teórico que orienta a produção de gramáticas particulares. Estas se ocupariam da observação e da descrição do modos de ordenação das idéias, em cada língua particular, focalizando-os como regras do bom uso das palavras, ou seja, quanto às suas funções sintáticas ou modo de ordenar as idéias em cada língua. (cf. lexis, p.13 cap. I)

A sistematização desses estudos teóricos vem a público nas primeiras décadas do século XVII e tem o seu registro na Gramática Geral e Razoada ou Gramática de Port Royal – nome de um mosteiro para mulheres, fundado em 1216 em uma região francesa que significa “grota cheia de sarças, onde a água se acumula” (p. IX). Arnauld e Lancelot são seus autores e definem Gramática como a arte do bem falar, ou seja, de explicar o pensamento por meio de “signos que os

homens inventaram para esse fim”. (cf. p. 3), não diferindo, portanto, da concepção de Dionísio de Trácia. (cf. Cap I, p. 29 ).

Observa o tradutor dessa obra que, em sendo uma Gramática Geral, o seu exemplário é formado por elementos ou frases de diferentes línguas e, para colaborar com leitores não poliglotas, os mesmos também foram traduzidas para o português.

A leitura dessa obra pelo pesquisador não teve por objetivo o registro da sua compreensão, mas ampliar aquela referente a de Jerônimo Soares Barbosa, autor da Gramática Philosófica da Língua Portuguesa ou Princípios da Gramática Geral Applicados à nossa Lingoagem: obra que revive a de Arnauld e Lancelot. Por conseguinte, o objetivo deste capítulo está voltado para os modos de ordenar as palavras do português e por eles observar as relações que tais palavras estabelecem entre si para conectar idéias e, por essas relações, privilegiar aquelas estabelecidas pelos pronomes. Tem-se, para tanto, como ponto de partida a Gramática de Soares Barbosa por ser o marco inicial dessa modalidade de descrição, a fim de estender o processo de compreensão das questões lingüísticas inerentes a essa classe de palavras.