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Alguns aspectos da fisiologia fetal

Respiração*

Com 28 semanas, quando o feto tem aproximadamente 1.000 g, os pulmões estão suficientemente desenvolvidos de modo a tornar possível a sobrevida do recém-nascido pré- termo. Antes disso, são incapazes de proporcionar trocas gasosas adequadas: a superfície alveolar e a vascularização são insuficientes. O desenvolvimento do aparelho respiratório fetal está caracterizado pelo incremento da área alveolar e do número de capilares que estabelecem contato íntimo com aquelas estruturas.

Síntese da lecitina (surfactante-ativo). O complexo surfactante, segregado pelas células epiteliais tipo II dos alvéolos pulmonares, parece capaz de reduzir a tensão superficial da interface ar-líquido e assim manter o lúmen dos alvéolos, evitando o seu colapso após o nascimento. Cerca de 90% do complexo surfactante estão compostos por fosfolipídios, dos quais a lecitina representa 80% e o fosfatidilglicerol (FG), 10%.

A lecitina é sintetizada por duas vias principais:

Via cistidina-difosfocolina (CDF-colina), com formação de lecitina constituída por cadeias de

ácidos graxos α-palmítico/β-palmítico

Via fosfatidiletanolamina, com reação de metilação e elaboração de lecitina composta por

cadeias de ácidos graxos α-palmítico/β-mirístico.

De 22 a 24 semanas até 35 semanas de gestação, a reação de metilação é a principal via de síntese da lecitina. A lecitina formada pela via CDF-colina, embora operante desde 18 semanas, somente torna-se expressiva após 36 semanas. A lecitina α-palmítica/β-palmítica é muito estável e, portanto, mais efetiva como surfactante.

O FG funciona como potencializador da ação surfactante da lecitina e aparece em quantidades apreciáveis na gestação de 37,5 semanas, crescendo sua produção até o termo.

Início da respiração. Antes do nascimento, os pulmões estão cheios de líquido (estágio secretório do pulmão fetal). Consequentemente, o arejamento do pulmão não se restringe à insuflação de órgão colapsado. Há a eliminação prévia de fluido por três vias: (1) um terço é expelido pela pressão exercida no tórax durante o parto; (2) outro terço é absorvido pelos capilares pulmonares; e (3) o restante passa para os linfáticos que drenam os brônquios e os vasos sanguíneos.

Quando os pulmões se inflam após o parto, forma-se interface ar-líquido na superfície da membrana alveolar. A camada líquida produz força que tende a colapsar os alvéolos. O complexo surfactante reduz a tensão superficial nos alvéolos, mantendo quantidade apreciável de ar residual nos pulmões após a expiração (40% do volume total), prevenindo a atelectasia.

O início dos movimentos respiratórios está filiado a estímulos térmicos e táteis, além da asfixia (diminuição do PO2 e do pH e aumento do PCO2) que ocorre no processo natural do

nascimento.

Por fim, a adequada respiração no período neonatal depende das alterações circulatórias que surgem no recém-nascido.

Circulação

Uma vez que o ovo humano não tem mais que pequenas reservas nutritivas, sua sobrevivência depende da precoce nidificação. A nutrição, inicialmente subordinada a materiais existentes nos lumens tubário e uterino, é substituída por outra, condicionada à sua implantação no endométrio. A formação das vilosidades representa aperfeiçoamento, por expandir a superfície de trocas; penetrando nos capilares, inicia-se a nutrição hemotrófica. Ela torna-se, entretanto, insuficiente à crescente massa ovular, pela falta de sistema eficaz de intercâmbio entre as vilosidades e o concepto.

Por volta da 3a semana, inicia-se a formação do sistema vascular no embrião, e,

simultaneamente, nas vilosidades que já contêm um eixo de tecido mesenquimatoso, diferenciam- se elementos que constituirão os capilares. A junção dos vasos do embrião com os do cório dá-se ao completar a 3a semana. Por transitar junto à vesícula, essa circulação é denominada

alantocorial e permanece durante toda a vida intrauterina. É a única importante, não

representando, todavia, a primeira que se estabelece. Durante a 3a semana formam-se os vasos do

embrião, entre os quais as duas aortas primitivas. Na porção cefálica elas constituem os tubos cardíacos que irão se fundir no coração primitivo. Das aortas, originam-se ramos – artérias

vitelinas ou onfalomesentéricas – que alcançam, ventralmente, a vesícula vitelina. Pelas veias

ocorre o retorno, fechando-se o circuito da circulação vitelina, que é diminuta e fugaz, traduzindo somente vestígio filogenético. Na Figura 2.10 estão representadas as duas circulações, tendo-se, para maior clareza, exagerado a importância da vitelina.

À medida que a primitiva circulação regride, formam-se, na porção caudal das aortas, as

artérias alantoide. Seguindo a orientação da alantoide (Figura 2.10), essas artérias alcançam os vasos que no cório foram, simultaneamente, diferenciando-se. Por veias homônimas das artérias, dá-se o retorno. Há, nessa fase do ovo, três circulações: uma própria do embrião e duas extraembrionárias (circulações vitelina e alantocorial). Com a regressão de um dos circuitos, permanecem dois e, somente na vida neonatal, um.

No concepto mais desenvolvido, os vasos alantocoriais passam a ser nomeados vasos

umbilicais, e a circulação alantocorial irá denominar-se, mais adequadamente, circulação fetoplacentária.

As artérias vitelinas constituirão, fundidas, a artéria mesentérica superior, e as veias, a veia

hepática. As artérias umbilicais, originando-se de porção da aorta que não vem a se fundir –

artérias ilíacas primitivas – continuam duplas, muito calibrosas na vida fetal, atrofiadas na extrauterina, em que se reconhecem como cordões fibrosos. As veias umbilicais, ao contrário das artérias, também se fundem.

Circulação fetal (Figura 2.18). A veia umbilical transporta sangue rico em oxigênio e nutrientes provenientes da placenta, alcançando o fígado fetal. Assim, o sangue da veia umbilical é distribuído via seio portal para o fígado (55% para o lobo esquerdo, 20% para o direito) e via

ducto venoso em direção ao coração (25% do fluxo). Assim, o ducto venoso age como o primeiro shunt que determina a proporção do sangue umbilical que é direcionado para o coração, por

mecanismo ainda indefinido.