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3.2 TEORIA ECONÔMICA DOS LEILÕES

3.2.2 Análise de Leilões

O fundamento das ferramentas de análise de leilões é a demonstração de equivalência da receita esperada nos diversos tipos de leilões. Conforme Klemperer (2004), qualquer leilão privado resulta no mesmo valor esperado de receita, desde que (i) os participantes sejam neutros ao risco; (ii) o objeto seja adquirido pela sua maior avaliação entre os participantes; e (iii) o participante com a menor avaliação espere ganho nulo. Esta equivalência se aplica também para os modelos mais gerais de leilões de valor comum. O Teorema da Equivalência de Receita é importante ao traduzir o problema de análise de leilão em termos de receitas marginais e custos marginais. Logicamente, as suposições que baseiam a equivalência não são sempre obedecidas, o que resulta em extensões que os incorporam na metodologia da análise de leilões. Algumas extensões relevantes são apresentadas na sequência:

Aversão ao Risco: afeta a equivalência de receita em leilões de primeiro preço – uma pequena elevação do lance eleva a probabilidade de vencer pelo custo de reduzir a receita do leilão. O comportamento de participantes com esta característica é de elevar os lances acima do que fariam participantes neutros ao risco. Outra variação é a aversão ao risco do leiloeiro. Combinações diferentes geram diferentes opções de leilão;

Assimetria: decorre de variações nas funções de distribuição dos participantes de leilões. Em leilões de valor privado, leilões de primeiro preço geram mais receita que de segundo preço, quando o valor médio (suporte) é assimétrico (com distribuições similares) entre os participantes, e o inverso quando o que varia são os formatos das distribuições entre os participantes são desiguais (com mesmo valor de suporte). Em leilões de valor ‘quase-comum’, assimetrias entre os participantes acirram os leilões abertos descendentes, e tendem em resultar em winner’s curse;

Correlação e Informações Afiliadas: é comum em leilões abertos que a estrutura de informação seja alterada no decorrer do leilão, uma vez que os lances realizados sinalizam informações privadas. Um resultado importante desta linha de pesquisa é que leilões ascendentes resultam em preços mais elevados que de carta fechada de segundo preço, que por sua vez são superiores a leilões de carta fechada de primeiro preço.

Milgrom e Weber (1982) apresentam categorias mais amplas para os modelos de leilão: Valores Privados Independentes, Valor Comum e Valor Afiliado. Os dois primeiros seguem as especificações já apresentadas no item 3.2.1. No modelo de leilão com Valor Afiliado, os valores estimados do objeto leiloado pelos participantes são interdependentes, uma vez que dependem tanto das informações privadas como das informações partilhadas com os demais participantes.

Uma questão crucial no desenho e análise de leilões é a existência de conluio ou, posto de outra forma, quais as formas de coibir o conluio. Inicialmente, é fácil verificar que um equilíbrio de conluio é mais facilmente atingido em leilões de segundo preço que em primeiro preço. Em uma situação de conluio, a empresa vencedora poderia dar o maior lance possível, e os demais valores próximos à zero.

O incentivo a desobedecer ao acordo é baixo, uma vez que a chance de vencer não é alta (não se sabe qual valor será o lance do vencedor combinado, e possivelmente será maior que o valorado pelos participantes). O mesmo não se aplica para o leilão de primeiro preço. Neste, todos terão grande incentivo de furar o conluio, uma vez que qualquer valor acima do baixo valor combinado gerará ganho para o vencedor.

(KLEMPERER, 2004)

Uma segunda questão relevante para o desenho de leilões é a atração de participantes, uma vez que leilões com pequeno número de participantes tem grande risco de baixo resultado para o leiloeiro e potencial ineficiência. Leilões ascendentes apresentam uma configuração que tende a desincentivar a entrada de participantes, principalmente se o custo de participação for alto. Neste tipo de leilão existe uma forte expectativa de que a empresa que melhor avalia o objeto irá eventualmente ganhar, porque permanece até o final do leilão. (BULOW; KLEMPERER, 1996)

O winner’s curse é outra barreira potencial à entrada, uma vez que reflete o risco de que o vencedor de um leilão seja aquele que superestimou o valor real do objeto. Sabendo desta possibilidade, muitos participantes potenciais se isentam de participar, principalmente participantes menos competitivos. Deste modo, o resultado esperado é a recorrência de vencedores em leilões com as características de assimetria de informação em leilões de valor comum. Em leilões ascendentes a presença de vantagens, mesmo que ínfimas, podem resultar em comportamento de

predação

pelas empresas mais competitivas em leilões repetidos. O resultado, novamente, é a redução dos futuros participantes dos leilões. (KLEMPERER, 1998)

O impacto da elevação do número de participantes em um leilão depende do tipo de leilão e das características do ativo sendo vendido. No caso de um ativo de valor comum, o crescimento no número de participantes inicialmente leva a um aumento agressivo dos lances. Por outro lado, devido ao winner’s curse, a percepção de sobreavaliação do ativo, a partir de certo número de participantes, deixa de afetar os lances. Isso caracteriza uma função não linear de relação entre o número de competidores e o lance máximo. (MILGROM; WEBER, 1982)

No caso de leilões de valor privado, este efeito não ocorre, uma vez que os agentes possuem valorações certas que balizam os seus lances, o que resulta em relação linear entre o valor dos lances e o número de participantes. A diferença entre os tipos de leilão é uma forma de se testar a natureza do valor do leilão, comum ou privado, conforme Paarsch (1992). A forma funcional da relação entre o valor dos lances e o número de participantes indica se o leilão de valor comum (não linear, como por exemplo, uma função quadrática) ou valor privado (linear).

Klemperer (2004) enumera uma série de desafios para a formulação e execução de leilões que maximizem o resultado para o leiloeiro:

Preços de Reserva: o preço mínimo mal estabelecido para o início do leilão agrava os problemas anteriormente destacados. Além disso, pode aumentar os incentivos à predação e conluio;

Problemas Políticos: um resultado altamente indesejado e custoso para os leiloeiros, principalmente no setor público, é o leilão vazio, em que nenhuma proposta é dada, como quando há formulação de preço de reserva irreal. A ocorrência deste problema é mais verificada em leilões de lance único de carta fechada de primeiro preço;

Estabelecimento de Regras: regras mal formuladas geram os mais diversos problemas. Os participantes utilizam regras mal elaboradas para se apropriar de valor nos leilões;

Credibilidade: a aplicação de regras pode não ser crível em casos em que a relação de poder em relação ao leiloeiro. Leilões de lances ascendentes são particularmente vulneráveis a este efeito, uma vez que na fase final apenas poucos participantes permanecem no jogo. A penalização e expulsão de um participante podem ser consideradas prejudiciais para o andamento do leilão, o que desestimula sua aplicação pelo leiloeiro. O resultado é o incentivo à quebra de regras.

Dados estes problemas, verificados em situações reais, Klemperer (2004) realiza uma análise de fatores que maximizam a eficácia dos modelos de leilões na geração de valor ao leiloeiro. Os leilões de lances ascendentes apresentam grandes vantagens em alocar o objeto do leilão ao participante que o melhor avalia, visto que este participante tem a chance de continuamente cobrir o lance dos demais participantes, mesmo que o comportamento inicial destes seja mais agressivo.

Permitir que participantes adquiram informações a partir dos lances dos demais participantes os torna menos cautelosos e mais agressivos no decorrer deste tipo de leilão, o que gera um resultado superior ao leiloeiro. Vários mecanismos podem ser utilizados para acirrar a concorrência, como definir o número máximo de rodadas, definir um número aleatório de rodadas, tornar os lances anônimos. Estes mecanismos dificultam a possibilidade de conluio.

Os leilões de carta fechada de primeiro preço também possuem pontos fortes que podem ser explorados. A incapacidade de retaliação minimiza os incentivos ao conluio. Conluios tácitos também são evitados, pois não há sinalização, como ocorre

em um leilão aberto ascendente. Do ponto de vista da entrada de participantes, esta modalidade é mais atraente, pois o resultado é mais incerto. Por esta razão, esta categoria desencoraja a formação de consórcio. Se empresas mais fortes formam consórcios, as demais empresas possuem maior chance de vencer o certame, visto que a variabilidade dos lances é minimizada. Deste modo, o próprio fato de desencorajar os consórcios torna os leilões mais competitivos. Por outro lado, a chance da ocorrência do winner’s curse, no caso de empresas fracas, também é menor que em leilões abertos de primeiro preço. Finalmente, a despeito das vantagens apresentadas, este tipo de leilão não tende a levar ao resultado mais eficiente, pois a captura do valor dado pelo participante mais forte pode não ser atingido, a depender do conhecimento de cada participante em relação aos seus concorrentes.

A solução da escolha entre os leilões de lance ascendente (English) e o de carta fechada (Dutch) é a combinação em um modelo híbrido. Segundo Milgrom (2007), este modelo híbrido, de duas rodadas – Anglo-Dutch Design – captura as vantagens de ambos os modelos. A primeira rodada é eficiente em coibir o conluio e encorajar a participação do máximo de empresas, uma vez que os participantes dão os lances sem chance de retaliação. A segunda rodada é mais eficiente na alocação do objeto do leilão com o participante que mais o valoriza, ou seja, contribui para maximizar o valor para o leiloeiro. Segundo Klemperer (2004) os consórcios também são desencorajados na fase inicial, pelos motivos já expostos. Na segunda rodada, o processo de troca e informações resultante dos lances sucessivos impulsiona a concorrência pelo maior preço, maximizando o resultado para o leiloeiro.