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2 INSTITUCIONALIZAÇÃO DA APRENDIZAGEM NO COTIDIANO ESCOLAR:

3.1 APRENDIZAGEM COMO PROCESSO DE FORMAÇÃO E

DESENVOLVIMENTO HUMANOS

A aprendizagem é o propósito do ensino. Ela é a razão para a existência de escolas e de outros espaços educativos e compõe a justificativa para que o direito à educação seja reconhecido como um direito humano universal, inalienável e indispensável a todos os povos.

Até aí parece que poucas pessoas discordariam. Contudo, mesmo uma afirmativa tão contundente necessita ser apresentada com mais argumentos, pois,

se ter o direito à aprendizagem reconhecido ainda requer luta, é sinal de que muitas dúvidas pairam a seu respeito.

Talvez, algumas delas se relacionem aos seguintes questionamentos: a aprendizagem não é um processo natural do ser humano? Que importância o ensino adquire para a aprendizagem? Basta ensinar para que a aprendizagem ocorra?

Além disso, por que a escola se tornou o espaço institucional – requerido e

reconhecido – para a efetivação da aprendizagem? De que maneiras a escola

contribui (ou poderia contribuir) para a efetivação da aprendizagem? Diante da possibilidade de existirem tais dúvidas, entende-se que o caminho mais apropriado para esclarecer o que se concebe por aprendizagem e a razão pela qual ela deve continuar a ser pretendida, reconhecida e alargada, seja construir uma escrita reflexiva e argumentativa em defesa de que a aprendizagem, subscrita no direito à educação, é necessária para a formação e o desenvolvimento humanos, para a qual o processo de ensino possui grande valor.

Antes de adentrar aos questionamentos manifestos e que permeiam um tema tão complexo, faz-se jus esclarecer que sua compreensão ultrapassa a dimensão da (desta) escrita. Contudo, é pela escrita que se pode exercitar o pensar de maneira lógica e organizada. É no pensar e no escrever, no escrever e no pensar, que a dúvida vai ganhando a consciência crítica e a consistência teórica que permitem indicar possibilidades para que a compreensão da aprendizagem seja a mais integral possível, portanto, voltada aos significados que o aprender adquire no século XXI.

Ao que pese aos processos históricos nacionais, até pouco tempo atrás, o ensino básico não ultrapassava a dimensão "conceitual" – seria mais adequado falar

em informativa –, uma vez que não era de interesse dos governantes, talvez nem

tão relevante para a vida em sociedade, que outras dimensões13 (atitudinal e

procedimental) fossem contempladas.

Falando especificamente do Brasil, portanto, houve por muito tempo certa coesão político-social quanto à finalidade instrumental dos processos educativos, o que favoreceu que a escola fosse traduzida em um espaço para a civilização da população carente, alfabetizando-a e ensinando-a alguns pressupostos básicos de

convivência – e subserviência – social, muito úteis à sua integração ao mercado do trabalho.

As instituições de ensino, destinadas a atender primeiramente à população branca, estavam a serviço de um projeto societário elitista, racista e machista, característico da sociedade patriarcal sobre a qual se fundou o país. Distinguindo oportunidades de acordo com a classe social, a cor da pele e/ou o gênero, a escola nasceu com objetivos claramente distantes das concepções pedagógicas mais modernas e nem sempre aproximados da concepção de aprendizagem que aqui é apresentada e discutida.

Transmissão de informações descontextualizadas, alienação, difusão de pensamento acrítico, consciência egocêntrica, meritocrática e discriminatória parecem exemplificar bem as características do ensino escolar destinado aos mais pobres, característica de sua expansão ao longo do século XIX. Enquanto se

governava – ou se governa – para menos de um terço da população, a

consequência era o abandono dos mais frágeis e a quase aniquilação de suas chances de inserção na vida social como um sujeito de direitos.

O tempo trouxe avanços. No entanto, não os trouxe sozinho. Foram conquistados com muita luta entre aqueles que queriam a permanência desse estado de coisas e os que desejavam mudanças, conforme é possível acompanhar debruçando-se sobre a análise da evolução histórico-jurídica da educação pública no Brasil14.

A virada de página é recente. Em outubro de 2018 foram comemorados os primeiros trinta anos da conquista jurídica do direito à educação no Brasil. Foi a Constituição Federal de 1988 que o incluiu, pela primeira vez, como um dos direitos sociais fundamentais sob a devida responsabilidade do Estado. Sem dúvidas, a inserção do direito à educação na Constituição vigente, resultado de um longo processo de luta social, por vezes apoiada por representantes políticos, por vezes por eles colocada à sombra, representa uma conquista importante na luta a favor da socialização do direito à aprendizagem.

Um movimento longo e muito requisitado que, embora reconhecido

juridicamente, ainda requereu – e requer – muita luta por regulamentação e, mais

14 O livro de Cynthia Greive Veiga, História da Educação, é um subsídio importante para o

conhecimento da evolução da educação pública no Brasil, tanto quanto os escritos de Cury (2005; 2011) e Faria Filho (1998) acerca dos aspectos jurídicos que envolvem as políticas educacionais.

ainda, por reconhecimento social, ou seja, prático15. A luta não cessou e não pode cessar. A conquista importante é ainda muito frágil e demanda mecanismos para sua sustentação. Deve ser reafirmada constantemente, visto que as mudanças operadas neste último século exigem que a educação esteja para além do ensino dos conhecimentos historicamente construídos pela humanidade.

As necessidades do mundo contemporâneo reclamam que se façam novas aprendizagens. Reproduzir conhecimentos e instrumentalizar-se para o mercado do trabalho não é suficiente no contexto atual em que a demanda por um sujeito capaz de constituir saberes, criar, se adaptar às mudanças político-econômicas, desenvolver habilidades e potencialidades ao máximo, propor mudanças sociais, engajar-se em projetos que prezem pela sustentabilidade ambiental e a paz mundial, agregar valor humano às relações, ou seja, um sujeito que seja capaz de aprender a

conhecer, a fazer, a ser e a conviver, conforme anunciam Delors et al. (2006)16, se

faz urgente.

Aliás, no relatório publicado pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), em 1996, sob o título: "Educação: um

tesouro a descobrir"17, Delors et al. explicitam que, enquanto princípio fundamental:

[...] a educação deve contribuir para o desenvolvimento total da pessoa –

espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, sentido estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade. Todo o ser humano deve ser preparado, especialmente graças à educação que recebe na juventude, para elaborar pensamentos autônomos e críticos e para formular os seus próprios juízos de valor, de modo a poder decidir, por si mesmo, como agir nas diferentes circunstâncias da vida. (DELORS et al., 2006, p. 99).

Todas essas expectativas em relação aos sujeitos são desenvolvidas por intermédio de experiências que ocorrem tanto no âmbito da educação formal quanto

15 "Observa-se, finalmente, que o direito não pode limitar-se à existência das normas jurídicas. Para o

exercício democrático do Direito, é preciso que se coadunem o aperfeiçoamento jurídico e as possibilidades de sua aplicação, ou seja, considerar mais as condições particulares dos indivíduos, sem perder de vista o conteúdo universalista." (STECANELA; LEMONS, 2020, p. 182.).

16 Ainda que se reconheça as potencialidades dos quatro pilares da educação apresentados por

Delors et al. (2006), não se pode deixar de fazer algumas problematizações em relação ao relatório, tais como: o que pautou os pressupostos e as premissas apontadas pelos(as) relatores(as) como tendo sido definidas pela humanidade a respeito de como deve ser a educação para o século XXI? Que interesses foram incorporados ao texto? Ele esteve ou está a serviço das lógicas dominantes da vida cotidiana? Considerando que o que ali está apontado é indicativo, projeto, como as políticas públicas das diferentes nações traduzem e implementam esses princípios, tanto nos textos da legislação quanto nas práticas cotidianas?

17 O relatório organizado por Jacques Delors e outros corresponde à Conferência de Jomtien,

realizada na Tailândia no ano de 1990, denominada Conferência Mundial sobre Educação para Todos.

da educação não formal, seja ela familiar, seja ela social. Conforme explicam Vigotsky, Luria, Leontiev (2001), a aprendizagem e o desenvolvimento, processos interligados e potenciais para a formação e constituição humana da pessoa, são favorecidos por intermédio das interações humanas e, sendo a escola ainda um importante espaço de socialização para as crianças e os(as) adolescentes, fica fácil entender o quanto podem ser potenciais para o desenvolvimento as aprendizagens na escola realizadas.

Retomando o primeiro questionamento sobre a aprendizagem ser ou não um processo natural do ser humano, pode-se afirmar que tanto a aprendizagem quanto o desenvolvimento são processos que ocorrem desde o nascimento da criança, ainda que em ritmos distintos. Contudo, enquanto o desenvolvimento, do ponto de vista biológico, ocorre quase que naturalmente à medida que se dá a maturação do próprio organismo, a aprendizagem requer determinadas mediações e intervenções.

Por serem processos interligados, as funções cognitivas desenvolvem-se apoiadas no desenvolvimento biológico, mas não estão restritas a ele. Por certo, a aprendizagem depende de condições biológicas próprias para isso, mas, também, das relações estabelecidas pelo sujeito com os outros sujeitos com quem convive. Como em uma via de mão dupla, a aprendizagem promove o desenvolvimento de outros processos biológicos mentais e esses permitem novas aprendizagens.

Considerada deste ponto de vista, a aprendizagem não é, em si mesma, desenvolvimento, mas uma correta organização da aprendizagem da criança conduz ao desenvolvimento mental, ativa todo um grupo de processos de desenvolvimento, e esta ativação não poderia produzir-se sem a aprendizagem. Por isso, a aprendizagem é um movimento intrinsecamente necessário e universal para que se desenvolvam na criança essas características humanas não naturais, mas formadas historicamente. (VIGOTSKY; LURIA; LEONTIEV, 2001, p. 115).

Então, que importância o ensino escolar adquire para a aprendizagem? Bem, como já foi dito, a interação social tem papel fundamental nesse processo, pois, sem ela, os processos cognitivos e seus níveis de desenvolvimento possivelmente não seriam despertados. Em outras palavras, a criança ou o(a)

adolescente permaneceria tempo demasiado – talvez nem saísse – do nível de

desenvolvimento real, que compreende aquilo que ela(ele) já sabe e é capaz de

ainda que essas sejam específicas para cada sujeito – continuariam a ser potenciais e nunca reais.

Pela via do ensino escolar, em que o processo de aprendizagem é deflagrado pelos(as) docentes a partir das ações e práticas pedagógicas por eles(as) escolhidas, são fomentadas as interações e propiciadas as experiências que contribuem para que as aprendizagens potenciais ocorram. Mesmo assim, não basta apenas ensinar para assegurar a aprendizagem.

É preciso que os(as) docentes assegurem-se de que estão sendo proporcionadas situações de aprendizagem que consideram o nível de desenvolvimento real e de desenvolvimento biológico do sujeito aprendiz, bem como o que lhe é potencial.

Nesse sentido, é preciso que os professores(as) tenham conhecimentos técnicos e específicos para a prática docente. Conhecimentos esses que os(as) permitam fazer as escolhas adequadas aos objetivos do ensino que são as aprendizagens potenciais e, sendo assim, sua atuação, não é difícil entender a razão pela qual a escola é um espaço privilegiado para a ativação da área de

desenvolvimento potencial18. Ainda conforme destacam Vigotsky, Luria e Leontiev:

[...] não é necessário sublinhar que a característica essencial da aprendizagem é que engendra a área de desenvolvimento potencial, ou seja, que faz nascer, estimula e ativa na criança um grupo de processos internos de desenvolvimento no âmbito das inter-relações com outros, que, na continuação, são absorvidos pelo curso interior de desenvolvimento e se convertem em aquisições internas da criança. (VIGOTSKY; LURIA; LEONTIEV, 2001, p. 115).

Seria, em suma, pelos conhecimentos docentes de identificação de cada um dos níveis de desenvolvimento (real e potencial) e de definição das intervenções mais adequadas para os(as) estudantes que a escola se tornou o espaço

institucional requerido e reconhecido19 para a efetivação da aprendizagem. Os(as)

professores atuariam diretamente entre esses dois níveis, na zona de desenvolvimento proximal, como assim foi definida pelos autores supracitados.

18 Dizendo de outro modo, o nível de desenvolvimento real é aquele em que a criança ou o(a)

adolescente se encontra, quer dizer, envolve as coisas que já sabe, já significou, já apreendeu; portanto, que já desenvolveu e é capaz de realizar sem ajuda. O nível de desenvolvimento potencial compreende aquilo que ela ou ele ainda não sabe, mas que de acordo com a etapa de desenvolvimento biológico em que se encontra, ou a maturidade biológica já adquirida, já está apta(o) a desenvolver e alcançar, se forem feitas as intervenções pertinentes.

19 As questões que envolvem a identificação ou não da escola como espaço (institucionalizante) de

A chamada zona de desenvolvimento proximal está no interstício entre o que a criança ou o(a) adolescente já sabe e aquilo que ela ou ele poderá saber e fazer autonomamente, mas que no momento demanda auxílio para conseguir. Uma intervenção pedagógica potencial para a aprendizagem e o desenvolvimento, portanto, é aquela em que o adulto (docente) que já desenvolveu tais potencialidades fornece ao aprendiz pistas, o instrui, demonstra ou assiste, para que aprenda a realizar as mesmas ações sem ajuda. Em suma, "a diferença entre o nível das tarefas realizáveis com o auxílio dos adultos e o nível das tarefas que podem desenvolver-se com uma atividade independente define a área de desenvolvimento potencial da criança." (VIGOTSKY; LURIA; LEONTIEV, 2001, p. 112).

Ao saber que existe uma potencialidade a ser explorada e lembrando que o ritmo de desenvolvimento de cada um é muito subjetivo, o(a) professor(a) opta por mediações e intervenções específicas para a aprendizagem de cada educando. Está convicto de que não é a idade que define a aprendizagem, nem somente a mediação e a intervenção que a garante, mas que sua realizabilidade depende da dessa interação.

A escola, nessa perspectiva, torna-se um lugar privilegiado para que a criança ou o(a) adolescente desenvolva algo novo, pois é um espaço formalizado para que mediações, interações, experiências e relações diversas aconteçam considerando a etapa de desenvolvimento de cada um(a). Logo, fazendo as mediações e intervenções pedagógicas adequadas, os(as) professores(as) e a

escola – pensando de forma institucionalizada – contribuem e se tornam

responsáveis pela efetivação da aprendizagem.

Na concepção da teoria sociointeracionista apresentada pelos autores e sob a interpretação cuidadosa de Oliveira, o aprendizado:

[...] é o processo fundamental para a construção do ser humano. O desenvolvimento da espécie humana e do indivíduo dessa espécie está, pois, baseado no aprendizado que, para Vigotsky, sempre envolve a interferência, direta ou indireta, de outros indivíduos e a reconstrução pessoal da experiência e dos significados. (OLIVEIRA, 1997, p. 78-79, grifos da autora).

Considerando tais pressupostos, a mediação e a intervenção pedagógicas podem ser entendidas como aquelas que precisam ocorrer de forma orientada e

planejada para o que a criança ou o(a) adolescente ainda não desenvolveu. Mas não apenas isso, visto que precisam ser posta em prática por intermédio de:

[...] uma intervenção pedagógica crítica, sensível, ostensiva, atenta para as diversidades – e para o respeito às diferenças – e para o desenvolvimento das capacidades potenciais do(a) estudante, alicerçada sobre experiências formativas e de socialização diversificadas, que se dá numa relação de humildade com o outro, é capaz de oportunizar e favorecer a aprendizagem. (LEMONS, 2015, p. 111).

O ensino na Educação Básica, aqui discutido, por si só não dá conta das aprendizagens potenciais, visto que desenvolver-se, enquanto aprimoramento

continuum, não é algo que se encerra ao final de determinada etapa escolar nem

está circunscrito aos tempos escolares. Todavia, é no cotidiano escolar que muitas situações de aprendizagem podem ser intencionalmente e artificialmente criadas para que o sujeito consolide, mesmo que não na totalidade, as potencialidades possíveis naquele momento.

É por essa razão que o espaço da escola e, especialmente, a mediação e a intervenção pedagógicas são tão importantes para a aprendizagem, pois é por meio dessas que a zona de desenvolvimento proximal é transformada em desenvolvimento potencial.

Essas questões são complexas, no entanto conduzem a prática pedagógica a outro patamar, bem distante da reprodução de conhecimentos historicamente acumulados pela humanidade ou da simples transferência de informações. Ao contrário, conduz a educação escolar a mediações e intervenções pedagógicas ou processos de ensino orientados para o que a criança e/ou o(a) adolescente ainda não desenvolveu.

Corroborando essa perspectiva, Freire (2013) insiste na valorização daqueles(as) a quem o ensino se destina, seja por intermédio da consideração do saber de experiência feita de cada sujeito aprendiz, seja pelo estímulo à discussão coletiva a respeito do que é importante ser ensinado na escola, uma vez que não se justifica um ensino do qual não se almeje aprendizagens significativas para os(as) estudantes.

Uma das diretrizes propostas por Freire para que o ensino e a aprendizagem tenham um horizonte comum é o diálogo estabelecido entre quem ensina e quem aprende, ou seja, entre professores(as) e estudantes, ambos ensinantes e

aprendizes20. Essa prática dialética e dialógica é um princípio importante da concepção de direito à aprendizagem aqui discutida. Sobre ela, Freire argumenta que:

[...] educar e educar-se, na prática da liberdade, é tarefa daqueles que sabem que pouco sabem – por isto sabem que sabem algo e podem assim chegar a saber mais – em diálogo com aqueles que, quase sempre, pensam que nada sabem, para que estes, transformando seu pensar que nada sabem em saber que pouco sabem, possam igualmente saber mais. (FREIRE, 1983, p. 15).

Azevedo (2013), ao discutir sobre a aprendizagem significativa da língua materna, refere que aprender tem a ver com o processo de atribuição de sentido ao objeto de aprendizagem, uma tarefa do sujeito cognoscente sobre o objeto cognoscível, como também já havia trazido Freire.

Pensar o ensino significa, necessária e prioritariamente, pensar a aprendizagem e pensá-la como um processo que demanda do sujeito cognoscente atribuir sentido ao objeto de conhecimento, pensá-la como um passo além da memorização temporária de conteúdos formalmente estabelecidos no âmbito escolar. (AZEVEDO, 2013, p. 192).

A problemática pedagógica seria, portanto, o aspecto de destaque nesta concepção de direito à aprendizagem, pois trata de uma essencialidade da qual o processo de ensino deve fazer jus. Nas palavras de Azevedo e Rowell: "se o saber pressupõe a construção de uma rede de informações, conceitos e conhecimentos interconectados além de uma gama de competências e habilidades desenvolvidas, faz-se necessário aprender a tecer essa rede e a lançá-la para resolver problemas." (AZEVEDO; ROWELL, 2010, p. 203).

Nessa perspectiva, o conhecimento existe enquanto desdobramento de um processo de aprendizagem significativa que se dá a partir de sentidos que o próprio aprendiz atribui ao que experiencia. Sem essa atribuição de sentidos não há aprendizagem e, sem um ensino com materiais e estratégias potencialmente significativas, o(a) estudante tem limitada possibilidade de aprender. Aprendizagem

20 Stecanela (2018, p. 939) tensiona a dimensão do diálogo na relação pedagógica, questionando se

ele "é capaz de produzir uma relação pedagógica dialógica em que essa não seja confundida em amizade" e encontra nas teorias de Freire e Buber subsídios para responder à questão. Segundo a autora, para Freire (1987; 2013) a relação pedagógica enfatiza a reciprocidade; para Buber (2001), que problematiza tal afirmativa, o papel de cada um na relação pedagógica deve ser relativizado de modo que esta não seja confundida com amizade. Para o filósofo austríaco, ela é mutualidade.

significativa é, então, "o processo pelo qual um significado novo é incorporado não arbitrária e não literalmente pelo aprendiz a outros significados já existentes em sua estrutura cognitiva, logo, resultantes de aprendizagens prévias igualmente significativas." (AZEVEDO, 2013, p. 199).

Explicitado brevemente, o direito à aprendizagem na Educação Básica nas dimensões jurídica e prática demanda um processo de reconhecimento que envolve fundamentalmente o envolvimento e o fazer docentes. A aprendizagem, como aqui está sendo colocada, dificilmente pode ser mensurada em situações nas quais se espera a expressão artificial de determinadas respostas discentes, uma vez que ela não somente é um fim em si mesmo, como compreende um processo altamente subjetivado.

Espontaneidade, curiosidade e liberdade de pensamento e ação são mecanismos intrínsecos e necessários para a aprendizagem em qualquer área do conhecimento e é por essa razão que situações de aprendizagem, potencialmente significativas para os(as) estudantes, devem estar presentes no cotidiano escolar, pois são elas as verdadeiras aprendizagens, conforme explica Azevedo:

Ancoradas em nossas estruturas cognitivas, são retidas na memória permanente ou de longa duração e nunca são efetivamente apagadas, são reestruturadas, redimensionadas, reconfiguradas por aprendizagens de conceitos ou proposições mais específicos/profundos/complexos. (AZEVEDO, 2013, p. 202).

Assim, situações significativas efetivadas por uma intervenção pedagógica adequada, conforme defende Stecanela (2018), estabelecida por intermédio de uma relação pedagógica pautada na tríade que a compõe professor(a)-estudante-

conhecimento permeada pelo diálogo, como um elemento que promove as conexões

e a própria relação, pode ser o limiar entre a aprendizagem e a não aprendizagem. Uma relação que não é apenas vínculo afetivo, mas que tem o diálogo como princípio e método; enquanto postura e prática que estimulam a curiosidade, a autonomia, a tomada de decisão, a crítica, a proposição do(a) educando(a). Para Stecanela:

É através de uma postura investigativa, pautada pela pergunta, pela