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As fontes do direito e a nova perspectiva sobre a produção

3.2. Fontes do Direito

3.2.2. As fontes do direito e a nova perspectiva sobre a produção

Muito embora a divergência doutrinária acerca das fontes do direito seja de singela constatação, as correntes mais tradicionais tendem a convergir quanto à classificação das fontes de direito em fontes formais e fontes materiais. As formais corresponderiam aos veículos introdutores utilizados para a introdução de normas jurídicas no sistema do direito positivo. As materiais, por seu turno, seriam os próprios acontecimentos verificados na realidade social (os suportes fácticos), os quais se subsumiriam às hipóteses das normas jurídicas (matar alguém, contratar, auferir renda).

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Ainda com referência às fontes formais, ter-se-iam as primárias (Constituição, leis complementares, leis ordinárias, medidas provisórias e atos regulamentares, como os decretos e outros veículos introdutores dessa índole) e as secundárias (por exemplo, atos normativos de segundo escalão e a jurisprudência).212

Não bastasse nossa convicção no sentido de que os seres humanos são as fontes do direito, entendemos carecer de sustentação esse modelo classificatório tradicional. No que toca às chamadas fontes formais, seríamos impingidos a aceitar que as leis (em sentido amplo) criam as normas jurídicas, naquela ultrapassada visão de direito gerando direito, algo inaceitável quando assentado que as normas jurídicas são criadas pela ação dos homens, mediante a produção de linguagem prescritiva. E quanto às fontes materiais, embora reconheçamos que os eventos ocorridos no plano da realidade podem desencadear efeitos jurídicos, mas isso somente ocorrerá quando relatados em linguagem competente. Ora, para tanto não precisamos nomear as ocorrências de fontes materiais. Basta a designação própria do discurso jurídico, sempre atual e que é conhecida por todos: falemos de fatos jurídicos.213

Uma nova perspectiva sobre a criação normativa já se fazia necessária. Pois bem. Mantendo na retentiva nossa convicção acerca dos homens serem as fontes do direito, cumpre ressaltar que, como destaca EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI, Ao deslocar o estudo das fontes, do universo normativo para o ato de aplicação do direito, ou seja, para o fato jurídico criador, PAULO DE BARROS CARVALHO, apoiado em LOURIVAL VILANOVA, imprimiu um avanço à teoria ... .214

Da análise dessa nova concepção é possível constatar, de pronto, o corte do uso das expressões fontes formais e fontes materiais (próprias das correntes tradicionais) para, considerando como as normas ingressam no sistema do direito positivo, operar com aquelas categorias de veículo introdutor de normas, e enunciado prescritivo, desenvolvendo os conceitos de normas introdutórias e normas introduzidas.

212 Essa a classificação adotada por RUY BARBOSA NOGUEIRA quanto às fontes do direito tributário, a despeito de utilizar fontes reais para designar as chamadas fontes materiais (Curso de direito tributário, 1980, p. 49-69).

213 PAULO DE BARROS CARVALHO, Curso de direito tributário, 2005, p. 52. 214

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Nesse sentido, a criação das normas introdutoras de enunciados prescritivos no sistema do direito positivo é realizada por aqueles acontecimentos verificados na realidade social que são juridicizados por normas reguladoras da própria produção normativa. São os fatos jurídicos criadores de normas.215 Esses fatos criam as

chamadas normas introdutórias. Por meio dessas normas introdutórias são veiculados os enunciados prescritivos, a partir dos quais o intérprete constrói os juízos hipotético-condicionais (normas jurídicas). Esses enunciados prescritivos são as normas introduzidas.

Assim, são identificados fatos jurídicos criadores de normas.216 As normas criadas atuam como veículos introdutores (instrumentos introdutórios) de normas jurídicas no sistema de direito positivo. Essas últimas, as normas introduzidas, correspondem aos enunciados prescritivos.

Desse modo, a expressão fonte formal é substituída por instrumentos introdutórios de normas (ou veículos introdutores). Esses instrumentos podem ser divididos em primários (a lei em sentido amplo) e secundários ou derivados (atos normativos subordinados à lei).

No âmbito do direito tributário, tem-se: (1) como instrumentos primários, lei constitucional, lei complementar, lei ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto-legislativo e resolução do Congresso Nacional ou do Senado; e (2) como instrumentos secundários, decreto regulamentar, instrução ministerial, circular, portaria, ordem de serviço e outros atos normativos estabelecidos pelas autoridades administrativas.217

Fatos jurídicos criam normas, as normas introdutórias (chamados veículos introdutores ou instrumentos introdutórios. Esses veículos introduzem outras normas, as normas introduzidas (enunciados prescritivos). Normas introdutórias e normas introduzidas. Eis a síntese dessa nova perspectiva: fatos jurídicos criadores de veículos introdutórios, que introduzem enunciados prescritivos no sistema do direito positivo.

215 LOURIVAL VILANOVA, Causalidade e relação no direito, 2000, p. 56.

216 Para EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI seriam esses fatos jurídicos criadores de normas as fontes do direito em sentido estrito (Lançamento tributário, 1996, p. 53).

217 Acerca dos instrumentos primários e secundários de introdução de normas tributárias, v. PAULO DE BARROS CARVALHO (Curso de direito tributário, 2005, p. 56-77).

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Essa moderna perspectiva do processo de criação normativa suplanta o modelo clássico, todavia, a rigor, em nada afeta nossa visão sobre a temática das fontes do direito. Antes, convivem em perfeita harmonia. É que, ao identificarmos no homem o foco ejetor de normas jurídicas, não descartamos a análise do modo como as ações humanas produzem novas unidades normativas, inserindo-as no sistema do direito positivo. As ações humanas são os fatos jurídicos criadores dos veículos introdutores de normas, os quais introduzem enunciados prescritivos, inovando o plexo normativo.