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PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

2.3 As primeiras expedições e o conflito com os povos indígenas e posseiros

No estado de São Paulo, a agricultura capitalista se expandia cada vez mais. A cafeicultura, principal responsável pela expansão, crescia significativamente e, consequentemente, também sua demanda por terras. No entanto, para que se pudesse expandir, as terras deveriam estar de acordo com os padrões mínimos de produção e deter condições para circulação. As terras do oeste do estado de São Paulo tinham várias denominações, mas todas as alcunhas expressavam o desconhecimento sobre elas.

10 Além dos brasileiros, o imigrante era um candidato em potencial a um lote de terras. Com os recursos que trouxera ou com o que amealhasse trabalhando nas fazendas dirigia-se para o “sertão”, a fim de realizar o sonho de ser um proprietário. (TEIXEIRA, 1979, p. 61)

José Sobreiro Filho Pierre Monbeig (1984) destaca que além de não estarem integradas à economia do estado era uma região pouco conhecida, habitadas por índios e conhecida como planalto ocidental (p.64), sertão e sertão ocidental:

Assim, em 1870, os planaltos e as florestas do oeste de São Paulo e do norte do Paraná constituíam vasto sertão, região mal conhecida, habitada sobretudo por índios, na qual se perdiam alguns sertanistas audazes. O sertão ocidental escapava completamente à economia da Província. (MONBEIG, 1984, p. 22. Grifo nosso)

Vasques (1973) refere-se à comum concepção de “terras habitadas por índios” ou “Sertão Desconhecido” e destaca o pouco conhecimento da região e as dificuldades em se conhecê-la:

Terras habitadas por índios ou “Sertão Desconhecido” eram os dizeres mais comuns nas antigas Cartas Corográficas de duzentos anos atrás. Muito mais da metade do atual Estado de S. Paulo era totalmente ignorada. Havia somente algumas descrições feitas por leigos, viajores que por motivos econômicos ou por ordens militares, se embrenhavam por aqueles desconhecidos sertões, parecendo mil males e enterrando, a cada passo, seus companheiros, vítimas de índios, acidentes e febres desconhecidas. (VASQUES, 1973, p. 1. Grifo nosso)

Abreu (1979) nos traz outra alcunha sobre a mesma região como “Vale do Paranapanema” ou “Sertão do Paranapanema”:

Esta parte sudoeste do Estado de São Paulo era chamada, no século XIX e princípios deste, de Vale do Paranapanema ou Sertão do Paranapanema. Ia desde Sorocaba e Botucatu até o rio Paraná, abrangendo a bacia do rio Paranapanema. Bem antes das expedições científicas do Serviço Geográfico e Geológico esse território foi visitado pelas “entradas” com finalidade de aprisionar índios aí existentes (ABREU 1979, p. 860 Grifo nosso).

Porém, independente da alcunha, todas se referiam às mesmas delimitações, ou seja, havia limites em comum. No oeste o limite era o rio Paraná e ao sul o rio Paranapanema11. O desconhecimento sobre as terras nesse período e o fato de serem habitadas por índios aparece repetidamente em várias obras e relatórios. Como exemplo do desconhecimento e a existência dos indígenas “ferozes”, Teixeira (1979) faz referência a uma das cartas geográficas do Império que cuja legenda “TERRENOS DESCONHECIDOS, HABITADOS POR SELVAGENS FEROZES” (p. 15). Diante de tamanho desconhecimento e da conjuntura de expansão do capitalismo e sua demanda por terra, sobretudo para expansão da cafeicultura, é que se inserem as ações da CGG –

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“Seu nome na língua tupi, significa rio ruim, ou água ruim, talvez referindo-se à pesca de peixes”. (LEITE, 1998, p. 23)

José Sobreiro Filho Commissão Geográphica e Geológica da Província de São Paulo chefiada por Orville A. Derby.

No entanto, devemos chamar a atenção para o fato de que antes da criação da Commissão Geográphica e Geológica houve um primeiro contato com a população indígena da região. Este primeiro contato com as terras e a população indígena da região foi estabelecido pioneiramente pelo protomovimento liderado por José Theodoro de Souza. Portanto, pelos registros que tivemos acesso, identificamos que foram dois os momentos e as formas de acesso e contato com os indígenas e as terras da região, com focos e objetivos diferenciados. No entanto, em ambos os momentos a violência e o conflito encontravam-se presentes.

Assim, em um primeiro momento ocorreu o contato por terra estabelecido por Jose Theodoro de Souza e familiares, sobretudo João da Silva Oliveira e Francisco de Paula Moraes, e seus conterrâneos mineiros, cujo objetivo era obter as terras através do grilo, ocupá-las e comercializá-las. Este contato destaca-se como a primeira ação deste proto ou quase-movimento socioterritorial rumo às terras do Paranapanema. O segundo contato, cujo acesso foi realizado predominantemente por via fluvial, foi pela Commissão Geográphica e Geológica da Província de São Paulo que tinha como principal objetivo, além de outras informações, conhecer o potencial de navegabilidade dos rios Itapetininga e Paranapanema.

Os contatos contribuíram muito também para se conhecer sobre os indígenas. De acordo com Antonio (1984, p. 46) e Abreu (1972, p. 15) os índios que ali habitavam “pertenciam ao grupo dos Guarani, também designados Cainguá ou Caiuá, Tupiniquim, Xavante e Caigang, estes últimos também chamados de Coroados, a partir do século XVIII”. Muito pouco se sabia sobre eles, eram arredios demais e, portanto, quase não tinham contato com o homem branco. As duas experiências de contato mais intensas foram as reduções jesuíticas de Loreto e Santo Inácio (LEITE, 1972, p. 50). No entanto, não contribuíram muito para obter-se informações e estabelecer uma relação respeitosa e harmoniosa.

Segundo Vaques quase não se sentia a presença dos indígenas:

Quanto aos indígenas, não se vê diretamente mas, a presença é sentida indiretamente pelas canoas encontradas às margens, amarradas a varas fincadas, as veredas estreitas que conduzem para dentro da mata e a movimentos ao longe de um remador e se esconder ou fugir apressadamente. (1973, p. 8)

José Sobreiro Filho Com o passar do tempo, alguns dos que restaram vivos acabavam por fugir para as barrancas do Paranapanema ou até se internarem nas terras do Mato Grosso12 como única forma de evitar o contato com o homem branco, que lhes representavam uma séria ameaça (LEITE, 1972, p. 50). No entanto, nem todos os indígenas recuavam. Ocorreram muitos conflitos, tanto da parte dos homens brancos quanto da parte dos indígenas que atacavam as fazendas que eram constituídas em suas terras:

Premido pela fome, pois a área de caça diminuía a cada ano, e não podendo competir com as armas dos brancos, o índio, na verdade, tornava-se cada vez mais arredio e em constante fuga para o Mato Grosso. Não obstante serem célebres os ataques que opôs ao pioneiro e às fazendas dos arredores de Campos Novos, Conceição de Monte Alegre e São Mateus, ao findar-se o século XIX, tratavam-se de assaltos já sem preparo, acanhados, sem os traiçoeiros ardis de seus antepassados.

<<Obrigados a fugir sempre diante do colono invasor>> o silvícola, não teve condições para competir com este, como ainda ocorre em nossos dias nas áreas de povoamento do norte matogrossense e com os Estados do Norte do País. Em 1890, já Teodoro Sampaio reconhecia a sua fuga constante das frentes pioneiras. (LEITE, 1972, p. 42)

Os conflitos iniciaram-se a partir dos primeiros contatos que os homem brancos ditos “civilizados” tiveram com os indígenas, como abordaremos adiante.

O conflito com os indígenas

Além da grilagem uma característica do proto ou quase-movimento socioterritorial foi a "limpeza territorial". Neste sentido, além da derrubada da floresta, conforme apresentaremos mais adiante, o extermínio indígena foi fundamental para o protomovimento de grilagem e ocupação das terras do Paranapanema. A principio é importante destacar que o conflito e a violência com os indígenas tem grande semelhança com o que mais tarde viria a acontecer com os sem terra. A força do latifúndio se expressou tanto na violência e agressividade contra os indígenas quanto no rechaço às investidas dos movimentos sem-terra. O conflito contra os indígenas e sem- terras são, na realidade, tanto faces da disputa territorial em dois momentos distintos quanto também reações diferentes contra o latifúndio e latifundiários, pois enquanto os indígenas lutaram para permanecer, os sem-terra lutaram tanto para resistir na luta

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“salvo uns poucos que, jangadas e pirogas, cruzaram o rio Paraná, ocultando-se nas florestas e cerrados mato-grossenses. (Leite, 1998, p. 33-4)”

José Sobreiro Filho quanto avançar ofensivamente contra o latifúndio atacando seu território. O produto deste histórico foi de um lado a expulsão e até mesmo ao extermínio dos indígenas e do outro lado algumas conquistas dos sem-terra. No entanto, os sem-terras também não passaram ilesos perante a violência e os bramidos dos latifundiários no Pontal do Paranapanema, pois em sua história houveram perdas, feridos, ameaças e desistência, conforme apontaremos no capítulo 2.

O conflito com os indígenas inicia-se logo no primeiro contato, sobretudo, por José Theodoro de Souza, figurado como um grande herói desbravador das terras desconhecidas do oeste, e seus familiares, que contribuíram significativamente para a ocupação da região. As terras do oeste da até então Província de São Paulo, inclusive as terras do Paranapanema, faziam parte de uma porção ambicionada pelo capitalismo. No entanto, haviam ali populações que não estavam inclusas na lógica metabólica do capital e, portanto, para que não freasse sua expansão deveriam ser integrados, expropriados ou exterminados. Neste contexto, a marcha pioneira, com seu amplo processo produtivo e sua acelerada ocupação territorial, avançou sobre as terras e acarretou um intenso processo de extermínio dos indígenas na porção do Vale do Paranapanema.

Visto que os indígenas encontravam-se fora do processo de expansão do capitalismo, os mesmos, em sua maioria, eram vistos como entraves para o crescimento e desenvolvimento da nação, ou seja, os índios eram tidos como inimigos do progresso e, portanto, para o homem branco deveriam então ser exterminados. Fundamentar a ideia dos indígenas como ferozes, violentos, selvagens13 e que representavam uma ameaça aos colonos servia como uma forma de ganhar legitimidade à ideia e “necessidade” do extermínio dos indígenas para ocupação da região. O custo social e cultural deste processo não interessava naquele momento e mal ou pouco se destacava a violência e crueldade do homem branco e o fato de que este foi o grande invasor das terras e exterminador dos indígenas. Criava-se uma concepção desumana apinhada de preconceito para fundamentar a ideia de que a frente pioneira era sinônimo de progresso e que os “não-civilizados” representavam uma ameaça ao progresso, portanto deveriam ser exterminados, ou seja, no custo do progresso estava embutido a destruição do território indígena, a extinção dos mesmos, sua cultura, etc., de tal maneira que tudo

13 Esta concepção encontra-se em diversas obras sobre o processo de ocupação da região do Pontal do Paranapanema.

José Sobreiro Filho parecia ser normal e totalmente permissível em nome da ocupação territorial do oeste de São Paulo.

Em geral, os conflitos com os indígenas ocorreram tanto na realização das expedições quanto depois de parte do território já ocupado. Como elemento fundamental para a consolidação das fazendas e estabelecimento do “desenvolvimento” da região, o processo entendido como “limpeza do território” foi iniciado desde a sua ocupação. Os povos indígenas eram vistos como estranhos, inimigos e que deveriam ser aniquilados para que então pudesse, sem impedimentos, se desenvolver a região. É importante ressaltar que essa história tem mais de um lado. Dentre eles destacam-se dois, um em que o homem branco se prostra como vítima dos ataques dos indígenas e, portanto, era obrigado a atacá-lo, e outro em que o os indígenas foram as reais vítimas da invasão realizada pelo homem branco e o atacava para defender seu território. No entanto, independente da ordem dos fatos ou de um enredo constituído por “vilões e mocinhos”, indubitavelmente, foram os indígenas os que mais sofreram e somaram o maior número de perdas.

Ao longo do processo de ocupação acarretado, sobretudo, pela frente pioneira, os índios eram relegados cada vez mais para as áreas longínquas e ainda pouco povoadas, como as bordas dos rios Paraná e Paranapanema. No entanto, como muitas vezes, devida a opressão do processo de ocupação “não restara outra opção aos “caigangues” senão atacar, vez por outra, ao pôr-do-sol, ou ao amanhecer, as palhoças instaladas fortuitamente no seio da floresta” (LEITE, 1981, p.43). Em contrapartida aos ataques dos indígenas e às ameaças para os interesses do homem branco, era preciso realizar a “limpeza do território”, ou seja, exterminar a população indígena. Formadas por bandos de jagunço, foram organizadas as “dadas” para realizar o extermínio indígena:

Porém o revide do colonizador branco era terrível. Era contratar bandos de jagunços armados, cujo objetivo era limpar o território e exterminar o “bugre ateu”. Houve expedições, na época chamadas “dadas”, unicamente para liquidar os índios. (LEITE, 1981, p.43).

E quanto à necessidade das terras:

Os novos pioneiros contudo precisavam daquelas terras. E quanto mais melhor. A ninguém permitiam embaraçar de leve seus planos. Expedições foram organizadas com o fito exclusivo de eliminar os silvícolas dos vales dos rios do Peixe e Paranapanema. Nesse mister, destacou-se o Cel. Sanches de Figueiredo, o terror dos coroados nos

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fins do século passado e início deste. Suas <<dadas>> (*)14 eram

contratadas pelos interessados nos terrenos, para varrer os imprudentes <<caigangs>>(**)15 que tinham seus ranchos, em geral,

armados ao longo dos ribeirões afluentes do Peixe, nos campos sujos. (LEITE, 1972, p. 42)

As dadas eram apinhadas pelo que havia de mais sangrento e desumano. A crueldade foi uma das características mais notáveis nos ataques realizados pelos homens brancos16. Teixeira (1979, p. 34-5) destaca a brutalidade e crueldade das investidas dos homens branco. Houveram também muitos conflitos com os indígenas durante o período de construção das estradas de ferro. Mombeig (1984, p. 131) destaca que nas nascentes dos rios do Peixe e Feio a hostilidade era intensa e implicou em problemas na construção da estrada de ferro do município de Bauru a Mato Grosso. O conflito foi tão intenso que era necessário organizar grupos militares para proteger os trabalhadores que construíam a estrada. No entanto, o período de construção desta estrada (1880 e 1900) marca o declínio dos indígenas, visto as matanças e doenças que se espalhavam ao terem contato com os brancos (MONBEIG, 1984, p. 131-2).

Em geral, a maioria dos contatos entre os homens brancos e os indígenas foram sangrentos e conflituosos17. Dentre as várias tribos que viviam na região, de acordo com Monbeig (1984, p. 130), os Xavantes se destacavam em ter uma relação pacífica com o homem branco e até mesmo em trabalhar lado-a-lado. Todavia, os Xavantes eram exceção. Por fim, os demais índio que não fugiram para o estado do Paraná ou para o estado do Mato Grosso, terminaram por serem exterminados ao longo dos anos devido à superioridade numérica dos colonizadores (MONBEIG, 1984, p. 132). Todo esse processo, de acordo com Teixeira (1979, p. 17), fez partir das margens do rio Paranapanema mais de 12.000 indígenas e, apesar de a região ter sido ocupada por indígenas, quase nada restou de sua cultura na população regional (LEITE, 1972, p. 51).

14 Nome pela qual eram chamadas as expedições que tinham o objetivo exclusivo de abrir picadões e eliminar o índio.

15 Os mesmos coroados.

16 Destaca-se nas dadas o papel do bugreiro, como caçadores de índios que se deslocam para o sertão a fim de empreender uma dada. (MONBEIG, 1984, p. 131)

José Sobreiro Filho O primeiro contato: José Theodoro de Souza

O primeiro contato com os indígenas das terras do Vale do Paranapanema foi estabelecido por Jose Theodoro de Souza. O expedicionário juntamente a um grupo de homens da família e alguns acompanhantes se arriscou a "desbravar" as terras do Paranapanema para "legitimar" e reconhecer as “terras desconhecidas” como sua posse. Foi no transcorrer da ocupação que ocorreu os primeiros contatos com os indígenas. É fundamental destacar que José Theodoro de Souza foi a principal liderança e, portanto, quem guiou e mobilizou o protomovimento de ocupação das terras do Vale do Paranapanema.

A primeira investida nas terras do Paranapanema foi feita com muito cuidado para que não se caísse em armadilhas ou emboscadas dos indígenas. De acordo com Cobra (1923, p. 18-21), tanto na ida quanto na volta o grupo de Jose Theodoro de Souza passou imune aos dos ataques indígenas. No entanto, apesar de não haver contato com os indígenas durante a expedição de reconhecimento das terras, foi no processo de povoamento e ocupação que de fato ocorreu contatos mais intensos e até mesmo sangrentos com os indígenas.

No grupo que realizou o povoamento primário, além das perturbações relacionadas aos problemas com a posse e legitimidade das terras, era constante o receio e medo de que nas matas que os cercavam houvessem índios que a todo tempo cercavam seus passos e mantinham-se a espreita das ações do homem branco colonizador. O primeiro contato foi estabelecido com os índios Coroado. Estes eram conhecidos como “índios de índole pacífica” (COBRA, 1923, p. 46). Entretanto, a boa relação foi pouco duradoura. Visto os hábitos culturais serem muito diferentes criavam- se algumas animosidades que acarretou em mortes e outros tipos de violência. Cobra (1923, p. 46-7) aponta que devido ao hábito mexerem nos pertences das casas dos colonizadores e de apanharem os bens dos colonizadores e levarem para o mato terminou por gerar conflitos:

É bem de ver o encommodo que causa a continuação das visitas. Tornaram-se importunos e, deixando-se que elles ajam livremente, carregam tudo para o matto, ficando limpas de todo as casas em que entrarem. É preciso muita vigilância e mesmo usar de energia para os conter dentro de certa linha.

Contra isso, porém, se revoltam e, de pacíficos que dantes se mostravam, outra vez que se apresentam, vêm dispostos para o ataque.

José Sobreiro Filho

Um dia, a uma reprimenda, acompanhada de castigo corporal, applicado aos importunos, por serem muito mexedores no trem de cozinha, nos mantimentos e nas armas dos mineiros, ele se levantaram e, passado algum tempo, atacaram os companheiros de Theodoro tanto no rio <<Taquaral>> como no <<Santa Rosa>> os quaes se viram obrigados a combater em defesa da vida.

O sangue correu, molhando aquella terra, pela primeira vez. (COBRA, 1923, p. 47)

Deste modo, estabeleceu-se uma situação conflituosa entre os brancos colonizadores, em sua maioria mineiros, e os indígenas. Mais adiante destaca Cobra “Nasceu o ódio e, com este a ideia de vingança de parte a parte”, deste sentimento fermentaram-se muitos outros conflitos (1923, p. 48). Os povoados da região temiam cada vez mais a presença e os ataques dos indígenas, sobretudo pela habilidade que tinham de trafegar pelas matas e conhecimento da natureza. Para se defender os povoados contavam com algumas sentinelas durante a noite e o dia, e com a ajuda também de cães, tão odiados pelos índios visto sua habilidade olfativa contribuir para identificar a proximidade dos indígenas. Segundo Cobra (1923, p. 136), os pioneiros que ali chegaram agiram mais no intuído de se defender do que atacar. Somente mais tarde, com o avançar do povoamento que foram realizadas as “dadas” na região. Apesar de muitos terem se dedicado às dadas, foram o Coronel Francisco Sanches de Figueiredo e o “proprietário” João da Silva os que conquistaram fama pelas investidas para exterminar os indígenas no Paranapanema (COBRA, 1923, p. 64). Na região, as dadas tinham como objetivo limpar o território exterminando ou empurrando os indígenas para outras terras, predominantemente para o Mato Grosso e Paraná, para que pudesse desenvolver ali os interesses dos colonizadores.

As “dadas” contavam com a experiência de um personagem fundamental para exterminar os indígenas. O capitão, visto larga experiência, tinha conhecimento sobre os silvícolas e, portanto, suas estratégias de combate, rastreamento, tortura, etc. Cobra (1923, p. 139- 7) apresenta detalhes e o relato de uma “dada” realizada nas terras do Paranapanema em que ocorreu o ataque aos indígenas depois de uma madrugada festiva. Dentre os trechos que descrevem e relatam a operação, destaca-se demasiado grau de crueldade, violência e desumanidade:

É alta madrugada. Dentro dos ranchos todos dormem. O chefe distribue seus homens em redor; manda preparar as armas, e esperar até que haja luz. Ao raiar do dia grita: upa! upa! upa! algumas vezes.