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No caso particular da Química, dominar sua linguagem implica que o aprendiz consiga estabelecer as relações conceituais entre representações de diferentes níveis, assim como transformar uma representação entre um nível e outro. Para Wu (2003), a aprendizagem e o desenvolvimento de competências representacionais implicam realizar ações que permitam ao sujeito que aprende:

a) Gerar representações para um propósito particular; b) Utilizar as representações para dar explicações;

c) Utilizar as representações em um contexto social, por exemplo, na escola, para comunicar sua compreensão e,

d) Estabelecer as relações entre diferentes representações. (p. 831)

Outra pesquisa desenvolvida pelos autores Wu e Krajcik (2000), cujo objetivo foi promover a compreensão das representações químicas dos estudantes mediante o uso de ferramentas visuais, deu como resultado que as dificuldades no entendimento do mundo microscópico se devem à necessidade de explicar o comportamento das substâncias através de representações de entidades invisíveis e abstratas que não têm correspondência com o

89 mundo perceptível (macroscópico). Processo que corresponderia ao real dado antes explanado. Razão pela qual se pensa que o estudante não consegue entender os fenômenos químicos e relacionar os tipos de representação: macroscópica, microscópica e simbólica.

Os pesquisadores verificaram que o uso de ferramentas tecnológicas, assim como a utilização de software especializado para o ensino de conceitos químicos, como estrutura molecular, melhora a compreensão dos fenômenos por parte dos estudantes, no sentido de que lhes permite interpretar múltiplas representações para uma mesma situação, desenvolvendo habilidades cognitivas, ajudando-lhes a constituir o mundo do real produzido.

Do mesmo modo, estas revisões permitiram nesta pesquisa a formulação e realização de práticas experimentais que envolveram a resolução de problemas favorecendo nos sujeitos a estruturação dos conceitos para construir representações fundadas sobre comportamentos microscópicos. Em outros casos, em que a contextualização histórica foi utilizada para entender como foram elaboradas as teorizações científicas e como elas se constituem como resultado de determinadas práticas científicas que deram origem às representações do mundo real, isto possibilitou mapear os fatores e os contextos que influíram na produção de um conhecimento que, mediante diversas situações, foi se tornando público no sentido em que se consolidou como um domínio ao qual todos os participantes podiam ter acesso.

A respeito disso, autores como Hoffmam e Lazlo (1991) argumentam que as representações em Química são metáforas, modelos e construtos teóricos que surgem da interpretação que os químicos fazem da natureza e da realidade. Deste modo, ao estudar as fórmulas, as estruturas, os símbolos utilizados na Química, os desenhos das estruturas moleculares e as redações das fórmulas químicas, se está estudando teorias, leis, conceitos, processos culturais e até ideologias.

Em concordância com isto, pode-se afirmar que as construções e os experimentos elaborados pelos cientistas estão carregados de ideologia e de teoria, já que eles contêm mensagens sobre a evolução das teorias que são reveladas no processo de construção histórica da Química. Portanto, as representações químicas estão fundamentadas no conhecimento, em suas transformações e mudanças, em construções e criações que refletem a unificação e reconstrução do conhecimento teórico e experimental.

90 As representações químicas cumprem diferentes propósitos e podem ser consideradas como modelos adequados para fins específicos. Por exemplo, o modelo molecular utilizando pinos e bolas, representa as posições físicas dos átomos e moléculas e os modelos de preenchimento de espaço proporcionam informação sobre o tamanho dos átomos, que é fundamental para determinar a conformação da molécula.

Contudo, a Química tem se convertido numa ciência microscópica, que passou de uma simples compreensão macroscópica de fenômenos observáveis, a uma interpretação e explicação do comportamento visível das substâncias a partir de fundamentos atomísticos. É assim que, ao explicar a cor de um corante, pode-se justificar esta propriedade em termos mecânico-quânticos, assim como a ação farmacológica de uma molécula está relacionada com seu poder eletrostático, propriedades que são analisadas a partir do mundo microscópico.

A partir do que foi dito anteriormente, pode-se deduzir que a compreensão das representações fica longe de uma simples intuição e percepção do recurso visual empregado para sua tradução pictórica ou escrita. No entanto, os químicos transformam a informação sensorial dos processos químicos explicando-as através de condutas atômico-moleculares em nível de partículas, e assim transpõe-se na forma de fórmulas e símbolos que façam sentido para eles explicarem um fenômeno em específico.

Uma representação é uma forma de ver o mundo, assim o aponta Hoffman e Lazlo (1991); são signos e símbolos expressados numa linguagem científica como uma forma que temos de pensar (são instrumentos da mente) para produzir o pensamento. A representação só é possível com a significação dos signos. Esse é o sentido que é dado aos conceitos. Razão pela qual sua função de comunicar e interagir com os outros é, então, uma das formas de representação que serve aos químicos. Função que pode ser análoga ao trabalho dos professores e dos estudantes no processo de ensino e de aprendizagem.

Em suma, as representações são modelos carregados de teoria que os químicos elaboram para interpretar a natureza. Definidas assim, cada tipo de representação proporciona informação sobre alguns conceitos, mas se desvanece em relação a outros. Elas fazem parte da linguagem química que é utilizada para a comunicação entre os especialistas, como uma forma de divulgar o conhecimento produzido pela pesquisa, o que requer consensos teóricos e metodológicos das propostas elaboradas pelos cientistas. Na

91 escola, a função da representação é ajudar o estudante na promoção e no desenvolvimento de competências científicas que o auxiliem na compreensão sobre o conhecimento químico. A respeito disto, os trabalhos de Galagovsky et al (2003) mostraram as dificuldades com relação à aprendizagem dos conceitos químicos, por serem considerados como entes abstratos mediados por analogias, desenhos, experiências de laboratório e representações simbólicas fornecidas pelos professores, que às vezes cumpriam o papel de dar definições, regras, leis e teorias que, no lugar de ajudar, terminavam provocando dificuldades para entender a ciência.

Os trabalhos de Johnstone (2006, p. 11) trazem uma proposta que apresenta os níveis de representação na Química, fundamentando que o comportamento macroscópico das substâncias refere-se a descrições concretas baseadas em características tangíveis, o microscópico dá conta do comportamento molecular no nível do não visível e o simbólico representa mediante símbolos e signos aspectos microscópicos, macroscópicos, matemáticos, entre outros. Tais níveis surgem de uma concepção de compreensão do pensamento químico baseado no modelo de processamento da informação. O conhecido triângulo apresentado por Johnstone aparece na Figura 9.

Figura 9. Níveis de representação de Jonhstone (1993; 2006)

Fonte: Jonhstone (1993)

Outros como Chittleborough; Treagust; Mocerino (2002) descrevem estes níveis da seguinte forma:

Nível Macroscópico: Corresponde ao real observável dos fenômenos químicos inclui as ideias e experiências dos estudantes.

Nível Simbólico: A representação do fenômeno químico usando uma variedade de modelos, imagens, formas matemáticas e formulações computacionais e,

92 Nível Submicroscópico: Representação de partículas (átomos, elétrons, moléculas) submicroscópicas que não podem ser observadas diretamente. (s/p)

Porém, existem contraposições ao triângulo de Jonhstone e seus níveis de representação. Para Labarca (2010), nenhum destes níveis é superior ao outro, senão que cada um complementa os restantes. Para o autor, a proposta dos três níveis tem gerado controvérsia. Como tudo aquilo que é novidade e é contrário ao que é amplamente aceito na comunidade de investigadores da Didática da Química.

Porém, chama a atenção o erro filosófico não advertido na proposta do triângulo, no referente a uma clássica confusão com respeito aos planos de argumentação. Tal confusão refere-se à falta de distinção do plano ontológico com o plano linguístico e conceitual, e deste, por sua vez, com o plano matemático. Como é explicado por Labarca, uma distinção conceitual permite entender que os vértices do referido triângulo são qualitativamente diferentes, no entanto, dois deles correspondem ao ontológico, o restante corresponde a uma mistura dos âmbitos matemático e conceitual.

De acordo com estas considerações, então, indicaremos que o sentido do termo ‘nível’, empregado por Johnstone, deveria corresponder, na verdade, a itens ontológicos, e não a itens conceituais ou matemáticos. Portanto, já não se trata de reinterpretar seu triângulo, senão de apreciar, simplesmente, que os diferentes planos de argumentação não conformam triângulo nenhum. Acreditamos que estas análises são um bom exemplo para mostrar que a Filosofia da Química é um recurso essencial para a Educação em Química, já que contribui para uma melhor compreensão de sua natureza e permite visualizar melhor sua função no contexto do ensino das ciências naturais.

Os argumentos de Labarca (2010) a respeito à proposta de Johnstone (1993) demonstram que o triângulo constituído por níveis se centra em fundamentos baseados no campo da percepção. Seria melhor pensar em níveis de representação utilizando fundamentos como a natureza das ciências, o pluralismo ontológico, o papel da linguagem verbal e não verbal e o contexto histórico e social para, assim, dar uma função integradora e pragmática para as representações na construção do conhecimento.

Galagovsky et al. (2003, p. 113) fundamentaram-se na proposta de Jonhstone (1993) para determinar as relações entre os níveis macroscópico e simbólico. O nível submicroscópico é interpretado como um caso especial do nível simbólico, no qual se

93 apresentam explicações mediante esquemas de partículas, expressas em uma linguagem gráfica que utiliza códigos específicos. O esquema elaborado pelos autores (Figura 10) mostra como o especialista da disciplina utiliza diferentes níveis de representação e consegue articulá-los empregando linguagens verbais e visuais que tentam tornar inteligível o nível macroscópico, elaborando explicações do tipo simbólico que podem utilizar linguagens gráficas, formais e verbais.

Figura 10. Níveis de interpretação e linguagens utilizados por um especialista em Química

Fonte: Galagovsky et al. (2003, p. 113)

A habilidade do especialista e do professor consiste em articular e utilizar qualquer tipo de representação para explicar os conceitos científicos em diversos contextos. A respeito do papel das representações utilizadas para explicar os conceitos pode-se afirmar que os estudantes explicam o comportamento das substâncias usando o modelo particulado, atribuindo-lhe às partículas características observáveis, isto é, empregam o nível

94 macroscópico para explicar o nível microscópico. Por isto é comum, por exemplo, que os estudantes desenhem as partículas coloridas. Esta última situação fez com que os autores (GALAGOVSKY et al., 2003) introduzissem um novo nível, além dos propostos por Jonhstone, este foi denominado como “semiparticulado”, para referir-se a um nível intermediário, entre o macroscópico e o submicroscópico, o qual daria conta de explicar a correspondência na forma de representar aspectos perceptivos de um fenômeno e as ideias alternativas adquiridas durante a instrução dos estudantes.

Segundo Izquierdo-Aymerich (1995), o conhecimento, a experimentação e a linguagem interagem para transformar o mundo. Assim, ensinar a raciocinar seria uma condição ou competência na qual o aluno é impelido a refletir, a tomar consciência de seus processos de aprendizagem para agir de maneira crítica e a expressar seus argumentos. A ciência escolar deveria conseguir que os estudantes aprendam a utilizar modelos teóricos (o que corresponde ao real dado) para representar e dar sentido aos conjuntos de dados que se obtêm sobre os fatos do mundo e vice-versa (para construir o real produzido) utilizando os dados do mundo para dar sentido aos modelos que lhes oferecem os textos e os diferentes meios de acesso à informação em geral e os recursos de que se dispõe atualmente para a divulgação científica.

Segundo García e Perales (2006), uma aprendizagem centrada na conversão das representações e, portanto, na coordenação de diferentes tipos de registros semióticos produz uma compreensão efetiva e integradora, que possibilita a transferência dos conhecimentos aprendidos e gera resultados positivos nas tarefas de produção e compreensão como leitura, escrita e resolução de problemas.

Por outro lado, os estudantes apresentam alguns problemas ao utilizar e compreender as representações semióticas: pois não sabem compreender sua natureza mediática e metafórica, quando analisam várias representações e se centram em só uma delas (a mais familiar e concreta) e em suas características superficiais (não as relevantes conceitualmente); igualmente, quando usam diferentes representações têm dificuldades em sua coordenação e integração, não realizando conexões entre elas quando se enfrentam processos em que se tem que resolver situações que requerem distintos processos de cognição. Mas essa dificuldade natural de constituir o pensamento conceitual não deve

95 servir de pretexto para buscar subterfúgios que impeçam o desenvolvimento do processo de significação interpessoal.

Assim, para que a Química seja ensinada com sucesso, os professores devem ter um bom conhecimento do tema e das ideias das quais eles estão se ocupando, a natureza disto tem de ser abordada a partir de fundamentos da Filosofia da Química, precisando da análise epistemológica e ontológica. Devem também ter um bom conhecimento do conteúdo pedagógico (CPC), a capacidade de comunicar a natureza do conhecimento aos estudantes mediante o enfoque da filosofia e a educação química (JUSTY; GILBERTH, 2002).

3.3 COMPETÊNCIAS REPRESENTACIONAIS E A LINGUAGEM DA QUÍMICA NO