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62 Raymundo Faoro em Os Donos do Poder faz interessante e importante comparação entre o Estado do Rio

Grande do Sul e o Estado da Bahia por volta do período estudado neste trabalho. Diz o autor: “Os 103.000 votos da Bahia, em 1898, caem para 61.000, em 1910, enquanto o total nacional se elevou de 462.000 para 628.000. O Rio Grande do Sul, em 1906, ultrapassa proporcionalmente a Bahia, com 42.000 votos, para atingir, em 1910, 67.000. Em 1930, o Estado sulino consegue alistar o dobro dos eleitores da Bahia, graças à maior alfabetização de seu povo. Desse momento em diante, o triângulo de poder, colocado no centro das combinações sucessórias, ao tempo de Campos Sales formado por São Paulo-Minas Gerais e Bahia, transforma-se no arranjo São Paulo-Minas Gerais e Rio Grande do Sul, com maior risco às manobras desintegratórias do sistema”. (Faoro, 2001, p. 662) Segundo Joseph Love: “Deve-se, em grande parte, atribuir o deslocamento da Bahia pelo Rio Grande do Sul a José Gomes Pinheiro Machado, o homem mais poderoso do Senado nos anos 1905-1915”. (Love, 1975, p. 147)

63 “Pinheiro era um aliado dos interesses paulistas...” (Love, J. O Rio Grande do Sul como Fator de Instabilidade na República Velha In: Fausto, B. (Org.) O Brasil Republicano, volume 1. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1997, p. 64)

64 “Diante do fato consumado, o líder gaúcho terá que recolher as esporas, engolindo suas restrições a um

conselheiro do trono, Rodrigues Alves. À oposição aberta, que importaria em marginalizar o seu Estado e anular o trabalho já consolidado, prefere o recuo tático, para melhores dias de luta.” (Faoro, 2001, p. 657)

Os ataques à candidatura do marechal Hermes da Fonseca continuaram na imprensa paulista nos meses de junho, julho e agosto de 1909, só sendo interrompidos por alguns dias por conta da morte do presidente Afonso Pena em 14 de junho. O Correio Paulistano de 04 de junho, por exemplo, voltou a afirmar que o marechal Hermes da Fonseca só foi escolhido candidato por ser militar.

“... o único motivo da indicação do ex-ministro da Guerra é a sua farda de marechal do exército e que, por conseqüência, a sua candidatura é genuinamente militar em contraposição aos absurdos vanilóquios com que se tem procurado destruir sua qualidade primordial.” (Correio Paulistano, 04/06/1909)

Tanto o Correio Paulistano quanto O Estado de S. Paulo de junho a agosto convocaram a população de São Paulo para participar de manifestações contrárias à candidatura do marechal Hermes da Fonseca e para prestar homenagem principalmente ao Barão do Rio Branco e a Rui Barbosa. Tais homenagens se justificavam pelo fato de os paulistas alimentarem a esperança de que o Barão do Rio Branco se tornasse candidato e, no caso de Rui Barbosa, por conta do posicionamento contrário deste à candidatura do marechal Hermes, a partir da carta de 19 de maio de 1909.

No âmbito desses periódicos a novidade ficava por conta de ataques mais diretos a Pinheiro Machado e por conta de comparações feitas entre o Estado de São Paulo e o do Rio Grande do Sul, mostrando o primeiro quase sempre como Estado civilizado e o outro como rústico e formado apenas na base da luta armada.

Ainda no final de maio de 1909 O Estado de S. Paulo publicou texto ressaltando a importância de São Paulo para a proclamação e encaminhamento dos assuntos da República.

“Os empreiteiros do candidato Hermes descobrem agora que São Paulo vale menos que o Rio Grande do Sul em matéria de tradições republicanas e se, portanto, o Rio Grande apoia a facção militarista, o militarismo é o supra-sumo do ideal republicano! É uma puerilidade bairrista andar a discutir quem vale mais. Cada parte da federação tem os seus méritos... Mas... trata-se do movimento republicano de 1889, que deu em resultado a república atual. Para ela é incontestável que ninguém concorreu tanto como São Paulo. Ninguém, portanto, tem mais direito de representar a pura tradição republicana do que o grande Estado. Não há confronto que lhe possa tirar a indiscutível primazia nesse ponto.” (O Estado de S. Paulo, 30/05/1909)

Em 01 de junho de 1909, se perguntando de onde vinha o prestígio político do senador gaúcho, O Estado de S. Paulo defendeu a idéia de que tal prestígio não era fruto dos debates na tribuna, nem do lento ensinamento pela imprensa, nem dos trabalhos eleitorais. Segundo o jornal paulista,

“Seu prestígio nasceu e cresceu, deixou de ser provinciano e fez-se nacional, nos combates contra Gumercindo Saraiva. Por outro lado, o Rio Grande do Sul é, pela natureza e pela sua situação, terra voltada a conflagrações freqüentes. O vasto tapete verde das suas... Campinas cobre milhares de ossadas humanas. Seus heróicos filhos, bons como todos os brasileiros, não tem horror ao sangue. A gloria que mais os seduz é a que se conquista pelas armas.” (O Estado de S. Paulo, 01/06/1909)

Até parece que neste trecho o jornal compara Pinheiro Machado a Rui Barbosa, pois parte da reputação do senador gaúcho vinha realmente da sua participação na Guerra do

Paraguai e na Revolução Federalista,65 enquanto Rui Barbosa foi sempre o homem devotado aos livros, aos debates na imprensa e na tribuna parlamentar. É claro que trajetórias de vida diferentes podem levar também a visões de mundo distintas. A este assunto voltaremos mais tarde para discutirmos as diferenças de personalidade e formas de ação entre Rui Barbosa e Pinheiro Machado. Todavia, o prestígio de Pinheiro Machado não vinha apenas de sua participação em guerras, mas também de sua capacidade para conduzir os chefes da política nacional, se tornando o que Quintino Bocaiúva chamou de “chefe dos chefes”. O próprio Rui Barbosa não via o senador gaúcho como simples pelejador dos pampas do Rio Grande, chegando a declarar (antes da separação causada pelo lançamento da candidatura do marechal Hermes da Fonseca) que Pinheiro Machado transitava pelos campos de batalha e pela arena dos parlamentos com a mesma intrepidez e a mesma arte.66

65 Revolução Federalista foi o nome dado à guerra civil que eclodiu no Rio Grande do Sul em 1893 e durou

até 1895. De um lado estavam os Republicanos, partidários de Júlio de Castilhos, que governava o Estado sulista com base numa Constituição de caráter positivista; do outro lado estavam os Federalistas, grupo formado pelos descontentes com a nova ordem e liderados por Gaspar da Silveira Martins. Os Federalistas queriam principalmente a “substituição da Constituição comtista do Estado por uma Constituição republicana representativa, modelada nos princípios do governo parlamentar”. (Calmon, 1956, p. 70). Como nas fileiras

Federalistas se encontravam dissidentes de Floriano Peixoto, e entre os castilhistas estavam seus fiéis correligionários, o marechal apoiou totalmente este último grupo, o que foi fundamental para a derrota dos

Federalistas. Pinheiro Machado, desde os primeiros momentos, participou da luta ao lado dos Republicanos como um dos chefes da chamada Divisão do Norte que combateu Gumercindo Saraiva, um dos principais chefes que lutavam ao lado dos Federalistas.

66 “Tão feliz nas lides e nos problemas da paz como nas dificuldades e conflitos da guerra, ele triunfa sempre

com a mesma facilidade e a mesma segurança, com a mesma intrepidez e a mesma arte, com a mesma estrela e o mesmo fulgor, nos campos de batalha ou na arena dos parlamentos.” (Barbosa, Rui apud Porto, 1985, p. 230)