• Nenhum resultado encontrado

Breves apontamentos sobre o desenvolvimento histórico constitucional do Peru

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ (páginas 67-70)

IV. CONFIGURAÇÃO DOS PRECEDENTES VINCULANTES NO SISTEMA PERUANO

4.1. Breves apontamentos sobre o desenvolvimento histórico constitucional do Peru

A história constitucional do Peru foi prodigalizada na promulgação de textos constitucionais e na incorporação nominal de instituições democráticas modernas, mas não na criação de uma consciência constitucional entre os cidadãos, nem no pleno exercício do poder com lealdade constitucional de seus governantes. Essas Constituições foram produzidas de acordo com as mudanças políticas e sociais da época, isso como consequência da carência de estabilidade política.165

Com efeito, as Constituições não corresponderam à realidade que se pretendia regulamentar. Desse modo, não significaram uma efetiva resposta às necessidades de cada momento histórico.166

Na sua vida republicana, o Peru teve 11 Constituições: as de 1823, 1826, 1834, 1839, 1856, 1860, 1867, 1920, 1933, 1979 e a atual Constituição de 1993.

Cada uma delas foi considerada, na época, como revolucionária. No entanto, na maioria das vezes, essas Constituições não estiveram em consonância com a vida política e social da sociedade peruana, o que trouxe como consequência a limitação do seu desenvolvimento.

Com a Constituição de 1979, se criou o Tribunal de Garantias Constitucionais. Assim, também foi estabelecido o controle concentrado de constitucionalidade, a partir da experiência espanhola. Essa função de controle da

165LANDA ARROYO, Cesar.Tribunal Constitución y Estado Democrático, p. 59.

166 BLUME, Ernesto. El Tribunal Constitucional Peruano como supremo interprete de la constitución. In:Revista de la Facultad de Derecho de la Pontificia Universidad Católica del Perú.

n° 50, p. 137.

constitucionalidade foi encarregada ao Tribunal de Garantias Constitucionais. A esse Tribunal foram conferidas duas funções principais: (i) declarar leis inconstitucionais e (ii) emitir decisões de cassação das sentenças denegatórias do Poder Judiciário, sobre processos de habeas corpus e amparo167, de acordo com o estabelecido no artigo 298 da referida Constituição.168

Durante a vigência do Tribunal de Garantias Constitucionais, se tinha a ideia de que os ministros foram porta-vozes autorizados da Constituição, porque não conseguiram construir legitimidade social na opinião pública, enquanto órgão constitucional encarregado de atenuar e controlar os excessos do poder.169

Em janeiro de 1993, instituiu-se o Congresso Constituinte Democrático e, durante seu funcionamento, pode-se dizer que se manteve um sistema constitucional flexível170, onde não houve diferença entre as leis ordinárias e a Constituição, caracterizando-o como um governo sem objetivos constitucionais.171 Da mesma forma se procedeu ao elaborar-se um novo texto constitucional, o qual entrou em vigor em 30 de dezembro de 1993 e é a Constituição atualmente em vigor.

Nesse quadro constitucional flexível, se introduz o Tribunal Constitucional, com o apoio da maioria do Congresso. No entanto, a nova versão do Tribunal Constitucional não foi implementada no governo do Alberto Fujimori até junho de 1996, devido ao zelo do governo na concessão de poderes de controle para outras instituições.172 Note-se que, no começo, se tinha a intenção de limitar o controle da constitucionalidade das leis, pois, para declarar uma lei inconstitucional, eram

167LANDA ARROYO, Cesar.Tribunal Constitución y Estado Democrático,p. 73.

168 “Articulo 298. O Tribunal de Garantias Constitucionais tem jurisdição em todo o território nacional, sendo competente para: Declarar a inconstitucionalidade parcial ou total das leis, decretos legislativos, normas regionais de caráter geral e ordenanças municipais que violentem a Constituição na forma ou no fundo e, conhecer em cassação as resoluções denegatórias de habeas corpuse ação de amparo em sede judicial”.

169LANDA ARROYO, Cesar.Tribunal Constitución y Estado Democrático, p. 74

170 Para aprofundar o tema ver AGUILÓ, Josep. Sobre el Constitucionalismo y la Resistencia Constitucional. In: ALARCÓN CABRERA, Carlos e VIGO, Rodolfo. (Coord.). Interpretación y Argumentación Jurídica: Problemas y Perspectivas actuales, p. 11-36.

171LANDA ARROYO, Cesar.Tribunal Constitución y Estado Democrático,p. 74,75.

172LANDA ARROYO, Cesar.Tribunal Constitución y Estado Democrático,p. 78,79.

necessários seis votos favoráveis dos sete juízes, requisito poucas vezes alcançado.

Frisa-se, que a criação do Tribunal de Garantias Constitucionais, na Constituição de 1979, e o Tribunal Constitucional na Constituição de 1993 surgiram da desconfiança tradicional do Poder Judiciário em geral e, sobretudo, da Corte Suprema. Tal desconfiança foi baseada na observação histórica de que o Poder Judiciário peruano tinha sofrido falta de independência em relação aos outros poderes do governo.173

O mesmo diagnóstico foi repetido na Constituição de 1993, embora a proposta inicial da maioria consistisse em que o controle da constitucionalidade repousasse em uma Sala da Corte Suprema. Afinal, prevaleceu a proposta de que o controle de constitucionalidade devia estar nas mãos de um Tribunal independente do Poder Judiciário. Assim, o professor Fernández Arce, no debate sobre Garantias Constitucionais, diante o Pleno Constituinte, justificou a criação do Tribunal Constitucional.174

Com a criação do Tribunal Constitucional do Peru, o juiz constitucional não é apenas fiel vigilante da aplicação da lei, mas tornou-se o guardião da Constituição. O Tribunal Constitucional, portanto, tem a função de velar pelo estrito cumprimento da Constituição por todos os poderes do Estado e os demais órgãos, é responsável por designar aos poderes e demais órgãos o cumprimento formal e material da Constituição. Nesse sentido, o Tribunal trabalha ativamente no desenvolvimento do Estado, por meio de suas decisões judiciais, que

173LIENDO, Fernando.Los precedentes vinculantes y su incorporación en el ordenamiento jurídico.

Condiciones y perspectivas,p. 84.

174 “Estoy convencido de que tiene que ser un órgano separado del Poder Judicial, porque esto requiere una especialidad y una independencia muy especiales. En segundo lugar, ¿Qué sucedería si este Tribunal fuera parte de la Corte Suprema –una sala Constitucional- y tuviera que revisar en casación resoluciones judiciales? ¿Contaría con la independencia necesaria para poder casar las resoluciones judiciales expedidas por otras salas de la Corte Suprema? Yo, sinceramente, creo que no (…) Efectivamente, en estos casos, creo que una Sala Constitucional que viera estos asuntos difícilmente podía ver con la independencia del caso; casar con dicha independencia resoluciones irregulares de la misma Corte Suprema”. (Debate Constitucional Pleno, [s.d.], p. 191).

interpretam o conteúdo das normas constitucionais e, consequentemente, declaram válida ou inválida uma lei ou decisão judicial.175

Frisa-se que, atualmente, o Tribunal Constitucional é uma peça essencial para qualquer país. Nesse sentido, Cappelletti apresentou a jurisdição constitucional como “a resposta mais importante e mais promissora para um número crescente de nações que tentaram dar solução ao problema da opressão do governo”.176 A partir desta perspectiva, o juiz constitucional torna-se um fiador contra o “inimigo” histórico das liberdades, que é o Estado.

No documento UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ (páginas 67-70)