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CÂMARA JR , J Mattoso Hi-0t e e-0tnut da lZng pont ,

p. 1 6 7 .

93 LLORACH, Emí l io A.

b

o

b

b

8 5

tradição gramatical portuguesa tem chamado de passiva pronom� nal. Não sem contestação, corno veremo� oportunamente.

Voltando ao latim clássico, diríamos, concluindo, que, corno se viu·, tanto a voz ativa corno a passiva podiam ser usa­ das irnpessoalmente com a finalidade de indeterminar o suj ei­ to. Centrando a comunicação no predicado e não no su jeito, o latim clássico preserva e resgata, desse mooto, a gênese esseQ cialmente verbal da própria frase no indo-ellllFopeu. Segundo alguns lingtiistas (Trombetti, Schuchardt, Ma.uthner)9 4, a pre­

sença de u"m agente-suj eito como tema, como ]_lXDmto de partida

.

-

-

da frase verbal representa uma cr1açao pos�erior na genese da

frase. No início era o verbo, isto é, era @ predicado. E o predicado a si mesmo se bastava. Nesse sen�ido, o lingtiista alemão Fritz Mauthner faz curiosa observaçãoi :

O su jeito , que ção primac ial, mais rec ente e tor) h o je deve

-

e u m se c on'Sl:i dera ter s i<!ll.m u ma 95 parvenan. termo e

-

no - 1. nvençao (grif o do Au

O variado numero de processos usados welo latim clássi co para a impessoalização verbal parece dar sustentação e coe

rência à a firmação do lingtiista alemão.

9 4 CA�MARA JR J M ., . atto so.

95 MAUTHNER, F .

Istr� sem falarmos

I '

Leipz ig, 1 9 2 3 , pp. 25 3 . Apu d CÂMARA JJR. , J . Matto so , P�inclpio� d e llng . g e�al , p. 1 80 .

nas chamadas orações sem sujeito com verbos essencialmente im pessoais do tipo: tronat, pluit, ningit, etc.

Antes de passarmos ao latim vulgar, façamos uma sínte­ se do estudado até aqui, numa espécie de resumo didático.

Resumo

Processos de indeterminação do sujeito no latim clássi

co:

r

vb. na 3 � pes. do plural

vb. na 3 � pes. do singular vb.

- ª

ào plural

voz na .l - pes.

ativa vb. na, 2� pes. do singular

pron . indef. (aliguis, quis, nemo ) partic. pres. no dativo

sintética ---> vb. intrans . e trans. indir.

voz na 3� pes. ào sing.

passiva

analítica � partic . passado + esse gerundivo neutro + est

Passaram ao português : na voz ativa , os três primeiros e o quinto (ampliado) ; da voz passiva, nada restou: a sintéti ca desapareceu, e a analítica não se presta à indeterminação do sujeito.

ô

ô

8 7

-

Quanto ao pronome se, nao era usado para indeterminar

o sujeito, embora pudesse se referir a .um sujeito lógico vago e indefinido, não expresso sintaticamente; o chamado se "pro­ nome apassivador" é uma criação românica. O se clássico era apenas pronome reflexivo e sua função sintática, a de acusati vo (obj . direto) .

3. 2 - No Latim Vulgar

3.2.1 - A Racionalizaç�o Analítica 3. 2. 1. 1 - A Passiva Analitica 3. 2.1. 2 - A Medial Analítica

19:) dinâmica

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3. 2 - No Latim Vulgar

3. 2 .1 A Racionalização Analítica

No latim corrente, o povo romano repudiava de forma sistemática o sintetismo da língua clássica . E por duas ra- zões principais : uma certa incapacidade ( ou dificuldade) de abstração, de um lado ; e a busca de clareza, por outro lado. As formas sintéticas em geral pareciam-lhe de frágil contorno · morfofonêmico e morfossintático, algo como que débeis em ter­ mos de im�gem ac6stica, pouco vigorosas , portanto, para trad� zir com a devida intensidade sentimentos, juízos subjetivos e

9 6

mesmo a comunicação em geral. O imediatismo e a espontanef dade próprios da língua oral, a imprevisibilidade da comunica ção direta, coloquial ·e Íntima, não podiam caber nos limites racionais e rígidos do sintetismo clássico. Além disso, ou · por isso mesmo, as formas sintéticas apresentavam aos olhos, e principalmente aos ouvidos, da massa falante um certo herme tismo, o que lhes obliterava a compreensãó imediata por parte das camadas sociais médias e populares do império romano, es­ tes os usuários típicos do chamado latim vulgar (ou latim cor rente, no dizer de Serafim ·da ·Silva Neto ) .

. .

-

Pelas razoes acima citadas , preferia o povo romano lançar mão das construções analíticas, das perífrases nomi- nais e verbais. Essas construções lhe pareciam mais encorpa-

ô

das, mais enfáticas, de vigor fÔnico e morfossintático mais

-

acentuado, prestando-se assim a uma compreensao mais segura e imediata, além de traduzir com mais clareza, no entendimento popular, seus estados de espírito e suas mensagens, principal

mente as mais subj etivas. Esta tendência é, aliás, natural e

espontânea na fala popular, uma espécie de "terapêutica lin- li... . " - - . d d G . 11· . � 9 7 Cf

g istica , na expressao apropria a e i 1eron. . o po� tuguês popular mais grande (por maior) , mais pequeno (por me­ nor), havia chegado ( por chegara) , pobre à beça, pobre pra burro (por paupérrimo) , etc.

Foi, por exemplo, a busca da clareza que decretou a morte da passiva sintét ica. Em seu lugar, reina soberana,

nas línguas românicas, a passiva analítica . Referindo-se a este fato, comenta Meillet:

97

98

C e pres en t pas s if n ' a pas v ecu. L a s eul e forme pas s ive qui ê t ait fr ê quen t e ê t ait

celle de l ' adj ect if en -tilll. s , du t y pe lect us, dict us , amatus , etc. , qu i , de plus , fourni� s ait le perfect um t out en�ier, et qui avait le mérit e d ' ê t re claire : d ictus es t es t un

· pas s if immé diat emen t analys able, clair au

premier abor-d. Et l ' on s ' expl iqu e ainsi qu e ce soit l e seu l type �ui ait su rvecu . . . - 9 8

Apu d VAANANEN , V. Op. cit. , p. 1 2 8. ME I LLET , A. E .6 q u. i.6 .6 e. , p • 2 5 9 •

ô

ô

ô

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Idêntica informação nos é fornecida por H . F. Muller :

The cause of the rapid exttension, by analogy of the analy t ica l constru� tion to the whole p assive sys tem , is a p pare�tly the general tendency to use auxiliari�s instead of

inflexions or desinences, which characteri

zes the transforma tion of La tin into Romance . 99

Essa busca da clareza por parte do pGVO romano levou certo autor, de cujo nome nao nos recordamos, a classificar o latim clássico de egoísta, devido ao fato de sua mensagem es­ tar centrada muito mais no emissor do que n� receptor . Em oposição, o latim vulgar é classificado de altruísta, já que neste a comunicação está muito ·mais voltada para a compreen­ sao por parte do receptor do que propriamente para o emissor

. da mensagem . Daí o analitismo dominante em todo o sistema

gramatical do latim vulgar . Esse analitismn representa um

dos aspectos mais importantes da busca de -c.ilareza a que se re fere Meillet.

me se.

tim .

Mas voltemos ao nosso ponto, . que é .a questão do prono­ Para tanto, retomemos o exame da vo� verbal em la-

99 MULLER,. H. F . "The p assive voice 1n vul0a r la tiu", 1 Il Th e �omanlQ �evlew , vol . XV, p . 85.

a

3. 2.1. 1 - A Passiva Analítica

Na língua portuguesa, o pronome reflexivo se chamou a si as duas funções de complemento objetivo : _a de objeto dire­ to , que já exercia no latim clássico, e a de objeto indireto. Em ambas as funções, em . português, o pronome reflexivo se co­ loca sempre em posição átona em relação ao verbo. Ao nosso si ficou reservada a função sintática de objeto indireto e de complemento nominal, já exercida em iatim pelo dativo sibi. Em oposição ao se, o nosso si é usado sempre em posição tôni ca, uma vez que seu emprego agora se apresenta regido de pre- posição. Ambos, tanto o se como o si, conservam o mesmo va-

f . d . 1 . d d 1 . "li - • 10 o

lor re lexivo ou me ia trazi o o atim ciassico.

Como foi então o reflexivo se adquirir as atribuições sintáticas que tem hoje em português? A saber, as de parte integrante do verbo, partícula de realce, símbolo de indeter­ minação do sujeito e pronome apassivador. Vamos tentar res­ ponder a essa indagação retomando as nossas considerações a respeito da voz passiva latina.

Já vimos anteriormente que os valores medial e passivo faziam parte da passiva sintética clássica� por isso mesmo chamada de médio-passiva. Nesse sentido, esclarece Vaananen:

1 0 0 O d a t i v o s i b i d eu � p o r a na 1 o g i a com IJD.1 (

<

mi h i ) . A f o r -

ma arcaica átona si deu �, o que explic a o seu emprego como obj eto indiret o. Em posição tôni�a, si permaneceu inalt erado, mant endo a sua fisionomia original, analógica

9 3

En latí n , la vo z llamada p asiva e s e n reali dad me dio -pasiva, ya que s irve para expre ­ sar al mismo tie mpo la pas iva pro piame n te dicha y la me dia : c ingor signific a " so y c e nido " y "me c in o " , mo ve or, " so y mo vido " y "me muevo ".1

º

1

Vimos também que a passiva sintética em -r duas características marcantes:

possuia a) a possibilidade de emprego impessoal sempre que ne­

cess�rio ou conveniente;

b) e esse valor médio-passivo a que se refere Vaananen. O emprego impessoal implica a mensagem centrada no ver bo , isto é, unicamente no predicado . O exemplo típico é o

conhecido sic i tur ad astra (VergÍlio) , se·ndo i tur equivalen- te ao português vai-se, com suj eito indeterminado. Chamamos

a atenção para o sentido ativo dessa construção impessoal re-

presentada pela forma sintética do .verbo. Forma passiva, mas sentido ativo sempre que essa médio-passiva tinha por finali- dade indeterminar o suj eito. Comparando o latim itur com o português vai-se, ambas as orações _sem su}eito gramatical, no dizer de Said Ali, conclui este filólogo:

1 0 1 . . . . .. VAANANEN , V . 1 0 2 SA ID ALI, M .

A mesma aus�nci a no exempl p latino : o verbo, na f orma mi dio- passiva , tem o mesmo sentido

. ( d " l . - . ) 1 0 2 ativo me ia sintetico .

Op. cit. , p. 2 05.

É compreensível , se levarmos em conta que a ' reflexiva ou média tem, na origem, um. sentido ativo e que esse valor ativo será retomado pela medial analítica, uma perífrase ver­ bo-pronominal reflexiva revalorizada pelo latim vulgar para substituir a medial sintética da lingua clássica. Dai a equ� valência em português, para a qual Said Ali chama a atenção: medial sintética (vivitur, itur) = medial .analítica (vive-se, vai-se) ,. onde se conserva o mesmo sentido ativo e impessoal

do original latino.

Quanto ao uso médio-passivo propriamente dito, este im ' plica a existência de um sujeito interessado e integrado na

ação verbal, tema ou ponto de partida e, ao mesmo tempo, pon- to de chegada do processo verbal. Como mostra o exemplo de Vaananen , moveor, que tanto pode ser interpretado como sou movido (passiva) como me movo (medial) .

Acontece que no latim vulgar os limiTes sutis entre o valor medial e o valor passivo se romperam com o desapareci-

mento da forma sintética. A língua popular realoca então

formalmente, e a seu modo, aqueles dois vaJLores antes concen­ trados simultaneamente na antiga passiva .sintética em -r. Mas como isso foi feito? Said Ali nos ensina como:

1. o3 SAID AL I , M.

( . . . ) esta dupla função [a medial e a pass� va] desdobrou- se nas lÍ�g� as ro�ânicas: de um lado, pelo uso do verbo seguido do pron� me reflexivo; do outro, pelo verbo ser mais

. ... . - . 1 0 3

o participio do preteri�@.

ô

9 5

Em outras palavras, para ambos os valores ( o medial e o passivo ) uma solução analítica, ou melhor, uma racionaliza­ çao analítica.

Para expressar a passiva propriamente dita, o latim vulgar recorreu �s formas do perfectum, revalorizando-as e generalizando o seu emprego a todos os tempos verbais. Já analisamos esse recurso em outra parte deste trabalho. Tra­ ta-se da passiva românica típica e geral: amatus sum (sou amado, e não mais fui amado no sentido clássico ) , amatus es (és amado ), amatus est (� amado ) , etc. Nada a acrescentar ao

que já dissemos. E além disso, não é esta que está a nos cau sar problemas. Deixemo-la em paz e vamos tratar agora- da ou­ tra face da moeda: o valor médio.

3.2.1 .2 - A Medial Analítica

Para expressar o valor médio o latim vulgar revalori­ zou e ampliou o uso da medial analítica já empregada no latim

clássico. E como era essa nova medial? Era, na verdade, uma perífrase verbo-pronominal, uma construção reflexiva, que pa�. sou assim a sucedâneo analítico, de acordo com a Índole do la

tim vulgar, da construção sintética clássica. Agora, em vez

-

de moveor, o que se tem e me moveo. A vocatur sucede se . vocat. Essa construção reflexiva com valor medial dinâmico nao era estranha ao latim clássico, que a empregava até mesmo com sujeitos inanimados. O que o latim vulgar fez foi ampli- ar e aprofundar o seu emprego. Há dois exemplos representati vos dessa medial dinâmica no latim clássico, um de. Plínio, ou

. ô

tro de VergÍlio.

Myrina quae Sebastopolim se vocat. nio , Nat. > 5. 12 1) 1 0 4

Clamor se tollit in auras. I I ,

4 s s0

° 5

( verg .

( P l Í -

Aen . ,

A tradição filológica românica vê em se vocat e se tollit sinônimos de vocatur e tollitQr, respectivamente. En­ tendem alguns romanistas que essas. construções reflexivas es­ tão sendo usadas para expressar o lado passivo das formas mé- dia-passivas vocatur e tollitur. Não pensamos assim e oport�

namente apresentaremos nossos argumentos. Por ora, reitere-

mos o seguinte: a medial analítica j� existia no latim cl�ssi co, usada até mesmo com sujeitos inanimados ( embora este uso fosse menos freqüente ) ; o latici vulgar revalorizou e ampliou o emprego dessa medial analítica.como alternativa � extinta

medial sintética.

Ali:

A esse respeito, vejamos o que diz Said

O que h ouve port anto foi simpl esment e ist o : ao l ado do medial sint ét ico exist iu desde t empos imemoriais o media l anal í t ico , e es­ t e � l ong e de ext ing uir-se, perdurou sem so­ l ução de cont inuidade, atravessando o l a t im

104 Apud VAANANEN, V. 105 Apud BOURC I E Z, E.

Op. cit . , p . 205.

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