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I. O futuro desinformado: aprendendo a lutar guerras inexistentes

I.1. c RAND Corporation: a escola da guerra futura

Os institutos estadunidenses de consultoria, os think tanks, foram um instrumento importante para o planejamento militar nos anos pós-guerra. O fato de serem financiados pelas forças armadas comprova esse papel. Relações contratuais entre pesquisadores e órgãos militares eram rotina para a OSRD durante a guerra e vários elos foram estabelecidos com laboratórios de universidades, inclusive com a finalidade de usar a OR. Os resultados dessas contribuições impressionaram o alto comando da Força Aérea dos EUA.39

Um dos generais da Força Aérea, Henry Harley Arnold, acreditava, ao fim da II Guerra, que uma próxima guerra seria decidida pelos cientistas, pois em um mundo já consideravelmente encolhido pela tecnologia, a escala de guerra no final do século XX seria possivelmente global, na velocidade supersônica e com um poder destrutivo mil vezes maior do que antes. Para isso, ele buscou uma maneira para que o financiamento da pesquisa militar não se perdesse, o que levaria os cientistas de volta às universidades e à indústria privada. Em paralelo a isso, alguns cientistas ligados à OR e à pesquisa e desenvolvimento durante a guerra também tinham interesse em manter a parceria com os militares.40

Em um encontro na Califórnia, em outubro de 1945, membros da Força Aérea e líderes de indústrias idealizaram uma organização que forneceria análises científicas independentes, principalmente em áreas comuns ao planejamento, à política e à tecnologia militar. A maneira encontrada para melhor alocar os cientistas dentro desse enfoque foi ligar o projeto a uma empresa fora de Washington D.C., afastando-os assim dos órgãos existentes de serviço civil. Também foi necessário arranjar outro nicho que não o universitário, que na avaliação dos participantes da reunião, não se interessaria por essa aliança entre ciência e interesses privados e militares. A empresa escolhida – e que aceitou a incumbência – foi a Douglas Aircraft Company. Teve início, assim, em 02 de Março de 1946, o projeto RAND (acrônimo para Research and Development) com um contrato exclusivo de dez milhões de dólares com a Força Aérea para estudar questões técnicas sobre mísseis e outros dispositivos de alcance intercontinental.41

39 SMITH, J.A., 1991, p. 115; FORTUN, M. and SCHWEBER, S. S., 1993, p. 610-611 40 SMITH, J.A., 1991, p. 114.

41 SHRADER, C., 2006, p. 69; SMITH, J.A., 1991, p. 117; DICKSON, Paul. Think tanks. New York:

Atheneum, 1971, p. 24; RICH, Andrew. Think tanks, public policy and the politics of expertise. Cambridge: Cambridge University Press, 2004, p.42; STEVENSON, Jonathan. Thinking beyond the unthinkable: harnessing doom from the Cold War to the War on Terror. New Yotk: Viking Pinguin, 2008, p. 35-36.

Em 1947, o projeto RAND ganhou sede própria, com escritórios em Santa Monica, Califórnia e, nos anos iniciais de 1948, o staff do projeto já superava duzentas pessoas. Em Maio de 1948, o RAND se tornou uma corporação independente e sem fins lucrativos. Isso ocorreu, primeiramente, devido a conflitos de interesse, já que concorrentes da Douglas Company viam como uma vantagem o contrato exclusivo que ela tinha, via projeto RAND, com a Força Aérea. Por outro lado, esse contrato também parecia nocivo à Douglas, pois impedia que ela firmasse contrato com outros órgãos governamentais.42

Já como uma corporação, em julho de 1948, a RAND obteve um empréstimo de um milhão de dólares da Ford Foundation e, em Novembro, dispunha de um quadro de cerca de trezentos empregados. A RAND manteve o contrato com a Força Aérea, o qual ainda estava influenciado pela mentalidade da OR, uma vez que pretendia que estudos e pesquisas científicas deveriam ser realizados abordando amplamente a guerra aérea e visando recomendar melhores métodos, técnicas e instrumentalidades.43

A RAND e sua forma de trabalho tinham uma abordagem científica que incomodara alguns cientistas já durante a guerra. A questão levantada por essas consultorias militares, iniciada pelos grupos de OR durante guerra, era acerca do estatuto de ciência e sua prática após a guerra. Além das lições aprendidas com a OR, os cientistas e policy makers estadunidenses aprenderam com a OSRD e com o Projeto Manhattan que a defesa nacional dependia de ciência pura, assim como de pesquisas voltadas à tecnologia de segurança nacional, ou seja, de ciência aplicada. Nesse sentido, e seguindo o modelo da OSRD, houve a intenção tanto de continuar com a pesquisa em laboratórios de governo, quanto em laboratórios civis, ou seja, de universidades e indústrias.44

Alguns cientistas da OSRD defendiam também que suas pesquisas deveriam continuar independentes do controle militar. Em favor disso, Vannevar Bush, o líder da OSRD, tinha como argumento que os planejadores militares só saberiam como explorar as novas armas se os cientistas que prestavam serviço a eles estivessem familiarizados com o que ocorria nos laboratórios. Por outro lado, esses cientistas precisavam entender também que tipo de armas precisavam ser desenvolvidas, o que passava por ter acesso às necessidades estratégicas dos militares. Essa tentativa de Bush de se manter o máximo possível afastado dos programas de OR – apesar de ela ter chegado às forças armadas estadunidenses por meio da OSRD e de

42 SHRADER, C., 2006, p. 59-60; SMITH, J.A., 1991, p. 115.

43 MCGANN, J.G., 1992., p. 735; GHAMARI-TABRIZI, S., 2005. p. 51-52; SHRADER, C., 2006, p. 60;

DICKSON, P., 1971, p. 24.

Bush – estava assentada em um ideal puro de ciência que defendia que os cientistas mantivessem ou recuperassem, ao fim da guerra, os seus trabalhos no setor civil.45

Todavia, alguns cientistas tinham desenvolvido uma predileção e uma necessidade pelos grandes projetos científicos e não viam problema no financiamento governamental. Porém, o fim da OSRD findara o intermediário civil entre ciência acadêmica e setor militar. Conforme Farnerud, isso engendrou dois tipos gerais de trabalhos que os físicos e cientistas prestavam para a defesa: de dispositivos e de estratégia. O primeiro era produzido em laboratórios e tratava de equipamentos e dispositivos militares, e, o segundo, era o conjunto de produtos da RAND Corporation, por exemplo.46

A RAND foi uma continuidade da OSRD ao trabalhar com research and development (ou R and D). R&D não era um termo genérico, mas tinha um significado próprio, dado pela

National Science Foundation. Conforme essa definição, ela congregaria três atividades.

Primeiramente, seria a pesquisa básica, ou a pesquisa não dirigida. Era a busca pelo conhecimento sem objetivos exteriores. Era o que alguns cientistas, como Bush e outros47, por exemplo, defendiam como a prática científica ideal. Outra atividade dentro da alcunha de R&D era a pesquisa aplicada, ou seja, a pesquisa voltada para um fim declarado. Por exemplo, a cura de uma doença ou um tipo de bomba mais adequada para destruir concreto. A última atividade era a de desenvolvimento. Ela consistia no uso sistemático das duas formas anteriores de pesquisa para criar e produzir dispositivos concretos. Era o desenvolvimento e a experimentação de um produto ou um processo, apesar de não ser sua produção. Portanto, a RAND Corporation era designada para atender esses três setores ao prestar serviço para as forças armadas.48

Para atender a essas finalidades, a RAND seguiu a tendência de empregar cientistas, os quais ganharam o papel de delineadores das bases para a decisão, por meio da OR. A RAND, em seus primeiros anos, desenvolveu trabalhos sobre motores para foguetes, sobre propulsão nuclear, sobre teoria dos jogos aplicada à guerra, sobre fadiga de materiais, entre outros. Foi devido a um dos primeiros estudos da RAND que a Força Aérea adotou o

45 AASERUD, Finn. Sputnik and the “Princeton Three”: The National Security Laboratory. Historical Studies in the Physical and Biological Sciences, Vol. 25, No. 2 (1995),pp 185-239, p. 186; SHRADER, C., 2006, p.

16-18; KEVLES, D., 1990, p. 240.

46 AASERUD, F., 1995, p. 186-187.

47 Outro exemplo dessa questão das diferentes visões de ciência no pós-guerra e as disputas de espaços

institucionais é a biografia de Merle Tuve. Cf. WANG, Jessica. Physics, Emotion and Scientific Self: Merle Tuve‟s Cold War. Historical Studies in the Natural Sciences. Vol. 42, N.5 (November 2012), pp. 341-388.

reabastecimento em voo para aviões militares. Ela também incentivou a criação de uma nova indústria metalúrgica, ao demonstrar a utilidade do titânio para voos espaciais.49

Um elemento que foi potencializado pela RAND, e que estava relacionado à tentativa de realizar a análise científica ampla das questões da Força Aérea, foi contratar economistas, cientistas políticos, psicólogos e cientistas sociais para trabalharem junto aos cientistas das ciências duras, principalmente físicos teóricos. Prognosticar a guerra aérea futura e os sistemas de armas alternativos passou a ter uma perspectiva mais teórica, política, sociológica e econômica. A RAND também atraiu pesquisadores jovens devido a uma série de fatores: primeiramente, pela liberdade que a RAND dava ao modo de trabalho; a RAND também oferecia recursos, bons pagamentos e benefícios, os quais poderiam ser complementados com aulas e consultorias; sua sede era próxima ao mar e muitos pesquisadores aproveitavam para descansar ou relaxar nas areias da Califórnia; emulava uma instituição acadêmica, porém, sem estudantes e sem encontros de professores; e disponibilizava o trabalho com equipes interdisciplinares e em diferentes níveis da pesquisa. Todavia, a pesquisa era delimitada pelas necessidades da Força Aérea e, por isso, havia uma grande pressão sobre os pesquisadores. Isso a tornava também atraente para a Força Aérea, uma vez que era mais conveniente e administrável em relação às informações sigilosas e de segurança do que um centro em uma universidade.50

Arriscamos, aqui, cogitar que essa diferença conflituosa de enfoque sobre a ciência que cercava a RAND significou um conflito de gerações. De um lado, a visão de cientistas como Bush, e contemporâneos a ele, que tiveram sua formação completa nos anos 10, 20 ou 30 do século XX, ou seja, ainda sob uma influência vitoriana e de concepção de uma ciência “pura”. De outro lado, a visão de cientistas jovens, formados durante ou após a II Guerra, de uma ciência mais utilitarista e voltada a finalidades práticas. Essa questão pode ser posta também nos termos de uma visão de antes e uma de após a guerra, de gerações nascidas em épocas diferentes. Não é de estranhar que a maioria dos cientistas contratados pela RAND não eram experts consolidados, sendo que a média de idade do staff, por exemplo, era, nos primeiros dez anos do projeto-corporação, de vinte e sete anos.51

Um dos jovens cientistas empregados pelo projeto RAND na Douglas Company era Sam Cohen – o amigo que ingressara no Exército junto com Kahn. Foi Cohen que indicou Kahn para a RAND. Kahn foi contratado, em 1947 – mesmo ano em que obteve o mestrado

49 DICKSON, P., 1971, p. 24; FORTUN, M. and SCHWEBER, S. S., 1993, p. 628-629.

50 DICKSON, P., 1971, p. 24-25; BRUCE-BRIGGS, B., 2000, p. 15-16; GHAMARI-TABRIZI, S., 2005, p. 51-

52, 54; SHRADER, C., 2006, p. 60; STEVENSON, J., 2008, p. 38 e Cf. Capítulo 2.

em Física pelo California Institute of Technology (CALTECH) – como um computer, ou seja, alguém que fazia os cálculos. Kahn, nesse período, publicou relatórios bastante técnicos e específicos, como, por exemplo, sobre atividades de partículas elementares e sobre a penetração de raios gamas em barreiras de proteção. Decorrente disso, dedicou-se ao método probabilístico chamado Monte Carlo. A grande contribuição de Kahn com o Monte Carlo foi desenvolver atalhos para os cálculos, principalmente ao usar um computador. Kahn participou de conferências e seminários sobre o tema. Isso, aliado com outros fatores – como o afastamento de outros grandes cientistas do tema – fizeram com que ele se tornasse uma autoridade no método. Kahn se dedicou ao método até 1952, quando deixou de ser seu principal interesse.52

Devido aos seus trabalhos sobre o Monte Carlo, Kahn participou dos projetos de elaboração de um motor nuclear para aviões, que foi superado pelo reabastecimento durante o voo. Kahn também esteve envolvido nos projetos da bomba-H. Por conta desses trabalhos com física, Kahn tentou o Ph.D. na área, porém, não obteve sucesso, principalmente por sua pesquisa ser financiada comercialmente e por ter dificuldades em se organizar para escrever textos. Após isso, também encontrou forte concorrência dentro da área de energia atômica da RAND e, então, afastou-se desse tema, em 1954, quanto tinha trinta e dois anos. Kahn, ao deixar as questões de física de lado, aproximou-se do setor de estudos de economia da RAND, onde foi bem recebido e reconhecido.53

Kahn nesse período também se tornou consultor dos estudos de Albert Wohlstetter. Wohlstetter, nascido em 1913 – ou seja, nove anos mais velho que Kahn – era estudante de filosofia, com formação em lógica matemática. Ingressara na RAND nos anos inicias do projeto e foi um dos pioneiros no uso da game theory na estratégia nuclear e na política de defesa. O sucesso de Wohlstetter na corporação veio com seus estudos sobre a defesa do país, nos quais propunha a ênfase na defesa dos elementos utilizados em bombardeio e o uso de bases em outros países – principalmente europeus – para reabastecimento de aviões. O sucesso das análises de Wohlstetter se deu, basicamente, por duas razões.54

Primeiramente, sua proposta acompanhava um projeto maior da política estadunidense, que envolvia as relações internacionais, a defesa e, destarte, uma concepção mais ampla de segurança nacional. A defesa e o bem estar dos cidadãos do país estavam ligadas ao planejamento militar amplo e não se restringia mais ao território dos EUA, mas

52 BRUCE-BRIGGS, B., 2000, p. 13, 16-18; GHAMARI-TABRIZI, S., 2005, p. 63, 132-133. 53 BRUCE-BRIGGS, B., 2000, p. 18-33; GHAMARI-TABRIZI, S., 2005, p. 65-66.

54 SMITH, J.A., 1991, p. 119-121; BRUCE-BRIGGS, B., 2000, p. 34-35; GHAMARI-TABRIZI, S., 2005, p. 67-

abarcava uma rede mundial composta de bases navais e aéreas. Uma meta para a segurança nacional era, agora, evitar o controle preponderante de outros Estados ou povos hostis sobre recursos, territórios e populações. Essa foi uma lição aprendida pela a segurança nacional dos EUA com a II Guerra: a importância da manutenção de um equilíbrio de poder favorável, principalmente na Eurásia. Nesse sentido, se o monopólio da bomba atômica foi uma das prioridades nos governos Roosevelt e Truman, estavam juntos dela a manutenção das forças naval e a área, a presença militar no Pacífico, o domínio sobre o ocidente e a atuação nos países derrotados. Estudos com temáticas internacionais envolvendo política, economia e questões militares ganharam destaque na RAND e eram abrangidos pelos Articles of Incorporation da corporação, que apresentava como os objetivos da corporação, além dos científicos, os educacionais e voltados ao bem-estar social e à política. Nesse sentido, a RAND produziu estudos sobre o potencial militar e econômico da URSS e sobre o sudeste da Ásia, por exemplo.55

Outro fator decisivo para o sucesso da proposta de Wohlstetter nos meios militares foi o modo que o estudo foi desenvolvido: uma análise profunda e detalhista, que parecia ter abarcado todos os pontos da questão. Nesse sentido, ele ajudou a revelar algumas fraquezas que poderiam surgir na defesa americana, urgindo ainda mais a questão frente aos testes nucleares russos em 1949. O estudo focava na questão dos ataques surpresa, constantemente comparado a Pearl Harbor. Pearl Harbor aparece como uma referência corrente, não só em Wohlstetter, como também em Kahn, não apenas pela lição histórica, mas também pelo conhecimento próximo, tanto no tempo, quanto no espaço: a esposa de Wohlstetter, Roberta, lançaria, em 1962, uma das obras de história militar que seria referência sobre o assunto,

Pearl Harbor: warning and decision.56

O impacto do trabalho da equipe de Wohlstetter foi imenso. A RAND adotou as recomendações do estudo que mudaram a forma de pensar a estratégia de defesa dos EUA. Antes, os EUA buscavam ter a capacidade do primeiro ataque e, com isso, deter o inimigo por conta do medo desse assalto inicial. O estudo de Wohlstetter, em contrapartida, propôs o conceito de capacidade do segundo ataque, ou seja, sobreviver a um primeiro ataque do inimigo de forma que se consiga puní-lo, em seguida, pelo primeiro assalto. O que importava,

55 MCGANN, J.G., 1992, p. 735; MCMAHON, Robert J., 2003, p. 7-8; GHAMARI-TABRIZI, S., 2005, p. 50-

51; BAS, E. 2002, p. 17-19; DICKSON, P., 1971, p. 66-69; RICH, A., 2004, p. 42; FORTUN, M. and SCHWEBER, S. S., 1993, p. 610-612, 628-629.

agora, era a força que se teria após ser atacado. Essa ideia se tornou o motif da deterrence e da defesa dos EUA e representou uma revisão da postura militar dos EUA.57

Essa revisão, conforme explicada por Kahn e Mann, estava associada com os institutos de consultoria e de pesquisa e desenvolvimento como a RAND. Isso fica claro com uma analogia desenvolvida por Kahn e Mann no relatório Games Theory. Conforme eles: há sua casa e sua família. Na casa, há um porão bem protegido, feito de concreto, onde um membro de sua família fica. Ele está lá porque tem a função de apertar um botão que explodirá a casa do vizinho caso isso seja necessário. Seu vizinho também está na mesma situação. Não se sabe se o porão tem a capacidade de proteger toda a família. Mesmo que ele tenha, não se pode garantir ou obrigar que as pessoas vivam nele o dia inteiro, todos os dias. Portanto, é preciso existir algum tipo de aviso para alertar e salvar a família. Frente às incertezas se a casa e o porão resistirão à explosão, ou se a explosão de fato ocorrerá, você e o vizinho tentarão aumentar a força de suas dinamites e fortalecer seus porões. Isso levaria, então, à necessidade de pesquisa e desenvolvimento, que buscaria melhorar as dinamites e a defesa do porão. Essa possibilidade de melhoramento das bombas e da defesa criaria, por fim, a necessidade de pesquisa sobre as possibilidades do que se alcançar e sobre a natureza dos processos de decisão.58

As instituições como a RAND teriam esse papel de desenvolver pesquisas e promover e incentivar desenvolvimentos, de forma a aconselhar os policy makers. É possível entender isso conforme a defesa que Kahn fez, no OTW, da importância de controlar o destino, que consistia em seguir os eventos com inteligência e cuidado. Essa prudência era justificada por ele, pois, uma vez que há várias armas poderosas (como as dinamites da analogia), os problemas e as escolhas reais possivelmente envolveriam acidentes, erros de cálculo, chantagem, uso indevido de armas. Portanto, para Kahn, todos esses problemas deveriam ser analisados. O papel dos EUA, nesse contexto, era proposto, inicialmente, pela opção de um curso de ação – entre vários possíveis – resoluto e com esperança, preparando-se para a possibilidade de se fazer a escolha errada ou de que eventos pudessem se desdobrar em um caminho inexorável, apesar das escolhas.59

57 DICKSON, P., 1971, p. 56-57; BRUCE-BRIGGS, B., 2000, p. 40-41. Grande parte da análise que Kahn faz

sobre Pearl Harbor fala é a partir do livro da Roberta Wohlstetter, como o próprio Kahn assume. Cf. KAHN, H., 1969, p. 411.

58 KAHN, H. e MANN, I. Game theory, 1957, p. 58-5963-64.

59 KAHN, H., On thermonuclear war, 1969, p. 252; KAHN, H. On thermonuclear war. New

Brunswick/London:Transactions, 2007, p. xv. Essa e as três próximas notas se referem ao prefácio de 1960 do OTW.

Para Kahn, escolher um curso de ação e uma postura de defesa era um problema doloroso, pois a escolha era feita sem se conhecer o resultado final. É, portanto, um problema de incerteza sobre o futuro, já que uma escolha benevolente, pensada e inteligente poderia ter resultados desastrosos. Sendo assim, a RAND e seus funcionários tinham que pensar como lidar com esse futuro incerto. Kahn foi um dos que lidou com essa questão.60