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Gato macho castrado, SRD, pelagem escura, pesando 2,900 kg, com 2 anos de idade foi atendido em janeiro de 2017 pelo Setor de Medicina Veterinária Felina (MEDFEL) do HCV-UFRGS. Relato da tutora de má cicatrização e aumento da lesão no olho esquerdo do animal após ser submetido a cirurgia de remoção tumoral após dois meses. No exame físico, constatou-se um nódulo firme, arredondado de aproximadamente 5 cm de diâmetro com aspecto irregular (Figura 16). Foi coletada amostra para exame histopatológico, o qual foi diagnosticado sarcóide. Exames complementares foram realizados para exclusão metastática, resultando negativo. O paciente foi submetido à exérese tumoral, enucleação do globo ocular esquerdo e cirurgia reconstrutiva com retalho de avanço (Figura 17). Em revisão observou-se que parte do tecido estava necrosado. O felino foi, então, submetido a um segundo procedimento reconstrutivo (Figura 18), desta vez usando a técnica do retalho de rotação (Figura 19). Foram realizadas consultas de revisão as quais o paciente estava com excelente recuperação e

cicatrização. No último contato com a tutora, a informação é de que a ferida cirúrgica está totalmente cicatrizada e repilada (Figura 20).

Figura 16 – Massa tumoral por sarcóide recobrindo grande área da face de felino em procedimento pré-cirúrgico.

Fonte: Cristiano Gomes, (2017).

Figura 17 – Retalho de avanço em felino com extensa neoplasia na face.

Fonte: Cristiano Gomes, (2017).

Figura 18 – Remoção da necrose e de parte do retalho de avanço da primeira cirurgia reconstrutiva.

Fonte: Cristiano Gomes, (2017).

Figura 19 – Reintervenção cirúrgica em felino com retalho de padrão subdérmico de rotação.

Fonte: Cristiano Gomes, (2017).

Figura 20 – Felino com face totalmente repilada após cirurgia reconstrutiva de exérese tumoral.

Fonte: Tutor, (2017).

4 DISCUSSÃO

O predomínio das neoplasias é decorrente de múltiplos fatores, dentre eles, a idade.

Normalmente os idosos são os mais acometidos por tumores, cerca de 45%, média entre 6 a 10 anos de idade (DALECK; NARDI, 2016). No presente estudo, os animais se enquadram na média de 10 anos, com exceção do caso de número 5 em que apresentou sarcóide, uma neoplasia rara de etiologia desconhecida (HANNA; DUNN,2003). No felino idoso, a diminuição da síntese de elastina acaba reduzindo a elasticidade da pele, deixando-a delgada, sujeita, assim, a levar mais tempo para cicatrizar ferimentos e lesões. (THE SPECIAL..., 2016; KRUSE et al., 2010). A relevância desse fator para as cirurgias reconstrutivas é fundamental para o planejamento pré-cirúrgico e análise do processo cicatricial do retalho. Conforme relatado o caso de número 1, a paciente com relativa senilidade teve uma recuperação pós cirúrgica mais delicada e um curto período de sobrevida.

A amostragem foi aleatória não tendo predileção por gênero, assim como nas pesquisas, tanto as neoplasias, quanto as reconstruções de face não apresentaram diferenças em relação a sexo (ALMEIDA, 2005). Os casos foram relatados em ordem decrescente da casuística tumoral, iniciando pelo carcinoma de células escamosas e finalizando com sarcóide, neoplasia de ocorrência mais rara.

Foram coletados somente dados da espécie felina sem raça definida. Nesse trabalho, como nos pesquisados, não obteve alterações condizentes com a raça, porém a cor da pelagem mostrou-se muito influente nos animas avaliados. Regiões despigmentadas sem ou com pouca cobertura pilosa, como o plano nasal, os lábios, o pavilhão auricular, as têmporas e as pálpebras dos felinos, são as mais predispostas ao aparecimento do carcinoma de células escamosas, principal neoplasia de face em felinos (DALECK; NARDI, 2016 e CUNHA, 2017). Entre os casos deste estudo, as áreas de pelagem clara equivaleram a 80% de prevalência neoplásica. A respeito aos procedimentos cirúrgicos a raça e a tonalidade da pelagem são irrelevantes.

A localização e a extensão do tumor podem fornecer informações determinantes para o grau de invasividade do tumor (MÜLLER et al., 2009). As regiões de pesquisa foram a face e o pescoço, tendo mais ênfase nos anexos como, olhos, lábios e orelhas. Não foi possível precisar as dimensões de todas as lesões tumorais dos animais acometidos devido alguns serem disformes e ulcerados.

Nos felinos acometidos pelas neoplasias, o tratamento de eleição é a ressecção cirúrgica do tecido lesionado. A ablação completa da neoplasia exige a remoção conjunta de 1 a 2 cm de

margem de segurança o que amplia as possibilidades de remissão (DAL-BÓ et al., 2013;

CUNHA, 2017). Todavia, os felinos são pouco dotados de sobras de pele na região da face, diferentemente da maioria dos caninos, exigindo técnicas e habilidades cirúrgicas precisas (PAVLETIC, 2018). As modalidades reconstrutivas mais empregadas nos pacientes pós exérese neoplásica foram os retalhos de avanço, rotação e transposição, sequência do mais para o menos utilizado respectivamente. Os pedículos permitem a cobertura imediata de uma ferida, evitando um processo regenerativo excessivo e à cicatrização por segunda intenção (FOSSUM, 2015). Nos casos em que são necessárias a enucleação e a blefaroplastia à cirurgia reconstrutiva por meio dos retalhos, provê o fechamento da falha (CUNHA, 2017).

Complicações nas cirurgias reconstrutivas são semelhantes às que ocorrem em cirurgias gerais de tecidos moles transcorrendo com infecções, hematomas ou seromas, deiscência de pontos e formação de cicatrizes extensas. Em concordância com Fossum (2015), a imunodeficiência viral felina (FIV) é um dos importantes causadores de retardo cicatricial.

Informação condizente com o segundo caso descrito nesse estudo o qual também apresentava um quadro anêmico, fator muito relevante a recuperação tecidual (MENDONÇA; NETTO, 2009). As extremidades sob tensão excessiva podem gerar a formação de edema ou comprometer os tecidos distais ao retalho (KIRPENSTEIJN; HAAR, 2013). A taxa de formação ou maturação de colágeno é mais lenta em felinos, levando isso em consideração, os autores recomendaram deixar as suturas por mais tempo nos gatos (AMSELLEM, 2011). A perfusão diminui 10% e 40% após a elevação inicial de um retalho único e bipediculado, respectivamente. Se houver a reintervenção de um pedículo após a terceira semana de cirurgia, a diminuição do fluxo sanguíneo ficaria até 90% menor que o normal, provavelmente, inviabilizando o tecido. A manipulação gradual da tira doadora ajuda a compensar impactos negativos dos retalhos de rotação e de avanço (HUNT, 2012).

As neoplasias possuem comportamento localmente infiltrativo, porém dispõem de baixo potencial metastático e costumam recidivar após a remoção cirúrgica (MÜLLER et al., 2009). A recuperação pós cirúrgica normalmente é rápida e o tempo médio livre das neoplasias malignas cursam em 27 meses, sendo que tempo médio de sobrevivência após a conchectomia é de 24 meses e 8 meses após a nosectomia (DELISLE; DEVAUCHELLE, 1999; CUNHA, 2017). Embora a maioria das neoplasias felinas não tenham cura, a ressecção da lesão e a consequente minimização dos sinais clínicos são a principal abordagem das cirurgias reconstrutivas. A qualidade de vida é priorizada frente à extensão dela.

O comprometimento pode ser muito difícil de ser avaliado devido a individualidade comportamental do gato, dependendo das percepções do proprietário (BARAL, 2015). Nos casos acima relatados, todos os animais chegaram para a primeira avaliação com estágio avançado de comprometimento neoplásico, dificultando tanto na ressecção cirúrgica com margem de segurança, quanto na recuperação dos pacientes devido às extensas áreas comprometidas.

O tratamento de pacientes com neoplasias cutâneas está apresentado considerável avanço desde as últimas décadas, gerando um impacto no aumento da sobrevida e na diminuição das taxas de metástase e recidiva tumorais (CUNHA,2017). A cirurgia reconstrutiva com os retalhos dérmicos locais são o método mais prático para fechamento de extensas lesões além de proporcionar um bom efeito estético (KRUSE, et al., 2010; FOSSUM, 2015). Todavia, as adversidades são ainda extremamente comuns, o que preconiza a constante melhoria e desenvolvimento, direcionando o tratamento para reduzir os efeitos indesejáveis e aumentar a qualidade de vida do felino oncológico automutilações (VASCONCELLOS et al., 2016). O presente estudo obteve resultados semelhantes aos da literatura com dados de melhora nos sinais clínicos e prolongamento do tempo de vida dos pacientes.

5 CONCLUSÃO

A utilização de retalhos na correção de defeitos após a ressecção tumoral foi eficaz a curto prazo com resultados estéticos satisfatórios. O tratamento é considerado de eleição especialmente para exérese de grandes massas neoplásicas e de perfil curativo. Nos casos relatados, neste presente trabalho, o tratamento teve caráter paliativo, pois todos os pacientes chegaram com alto grau de comprometimento tumoral. Em média os animais obtiveram 12 meses de sobrevida em condições mais favoráveis de qualidade de vida.

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