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Causas da ocorrência de ácaros em soja

3. EFEITO DE AGROTÓXICOS UTILIZADOS EM SOJA SOBRE OS FUNGOS

4.1.2 Causas da ocorrência de ácaros em soja

Nos últimos anos, surtos populacionais de ácaros têm sido observados em diferentes regiões produtoras de soja do Brasil, vários fatores podem estar relacionados a estes eventos, alguns destes fatores são apresentados a seguir.

4.1.2.1 Soja transgênica e manejo de plantas daninhas.

O aumento dos registros de surtos populacionais de ácaros coincidiu com o avanço da área cultivada com soja transgênica tolerante ao glifosato. Isso levantou dúvidas sobre a possibilidade de estas cultivares, ou o manejo fitossanitário associado a elas, estarar favorecendo a ocorrência de ácaros na cultura. Em experimento de campo realizado no RS, foi observado que a soja transgênica tolerante ao glifosato, BRS 245 RR, não afetou significativamente a densidade populacional de ácaros em relação a uma cultivar não-transgênica, BRS 133 (ROGGIA, 2007). No entanto, neste experimento foi observado que a ausência de plantas daninhas favorece a população de ácaros, e que isso independe do emprego de herbicidas. Muitas plantas daninhas servem de abrigo e oferece alimento alternativo para predadores que controlam os ácaros-praga, desta forma a eliminação das plantas daninhas pode estar prejudicando o estabelecimento destes predadores na cultura da soja.

4.1.2.2 Herbicida glifosato

Com o avanço da área cultivada com soja transgênica tolerante ao glifosato, este herbicida passou a ser um dos mais empregados na cultura. Vários estudos demonstram a ação deletéria de algumas formulações comerciais de glifosato a certos fungos patogênicos a ácaros e insetos (COSTA et al., 2004; MORJAN; PEDIGO;

LEWIS, 2002; PEDIGO; LEWIS; MORJAN, 2002; SOSA-GÓMEZ, 2005). Experimentos em laboratório mostram que a ação fungicida dos herbicidas à base de glifosato sobre N. floridana, Nomuraea rileyi (Farlow) Samson, Metarhizium anisopliae (Metchnikoff) e Beauveria bassiana (Balsamo) Vuillemin é atribuída aos componentes inertes da formulação comercial e não ao princípio ativo (MORJAN; PEDIGO; LEWIS, 2002).

Estudos em campo conduzidos no EUA demonstraram que campos cultivados com soja transgênica tiveram populações mais elevadas de ácaros tetraniquídeos do que os com cultivares não-transgênicas e que a taxa de infecção de ácaros por N. floridana, foi menor nas lavouras com soja transgênica (54%) em relações a lavouras não-transgênicas (58%) (PEDIGO; LEWIS; MORJAN, 2002). No Brasil o efeito do emprego de glifosato, e outros manejos de plantas daninhas, foi avaliado em campo sobre a densidade de ácaros, foi observado que as maiores densidades de ácaros ocorreram onde o controle de plantas daninhas foi mais eficiente, tanto nos tratamentos com herbicida como nos com controle manual (ROGGIA, 2007).

4.1.2.3 Inseticidas piretróides.

Em campo, o efeito de piretróides sobre o aumento populacional de ácaros tetraniquídeos foi observado por vários pesquisadores, entre eles Oliveira; Vercesi (1983), Bleicher; Vidal Neto (1993) e Trichilo; Wilson (1993), todos na cultura do algodão. Além disso, Childers; Abou-Setta (1999) observaram que o emprego de piretróide antecipou o pico populacional de Panonychus citri em limoeiro. Trichilo;

Wilson (1993) citaram cinco fatores relacionados à ocorrência de surtos populacionais de tetraniquídeos induzida pela aplicação de piretróides, estes são aqui apresentados acrescidos de referências de estudos que embasam estas hipótese:

a) o efeito deletério de piretróides sobre inimigos naturais, principalmente sobre ácaros predadores (SHANKS; ANTONELLI; CONGDON, 1992; CROSS; BERRIE, 1994;

GROUT; RICHARDS; STEPHEN, 1997; REIS et al., 1998; GOTOH; GOMI, 2000; SATO et al., 2001);

b) o efeito de dosagens sub-letais de piretróides estimulando o incremento populacional de tetraniquídeos devido ao efeito direto do inseticida sobre os ácaros ou indireto sobre a fisiologia da planta (IFTNER; HALL, 1984);

c) o efeito da dispersão causada pelos piretróides que proporciona dispersão e rearranjo da população reduzindo a competição intra-específica e favorecendo o aumento da densidade populacional de ácaros (IFTNER; HALL, 1983);

d) o efeito deletério dos piretróides sobre outros fitófagos, reduzindo a competição interespecífica, favorecendo os ácaros tetraniquídeos (GERSON; COHEN, 1989);

e) a possibilidade de os piretróides alterarem a razão sexual induzindo a um maior número de fêmeas na população que favorece o incremento populacional de ácaros (DITTRICH; STREIBERT; BATHE, 1974). Adicionalmente Oliveira (1998) observou que fêmeas de Oligonychus ilicis (McGregor, 1917) descendentes de indivíduos expostos a piretróide apresentam aumento de aproximadamente 32% na taxa de oviposição.

Trichilo; Wilson (1993) simularam diferentes parâmetros reprodutivos de ácaros tetraniquídeos, como fecundidade, duração do desenvolvimento e sobrevivência, e constataram que com a variação isolada de cada fator não foi possível atingir os níveis populacionais de ácaros observados em campo de algodoeiro com aplicação de piretróide. Estes autores conseguiram reproduzir os níveis populacionais observados em campo apenas quando variaram conjuntamente esses parâmetros. Sendo que o parâmetro que mais influenciou na indução de surtos populacionais foi à sobrevivência, que no modelo proposto representa a ação de inimigos naturais.

Os piretróides também podem afetar fungos entomopatogênicos, como observado por Alzogaray et al. (1998) em estudo que mostra que o inseticida piretróide deltametrina, em dose elevada, prejudicou a germinação e o desenvolvimento de B.

bassiana sobre Triatoma infestans. No entanto, Sosa-Gómez (2005) observou que as menores dosagens de lambda-cialotrina não afetaram significativamente a germinação de conídios do fungo entomopatogênico Metarhizium anisopliae, e Silva; Silva e Heineck (1993) não observaram efeito deletério de permetrina sobre N. rileyi, in vitro.

Apesar disso, pouco se sabe sobre o efeito de piretróides sobre outros fungos entomopatogênicos.

Além dos piretróides, outros inseticidas apresentam ação deletéria sobre ácaros fitoseídeos como clorpirifós (PRISCHMANN et al., 2005), etiona, dimetoato, metidationa, óleo mineral, diazinona (SATO et al., 2001) e imidacloprido (JAMES, 2003). Além disso James; Price (2002) observaram que o inseticida imidacloprido induziu a um aumento de oviposição de 10-26% em fêmea de T. urticae. Em soja o inseticida imidacloprido é indicado, em mistura comercial com um inseticida piretróide, para o controle de percevejos fitófagos e para mosca-banca (EMBRAPA, 2008). No entanto, é importante considerar que as pulverizações com este produto para controle de percevejos são realizadas comumente no final do ciclo da soja, e, nestas condições, o efeito deste produto pode não ser notado sobre a população de ácaros ou sobre a produtividade da cultura.

4.1.2.4 Fungicidas

O aumento do número de casos de surtos de ácaros em soja esteve relacionado ao avanço da ferrugem-asiática-da-soja (Phakopsora pachyrhizi H. Sydow & P. Sydow) e ao maior emprego de fungicidas para o controle desta doença. O efeito deletério de fungicidas sobre N. floridada em ácaros tetraniquídeos foi demonstrado para alguns fungicidas empregados em olericultura, como Captan, Mancozeb, Tolylfluanid, Fenhexamid e Cyprodinil+Fludioxonil (KLINGEN; WESTRUM, 2007; WEKESA; KNAPP;

DELALIBERA JÚNIOR, 2008). No entanto, é importante considerar que os fungicidas empregados em soja são, predominantemente, dos grupos químicos das estrobilurinas e dos triazóis, diferentemente dos empregados em olericultura. Em campo, Koch; Potter e Ragsdale (2010) observaram efeito deletério de alguns fungicidas da soja (triazóis e estrobilurinas) sobre a prevalência do fungo Entomophthorales Pandora neoaphidis (Remaud. & Hennebert) Humber em pulgões, adicionalmente constataram que a aplicação da mistura comercial de estrobilurina+triazol foi mais prejudicial ao fungo do que apenas a estrobilurina.

O efeito de fungicidas sobre ácaros predadores foi amplamente estudado para o contexto da fruticultura, sendo que a maior parte dos produtos empregados não afeta ou afeta pouco a densidade de ácaros predadores (CROSS; BERRIE, 1994; GROUT;

RICHARDS; STEPHEN, 1997; REIS et al., 1998; SATO et al., 2001; YAMAMOTO;

BASSANEZI, 2003). Sendo que, algumas espécies de predadores podem ser mais sensíveis aos fungicidas do que outras (BERNARD; HORNE; HOFFMANN, 2004).

Yamamoto; Bassanezi (2003) classificaram o triazol, tebuconazol, como levemente nocivo a ácaros predadores, enquanto que Sato et al. (2001) observaram redução de 31,53% da densidade de fitoseídeos no tratamento com tebuconazol.