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3. Revisão bibliográfica

3.3. Tumores mamários felinos

3.3.4. Classificação histopatológica

A classificação histopatológica das lesões mamárias felinas (LMF), sugerida pela OMS, baseia- se na diversidade das suas características morfológicas (Misdorp et al., 1999). Presentemente inclui 7 subtipos de lesões não tumorais, 6 subtipos de tumores benignos e 8 subtipos de tumores malignos, mencionados na tabela 2, bem como um grupo de tumores não-classificáveis (Misdorp et al., 1999).

Esta classificação é adotada em todo o mundo e é razoavelmente reprodutível. Contudo, apresenta a grande desvantagem de classificar no mesmo subtipo tumores com perfis biológicos e clínicos muito distintos, pelo que tem implicações prognósticas e preditivas mínimas, revelando a este nível uma utilidade médica bastante modesta (Misdorp et al., 1999; Preziosi, Sarli, Benazzi, Mandrioli & Marcato, 2002; Viale, 2012). Tal desvantagem relaciona-se com o facto de analisar apenas as alterações estruturais dos tecidos mamários e não as causas de tais alterações (relacionadas com o prognóstico), sendo que inúmeras neoplasias mamárias com etiologia diferente podem ter uma apresentação clínica e histológica semelhante, e as neoplasias

Hiperplasias/Displasias mamárias Tumores benignos Tumores malignos

Hiperplasia ductal Adenoma simples Carcinoma não infiltrativo (in situ) Hiperplasia lobular Adenoma complexo Carcinoma tubulo-papilifero Hiperplasia epitelial Fibroadenoma de baixa

celularidade Carcinoma sólido

Adenose Fibroadenoma de alta

celularidade Carcinoma cribiforme

Hiperplasia fibroadenomatosa Tumor misto benigno Carcinoma das células escamosas

Quistos Papiloma ductal Carcinoma mucinoso

Ectasia ductal Carcinossarcoma

Fibrose focal Carcinoma ou sarcoma em tumor benigno

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mamárias com a mesma oncogénese podem ter apresentações fenotípicas muito diferentes (Weber, 2010). Assim, é compreensível que os próprios autores indiquem que se trata de uma classificação meramente “morfológica descritiva e não de uma classificação prognóstica” (Misdorp et al., 1999, p.25, tradução livre). Na realidade, a mesma classifica cerca de 80% das LMF como adenocarcinomas, maioritariamente dos subtipos túbulo-papílifero (apresentam formações tubulares e/ou projeções papilares), sólido (células tumorais dispostas em “cordões”, “lençóis” ou “ninhos”) e cribiforme (semelhante a um crivo, com pequenas aberturas) (Misdorp

et al., 1999; Lana et al., 2007; Costa, 2010). Assim, transmite o conceito de que os TMF são

neoplasias monótonas, com pouca variabilidade histológica, não espelhando a sua verdadeira heterogeneidade, o que contribuiu para que estes fossem pouco explorados e se traduziu, evidentemente, num reduzido número de estudos publicados sobre os mesmos, sobretudo em comparação com as espécies humana e canina (apenas cerca de 200 artigos foram publicados sobre os TMF deste de 1966) (Travassos, 2006; Viale, 2012; Zappulli et al., 2014).

No entanto, convém realçar que existe uma certa variação histológica tumoral intrínseca, na medida em que diferentes lesões tumorais podem apresentar subtipos histológicos igualmente diferentes e nas mesmas lesões neoplásicas podem coexistir vários subtipos histomorfológicos, pelo que nesses casos a classificação geral deve incluir o subtipo predominante seguido do(s) minoritário(s) e a análise histopatológica deve ser, logicamente, sempre realizada em cada tumor individualmente (Misdorp et al., 1999; Peleteiro et al., 2011). Os TMF malignos mais frequentes são os epiteliais já citados, enquanto os menos frequentes são os carcinomas de células escamosas (constituídos por um padrão sólido com áreas de diferenciação escamosa), carcinomas mucinosos (tipo simples ou complexo com abundante produção de mucina), carcinossarcomas (com tecido epitelial – luminal e/ou mioepitelial – e mesenquimal – conjuntivo) e os mesenquimais denominados de sarcomas em tumores benignos (focos distintos de células de aparência maligna em adenomas complexos ou em tumores mistos benignos) (Misdorp et al., 1999; Lana et al., 2007). Os TMF benignos são normalmente fibroadenomas (apresentam células epiteliais e células estromais) e raramente papilomas ductais (tumores simples ou complexos localizados em ductos distendidos, sob a forma de lóbulos ou de ramificações) (Misdorp et al., 1999; Morris, 2013).

Posto isto, compreende-se que vários autores considerem que esta classificação descritiva é desnecessariamente complexa, pois pode conduzir a uma série de combinações de vários padrões morfológicos, sendo um sério desafio, por vezes, encontrar informação clínica relevante na miríade de resultados possíveis, apesar de aproximadamente 80% dos casos incluírem apenas 3 subtipos, conforme suprarreferido (Peleteiro, 1994; Travassos, 2006). Ainda assim, é importante salientar que a análise histopatológica continua a ter um papel fundamental

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nos casos de TMF, não só por permitir obter o diagnóstico definitivo, distinguindo lesões não tumorais de tumorais e neoplasias benignas de malignas, bem como porque, de facto, alguns subtipos histológicos menos comuns estão associados com o prognóstico (p.ex. tumores complexos estão correlacionados com maiores TS), pelo que tal informação não deve ser descartada (Seixas et al., 2008; Viale, 2012). Ademais, a análise histopatológica inclui não só a classificação histológica, mas também a avaliação de outras características importantes da lesão, como o grau de malignidade, a presença de permeação vascular e/ou de necrose, com valor prognóstico comprovado. O grau de malignidade é determinado de acordo com uma adaptação do método de Scarff-Bloom-Richardson feita por Elston e Ellis (1998) que utiliza um sistema numérico de 1 a 3 para avaliar o pleomorfismo nuclear, a formação de túbulos e o número de mitoses, conforme descrito na tabela 3, não se aplicando a carcinomas não infiltrativos, nem a sarcomas ou a outras formas pouco comuns de TM (Peleteiro, 1994).

O pleomorfismo nuclear é definido mediante a análise da variabilidade nuclear, do número e do tamanho dos nucléolos. Na estimativa da formação de túbulos só se consideram as estruturas com clara formação de lúmen central, utilizando-se como cut-off’s os valores de 10% e 75% da extensão da massa neoplásica. A contagem do número de mitoses é feita em 10 campos de grande ampliação (40x) na periferia do tumor. No final, o somatório dos valores atribuídos a cada um dos 3 parâmetros permite identificar os tumores de baixo grau de malignidade (grau I, pontuação total 3-5), de grau de malignidade intermédio (grau II, pontuação total 6-7) e de elevado grau de malignidade (grau III, pontuação total 8-9) (Elston & Ellis, 1998).

Parâmetro Pontuação

Pleomorfismo nuclear

Núcleos pequenos, uniformes e regulares 1

Aumento moderado do tamanho e variabilidade 2

Variação marcada com nucléolos proeminentes ou múltiplos 3 Formação de túbulos Frequente (>75%) 1 Moderada (10-75%) 2 Reduzida ou ausente (<10%) 3 Número de mitoses 0-5 mitoses 1 6-10 mitoses 2 >11 mitoses 3

Tabela 3 – Critérios utilizados na determinação do grau de malignidade (adaptado de Elston & Ellis, 1998).

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