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3 A TRAJETÓRIA DOS IRMÃOS CAMPANA

5.4. A NOMENCLATURA BASEADA NA TERMINOLOGIA DA TECNOLOGIA

5.4.2. Concepções sobre tecnologia

Com freqüência, observa-se o uso da palavra tecnologia empregada como uma forma de diferenciar um produto, como ferramenta de marketing, ou ainda como um sinônimo para um novo equipamento ou inovação técnica. A tecnologia pode ser definida como o conjunto de conhecimentos científicos, empíricos ou intuitivos empregados na produção e comercialização dos bens (GAMA, 1987).

Para M. J. Herskovitz “os homens extraem do seu habitat, por meio de sua tecnologia, os alimentos, o abrigo, as roupas e as ferramentas de que necessitam para sobreviver. Os objetos que fazem e usam para esses fins classificam-se em geral sobre a rubrica da cultura material”. (KERSKOVITZ APUD GAMA, 1987, p. 11).

Ocorrem também outros equívocos na compreensão do significado da tecnologia: ela pode ser concebida como o conjunto de técnicas, geralmente associado a um fator de medição do grau de avanço tecnológico de um determinado país ou sociedade; ou como uma ideologia da técnica. (PINTO, 2005). A tecnologia é entendida como técnica quando se confunde com uma produção material. É a técnica, e não a tecnologia, quando a palavra tecnologia é usada para tratar de instrumentos, máquinas e aparelhos que são erroneamente compreendidos como a própria tecnologia materializada.

O senso comum da sociedade em geral classifica como tecnologia os objetos materiais, como se estes fossem um resultado natural do avanço tecnológico. Esta visão foi construída por um longo período de crença na técnica como sinônimo de tecnologia; suas origens remontam ao período de invenções, descobertas e expansão européia, entre os séculos XVII e XIX. Este período contribuiu com a formação do pensamento que concebe a sociedade atual como uma sociedade na qual a explosão tecnológica atingiu seu apogeu, não tendo similares. Esta sensação é provocada pela velocidade das transformações sociais, que as novas tecnologias programaram, e são percebidas como um apogeu ao se analisarem todas as transformações anteriores ao século XX.

A Revolução Científico-Tecnológica, por volta de 1870, trouxe o desenvolvimento das aplicações sobre eletricidade, motores, combustíveis, indústrias químicas, siderúrgicas, plásticos, meios de transporte, comunicações, fotografia e cinema, (SEVCENKO, 2000) só para citar algumas invenções importantíssimas, que contribuíram para a noção de progresso e também de aceleração do tempo e da modernidade.

A confusão entre ferramentas como sendo a própria tecnologia tem origem na época das invenções, quando se acreditava que uma invenção simbolizava a

ciência, a descoberta e o avanço daquele instrumento. Isto contribuiu para uma compreensão superficial de tecnologia como a materialização em equipamentos, máquinas, ferramentas, etc. Esta concepção também possui fundamentos que remontam às origens do modernismo, na qual tecnologia era um tipo de ciência ou conhecimento que aproximava as nações do progresso. A união de tecnologia e progresso foi logo aceita na sociedade de um modo geral e as confusões se multiplicaram.

O mundo tecnológico de hoje desperta uma sensação de que estamos constantemente em uma montanha-russa; ora subimos rapidamente, ora descemos e nem nos damos conta de todas as sensações que nos acometem. (SEVCENKO, 2000). As invenções ajudaram a caracterizar a tecnologia como a materialização de técnicas, mas são responsáveis por criar um equívoco. Ao depositar nas ferramentas ou equipamentos materiais a noção de tecnologia, o saber, a experiência e outros conhecimentos ficam ocultos. São adotadas concepções errôneas, mas que muitas vezes são convenientes, pois ajudam a reforçar diferenças entre países, entre culturas, entre classes até. O significado de tecnologia dilui-se na esfera das apropriações que são feitas do termo. Desta forma, a publicidade apresenta produtos com a mais alta tecnologia, que variam do celular ao tênis para atletas. O termo tecnologia acaba por enaltecer o que nem é tão nobre ou avançado em um determinado produto.

O conceito no tech expressa esta concepção de que instrumentos, ferramentas e máquinas são vistas como a própria tecnologia, embora isoladamente, como o resultado de um processo “natural” de evolução científica. Neste pensamento, não são considerados os papéis das sociedades e das pessoas como agentes de criação, mudança e utilização destas “tecnologias”. Estas são ferramentas; são técnicas que materializam um saber tecnológico que antecede esta materialização em objetos físicos, como ferramentas, produtos, artefatos variados. Quando a tecnologia é compreendida como um dado material isolado de seu contexto e dos conhecimentos que possibilitaram a sua existência, corre-se o risco de perder os significados e perceber a amplitude da tecnologia na

atividade humana. A tecnologia está associada à presença humana, às suas pesquisas, aos seus hábitos; constitui um valor da existência humana.

Desta forma, os sistemas de produção do mobiliário constituem sistemas tecnológicos, dentro de um sistema ainda maior e mais abrangente como é a sociedade contemporânea. Ruth Cowan (1997) acredita que os

Sistemas tecnológicos são uma série de tecnologias. Um instrumento solitário, até mesmo o mais primitivo deles, não é normalmente suficiente para realizar o trabalho. Um martelo, por exemplo, deve ser aplicado a alguma coisa (um prego, uma tábua) o qual também é um instrumento, para poder funcionar como um martelo: uma lata precisa de um abridor...Todos os sistemas tecnológicos, por definição, tem pessoas embebidas neles. Um martelo não é realmente um martelo até alguém pegá-lo e usá-lo. Os sistemas tecnológicos podem, e alguns realmente tornam-se muito grandes e muito complexos; o paradigma poderia ser um computador pessoas o qual requer uma rede elétrica mais o programa, disquetes, impressoras, scanners e modems – assim como programadores, professores e fabricantes – de forma a funcionar propriamente.

A produção de um móvel, nesta perspectiva, envolve uma série de subsistemas para se concretizar. Da escolha do material, que depende de um conhecimento sobre a manipulação e as possibilidades estruturais e viabilidade técnica, como um móvel planejado para o mobiliário urbano, por exemplo, deve considerar no projeto o uso de uma população, a conservação em relação aos aspectos climáticos, que determinam escolha de materiais, os aspectos técnicos e funcionais, definindo usos, funções, etc.

O conhecimento de ferramentas, materiais, ferragens, acessórios, desenho, softwares de desenho, equipamentos, cores, proporção e composição, e ainda podem ser enumerados outros conhecimentos que fazem parte do processo de desenvolvimento do mobiliário, mesmo que o uso mude, ou a função a que se destina seja diferente. O móvel industrializado exige um saber tanto da matéria-prima a ser empregada, como os componentes da madeira, ferragens de acordo com o uso, acabamentos que podem ser empregados de acordo com o tipo de material usado, embalagem, armazenamento, transporte, comercialização. Todas estas etapas constituem o projeto de móveis industriais. Estas etapas podem mudar se o mobiliário for feito sob medida, encomendado a

um marceneiro, que fará um único modelo. Este profissional não possui o mesmo equipamento da indústria e não fornece material para lojas e vários clientes. Seus produtos são únicos, mas não são essencialmente artesanais, pois empregam ferramentas e geralmente é um processo semi-industrial.

Os exemplos fornecem processos distintos de fabricação; e ainda existem formas híbridas e combinadas destes processos. Embora os modelos de fabricação sejam diferentes, a tecnologia está igualmente presente. A utilização de máquinas industriais é vista como uma atividade altamente avançada e tecnológica; mas não se avalia neste pensamento a complexidade que existe no trabalho artesanal ou semi-industrial. Conhecer materiais, saber como estruturá- los e trabalhar não apenas formas, mas cortes, acabamentos, conformação e outras fases exigem um saber que não é exigido como uma atividade imediata. Requer um estudo, uma prática para poder conhecer e assim, inovar, modificar, experimentar. Se, por um lado, os equipamentos facilitam este processo e apresentam a tecnologia do fazer tradicional aplicado ao maquinário, por outro, a utilização de equipamentos tornou desnecessário em muitos casos os conhecimentos sobre o processo de fabricação do mobiliário. Deste modo, o designer deixou de ser efetivamente o profissional ligado à produção, passando à concepção e planejamento. Neste longo processo de industrialização, separação e especialização das atividades do trabalho, o conhecimento sobre processos de fabricação deixou de fazer parte da atividade do designer.