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Diante do panorama estabelecido com as observações a partir dos dois serviços referidos, o que chama a atenção são as consequências que se desvelam no funcionamento cotidiano dos mesmos, isso a partir dos pontos positivos e negativos gerados entre a articulação da gestão pública da saúde com as gerências pública e privada situada nos serviços.

Os benefícios gerados e os malefícios instituídos a partir do incentivo das parcerias público-privadas, bem como das iniquidades geradas pela negligência com os serviços gerenciados publicamente, montam este panorama nos levando a conclusões de que as consequências vistas dentro dos serviços estão ligadas às causas que remetem à administração pública, à forma que a gestão do Estado beneficia e negligencia ao mesmo tempo uma (privada) e outra (pública). É incorrer em erro pensar que os tipos de gerência seriam a causa principal das consequências que influenciam o funcionamento e cotidiano dos serviços, pois estas são consequências das articulações estabelecidas a partir da gestão pública e suas contradições inerentes.

Como ponto de fuga, o qual seria uma via de saída para este entrave, seria necessário fazer uma análise a partir do que coloca Paula (2005), em que

Examinando esses modelos, identificamos três dimensões fundamentais para a construção de uma gestão pública democrática: 1) a dimensão econômico- financeira, que se relaciona com os problemas do âmbito das finanças públicas e investimentos estatais, envolvendo questões de natureza fiscal, tributária e monetária; 2) a dimensão institucional-administrativa, que abrange os problemas de organização e articulação dos órgãos que compõem o aparato estatal, como as dificuldades de planejamento, direção e controle das ações estatais, e a questão da profissionalização dos servidores públicos para o

desempenho de suas funções; 3) a dimensão sociopolítica, que compreende problemas situados no âmago das relações entre o Estado e a sociedade, envolvendo os direitos dos cidadãos e sua participação na gestão. (p. 40)

Os três pontos abordados se fazem importantes e articulados entre si, reverberando em diferentes planos de interferência que iriam desde as relações micro, no cotidiano dos serviços e das relações de cuidado dos profissionais com usuários e familiares, bem como as relações de âmbito macro, tendo que se reorganizarem as dimensões sócio-políticas (e jurídicas) envolvidas e que acabam por determinar o entrave da gestão pública.

Tal questão está referida no problema relativo à forma de repasse realizado dentro dos processos normatizados de financiamento na área de saúde mental, em que o instituído através das instâncias jurídicas interfere na realidade prática dos serviços que atuam nos cuidados à população. Também acaba por revelar interesses e posicionamento sociais e políticos, interferindo também no andamento da reforma psiquiátrica para melhor desenvolvimento da rede de saúde mental, bem como afetando os princípios de democratização e universalização da saúde instaurados pelo SUS.

Uma gestão voltada para a democratização dos processos e articulações que envolvam decisões descentralizadas com maior participação social seria uma boa alternativa para a resolução das iniquidades geradas pelo atraso permanente na gestão pública brasileira. Uma gestão social e democrática, a qual objetivaria uma reorganização da administração e do aparelho de Estado, revelando que o caminho para isso seria uma gestão para o desenvolvimento social (Oliveira, Cançado, & Pereira, 2010).

Uma gestão social priorizaria uma maior participação social, em que a relação entre a sociedade civil e o Estado seria um meio fértil para o desenvolvimento de política que priorizem o desenvolvimento social em detrimento das práticas de mercado e valorização do capital. Daí ser um tipo de gestão mais adequado às políticas sociais e ambientais, já que são

áreas que o desenvolvimento qualitativo tem de superar as necessidades de desenvolvimento quantitativo, ou seja, desenvolver o social em detrimento de políticas que visem o aspecto somente econômico e financeiro.

Segundo Paula (2005) os modos de gestão societal que buscam priorizar o desenvolvimento social, trouxeram pontos positivos e introduziu diferenças no modo de gerir o interesse público e inovações na cultura política a partir de sua execução nos espaços públicos, entretanto a autora aponta pontos que precisam de pesquisas e reflexão a respeito dos questionamentos lançados a partir das experiências já praticadas

• o equilíbrio e as interações entre o executivo, o legislativo e os cidadãos; • o impacto das novas experiências na qualidade de vidados cidadãos e na redução das desigualdades;

• o modo como se altera a cultura política, se estimula a participação social e se criam novos formatos institucionais e administrativos;

• a interferência da falta de vontade política e dos entraves burocráticos na partilha de poder;

• os caminhos para viabilizar a capacitação técnica e política dos funcionários públicos e dos cidadãos;

• a elaboração de uma nova proposta para a organização administrativa do aparelho do Estado;

• a necessidade de sistematizar experiências alternativas de gestão que contemplem os aspectos técnicos e políticos;

• a busca de um equilíbrio entre as dimensões econômico-financeira, institucional-administrativa e sociopolítica;

• as referências teóricas e metodológicas que poderiam ajudar a melhor compreender os processos políticos e administrativos estudados, como é caso,

por exemplo, do neo-institucionalismo e da teoria das redes interorganizacionais. (p. 47)

Com isso posto torna-se imprescindível a reformulação do movimento gerencial que caracterizou a “nova” administração pública, movimento este ainda em andamento desde a metade da década de 1990. Vemos que a administração pública e dos interesses públicos possui uma lógica própria, em que tem de ser levado em consideração a melhor capacitação dos gestores, desafiando os governantes há manter um equilíbrio entre o processo de humanização da gestão e os interesses políticos inerentes ao movimento democrático. O envolvimento da sociedade civil seria, além de um avanço em termos de desenvolvimento social, uma forma de manter um controle social nas articulações entre as gestões públicas e as gerências dos serviços públicos, onde os interesses e decisões fariam parte também a partir das reivindicações da esfera social.