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“Negar não é resolver, é simplesmente esconder E o que se esconde fere,

Ainda que de maneira silenciosa”.

( Autor desconhecido)

Acredita-se que essa pesquisa, associando as representações sociais e a morte, poderá contribuir para o estabelecimento de estratégias de formação de uma educação voltada para a vida, ajudando no processo de alteração de um núcleo representacional que se configurou em torno da morte e da criança.

Como pode ser percebido, por meio de alguns instrumentos e técnicas, chegou- se as representações sociais de professoras e pais , de uma escola pública e uma escola privada de Brasília/DF, posibilitando refletir sobre os objetivos desse trabalho. Ressalta- se que devido a amostra da pesquisa ser pequena, não se pode generalizar os dados.

Analisando as representações sociais que professoras e pais possuem sobre morte, em duas instituições de educação infantil, pode-se constatar que essas representações ainda estão muito vinculadas as representações sociais historicamente concebidas pela nossa cultura, o que vem a reforçar os mitos que se configuraram na relação da criança com a morte. No entanto, percebeu-se o interesse dos participantes em buscar conhecimentos sobre essa relação, para poderem tratarem o fato da morte com à criança de uma maneira mais adequada.

Levantando e comparando as representações sociais sobre morte entre professoras e pais de uma rede particular de ensino e de uma rede pública de ensino, em Brasília, obteve-se os seguintes resultados. Com relação aos pais, tanto os da escola pública como os da escola particular possuem uma representação muito ligada às concepções religiosas, constatadas na Tabela 8 (p.92), e reforçada essa influência da

religião em outras questões, como na Tabela 2 (p. 80), em que os pais, de ambas escolas, ancoram-se em explicações religiosas para tratarem do fato da morte com seus filhos.

Com relação as professoras pesquisadas, enquanto as representações das professoras da escola pública estão mais relacionadas à concepções religiosas, as representações das professoras da escola particular estão mais vinculadas a como se dá o fato na realidade (Tabela 9, p.93), no entanto na técnica de associação-livre (p.125), professoras das duas escolas, citam a perda como o sentimento mais forte ligado a representação social que têm da morte. Na representação gráfica, solicitada num dos trabalhos do grupo focal , houve coincidência também nos desenhos, os quais os mais representados foram a cruz, as nuvens, o caixão e o cravo, podendo-se concluir que nessa representação, ficou muito evidente a lembrança dos rituais fúnebres na representação simbólica que se faz da morte.

Dessa forma, conclui-se que as representações sociais que professoras e pais têm da morte, tanto da escola pública como da escola particular pesquisadas não diferenciam muito, e que ambas reforçam os mitos que existem entre a criança e o fato da morte, dificultando uma percepção real da criança para com o fato, como também a importância do conhecimento da finitude dos seres.

Com relação a criação de estratégias com as professoras, gerando recursos pedagógicos sobre a temática morte, não houve condições de um aprofundamento da questão, como desejávamos, devido ao tempo no grupo focal ter sido bastante reduzido. Porém, quando questionadas a sugerir atividades que podem ajudar à criança num momento de perda, foram citadas: músicas, teatros, jogos e conversas informais na rodinha, que pudessem propiciar o enfoque da morte, como o exemplo citado no texto que foi lido (anexo 10); além dos livros infantis.

Como era do interesse dessa pesquisa, evidenciou-se, principalmente, o recurso da literatura infantil para abordar a temática morte. No quarto encontro do grupo focal, aproveitou-se para focar na estratégia do livro infantil, apresentando diversos livros infantis que abordam tal temática, com enfoques diferentes, os quais elas puderam manusear e questionar a respeito dos mesmos. Nesse episódio, falou-se a respeito da pesquisa que esse trabalho estava fazendo sobre levantar a bibliografia existente de livros

infantis que abordem morte e perdas a serem tratados com crianças da faixa etária da educação infantil, incluindo uma breve sinopse de cada livro, para facilitar à escolha do adulto (p.112). Esse encontro foi de grande valia para os participantes, pois a maioria das professoras, de ambas escolas, não conheciam os livros apresentados, mostrando entusiasmo com a existência de alguns dos livros. Na escola particular, onde houve a possibilidade de um aprofundamento das questões sobre a literatura infantil, ficou evidenciado como esse recurso suscita questões pessoais.

Concluindo, pensa-se que é imprescindível um processo educativo voltado para todos os atos e situações da existência humana, uma educação voltada para as relações familiares, para as relações com os outros, para o trabalho, para o trânsito, para o respeito ao meio ambiente, e consequentemente uma preparação para a morte, onde se oriente e se esclareçam os esquívocos e supertições relacionados a esse tema.

Quando se propõe uma educação infantil em que seja abordado o fato da morte, não se está dizendo que vai existir o tema como um objeto de estudo ou pesquisa, mas sim que vai se aproveitar e inserir o fato como algo natural da vida, quando no estudo das plantas, dos animais, dos seres humanos, ou quando o fato for suscitado pelo grupo. O importante é que o professor e a escola estejam preparados para lidar com o assunto e que possuam estratégias para utilizar de uma forma adequada com a criança e a família.

Sabe-se das limitações dessa pesquisa, provindas do grande tabu que ainda existe com relação ao tema. Inicialmente, desejava-se um número maior de encontros com as professoras, como também a participação das crianças e uma maior participação dos pais. No entanto, na prática, encontrou-se alguns obstáculos, com relação a proposta para as profesoras, na escola pública o tempo que nos foi concedido é o que elas usam para confeccionar atividades que serão realizadas em sala, e na escola particular, o horário que utilizamos com o grupo focal era o da coordenação das atividades diárias, portanto não poderia ser muito extenso do que já foi disponibilizado. Dessa forma, agradece-se a oportunidade à pesquisa que ambas escolas concederam, mas ressalta-se que o tempo concedido restringiu os objetivos iniciais desse trabalho. Mesmo assim, deseja-se que os resultados obtidos possibilitem algumas contribuições na prática

profissional de professores e pais que lidam com a educação infantil e que devem estar preparados para situações diversas da vida, como no caso a morte.

Espera-se também que essa pesquisa sirva de estímulo a outras pesquisas, para que se possa avançar numa educação para a vida, com mais qualidade, abordando todos os aspectos individuais e sociais das crianças.

Como contribuição final deste trabalho, considerando que a autora sempre teve a preocupação de, por meio dessa pesquisa, colaborar na prática das professoras com relação a temática da morte, inclui-se uma proposta de trabalho, utilizando-se o tema morte com crianças de forma efetiva - uma educação infantil como espaço de ecologia humana, o que veremos a seguir:

A Instituição de Educação Infantil como espaço de ecologia humana

Pensar a instituição de educação infantil como espaço de ecologia humana, significa entendê-la como um contexto educacional de formação que está em constantes transformações. Um espaço que merece ser pensado e aperfeiçoado com seriedade, pois como nos diz Moraes (2004):

“É chegada hora de sonhar com a potencialidade de um novo mundo ou de uma nova era fundada na justiça, no amor e na fraternidade humana. Uma nova época capaz de oferecer uma educação verdadeiramente inter e transdisciplinar, ecológica, sistêmica, que leve em conta as diferentes relações presentes no processo de construção do conhecimento e resgate a importância da intuição, da imaginação, da sensibilidade e do corpo na emergência desses processos” (p.235).

A instituição de educação infantil é uma das maiores responsáveis, junto à família, por uma educação ecológica humana, entendendo-se essa educação voltada para todas as relações dos seres vivos com o ambiente em que vivem.

Mas, o que um estudo sobre morte e criança pode colaborar para uma educação ecológica humana? Nas últimas décadas as escolas vem discutindo e se preocupando com vários temas como a educação sexual, drogas, educação no trânsito dentre outras, no entanto a morte continua sendo um tema proibido, o qual a criança recebe informações do tipo: “ele foi para o céu”, “está descansando” ou “foi viajar”. Esses tipos de metáforas são usadas no intuito de poupar a criança do sofrimento que a morte causa, no entanto tais

explicações podem trazer dificuldades no futuro ao lidar com as perdas, como também perde-se a oportunidade de trabalhar com a criança sobre a finitude dos seres.

Nos seus estudos sobre morte e a criança, Torres (1999) afirmou a importância de falar sobre o tema com a criança, esclarecendo o processo que todos os seres vivos passam: nascem, crescem e morrem. Insistiu na relevância de pesquisadores investigarem a percepção e o conceito de morte nos diferentes estágios do desenvolvimento da criança, e que a escola, junto com a família, é um dos espaços sociais que pode promover reflexões sobre a morte, fazendo com que o tema supere o tabu e o sofrimento.

Autores como Bigheto e Incontri (2007) relatam que nas suas práticas em sala de aula perceberam que a criança não considera a morte tão tragicamente como o adulto, podendo até mesmo discutir a morte de alguém muito próximo de forma natural. Concluem que, nos diversos momentos que as crianças conversavam sobre a temática da morte o que guiava esses momentos era uma naturalidade com o assunto. Dessa forma, ao trabalhar desde cedo com a criança sobre a finitude dos seres, acredita-se que a criança poderá compreender melhor a natureza humana, deparando-se com os seus limites e de outras espécies, aprendendo a respeitar e colaborar com o meio ecológico e social que está inserida.

De acordo com Cerqueira (2006), deseja-se uma escola que vise a formação do sujeito num sentido amplo, “uma escola viva, dinâmica, pulsante, democrática: uma escola que enxergue o sujeito como um todo, que valorize e respeite o ser humano em todas suas dimensões emocionais, racionais e espirituais. Uma escola que possa contribuir para a transformação da realidade” (p.31).

Deseja-se uma escola que não negue o que seus alunos podem estar vivenciando e consequentemente sendo prejudicados na sua aprendizagem escolar. Deseja-se uma escola competente, que seja e sinta-se responsável por todos os seus membros: funcionários, professores, alunos e pais. Que a escola sinta-se cuidante de todos eles. Citando Boff (1999), que tão bem soube conceituar a palavra cuidante:

“Somos cuidantes quando prestamos atenção aos valores que estão em jogo, atentos ao que realmente interessa e preocupados com o impacto que nossas idéias e ações podem causar nos outros. Somos cuidantes quando não nos contentamos apenas em classificar e analisar dados, mas quando discernimos atrás deles, pessoas, destinos e valores. Por isso, somos cuidantes quando distinguimos o que é urgente e o

que não é, quando estabelecemos prioridades e aceitamos processos. Em outras palavras, ser cuidante é ser ético, pessoa que coloca o bem comum acima do bem particular, que se responsabiliza pela qualidade de vida social e ecológica e que dá valor a dimensão espiritual, importante para o sentido da vida e da morte”(p.87).

A escola, como um dos espaços sociais mais importante da vida da criança deve propiciar momentos de diálogos entre os profissionais, pais e crianças, os quais estejam vivenciando a morte de alguém querido, fazendo-os refletir e compreender esse fato como dimensão da existência do ser vivo. É preciso que a criança perceba o ciclo de desenvolvimento dos seres vivos onde nascem, crescem e passam por várias fases.

Para Bigheto e Incontri (2007):

“É preciso, pois ter a coragem e a habilidade para trazer à baila tais assuntos, mas sabendo discutí-los de forma plural e interdisciplinar. É claro que na temática da morte, podemos explicá-la biologicamente, podemos tecer reflexões sobre problemas sociais em que ela aparece como protagonista, mas aí sim, se revela a necessidade de uma militância – é nosso dever trazê-la de forma natural e sensível, abrindo a possibilidade para que a criança, desde cedo, perceba a sua transcedência” (p.34).

Esses autores reforçam a necessidade de incluir a dimensão da transcedência humana na educação, para que possamos nos livrar do medo da morte, e consequentemente livrar do medo da vida. Pois, para eles, viver com o permanente risco da morte daqueles que amamos como também a nossa é tomar para si algo que muitas vezes não damos conta.

Conforme Santos (2007), a preocupação com a educação para transcender advém de duas questões, uma estatística, de acordo com os dados do World Value Survey (DATAFOLHA, 2007), a maioria da população brasileira acredita na sobrevivência após a morte (79%), que temos alma (82%), na existência de Deus (99%) e na reencarnação (66%), portanto é preciso apropriar a educação à realidade sócio-cultural brasileira, e a segunda questão é que não existe uma ciência neutra, nem uma educação neutra.

Trabalhar essa temática, desde cedo, com respeito à individualidade de cada ser, as suas crenças, de maneira plural, amparadas no diálogo, principalmente na escuta, acredita-se que se estará educando para o fato da morte.

Santos (2007) adverte que ensinar, educar e aprender a respeito da morte é vivenciar, expor sentimentos e emoções no processo de ensino-aprendizagem, é entrar na nossa mais íntima percepção da morte, ou seja, o que entendemos pelo fato da morte e o processo de morrer, sejam eles do outro ou do nosso. No entanto, sabe-se da dificuldade de

abordar essa temática na escola seja com pais seja com crianças. Daí que, coloca-se um grande desafio para os educadores, a possibilidade de mudar, de criar, visando uma educação ampla que enxergue o ser humano na sua totalidade, proporcionando-o uma melhor qualidade de vida.

Nesse trabalho não houve a possibilidade de trabalhar a temática morte com as crianças, apesar de estar na proposta inicial. Em ambas escolas pesquisadas não obteve-se a permissão total dos pais para que seus filhos participassem de momentos lúdicos que abordassem tal assunto. As falas dos pais que não autorizaram a participação da criança na pesquisa foram coincidentes, do tipo: “eu não gostaria que minha filha participasse desse evento, acho que não é o momento”. Nessa expressão, pode-se perceber claramente a idéia que os adultos possuem de que o tema morte não é apropriado para crianças. Colocando de uma maneira mais otimista essa questão, pensa-se que é muito difícil para os pais autorizarem tal temática a ser abordada com seus filhos, numa pesquisa científica, pois: não se conhece o pesquisador; é um trabalho com data estipulada para terminar e pode não haver continuidade por parte da escola; não se sabe se os professores estão preparados o suficiente para lidar com questões que poderão surgir; e por fim, os pais também não estão preparados para lidar com essas questões, o que ficou claro nos questionários aplicados.

Nos questionários, também, evidenciou-se que 61% dos pais da escola pública e 70% dos pais da escola particular gostariam que a escola abordasse tal temática, como também 86% das professoras da escola pública e 80% das professoras da escola particular defendem a importância de uma abordagem nesse sentido. Dessa forma, insiste-se numa ação em que os educadores discutam e busquem conhecer sobre morte e crianças, para que possam dar todo o suporte à família e à criança sobre tal assunto, e percebam que o assunto é muito mais abrangente do que se possa imaginar e envolve várias questões que se ampliadas num contexto educacional, favorecerá uma compreensão maior das atitudes do indivíduo perante à vida.

Iniciou-se esse trabalho com uma reflexão, no epílogo, sobre o que é a vida, e termina-se com uma mensagem para que todos aproveitem e valorizem cada momento vivido, pois só assim faremos diferença na nossa vida e na vida das pessoas que passam pelas nossas vidas.

Epitáfio