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CAPÍTULO 3 – PERFIL DO DOCENTE DE FILOSOFIA DA REDE ESTADUAL

3.1 De qual contexto estamos falando?

Gimeno Sacristán (1998, p. 129) adverte que, para compreendermos a realidade curricular, precisamos antes conhecer os contextos nos quais o currículo real é forjado:

[...] para entender o currículo real é preciso esclarecer os âmbitos práticos em que é elaborado e desenvolvido, pois, do contrário, estaríamos falando de um objeto reificado à margem da realidade [...] é preciso [...] entender como o currículo se configura em relação aos contextos não apenas pedagógicos, mas políticos, econômicos, legislativos, administrativos, organização de escolas, práticas de supervisão e de controle, etc.

O autor menciona cinco contextos que se inter-relacionam e moldam o currículo real: a) o do sistema educacional; b) o psicossocial; c) o didático; d) o organizativo; e) e o exterior.

Nessa perspectiva o currículo é uma trama de elementos e de agentes que mediam as práticas pedagógicas. Se, por um lado, há as atividades curriculares compostas, segundo Gimeno Sacristán (1998, p. 130), pela ordenação do currículo em séries, ciclos etc.; pelos textos escolares; pelos planos da escola e do professor; pelas avaliações dos alunos e/ou do próprio currículo; e pelas inovações curriculares, por outro lado, as influências sociais, econômicas e culturais; as regulações políticas e administrativas; a produção de meios didáticos etc. são os âmbitos que modelam o

currículo.

Apresentamos, a seguir, dados contendo algumas informações sobre os professores de Filosofia no Ensino Médio da Rede Estadual de São Paulo com a intenção de fornecer elementos que contribuam para a compreensão do contexto no qual se desenvolve a atuação desses docentes.

Os dados, coletados no Departamento de Recursos Humanos (Drhu)19 da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, dizem respeito aos docentes que, com data base em 31 de março de 2011, tinham aulas de Filosofia atribuídas no Ensino Médio da Rede Estadual paulista. Ou seja, consideramos, neste estudo, aquele indivíduo

que participou do processo de atribuição de aulas e que pode estar em efetivo exercício em sala de aula ou em outros cargos e/ou funções.

A identificação desses docentes é feita mediante os respectivos números de Registro Geral em um Sistema denominado Prodesp (Companhia de Processamento de Dados do Estado de São Paulo). O Sistema também é utilizado pela Secretaria de Educação do Estado de São Paulo, alimentado em suas informações pelas unidades escolares.

As informações recolhidas pelo Drhu e que nos foram fornecidas se referem aos dados pessoais, funcionais e de formação dos professores de Filosofia da Rede Estadual paulista e abrangem as seguintes categorias: sexo; idade; categoria funcional; tempo na função; motivos de afastamentos; número de aulas; Diretoria de Ensino e Unidade Escolar às quais pertencem; número de cargos que ocupam; formação inicial; cursos de pós-graduação; tipo de instituição na qual foi realizada a formação inicial; data de início e de término do curso de graduação.

Esses dados possuem grande relevância para a caracterização do grupo analisado. É o que esclarece Gatti (2004, p. 26) ao afirmar:

Estas análises, a partir de dados quantificados, contextualizadas por perspectivas teóricas, com escolhas metodológicas cuidadosas, trazem subsídios concretos para a compreensão de fenômenos educacionais indo além dos casuísmos e contribuindo para a produção/enfrentamento de políticas educacionais, para planejamento, administração/gestão da educação, podendo ainda orientar ações pedagógicas de cunho mais geral ou específico. Permitem ainda desmistificar representações, preconceitos, “achômetros”, sobre fenômenos educacionais, construídos apenas a partir do senso comum do cotidiano, ou do marketing.

Conforme já salientado, identificamos na planilha recebida do Drhu que o número de professores foi calculado em duplicidade, isso em razão das diversas formações que esses docentes possuem. Por exemplo: se o Professor X tem licenciatura plena em História e Estudos Sociais e Mestrado em Educação, esse sujeito foi computado três vezes. Isso exigiu que nosso primeiro trabalho de tabulação dos dados fosse eliminar essas duplicidades.

Chegamos então ao contingente de 4.042 professores de Filosofia na Rede

Estadual paulista, subdivididos nas Coordenadorias conforme a seguir: no Interior

(CEI), concentram-se 56% dos docentes de Filosofia do Estado, ao passo que as diretorias da COGSP da Capital e da Grande São Paulo somam, respectivamente, 23% e 21% desses professores, totalizando 44% dos docentes de Filosofia do Estado.

O primeiro aspecto que nos chamou a atenção refere-se ao número de professores de Filosofia por Unidade Escolar. A pesquisa demonstra que o trabalho do professor de Filosofia pode ser solitário, sem pares para discutir ou planejar suas práticas pedagógicas. Os dados apresentados na Tabela 3.1 evidenciam esse trabalho solitário dos docentes.

TABELA 3.1 – Porcentagem de docentes de Filosofia por Unidade Escolar – São Paulo – 2011 Escolas por

Coordenadoria

Número de professores de Filosofia por Unidade Escolar

1 2 3 4 5 6 Total CEI 69% 23% 6,5% 1% <1% <1% 100% COGSP /Grande São Paulo 70% 23% 5% 1,5% 0,5% - 100% COGSP/ CAPITAL 55% 30,5% 10% 3% <1% <1% 100% TOTAL 66,5% 24,5% 6,5% 1,5% <1% <1% 100%

Fonte: Elaborada pela autora.

Mais da metade (66,5%) das escolas de Ensino Médio do Estado de São Paulo possuem apenas um professor de Filosofia. Esses docentes são, ao mesmo tempo, os gestores e avaliadores do próprio trabalho tendo como parâmetro para a prática e a reflexão os alunos em sala de aula, a equipe gestora da UE e/ou os colegas das demais áreas.

Alguns dos elementos próprios do fazer pedagógico, como planejar a aula, preparar exercícios, provas, textos, ainda que o docente se apóie no livro didático, é de responsabilidade dele, o mesmo acontecendo com a correção de provas, exercícios, redações, o que caracteriza o processo de trabalho pedagógico como solitário, individual. (CAÇÃO, 2007, p. 167)

Entendemos serem necessários interlocutores para que se possa realizar a reflexão com a prática. É claro que essa interlocução pode dar-se com os alunos ou com os professores de outros componentes curriculares quando analisam no coletivo as práticas de sala de aula; no entanto, ao se deparar com as dificuldades específicas do ensino de Filosofia, esse professor se sente desamparado.

É no diálogo com seus pares que lhe é permitido confrontar ideias, sanar dúvidas, dividir as incertezas do seu trabalho e construir novas práticas. Advogamos não o término da individualidade do trabalho do docente de Filosofia, mas sim do isolamento que lhe é imposto em decorrência das condições de trabalho às quais ele é submetido, tais como a quantidade de aulas de Filosofia na grade curricular, a carga horária semanal e os insuficientes cursos de formação em serviço.

Os dados a seguir apresentam os resultados obtidos em nossa pesquisa, agrupados nestas categorias: a) dados pessoais; b) dados funcionais; e c) dados de formação. Esses dados estatísticos nos permitem compreender, em parte, o contexto em que se desenvolve a atuação dos professores de Filosofia no Ensino Médio da Rede Estadual paulista e as consequências advindas da efetivação da disciplina como componente curricular obrigatório.