• Nenhum resultado encontrado

2.2.3 ‐ O CONTEXTO NACIONAL 

O quadro da arquitetura brasileira do período, já estudado na análise  do  papel  de  Levi  na  historiografia,  é  de  convivência  de  inúmeros  raciocínios,  entre  eles,  os  que  tentam  introduzir  as  vanguardas  modernas.  Mesmo  que  panoramicamente  ‐  o  que  pressupõe  uma  inevitável  superficialidade  ‐  me  parece  interessante  fazer  um  levantamento  dessas  iniciativas,  contemporâneas  às  obras  examinadas de Levi.  

 

Cronologicamente, a primeira é a de Gregori Warchavchik, já referida  neste  trabalho  algumas  vezes,  mas  sempre  se  restringindo  à 

RINO LEVI NA HISTÓRIA

193

residência  do  arquiteto83,  a  conhecida  Casa  da  Rua  Santa  Cruz,  São 

Paulo,  1927/28.[112].  Lendo  o  manifesto  Acerca  da  Arquitetura 

Moderna (1925) ‐ também já citado ‐ onde as referências aos textos de 

Le  Corbusier  são  literais,  cria‐se  a  expectativa  de  que  os  projetos  repitam  essa  referência.  Mas  não  é  o  que  acontece.  Desde  a  sua  própria residência e no conjunto de obras do final da década de 20 e  começo de 30, em São Paulo, a familiaridade muito mais forte é com  as vanguardas alemãs e, particularmente, com Walter Gropius.  

 

Na  casa  Max  Graff84,  também  conhecida  como  casa  da  Rua  Mello 

Alves,  de  1929[113],  é  marcante  a  semelhança  com  o  repertório  de 

Gropius.  A  movimentação  dos  volumes,  solidamente  apoiados  no  chão,  o  uso  das  aberturas  e  a  maneira  de  manipular  as  marquises,  tudo remete às casas dos professores da Bauhaus. 

83 Casa do arquiteto, Rua Santa Cruz, São Paulo, 1927. Arquiteto Gregori Warchavchik. 84 Casa Max Graff, Rua Mello Alves, São Paulo, 1929. Arquiteto Gregori Warchavchik.

RINO LEVI NA HISTÓRIA

194

   

Warchavchik  está,  também,  preocupado  com  a  fabricação  em  série  dos componentes da habitação. Nesse sentido, numa oficina no fundo  da  sua  casa,  desenvolve  protótipos  de  caixilhos,  luminárias,  móveis,  tentando  ‐  paradoxalmente  ‐  de  maneira  artesanal  demonstrar  as  possibilidades da produção industrial em série. 

 

 A  produção  em  série  de  casas  também  foi  objeto  das  suas 

preocupações. Prova disso são as casas econômicas em série85, na Rua 

Barão de Jaraguá, de 1929 [114] e as casas econômicas em série86, na 

Rua  Dna.  Berta,  de  1930  [115].  Nas  duas,  o  partido  dos  sobrados 

geminados  formando  prismas  retangulares,  com  diferenciação  nas  casas de esquina, remetem às experiências alemãs. 

85 Casas em série, Rua Barão de Jaraguá, São Paulo, 1929. Arquiteto Gregori Warchavchik. 86 Casas econômicas em série, Rua Dna. Berta, São Paulo, 1930. Arquiteto Gregori Warchavchik.

RINO LEVI NA HISTÓRIA

195

 

 

A Casa Modernista87 da Rua Itápolis, em 1930 [116], ganhou esse nome 

por conta de exposição ao público, que foi montada com o intuito de  mostrar a população paulistana como morava o “homem moderno”. A 

87 Casa Modernista, Rua Itápolis, São Paulo, 1930. Arquiteto Gregori Warchavchik.

[115] Casas econômicas em séri, Rua Dna. Berta, São Paulo, 1930. Arquiteto Gregori

Warchavchik. Vista panorâmica.

[114] Casa econômicas em série, Rua Barão de Jaguara, São Paulo, 1929. Arquiteto Gregori

RINO LEVI NA HISTÓRIA

196

casa estava decorada com obras de Tarsila do Amaral, Regina Gomide  Graz, Oswaldo Goeldi, Menotti Del Picchia, Lasar Segall, John Graz,  Jenny  Klabin  Segall,  Antonio  Gomide,  Esther  Bessel,  Emiliano  di  Cavalcanti,  Cícero  Dias,  Celso  Antonio,  Victor  Brecheret  e  Anita  Malfati,  ou  seja,  todo  o  grupo  de  artistas  comprometido  com  a  introdução  das  questões  modernas  na  provinciana  São  Paulo  da  década de 20.   

 

Figuravam  também  obras  de  Jacques  Lipschitz,  Sonia  Delaunay  e  objetos  procedentes  de  Paris  e  Dessau.  O  caráter  didático  ia  mais  longe:  na  biblioteca  figuravam  obras  de  Alcântara  Machado,  Álvaro  Moreyra,  Affonso  Schmidt,  Arthur  Carneiro,  Ascenso  Ferreira,  Augusto  Meyer,  Brasil  Gerson,  Cassiano  Ricardo,  Felippe  d’Oliveira,  Graça  Aranha,  Guilherme  de  Almeida,  Manuel  Bandeira,  Mario  de  Andrade, Menotti Del Picchia, Motta Filho, Osório César, Oswald de  Andrade, Plínio Cavalcanti e Plínio Salgado.  

 

[116] Casa Modernista, Rua Itápolis, São Paulo, 1930. Arquiteto Gregori Warchavchik. Vista

RINO LEVI NA HISTÓRIA

197

O projeto aprofunda e solidifica as questões que Warchavchik vinha  trabalhando.  Aqui,  o  prisma  cúbico  só  perde  a  integridade  com  as  duas  marquises  em  fachadas  diferentes,  que  formam  verdadeira  alavanca, imprimindo grande dinamismo. A primeira corre paralela à  fachada  frontal,  ultrapassando‐a  para  apoiar‐se  em  pilar  linear.  A  segunda nasce perpendicular à fachada lateral e também se apóia em  pilar  linear,  além  de  marcar  e  proteger  o  acesso.  Esses  diferentes  níveis  são  complementados  por  um  jardim  em  patamares  que  vai  vencendo terreno até a rua. O paisagismo deste e de todos os jardins  desta série é de Mina Klabin Warchavchik, que introduz as cores e as  formas  da  flora  tropical  como  rico  contraponto  ao  branco  predominante  nos  projetos  do  marido.  Consta  que  acompanhando  Warchavchik na sua estadia no Rio de Janeiro, no começo da década  de 1930, Nina teria introduzido o jovem Burle Marx nesse raciocínio.    As fotos da época deixam claro o quanto a casa é inaugural no novo  loteamento do Pacaembu, onde ela é construída, tanto no sentido da  ocupação quanto nas características do projeto, estranhas às sedes de  chácaras que deram origem aos novos lotes.    O mesmo acontece com a casa da Rua Bahia88 [117], distante alguns 

quarteirões  da  casa  da  Rua  Itápolis.  Os  membros  do  Congresso  da 

Habitação,  posando  à  frente  da  casa,  em  maio  de  1931,  dão  uma 

mostra da novidade em que ela se constitui. Talvez aqui, mais do que  em qualquer outra casa de Warchavchik, tenhamos a convivência de  vários  repertórios:  Gropius  ‐  mais  visível  na  fachada  para  a  rua,  marcado pela abertura vertical que ilumina a escada ‐ e Le Corbusier ‐  mais visível na fachada posterior com suas janelas horizontais e seus  terraços  sobre  pilotis  [118].  As  duas  referências  são,  no  entanto,  harmonizadas  com  sucesso.  O  mesmo  se  observa  nas  plantas  [119],  que  tira  partido  com  inteligência  da  inclinação  do  terreno.  No  interior, o espaço da sala de jantar tem teto luminoso [120], de vidros 

RINO LEVI NA HISTÓRIA

198

granitè, opalino, opaco, amarelo e vermelho, com clara referência ao  De  Stijl.  Os  móveis  embutidos,  também  desenhados  pelo  arquiteto,  dialogam  com  a  produção  da  Bauhaus.  O  jardim  apresenta‐se  agora  na parte posterior do lote e outra vez vence o desnível em patamares.   

 

 

118] Casa da Rua Bahia, São Paulo, 1930. Fachada posterior.

[[117] Casa da Rua Bahia, São Paulo, 1930. Vista frontal com membros do “Congresso de

RINO LEVI NA HISTÓRIA

199

 

 

[120]

Casa da Rua Bahia, São Paulo, 1930. Teto Luminoso da sala de jantar.

RINO LEVI NA HISTÓRIA

200

Em  1931,  chamado  por  Lúcio  Costa  para  lecionar  Composição  de 

Arquitetura  na  Escola  Nacional  de  Belas  Artes,  no  Rio  de  Janeiro, 

convoca  para  seu  assistente  o  jovem  arquiteto  Affonso  Reidy,  então  com  20  anos  de  idade.  No  mesmo  ano  constrói  a  casa  da  Rua 

Toneleiros89 [121], conhecida como a primeira casa modernista do Rio. 

Nela  podemos  observar  todos  os  procedimentos  já  apontados,  aos  quais  se  acrescenta ‐ neste  caso ‐ o  uso de  patamares  para  vencer  a  declividade  do  terreno,  na  implantação  da  casa  e  não  nos  jardins.  Também  esta  casa  é  objeto  de  exposição  pública  na  época  de  sua  inauguração. Sobre ela, Abelardo de Souza comenta que as mais altas 

personalidades  do  mundo  oficial  e  artístico  compareceram,  estando  entre elas o famoso arquiteto Frank Lloyd Wright. Tal foi o interesse 

desse  arquiteto  pela  obra  de  Warchavchik,  que  ele  compareceu  por  mais de uma semana, acompanhado por grande número de alunos de  arquitetura, para discutir os vários detalhes e novidades construtivas  que a casa apresentava. 

 

89 Casa de Rua Toneleiros, Rio de Janeiro, 1931. Arquiteto Gregori Warchavchik.

Documentos relacionados