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A Convenção dos Direitos da Criança

7. Os instrumentos internacionais relacionados com o casamento infantil

7.2 A Convenção dos Direitos da Criança

A 20 de Novembro de 1989, as Nações Unidas adotaram por unanimidade a Convenção sobre os Direitos da Criança249. Este documento enuncia um amplo conjunto de direitos fundamentais - os direitos civis e políticos, os direitos económicos, sociais e culturais de todas as crianças - bem como as respectivas disposições para que sejam aplicados, demonstrando, deste modo, a visão de que a criança é detentora de direitos legais nos termos do direito internacional.250 Mesmo sendo uma norma ius cogens, a CDC sofre violações diárias cada vez que ocorre um casamento infantil. Ao ser obrigada a contrair matrimónio, grande parte da CDC é violada destacando-se as violações ao direito de protecção contra os maus tratos e negligência presente no artigo 19; direito ao lazer, actividades recreativas e culturais disposto no artigo 31; direito à saúde e serviços médicos de acordo com o artigo 24; direito um nível de vida que permita o seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e social de acordo o artigo 27; o dever do Estado parte proteger a criança contra todas as formas de exploração segundo disposto no artigo 36; direito à educação segundo o artigo 28. Embora a CDC não proíba expressamente o casamento infantil, a prática viola directamente as disposições destinadas a proteger as crianças.

248 idem.

249 UNICEF - Convenção sobre os Direitos da Criança, 1989 [Em linha] Disponível em:

<https://www.unicef.pt/docs/pdf_publicacoes/convencao_direitos_crianca2004.pdf>

250 UNICEF - Direitos das Crianças [Em linha] Disponível em WWW:<URL:

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De acordo com o CEPC, a CDC é ineficaz, tendo justificado que nenhum tratado ou convenção é a solução para terminar com o casamento infantil. Segundo este, a formulação do melhor interesse da criança evoluiu para um quadro de direitos humanos para as crianças, proclamando a ideia de que a as crianças são melhor protegidas devido aos direitos que lhe são conferidos.251 Assim, a Convenção não consagra verdadeiros direitos da criança, mas sim deveres assumidos pelos Estados relativamente à situação da criança, perante a comunidade internacional.252 Embora a Convenção de 1989 estabeleça uma definição sólida de criança, a mesma é infrutífera na protecção destas contra os perigos e danos do casamento infantil, pois as disposições que poderiam ser aplicadas à proibição do casamento de crianças não identificam de forma explicita a prática. Tais disposições, para além de não protegerem totalmente e de forma expressa as crianças, ainda permitem que as regras culturais dominem o direito internacional, tornado a Convenção fraca no combate ao casamento infantil.253 Por conseguinte, alguns países neguem de facto, que as disposições da CDC proíbam a prática tendo por base o artigo 14 número 2 da mesma. Segundo este, os pais têm o direito de controlar os domínios religioso, educacional e cultural dos seus filhos o que, de acordo com a visão de alguns legisladores, concede aos pais o direito de escolher conjugues e determinar quando os seus filhos se casarão com base em práticas culturais e religiosas.254

A inexistência de leis internacionais e internas de cado Estado que penalizem o casamento infantil ou, caso existam, a leve penalização que não reflete a natureza severa do acto, juntamente com a pressão dos próprios oficiais da aplicação da lei e dos cidadãos para que não sejam seguidas as leis que proíbam a prática255, acaba por tornar a CDC ineficaz.256 Apesar da CDC não estabelecer medidas de implementação das suas disposições, é o tratado mais longo da ONU em vigor que consagra a implementação dos direitos da criança em tempos de paz e de conflitos armados, consagrando pela primeira vez no

251 KOHM, Lynne Marie, op. cit., p.2

252 PINHEIRO, Jorge Duarte – Estudos de Direito da Família e das Crianças. Lisboa: AAFDL, 2015b, p. 328 253 ibidem, p. 5

254 idem.

255 Tal demonstra a profunda aceitação tradicional da mesma. Inclusive, muitos dos decisores são parte

integrante da comunidade compartilhando a crença que o casamento infantil é benéfico tanto para a criança como para a sua família.

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direito internacional vinculativo os princípios da adopção.257 Assim, actualmente a CDC é o tratado internacional de direitos humanos mais amplamente ratificado em toda a história. Neste momento, apenas o EUA são o único país que não ratificou o tratado.258

7.2.1 Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo à venda de crianças, prostituição e pornografia infantis

Como forma de realizar os objectivos da CDC, a 25 de maio de 2000 a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou dois protocolos facultativos. Quanto ao protocolo relativo à venda de crianças, prostituição e pornografia infantis259 este criminaliza tais actos, protegendo as crianças, independentemente do género, menores de dezoito anos dessas violações.

Não estando identificado expressamente o casamento infantil, o mesmo pode ser enquadrado na disposição do artigo 2 alínea a) do Protocolo. Segunda esta, a venda de crianças diz respeito a qualquer acto ou transação pela qual uma criança seja transferida por qualquer pessoa ou grupo de pessoas para outra pessoa ou grupo a troco de remuneração ou qualquer outra retribuição. Deste modo, considere-se que a presente disposição se enquadra na questão do dote, em que as crianças são entregues ao futuro conjugue em troca de um valor monetário ou de bens materiais.

É com esta perspectiva que, uma vez retificado o presente Protocolo, os Estados devem modificar as suas leis internas de modo a que as penalizações previstas estejam implementadas no país.

257 ZELDIN, Wendy, op. cit., p. 3

258 Nações Unidas no Brasil. ONU: Com adesão do Sudão do Sul, apenas EUA não ratificaram Convenção

sobre os Direitos das Crianças. [Em linha] Disponível em WWW:<URL:https://nacoesunidas.org/onu-com- adesao-do-sudao-do-sul-apenas-eua-nao-ratificaram-convencao-sobre-os-direitos-das-criancas/>

259 UNICEF. Protocolo Facultativo à Convenção sobre os Direitos da Criança relativo à venda de crianças,

prostituição e pornografia infantis. [Em linha] Disponível em:

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7.3 Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação

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