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1 AS PROPOSIÇÕES CURRICULARES DAS ESCOLAS DA REDE MUNICIPAL DE

1.2 Críticas ao Programa Escola Plural

Em que pese a visão da Escola Plural como uma escola voltada para todos, um grupo de professores apresentou resistência em relação a essa proposta, contribuindo para reforçar a divulgação de críticas que se espalharam por toda a cidade, seja pelos meios de comunicação, pela política de oposição ao partido do governo ou por parte das comunidades escolares. Tanto as críticas como a resistência de alguns professores acabaram por prejudicar a imagem do programa. Na avaliação metodológica realizada pelo Game, cuja coordenação geral coube a Ângela Dalben, constatou-se que “as famílias não participam efetivamente da construção do projeto pedagógico. Não há canais estabelecidos para que isso aconteça” (MAZONI, 2003, p. 97).

Com base no estudo mencionado, pode-se afirmar que a resistência tinha origem na insatisfação dos educadores. Segundo Barreto; Mitrulis (2001), lidar com a possibilidade de não poder reprovar os alunos causava perplexidade aos professores e a sensação de perda de controle e poder sobre a situação de ensino, repercutindo em maiores dificuldades para o manejo da classe. Além disso, a progressão continuada foi considerada inapropriada, pois muitos professores concebiam a retenção como uma oportunidade do aluno aprender o que não conseguiu ao longo do ano escolar.

Segundo Dalben, "as reações foram diversas: resistência, ansiedade, insegurança, envolvimento, empenho e esperança foram sentimentos comuns entre os profissionais”. A autora afirma que

as análises efetuadas apontaram alguns aspectos presentes na prática pedagógica das escolas municipais que exigem investimento imediato por parte da SMED, porque significam dificuldades enfrentadas pelos profissionais no cotidiano de seu trabalho. [...] 1- Estruturar parâmetros curriculares básicos próprios da Escola Plural para os três ciclos de formação - esta é uma questão prioritária para a maioria das escolas. Não basta a apresentação de linhas gerais direcionadoras, como já foi proposto nos cadernos da Escola Plural. 2- A ausência de tais parâmetros tem dificultado a organização do processo de ensino, a articulação coletiva do trabalho entre ciclos e os processos de avaliação. Tem favorecido, inclusive, o retorno a uma perspectiva seriada, porque os professores têm utilizado os materiais disponíveis no mercado e, todos eles, fundamentados no modelo seriado (DALBEN, 2000, p. 118).

No desenrolar do Programa os professores optam por seguir conteúdos estabelecidos pela rede particular ou estadual de Minas Gerais, isso por não se sentirem parte efetiva na construção da proposta e tampouco se sentirem preparados para tal e com dificuldades para dela se apropriar,.

Era notável as dificuldades de alguns professores em transpor a teoria para a prática, embora todos os profissionais da 1ª a 4ª série tenham sido preparados nos fundamentos e práticas da Escola Plural uma vez que “a capacitação dos profissionais e a resolução dos problemas materiais das escolas foram considerados essenciais para o sucesso da experiência” (SILVA, 2002, p. 16).

Passados aproximadamente cinco anos da implementação, as escolas plurais ainda cometiam equívocos de interpretação da proposta e outras vivenciavam lutas de concepção no interior das escolas. O relatório de avaliação de Ângela Dalben mencionou que “um número bastante significativo de professores acreditou na proposta e se esforçou para mudar a prática pedagógica como um todo, apesar das resistências de alguns” (DALBEN, 2001, p. 59).

Pode-se atribuir às resistências dos professores, coordenadores e até mesmo de gestores escolares às seguintes hipóteses: falta de formação continuada mais focada nas dificuldades metodológicas do programa; questão político-ideológica em relação ao partido político que governava e, por fim, dificuldade em estabelecer equilíbrio entre o

respeito, a autonomia e a diversidade, além do fato de não se conseguir obter a unidade numa rede tão extensa como a de Belo Horizonte.

Em 2002, a SMED fez uma consulta aos professores, através de um questionário (Anexo 1), para saber o que pensavam sobre a Escola Plural e avaliar a questão curricular. As informações obtidas se aproximaram daquelas levantadas na pesquisa desenvolvida pela Universidade Federal de Minas Gerais, anteriormente mencionada. A concepção de escola como espaço de transmissão de conhecimento ainda era bem forte no interior das salas de aula.

Dalben continua avaliando que

todos consideram que é indispensável cuidar dos conteúdos escolares e se apoiam nos Programas do Estado e nos PCNs [...]. Acham, entretanto, que trabalhar só com projetos é limitar os horizontes dos alunos: é preciso garantir os conteúdos escolares “universais” (DALBEN, 2000, p. 104).

Mazzilli (2000) afirma que a Escola Plural não foi bem compreendida por muitos professores que se sentiram despreparados diante das mudanças. A implantação gradativa teria, segundo a pesquisadora, oferecido melhores condições de discussão e reflexão aos profissionais. Para aceitar as mudanças e, consequentemente, alterar sua prática, os professores precisariam compreender muito bem a proposta.

Como não houve adesão pela maioria do professorado, o êxito da Escola Plural ficou comprometido. Mazzilli (2000, p. 119) reflete

a adesão é facilitada quando se tem um suporte institucional que garanta condições necessárias à implementação do plano e uma intervenção planejada, deliberada e contínua do agente inovador, ou seja, dos responsáveis pela liderança do processo. Para isso há necessidade de empenhar-se na formação específica desse professor, considerando, inclusive, que esse processo não é simples, porque, de maneira geral os professores já possuem uma prática cultural sedimentada e nela se apoiam resistindo muitas vezes à inovação.

Um dos aspectos que mais dificultaram a ação docente na proposta da Escola Plural foi a organização por ciclos de formação, que implica em trabalhar com uma diversidade cultural e de ritmos muito diferenciados dos alunos.

Outra questão diz respeito aos processos avaliativos. Na proposta da Escola Plural avaliar toma um caráter processual, parte integrante do processo de ensino e

aprendizagem. No entanto, embora tenha sido um elemento de dificuldade, Mazzilli (2000, p. 122) afirma que esse foi um momento propício para que ”os professores pudessem romper com uma prática de avaliação tradicional, classificatória e mantenedora de diferenças sociais”.

Mazzilli (2000) afirma que professores e estudantes aceitaram e compreenderam a necessidade de formas de avaliação menos repressoras, embora tenha havido dificuldades para abandonar elementos sempre presentes na prática tradicional de avaliar, práticas essas que conferiam aos professores o controle sobre os alunos e, sem os quais, muitos se sentiriam perdidos.

É certo que, nesse esforço, seria necessário também o envolvimento dos pais ou responsáveis pelos alunos, que demonstraram opiniões contraditórias sobre a avaliação dos discentes, acostumados que estavam com as avaliações mensais, com as notas e boletins. Mazzilli (2000), entretanto, em suas pesquisas, observa que o envolvimento dos pais com a escola é muito restrito, o que dificultou a compreensão da proposta e suas mudanças.

O lançamento do caderno Referenciais Curriculares, elaborado pela equipe técnica da SMED, mostra a preocupação da mesma com a reação do corpo docente em relação à proposta da Escola Plural. Várias questões foram levantadas nos encontros de Coordenadores Pedagógicos escolares organizados pela Rede, e até mesmo nos espaços mais amplos da cidade, pela comunidade. A reação veio após vários experimentos e após constatar-se a necessidade de responder à insatisfação de professores, pais e alunos, adequando o projeto às demandas do educando. Em síntese,

as experiências históricas do currículo único, mínimo e obrigatório são inócuas para o equacionamento das situações próprias de cada escola. Hoje, no Brasil, não há mais a proposta de um currículo nacional único e obrigatório: o próprio MEC tem como proposta parâmetros. [...] A Escola Plural parte da ideia de que os processos escolares são diversificados, conforme a comunidade escolar, de acordo com as condições dos educandos e as condições de trabalho na escola, por isso propõe referenciais curriculares que orientem a construção da proposta curricular em todos os níveis e modalidades de ensino. Diante da demanda dos profissionais e comunidade por mais clareza na proposta curricular de cada escola, consideramos de fundamental importância, centralizar o processo de construção da proposta curricular no interior da escola de modo que a mesma se veja responsável por pensar e produzir o seu próprio currículo e sistematizar parâmetros gerais da Rede (SMED, 2003, p. 07-09)

O Desafio da Qualidade passa a orientar a gestão educacional de Minas Gerais e as metas estabelecidas pelo programa atribuem especial importância à participação da comunidade escolar para o alcance da qualidade educacional pretendida.

O programa relacionou como metas de gestão: manutenção das conquistas; universalização do ensino médio; ampliação da duração do ensino fundamental; intensificação das ações dirigidas ao atendimento de jovens e adultos, com ênfase na alfabetização e na formação para o trabalho e melhorar as condições para elevação da qualidade da educação (CARVALHAES, 2014).

Com essa base, os Referenciais Curriculares da Escola Plural chegaram com uma proposta dinâmica e com elementos comuns a todas às escolas da Rede. Esse aspecto possibilitou a incorporação de elementos particulares da realidade de cada instituição escolar.

A evolução das discussões sobre a política educacional do município culminou, portanto,em novas demandas de toda a comunidade escolar, em novas orientações na perspectiva do trabalho pedagógico e nas propostas curriculares da RME/BH. A transição entre a proposta Plural e as atuais Proposições Curriculares é o tema do próximo tópico desta pesquisa.

1.3 Transição do Modelo da Escola Plural para a discussão das novas