• Nenhum resultado encontrado

1. ABORDAGEM QUALITATIVA DA PESQUISA

1.2 Critérios de escolha da pesquisa empírica

1.2.1 A escola

A pesquisa empírica deu-se no espaço de uma única escola. A restrição aconteceu em função de que o trabalho seria muito mais laborioso se fossem procuradas outras escolas, especialmente porque eu haveria de conhecer os documentos oficiais das mesmas, negociar com mais professoras a disponibilidade para a entrevista, o que acarretaria em uma demanda maior de tempo. Além disso, parti da hipótese de que, ao trabalhar com professores pertencentes a um mesmo grupo, poderiam ser gerados importantes elementos sobre a escola e o trabalho desenvolvido pelo grupo, o que, provavelmente, não aconteceria caso fossem escolhidas mais escolas, até porque, do mesmo modo, o número de entrevistas permaneceria limitado a não mais do que seis, em função do tempo que cada uma despende.

21

A escolha da escola, na qual atuam as professoras convidadas a participar da pesquisa, deu-se de maneira aleatória, obedecendo a um critério inicial, qual seja, de ser uma escola pública. Isso, em virtude de que a pesquisa que aqui é explanada é fomentada por uma instituição pública, visando, de certa forma, contribuir principalmente para esta esfera educacional. Na medida em que foram acontecendo as primeiras aproximações com a escola, começaram a se definir critérios mais claros de inclusão e exclusão da instituição, bem como das entrevistadas.

Considerei como fator importante a minha mudança de cidade, logo, o meu desconhecimento sobre a rede pública de ensino do local. Assim, o critério proximidade tomou uma proporção considerável. A escola em que foram feitas as visitas e, posteriormente, as entrevistas fica em um bairro vizinho daquele em que moro. Entretanto, cabe destacar que este não foi um elemento decisivo. A escolha da escola efetivou-se na medida em que pude analisar alguns documentos da escola: Projeto Político Pedagógico, Regimento e Planos de Estudos22.

Na análise desses documentos, pude reconhecer aspectos próximos ou que minimamente faziam referência à necessidade de valorização da experiência do aluno.

As primeiras aproximações da instituição

A conversa inicial deu-se com a vice-diretora da escola. Depois das devidas apresentações, a ela tentei explicar os objetivos de meu projeto de pesquisa e, também, fazer o pedido para que tal pesquisa pudesse ser ali realizada. Mostrando-se aberta ao diálogo, a mesma, em um clima informal, recebeu-me com entusiasmo. Logo, “sem

deixar que eu me explicasse ou me apresentasse, como eu acreditava ser o convencional, disse: – a gente sempre ajuda as meninas” (Anotação do Diário de Campo, dia 12/09/07). Dessa forma, sem muita cerimônia e até com certa pressa, ela demonstrou que por ali já passaram outras pesquisadoras, estagiárias, que também foram “ajudadas”. Embora eu me incomodasse com tal terminologia, esta era a forma com que ela entendia meu pedido de colaboração à pesquisa.

Como este contato inicial não garantia a realização da pesquisa na escola, dado que eu ainda não havia lido os documentos oficiais da mesma, meu primeiro passo foi pedir permissão para ler o Projeto Político Pedagógico e os Planos da Escola, deixando

22

Estes documentos, embora citados no decorrer do texto, não têm sua fonte explicitada na cessão de referências, pois, o nome da escola e os dados identificatórios precisaram ser mantidos em sigilo, pois houve um compromisso de anonimato devido às professoras que cederam as entrevistas.

claro que essa era uma das etapas da pesquisa. Então, fui encaminhada para conversar com a Diretora da escola23.

A leitura e análise dos documentos oficiais da escola como critério de seleção Quanto aos Documentos da escola, o objetivo de analisá-los foi de procurar neles elementos que sinalizassem o discurso de valorização da experiência. Na leitura que fiz, procurei apontar aquilo que caracterizava a instituição de modo geral: nome, localização, identificação, objetivos, contextualização e alguns excertos significativos sobre a valorização da experiência, presentes no Projeto Político Pedagógico, explicitados principalmente nos “princípios metodológicos” e no “processo pedagógico”, presentes nos Planos de Ensino.

Cabe destacar então, alguns dos trechos destes documentos, os quais sinalizam a valorização da experiência e, por conseqüência, vão ao encontro do que foi definido como critério de escolha.

Nos Planos de Estudo dessa escola, organizados para o ano de 2007, especialmente em seu Item 2, constam algumas informações sobre a “Contextualização: realidade da escola, caracterização da clientela e auto conhecimento do professor”. Ali, podem ser encontrados importantes aspectos que definem a concepção de educação, ensino e aprendizagem que a escola planeja alcançar:

O conhecimento da realidade do aluno é essencial para subsidiar o processo de planejamento numa perspectiva dialética. Devemos ter em conta o aluno real, que efetivamente está na sala de aula, que é um ser que tem suas necessidades, interesses, nível de desenvolvimento (psicomotor, sócio-afetivo e cognitivo), quadro de significações, experiências anteriores (história pessoal) sendo bem distinto daquele aluno ideal, dos manuais pedagógicos ou do sonho de alguns professores.

23

Ainda neste mesmo dia, conversei com a Diretora da escola: como segue a descrição feita no Diário de Campo: “Ao me apresentar pedi para falar um pouco sobre minha condição

ali, de forma bem rápida, pois não queria tirar-lhe o tempo. Então ela me ouviu. Falei de minha situação como aluna do curso de Mestrado em Educação, da cidade de Santa Maria e, também, de minha mudança para o município de Lajeado, em função de um concurso que fiz e passei. Expus o fato de que a análise dos documentos seria uma primeira etapa da pesquisa e que, em seguida, se possível, eu estaria realizando entrevistas com professores das quatro séries iniciais do Ensino Fundamental e duas professoras da Educação Infantil. Ela, então, mostrou-se bastante receptiva e preocupada em marcar um dia para que eu analisasse os documentos da escola. Perguntou-me, então, se para dali uma semana seria viável (?) respondi que sim e agradeci a receptividade” (Relato do Diário de Campo, dia 12/09/07).

Da mesma forma, no Projeto Político Pedagógico, especificamente no item que se refere à “Metodologia”, encontrei elementos condizentes com a necessidade de aproximar o aluno de situações que lhes sejam significativas:

Nossa proposta curricular requer um aluno que construa seus conhecimentos através da interação com o meio em que vive [...] Ensinar passa a ser um desafio. Cria-se uma nova ação docente, na qual, os professores e os alunos participam de um processo para aprender de forma criativa, dinâmica e engajadora, que tenha como base o diálogo e as descobertas. Este processo deve permitir ao professor a ao aluno aprender a aprender, num processo coletivo para produção do conhecimento. Os professores ao mesmo tempo que ensinam aprendem; os alunos, ao mesmo tempo em que aprendem podem estar ensinando. Eles são parceiros que devem buscar colaboração, cooperação e criatividade para tornar a aprendizagem mais significativa e crítica no âmbito de um contexto pedagógico democrático (p. 5 - 6).

Outra importante passagem dos documentos oficiais da escola, que sinaliza uma proposta de educação voltada para a valorização e incentivo à experiência do aluno, pode ser encontrada no Regimento escolar do ano de 2007. Especificamente no item 10.1 Metodologia de Ensino, decorrente do item 10. Processo Pedagógico:

10.1. metodologia de Ensino: A metodologia de projetos é o eixo norteador da prática pedagógica da escola. Citando Fernando Hernández (1998): ‘...um

dos atuais desafios da escola é convidar os alunos a se aproximarem de como o conhecimento é construído, social e academicamente (desde quando, por quem, com que finalidade...) e não considerar que o conhecimento é algo pré-existente e essencialista’. O planejamento por projetos pressupõe uma

mudança de postura, onde o professor deixa de ser apenas um transmissor de conteúdos prontos, transformando-se em um pesquisador e aprendiz, percebendo seus alunos como sujeitos sociais. O professor assume a coordenação do processo sem impor a sua lógica, possibilitando que o aluno tenha acesso às diferentes formas de construir conhecimento, rompendo assim com a dicotomia entre “aprender para a escola” e “aprender para a vida”, evitando que os alunos entrem em contato com conteúdos de áreas de conhecimento de forma abstrata e descontextualizada.

Mais uma vez, é reiterada, nos documentos oficiais da escola, a centralidade do aluno e a necessidade de se desenvolver um trabalho de ensino e aprendizagem que considere ambos, professor e aluno, como sujeitos pensantes e aprendentes do processo educativo. A perspectiva investigativa presente na organização por projetos é assumida como postura didática organizacional da escola, apresentando-se como importante a idéia de valorização do aluno, daquilo que faz parte de sua vida. É uma escola que se preocupa em “aprender para a vida”. Dessa forma, a escola cumpriu mais um critério de seleção, ou seja, o de que a instituição escolhida deveria supor, em seus documentos

oficiais, a valorização do aluno, de sua vida, daquilo que lhe significa, que é parte de suas experiências.

1.2.2 As professoras

Após ter sido feito um mapeamento inicial dos pressupostos que subsidiam os ideais de prática educativa na escola, busquei investigar a formação acadêmica das professoras atuantes nos primeiros anos de escolarização das crianças, especificamente aquelas que trabalham com a faixa etária entre 4 e 10 anos, dada a inquietação geradora da pesquisa. Outro critério foi a formação inicial no curso de pedagogia, o que todas possuem.

Foram entrevistadas seis professoras24: duas delas atuantes na educação da criança entre 4 e 6 anos, e as outras quatro professoras atuantes nos quatro anos iniciais do Ensino Fundamental25. Com o objetivo de preservar ao máximo a identidade das entrevistadas nomeei-as, ficticiamente, como: Maria, Ana, Lúcia, Carla, Claudia e Rita (ordem crescente de atuação nos diferentes níveis da escola).

Em uma das reuniões pedagógicas da escola agendei minha visita. Foi o primeiro contato com as professoras. Das seis professoras que eu pretendia entrevistar, três encontravam-se no dia (Ana, Claudia e Rita). Conversei com elas, apresentei o projeto e não tive resistência para marcar dia e horário, apesar de elas terem pouco tempo. A sugestão foi de que realizássemos as entrevistas no horário da Educação Física, e assim aconteceu. Com as demais professoras, que não estavam na reunião (Maria, Lúcia e Carla), tive alguns imprevistos, muito embora isso não tenha comprometido a realização das entrevistas.

Carla, professora da segunda série, resistiu bastante para conceder a entrevista. De uma forma ou outra encontrava maneiras de justificar a inviabilidade de nosso encontro, sugerindo-me, inclusive, que eu entrevistasse as professoras com quem eu trabalhava em minha escola. Então, mais uma vez expliquei a ela que todas as professoras colaboradoras deveriam fazer parte da mesma escola e que a sua participação seria muito importante. Novamente, a professora justificou não ter horário: “– Não gosto de

deixar eles (alunos) sozinhos na educação física”. Então sugeri que

24

A opção por entrevistar estas profissionais deu-se, principalmente, por serem pedagogos e por representarem a classe de profissionais que têm o primeiro contato educacional no processo de escolarização das crianças.

25

Neste momento não estamos fazendo referência ao Ensino Fundamental de nove anos, ainda nos pautamos na organização do Ensino Fundamental de oito anos. Muito embora, a escola da qual fazem parte as professoras entrevistadas esteja organizada no modelo de Ensino Fundamental com nove anos.

fizéssemos fora do horário das aulas, até mesmo fora do espaço da escola, ela mais uma vez justificou: “ – Eu não posso, à tardinha é o único horário que posso

ficar com meu marido, minha família...”. Quase sem argumentos, eu já comecei

a pensar em outro professor. Foi quando ela disse: “–Sexta-feira às 10 horas” (Diário de Campo, dia 27/11/2007). Prontamente confirmei e, assim, realizamos o encontro no dia 30/11/2007.

Com Maria (professora da turma de educação infantil do turno da tarde), entrei em contato via telefone. Inicialmente com certa resistência, ela atendeu-me, escutou minha apresentação, meu objetivo em estar lhe ligando e, ao final, pediu para que eu ligasse em outro momento para marcarmos a data. Em um segundo telefonema, ela mostrou-se mais aberta ao diálogo, deixando previamente agendados o dia e o horário e dando-me dicas sobre o endereço de sua casa. E, finalmente, em uma terceira ligação, já com um ar de expectativa e curiosidade, ela confirmou o dia e o horário, dando-me, inclusive pontos de referência para que eu encontrasse sua casa.

Para finalizar, minha última entrevista aconteceu em minha casa, por ser o local mais viável para esta professora (da primeira série). Tudo transcorreu muito bem, até o momento em que verifiquei que a parte final de nossa entrevista não foi gravada, em virtude de problemas técnicos com o gravador e a fita. Entretanto, a professora disponibilizou-se para, mais uma vez, realizar a segunda parte da entrevista, as últimas questões.

Cabe aqui destacar, além disso, o fato de que, após serem entrevistadas, todas as professoras preocuparam-se em ouvir suas vozes no gravador. Queriam ouvir-se, faziam sempre uma imagem pejorativa de seus tons de voz e, também, alegravam-se ao se ouvirem. Outra situação interessante que revelava satisfação por parte das professoras era o momento em que eu levava até elas as entrevistas transcritas. Com esmero elas queriam ver, ler26. Sentiam-se “importantes”.