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Da modernização à transformação com a II Guerra Mundial

2 A REVISÃO DE TEORIAS E A EXPLICITAÇÃO DE CONCEITOS

3 A DINÂMICA DAS TRANSFORMAÇÕES SOCIOESPACIAIS E A EVOLUÇÃO DOS ESPAÇOS PÚBLICOS DE LAZER NATALENSES

3.1 O contexto da evolução dos espaços públicos de lazer natalense

3.1.2 Da modernização à transformação com a II Guerra Mundial

A partir de 1920, ocorreu um processo de modernização no estado do Rio Grande do Norte, com a construção de açudes, estradas de rodagem e ferrovias que repercutiu em Natal. A população da capital aos poucos aumentou, e os bairros da Cidade Alta e Ribeira aumentaram seu adensamento populacional. O bairro do Alecrim intensificou seu processo de

formação e a Cidade Nova se constituiu em um atrativo para as elites natalenses, que aí passaram a construir suas residências (LIMA, 2001).

Em 1929 foi elaborado mais um plano para Natal, o Plano Palumbo ou Plano Geral de Sistematização da Cidade, que evocou os princípios urbanísticos enfatizados internacionalmente pelo “Movimento Cidade Jardim”, cujos princípios artísticos contemplam o desenho de praças, ruas e conjuntos de edifícios, e valorizavam o espaço público e a preservação do que já existia. Isso resultou em modernização e embelezamento da cidade e o ajardinamento das praças. Esse plano incluiu também parte da ordenação do bairro do Alecrim.

O Plano Palumbo determinou, ainda, a ordenação da estrutura viária do tipo xadrez – ruas principais e ruas secundárias com quarteirões simétricos. Esse plano não foi implementado em sua totalidade. Provavelmente as obras de abertura e alargamento de ruas, avenidas e praças executadas no período faziam parte dele. Nele existia a proposta de um grande parque “cidade recreio”, porém, esse equipamento de lazer não foi implantado (LIMA, 2001).

Na época, a Praça Pedro Velho, que já se constituía em importante área de lazer da cidade, sofreu uma primeira grande intervenção. Sua área foi dividida em três partes distintas: um parque infantil, uma área de esportes e a área de passeio. O parque infantil era subdividido em duas áreas com equipamentos de madeira: uma destinada para meninos (pintada de azul) e outra destinada para meninas (pintada da cor vermelha). Esse espaço só era aberto para os usuários nas tardes dos domingos. Nesse período, foi criada a Liga Desportiva de Basquete e Voley, que realizava seus jogos nessa praça (BARBOSA,1995).

Quanto às práticas desportivas desenvolvidas no país nessa época, observa-se que existia uma importação das práticas inglesas pelas elites, destacando-se o futebol. O crescimento do interesse da população brasileira pelo futebol, dinamiza a construção de

estádios para a prática e assistência desse esporte que vai se tornando espetáculo (REIS apud BRUHNS, 2000). Em Natal, foi construído, então, o primeiro estádio de futebol, o Juvenal Lamartine, no bairro de Tirol. Durante muitos anos, foi o local onde se disputavam as partidas mais importantes nessa capital.

No Brasil, com a Revolução de 1930, a idéia de planejamento nacional começou a se afirmar. A intervenção no espaço urbano, que até então se dava por projetos isolados, passou, a partir daí, a abordar a cidade como um todo.

No Rio Grande do Norte a produção do algodão encontra-se em alta. Nesse período a oligarquia algodoeiro-pecuária tem a ampliação de sua base econômica e expande sua base material apropriando-se de terras ao redor da cidade do Natal, deixadas sem uso em prol da especulação futura (CLEMENTINO,1995).

Porém, em Natal percebe-se um atraso em relação ao crescimento de outras cidades nordestinas. Na infraestrutura, merece destaque a implantação da primeira linha telefônica da cidade e a construção, em 1933, da praça Carlos Gomes, no Baldo, área próxima ao centro da cidade em direção ao Alecrim.

Em 1935 foi contratado o Plano de Expansão de Natal ou Plano Geral de Obras, ressaltando as idéias de intervenção estatal para a expansão da cidade. Previa esse Plano dotar a cidade de bairros operários na sua periferia, o que reforçava a segregação socioespacial, enquanto revalorizava os bairros já existentes com parques, praças e canais. Nesse sentido, foi construído apenas um parque destinado ao lazer em torno da lagoa Manuel Felipe, hoje Cidade da Criança, juntamente com um projeto de captação de águas pluviais, cujas canalizações desaguavam nessa lagoa, e, no Alecrim, ocorreu a construção da praça Gentil Ferreira importante área de lazer desse bairro (MIRANDA, 1999).

O três planos até então implementados em Natal se fundem nessa proposta e, durante aproximados trinta anos, não ocorreu a implementação de nenhum outro. Porém, a partir de 1942, a cidade sofre grandes intervenções devido à entrada do Brasil na II Guerra Mundial.

A influência da implantação, em Natal, de uma base aérea de operação militar na II Guerra Mundial, devido ao acordo entre o Brasil e os Estados Unidos firmado em 1943, apresentou-se de crucial importância no seu processo de expansão urbana, possibilitando o crescimento do comércio, indústria e serviços, servindo de atrativo para migrantes do interior do estado do Rio Grande do Norte, bem como dos estados vizinhos. Para Clementino (1995, p. 346): “[...] a partir desse evento a capital estadual concentra população e desenvolve atividades terciárias aparentemente compatíveis com situações geradoras de desenvolvimento urbano”.

A população de Natal, modificou, na época, sua rotina de lazer, sendo oferecidas festas e bailes para o entretenimento das tropas aqui alocadas. Foram inaugurados inúmeros novos bares, restaurantes, bordéis e clubes, passando a cidade, abruptamente, de uma vida pacata e provinciana para um movimento de metrópole. As principais ruas e praças ficavam repletas de pessoas de várias nacionalidades, como também de outras partes do país. Também, foram exibidos em praça pública na Explanada Silva Jardim na Ribeira e em frente ao Hospital Luís Soares no Alecrim, alguns filmes pelo Comitê de Coordenação Interamericana, para agradar a população local e entreter os militares (BEZERRA, 2002).

Entre as décadas de 1940 e 1950 não se executaram, na cidade, planos urbanísticos, e o padrão espacial de expansão anterior se consolidou com a construção da rodovia Parnamirim Road, que ligava Natal à Base Aérea norte-americana em Parnamirim, como já previa o Plano da Cidade Nova (LIMA, 2001).

A rodovia asfaltada Natal-Parnamirim (atual Hermes da Fonseca/ Salgado Filho /BR- 101) e a avenida Alexandrino de Alencar, perpendicular à “ Pista”, via de acesso à Base Naval

do Alecrim, ambas construídas pelos americanos, e as construções de vilas militares para abrigar militares brasileiros aqui chegados nos bairro de Tirol, Petrópolis e Alecrim, foram obras marcantes desse período. Também, na época, foi construída a Antiga Base de Hidroaviões de Natal, na margem direita do estuário do Potengi/Jundiaí, conhecida como Rampa. Depois da Segunda Guerra essa área foi transformada em um clube social e cassino dos oficiais das forças armadas. Essas obras consolidam, assim, o desenho da expansão urbana pré-existente.

Enquanto isso, a Leste da cidade, a população pobre concentra-se nas Rocas, formando um bairro com residências precárias paralelas à praia, e em 1946, inicia-se a construção da Avenida Circular, partindo da Praia do Meio rumo ao Forte dos Reis Magos, fazendo surgir o Bairro de Santos Reis. Nesse período a população pobre também aumentava no bairro do Alecrim (CASCUDO, 1999).

Os loteamentos realizados em Natal, na época, estavam distribuídos da seguinte forma: nas áreas ricas Lagoa Nova, Tirol e Petrópolis; e nas áreas pobres Alecrim, Quintas, e Lagoa Seca. Os grandes loteamentos populares concentravam-se no Alecrim. Foram iniciadas, nos loteamentos cujos preços eram mais acessíveis, as construções de moradias financiadas por meio da Fundação da Habitação Popular (FUNDHAP).

O rápido crescimento provocado pelo grande número de migrantes, que eram atraídos pelo capital estrangeiro que circulava na cidade, durante a Guerra, trouxe como conseqüência, também, o esgotamento da capacidade de abastecimento de água, energia e alimentos. Segundo Clementino (1995), existia um clima de falso progresso na cidade na época, pois as vantagens financeiras, proporcionadas pelo fato de Natal haver sido centro de fluxo durante a Guerra, concentravam-se nas mãos de poucos, porém, isso deixou marcas indeléveis no processo de modernização da cidade.

Com o fim da II Guerra, a crise se instalou em Natal, o desemprego tornou-se alto, e as atividades econômicas urbanas se retraíram, o que demonstra a fragilidade dos processos econômicos artificiais e impostos, que não contemplam as potencialidades locais e os impactos de suas implantações.

Na década de 1950-60, obras com financiamentos internacionais são incorporadas à cidade que ganha seu primeiro conjunto habitacional, recebendo o nome de “Cidade da Esperança”, construído com financiamento da agência norte-americana United State Aid for Developement (USAID). Nesse período foram construídas, ainda, a Estação Rodoviária Presidente Kennedy na Ribeira e o Hotel Reis Magos na Praia do Meio (LIMA, 2001).

Surgiram os primeiros assentamentos denominados oficialmente de favelas na cidade – Mãe Luiza e Brasília Teimosa – ambas nas proximidades das praias, formadas pela população pobre já residente na cidade, e por retirantes vindos do interior do estado, devido às secas.

No contexto brasileiro, no que se refere às práticas do lazer e da recreação, nesse período, reforçou-se o discurso nacionalista da disciplina da moral e do civismo como componente da ideologia esportiva (LINHARES, 2001). Isso se reflete nessas práticas também no Rio Grande do Norte. No âmbito do lazer nacional um fato relevante foi o surgimento das entidades semipúblicas, o Serviço Social do Comércio (SESC) e o Serviço Social da Indústria (SENAI), oferecendo atividades para os trabalhadores desses setores da economia, que depois também tiveram suas sedes implantadas em Natal.

Em 1960, assume a prefeitura da cidade de Natal um governo de esquerda que, tendo um caráter popular e democrático, estimula a formação de comitês por bairros, integrados por pessoas das classes de menor poder aquisitivo, desapropria lotes de terra na orla marítima, declarando-as de utilidade pública para regularizar a então favela denominada Brasília Teimosa, e inicia um programa de casas populares (LIMA, 2001).

Ainda segundo Lima (2001), quanto aos espaços públicos de lazer, a prefeitura, investindo em obras para este fim, construiu uma concha acústica na praça André de Albuquerque, um anfiteatro e uma galeria de artes com exposições permanentes, e fundou, no Alecrim, o Teatrinho do Povo. Na área correspondente às quadras de esporte na praça Pedro Velho construiu, em 1963, um ginásio de esportes, coberto com quadra poliesportiva e capacidade para quatro mil pessoas, o que reduziu em 1/3 a área total da praça.

Durante esse período, o processo de urbanização repercutiu os impactos das obras construídas no período da II Guerra Mundial que consolidou as propostas básicas dos planos urbanísticos anteriores e definiu um dos principais eixos de expansão da cidade, com a construção da “Parnamirim Road”. Quanto aos espaços de lazer, o que se percebe foi uma mudança de intenção nas intervenções feitas na cidade, que durante a II Guerra eram voltados para a população estrangeira e com caráter privado, compostos de entretenimentos com valores exógenos e eventuais, passando, no início dos anos de 1960, a se destinar ao lazer da população local, com ênfase nas atividades esportivas e voltados à arte e à cultura potiguar.