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6. DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA NACIONAL

Capítulo 6

6. DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA BIOTECNOLOGIA

ato deliberativo da Anvisa expedido com vistas ao atendimento do art. 229 C da Lei nº 9.279/96, no qual a Agência examina o objeto do pedido de patente. Entretanto, o art. 4° da mesma lei determina que após recebimento dos pedidos de patente encaminhados pelo INPI, a Anvisa analisará tais pedidos à luz da saúde pública, mediante decisão consubstanciada em parecer técnico emitido pela unidade organizacional competente no âmbito da Agência. Na prática a figura da anuência prévia como ato deliberativo e ao mesmo tempo obrigatório em casos de interesse da saúde pública, condiciona a inovação a um duplo exame tornando o prazo de análise aumentado e distanciando a inovação do mercado e da sociedade (FORMENT, 2010;

PADRÓN; DOMONT, 2014)

Uma outra questão que interfere na produção de inovação biotecnológica no Brasil é como evitar a biopirataria garantindo a exploração da biodiversidade nacional com repartição de benefícios e preservação cultural e do meio ambiente frente a Convenção sobre Diversidade Biológica e a Medida Provisória 13.123/15 (BRASIL, 2000, 2015). No caso de a matéria pleiteada como inovação se referir a um componente do patrimônio genético nacional - GH ou associado ao conhecimento tradicional -ATK o procedimento para solicitar proteção dessa inovação deve atender aos seguintes requisitos: o depositante deve fornecer a origem do GH e/ou ATK acessado, providenciar o numero da autorização de acesso fornecido pelo Conselho de Gestão do Patrimônio Genético se a Patente foi depositada após 30/06/2000 e ainda atender o solicitado nos Anexo I e II da Resolução nº 69/2013 (Formulário FQ011- Declaração de Acesso ao Patrimônio Genético) e (Formulário FQ012- Declaração Negativa de Acesso ao Patrimônio Genético).

Essas exigências objetivam a proteção do material genético nacional, entretanto dificultam o avanço das pesquisas no tempo adequado para sua melhor utilização pela sociedade. Ainda, quando a invenção vem de células humanas a concessão ou não do depósito de Patente no Brasil considera os aspectos morais/éticos explicitados no artigo 18 I da LPI, em conjunto com a Lei de Biossegurança. Entretanto, as lacunas legais inviabilizam o desenvolvimento da inovação na área, visto que não havendo regramento, a pesquisa fica estagnada (PADRÓN; DOMONT, 2014). Um exemplo disso é a proteção intelectual das tecnologias envolvendo células tronco. A Lei de biossegurança permite o uso terapêutico e de pesquisa para embriões provenientes de fertilização invitro (FIV), mas é silente com relação à patenteabilidade (BRASIL, 2005). Da mesma forma, a medicina regenerativa apresenta hoje grande potencial terapêutico, e o Brasil tem grupos de pesquisa consolidados nessa área (THORSTEINSDÓTTIR, 2010). Porém, enquanto o Escritório de Patentes Europeu (EPO) considera que tecnologias envolvendo essas células não são passíveis de proteção patentária

porque a destruição de um embrião é imoral, o Escritório de Patentes Americano (USPTO) não entende dessa forma, pois sustenta que questões morais não devem ser consideradas na analise da concessão de Patentes. Nesse contexto, uma definição legal brasileira positiva permitiria o avanço tecnológico necessário para atender as demandas sociais (DE RASSENFOSSE et al., 2013).

Algumas questões permanecem em aberto acerca da aplicação do artigo 18 inciso I da LPI e da Lei de Biossegurança (artigos 5° e 6°), como o Artigo 5° parágrafo 3 que determina a proibição de comercialização das células tronco embrionárias. Por analogia pode-se supor que o processo de cultivo, de obtenção ou uso ou de células fetais ou de células tronco embrionárias humanas que foram obtidas a partir da etapa de blastomero/blastocisto do desenvolvimento embrionário de ovócitos fertilizados de FIV são patenteáveis. Porém, não há determinação legal expressa. Ainda, composições contendo células tronco embrionárias humanas ou células fetais ou processos que geram células diferenciadas assim como outros processos e produtos obtidos a partir dessas células não são contempladas com dispositivos legais específicos que regulem sua manipulação.

Com relação às quimeras, o Artigo 6º da Lei de Biossegurança diz que clonagem humana é proibida, dessa forma, pode-se pressupor que, processo de cultivo, de obtenção ou uso ou de células tronco embrionárias humanas que foram provenientes de somatic cell nuclear transfer - SCNT não são permitidos. Também a patenteabilidade de invenção relacionadas a xenotransplantes, patenteabilidade de produtos e processos que envolvam tecidos de doadores mortos, ex: arcabouço de colágeno.

No Reino Unido existem cláusulas de moralidade mas o entendimento acerca desta matéria se baseia na distinção ente celulas toti e pluripotentes, de forma que a linhagem de células tronco embrionárias são patenteáveis. Na Alemanha a legislação pertinente é considerada a mais restritiva da Europa, pesquisa e patente com células tronco embrionárias é permitida desde que sejam usadas células tronco pluripotentes obtidas a partir de linhagens de células importadas. Nos EUA, no Canadá e na Austrália a legislação não menciona aspectos morais da patenteabilidade das invenções. Linhagens de células tronco embrionárias são patenteáveis. Já no Japão existe o aspecto moral na lei de patentes, mas com relação as tecnologias envolvendo ciência e tecnologia, são considerados bem liberais (SHYH-JEN WANG, 2013)

O advento da biologia sintética sucita questões não contempladas na legislação nacional vigente (IWE, 2012; PADRÓN; DOMONT, 2014). A biologia sintética, ciência que visa a engenharia de novos componentes biológicos e organismos e o redesenho dos organismos já

existentes, podendo misturar engenharia genética, química sintética, engenharia de metabolismos e ainda envolver nanotecnologia e inteligência artificial para originar uma nova célula, conduz a uma necessária adequação legal quando a questões éticas e comerciais sob o risco de paralizar a pesquisa nacional e/ou por em risco a segurança social (PADRÓN;

DOMONT, 2014; ROBERTSON, 2010; SILVEIRA, 2014).

Ainda há que ser discutido na legislação nacional o paradigma da descoberta versus invenção (SILVEIRA, 2014). Com relação a patenteabilidade de todo ou parte de seres vivos

“isolados da natureza” o limite da distinção entre o que é considerado natural e o que é “isolado ou sintético”, o que é descoberta e o que é invenção fica a cargo de cada país. A diretiva Européia 98/44 nos artigos 5.2 e 5.3 determina que um elemento isolado do corpo humano ou produzido por meio de um processo técnico, incluindo a sequência integral ou parcial de um gene, pode constituir uma invenção patenteável, ainda que a estrutura desse elemento seja idêntica a um elemento natural e desde que a aplicação industrial de uma sequência integral ou parcial de um gene seja descrita no pedido de patente. Neste exemplo reconhece-se claramente a falta de novidade do material, pois ele pode até ser idêntico ao elemento natural, e atribui-se um impacto predominante à utilidade. Não importa que o gene já exista na natureza; o que importa é que ele e a sua função tenham sido identificados sob argumento de que a informação genética primária deve permanecer disponível em base de dados públicas (CONTRERAS, 2011; SILVEIRA, 2014).

Esta discussão se insere na esfera da farmacogenômica, medicina personalizada e acesso ao diagnóstico de doenças. A farmacogenética ou farmacogenômica (descobertas de associações de doenças e genes (haplótipos, polimorfismos) é importante para direcionar tratamentos como testes de diagnóstico baseados em microarranjos de DNA que poderiam se tornar inviáveis devido ao grande número de licenças. A questão é controversa, entretanto, a legislação nacional não pode permanecer omissa (OVERWALLE, 2009; SILVEIRA, 2014;

WORLD BANK, 2014)

Com relação a interação academia e indústria em parcerias público-privada, o papel das universidades tem mudado. Não basta gerar conhecimento e recursos humanos, a universidade virou também uma fonte de inovação, a geração de inovação tecnológica que se transforma em riqueza econômica. Essa fonte de inovação precisa melhor utilizar as ferramentas oportunizadas atravéz da Lei de Inovação, no sentido de cada vez mais aproximar o setor acadêmico das empresas buscando unir esforços para um desenvolvimento tecnológico comum. O setor público tem sido o grande motor gerador do conhecimento que fundamenta a pesquisa e desenvolvimento e a inovação no setor privado. O sequenciamento de genomas, a genômica

comparativa, farmacogenômica, metabolômica, metagenômica e pesquisas com células tronco implicam em muita incerteza e alto custo. Em função disso, a industria passa a buscar out-sourcing para realizar pesquisa conjunta nas universidades (SILVEIRA, 2014; WORLD BANK, 2014).

Nesse contexto tramitam nas esferas competentes duas propostas de mudança na LPI brasileira que projetam impactos na indústria biotecnológica. O Projeto de Lei de autoria do Deputado Mendes Thame (PL n°4961 de 2005), que visa alterar o Artigo 10 inciso IX da LPI e permitir o patenteamento de moléculas isoladas, em seu estado natural, e de estender a proteção dos organismos geneticamente modificados para qualquer organismo e não somente os “micro-organismos”, como definido no parágrafo único do artigo 18 da LPI em vigor (THAME, 2005); e o Projeto de Lei de autoria do deputado Newton Lima Neto (PL n°5402 de 2013), que visa não alterar o Artigo 10 inciso IX da LPI e o artigo 18 no que tange a proteção de matéria isolada da natureza e a proteção de OGM e inserir disposições TRIPs – na LPI alterando a redação dos artigos 10,13,14,31,195,e 229-C. Dessa forma, pode-se entender que no decorrer da última década o desenvolvimento da ciência nacional aguarda uma decisão governamental que a conduza (NEWTON LIMA, 2013).