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2.3. Poderes públicos de autoridade da Polícia Municipal

3.1.2. Do Princípio da Legalidade

Após termos abordado a questão da prossecução do interesse público pela AP e de termos concluído que uma das caraterísticas desse interesse público é o facto de estar previsto em lei, vamos agora precisamente debruçarmo-nos sobre esse aspeto legal, ou

193G

OMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA,Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª Edição

Revista, 2010, op. cit., p. 796.

194M

ANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial…, op. cit., p. 210.

195Idem., p. 211. Para um estudo mais aprofundado sobre este tema da prossecução do interesse público

atividade na policial, veja-se o mesmo autor e obra, pp. 210-214.

196M

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seja, sobre o princípio da legalidade que abrange toda a atividade da AP, na qual se inclui também, como já sabemos, a polícia municipal.

Uma vez mais referimos o art.º 266.º, n.º 2 da CRP para refletirmos sobre a expressão ali constante de que “os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei”. Daqui resulta o princípio da legalidade, “segundo o qual nenhum órgão ou Agente da AP tem a faculdade de praticar atos que possam contender com interesses alheios senão em virtude de uma norma geral anterior”197.

Nesta perspetiva, o princípio da legalidade, corolário do Estado de Direito, apesar de funcionar também como um limite da atuação da AP, ao permitir-lhe fazer apenas o que está na lei, obriga que a AP e a Polícia em particular apenas pode atuar com fundamento na lei e nos limites por ela impostos, constituindo a lei o fundamento da ação na proteção do interesse público e dos direitos e deveres dos cidadãos e que a Polícia está, por maioria de razão, obrigada a cumprir e fazer cumprir. O princípio da legalidade diz-nos o que a AP deve ou pode fazer198.

As principais funções hoje desempenhadas pelo princípio da legalidade são, por um lado, procurar assegurar o primado do poder legislativo sobre o poder administrativo e por outro, garantir os direitos e interesses dos particulares199.

A Polícia, no âmbito das suas funções de AP, “está obrigada a respeitar e a prosseguir todo o bloco da legalidade – que se afirma como fundamento, fim e limite de toda a sua atuação –, cuja dimensão funcional e material inclui a cláusula geral de

polícia”200.

MARCELO REBELO DE SOUSA E ANDRÉ DE MATOS referem que, ancorado ao princípio da legalidade, está a margem de livre decisão administrativa que consiste num “espaço de liberdade da atuação administrativa conferido por lei e limitado pelo bloco da legalidade, implicando, portanto, uma parcial autodeterminação administrativa”201

. Segundo os mesmos autores, esta margem de livre decisão integra duas formas: a

discricionariedade e a margem de livre apreciação com fundamentos e

consequências idênticas202.

197M

ARCELLO CAETANO, Manual de Direito Administrativo – Tomo I, 10.ª Edição (Reimpressão), (Coimbra: Almedina, 1980), p. 30.

198

DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, op. cit., p. 42.

199J

OÃO CAUPERS,Introdução ao Estudo do Direito, op. cit., p. 50. 200M

ANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial…, op. cit., p. 186.

201

MARCELO REBELO DE SOUSA e ANDRÉ DE MATOS, Direito Administrativo Geral, op. cit., p. 180.

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A discricionariedade consiste numa liberdade conferida por lei à administração para que esta escolha entre várias alternativas de atuação juridicamente admissíveis, que pode ser a escolha entre agir e não agir, ou na escolha de uma entre várias formas de atuação, mas sempre à luz dos limites jurídicos aplicáveis203.

A margem de livre apreciação resulta da atribuição da lei numa liberdade na

apreciação de situações de facto que dizem respeito aos pressupostos das suas decisões e não, expressamente, como sucede na discricionariedade, de uma escolha entre várias alternativas admissíveis204. Aqui relevam-se os conceitos indeterminados e que se possa considerar que para um caso concreto haja mais que uma solução possível ou, pelo menos que haja dúvidas acerca de qual é a tal solução, justificando-se assim a margem de livre apreciação da AP205 mas sempre de acordo com o estipulado legalmente.

O princípio da legalidade abrange não apenas o respeito da lei, mas a subordinação da AP à Constituição206, à lei ordinária, aos regulamentos, aos direitos resultantes de contrato administrativo e de Direito Privado, de atos administrativos constitutivos de direitos aos princípios gerais do direito, bem como do direito internacional que vigore no nosso país e qualquer violação por parte da AP desta normas ou atos, implica violação da legalidade, logo ilegal207.

Uma das exceções que se aponta ao princípio da legalidade é o chamado estado

de necessidade justificante 208 que é geralmente entendido como circunstância excecional segundo a qual determinado comportamento ilícito, ao ser adotado mediante certas fundamentações, essa atuação que inicialmente seria ilícita, possa tornar-se lícita, ou pelo menos justificativa de um comportamento tipificado pela lei como ilegal209.

203 Idem, p. 184.

204 Idem, p. 187. Para um melhor estudo desta matéria, ver estes autores e esta obra nas pp. 187-194. Ver

também MANUEL VALENTE, Teoria Geral do Direito Policial, op. cit., pp.185-196.

205

Idem, p. 188.

206 Como nos ensina M

ANUEL VALENTE, a Constituição deve ser encarada como o primeiro código de conduta, de legalidade e de legitimidade da atividade policial, quer em relação aos direitos fundamentais em geral, como perante o direito à liberdade e segurança. In, MANUEL MONTEIRO GUEDES VALENTE,

Segurança: Um Tópico Jurídico em Reconstrução, (Lisboa: Âncora Editora, 2013), p. 26. 207

DIOGO FREITAS DO AMARAL, Curso de Direito Administrativo, op. cit., p. 50.

208 Estado de necessidade justificante, melhor conhecido por direito de necessidade, não se confunde com

o estado de necessidade desculpante, que é uma causa de exclusão da culpa e não da ilicitude, como este direito de necessidade.

209J

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