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1 DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO

3.3 EFEITO DOS RECURSOS

3.3.1 Efeito Obstativo

Um dos principais efeitos da interposição do recurso é obstar o trânsito em julgado da decisão, prolongando a litispendência. “Assim, interposto o recurso, e enquanto se aguarda o julgamento, não há como incidir sobre a decisão impugnada preclusão ou coisa julgada.”165

164 BUENO, Cassio Scarpinella. Efeitos dos recursos. In. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins (66-90). Volume 10. Coordenação de NERY, Nelson Jr; e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 69.

165 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil: Processo de conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 513.

José Carlos Barbosa Moreira166, no entanto, aduz que não basta a interposição do recurso para que se obste a consumação da coisa julgada. Para ele é preciso que o recurso tenha um juízo de admissibilidade positivo.

Se o recurso, ao ser interposto, satisfazia os requisitos de admissibilidade, e só depois veio a faltar um deles, ou vários, a interposição foi eficaz no impedir a formação da res iudicata, e apenas deixou de produzir esse efeito no momento em que se verificou o fato superveniente, por força do qual se tornou inadmissível o recurso. Se, todavia, a inadmissibilidade estava configurada ab initio, a interposição do recurso não obstou ao surgimento da coisa julgada, que (com ressalva dos casos em que a lei mesma a exclui, independentemente de recurso) remonta: a) ao próprio instante da publicação, em se tratando de decisão irrecorrível; ou b) ao instante em que, entre a publicação e a interposição, ocorreu o fato gerador da inadmissibilidade – v.g., no caso de ser admissível recurso diverso, não interposto, no termo final do respectivo prazo de interposição, escoado in albis.167

Para entendimento do que exposto é preciso posicionar-se quanto ao caráter que se reveste a decisão que realiza este exercício de admissibilidade. Para José Carlos Barbosa Moreira o juízo de admissibilidade possui sempre a natureza declaratória, de maneira que a decisão apenas a reconhece, não tendo a interposição do recurso gerado qualquer efeito, isto quer dizer que a declaração negativa teria efeito retroativo.

Positivo ou negativo, o juízo de admissibilidade é essencialmente declaratório. Ao proferí-lo, o que o faz o órgão judicial é verificar se estão ou não satisfeitos os requisitos responsáveis à legítima apreciação do mérito do recurso. A existência ou inexistência de tais requisitos é, todavia, anterior ao pronunciamento, o que não a gera, mas simplesmente a reconhece.

Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, no entanto, afirmam que a decisão que reconhece a inadmissibilidade do recurso possui uma

166 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro:

Forense, 1998. p. 262.

natureza constitutiva-negativa “em que se aplica a sanção da inadmissibilidade (invalidade) ao ato-complexo, que se apresenta defeituoso/viciado.”168

A jurisprudência nacional, no entanto, não é pacífica em adotar uma ou outra posição. Ela se coloca no sentido de que em se tratando de recurso manifestamente incabível ou manifestamente intempestivo, não terá ele o condão de obstar a coisa julgada. Nas demais hipóteses de juízo negativo de inadmissibilidade, terá o recurso obstado o trânsito em julgado.169

A jurisprudência apegou-se ao que mais palpável à operação do sistema recursal, evitando o benefício indevido do recorrente quando manifesta a inadmissibilidade recursal.

168 DIDIER, Fredie Jr., CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. Volume III. Salvador: JusPodium, 2011. p. 70.

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PROCESSUAL CIVIL - AÇÃO RESCISÓRIA - PRAZO DECADENCIAL - ART. 495 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - TERMO A QUO - TRÂNSITO EM JULGADO DA DECISÃO PROFERIDA SOBRE O ÚLTIMO RECURSO INTERPOSTO, AINDA QUE DISCUTA APENAS A TEMPESTIVIDADE DE RECURSO - PRECEDENTES - EMBARGOS REJEITADOS. I - Já decidiu esta Colenda Corte Superior que a sentença é una, indivisível e só transita em julgado como um todo após decorrido in albis o prazo para a interposição do último recurso cabível, sendo vedada a propositura de ação rescisória de capítulo do decisum que não foi objeto do recurso. Impossível, portanto, conceber-se a existência de uma ação em curso e, ao mesmo tempo, várias ações rescisória no seu bojo, não se admitindo ações rescisórias em julgados no mesmo processo. II - Sendo assim, na hipótese do processo seguir, mesmo que a matéria a ser apreciada pelas instâncias superiores refira-se tão somente à intempestividade do apelo - existindo controvérsia acerca deste requisito de admissibilidade, não há que se falar no trânsito em julgado da sentença rescindenda até que o último órgão jurisdicional se manifeste sobre o derradeiro recurso. Precedentes. III - No caso específico dos autos, a questão sobre a tempestividade dos embargos de declaração opostos contra sentença que julgou procedente o pedido do autor refere-se à alteração do serviço de intimação dos atos judiciais, que antes era feita pelo correio para o advogado residente em outra capital, e que posteriormente passou a ser por meio de publicação de edital. IV - Prevalecendo o raciocínio constante nos julgados divergentes, tornar-se-ia necessária a propositura de ação rescisória antes da conclusão derradeira sobre o feito, mesmo que a matéria pendente se refira à discussão processual superveniente V - Desconsiderar a interposição de recurso intempestivo para fins de contagem do prazo decadencial para a propositura de ação rescisória seria descartar, por completo, a hipótese de reforma do julgado que declarou a intempestividade pelas instâncias superiores, negando-se a existência de dúvida com relação à admissibilidade do recurso. VI - Embargos de divergência rejeitados. (STJ, EResp nº 441.252/CE. Corte Especial. Relator Gilson Dipp. Julgado em. 29/06/2005. Publicado em 18/12/2006)

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. PRAZO DECADENCIAL. DIES A QUO. 1. O dies a quo da contagem do prazo decadencial de dois anos para a propositura da ação rescisória é a data em que se deu o trânsito em julgado da última decisão. 2. Nos casos em que o recurso especial interposto contra o acórdão rescindendo é inadmitido por intempestividade, o prazo em comento conta-se a partir do término do lapso para a interposição do apelo raro. Precedentes. 3. Recurso especial improvido. (STJ, REsp 756.024/PR. 2ª Turma. Relator Castro Meira. Julgado em 25.10.2005. Publicado em 14.11.2005). No mesmo sentido: STJ, Resp 1194.507/BA. Monocrática. Relator Humberto Martins. Julgado em 16/06/2010. Publicado em 21/06/2010.

Em síntese, como característica essencial ao efeito obstativo, destaca- se sua capacidade de manter a litispendência, impedido os efeitos da preclusão sob o que decidido.

3.3.2. Efeito Suspensivo

O efeito suspensivo consiste na possibilidade de prolongar o estado de ineficácia dos efeitos das decisões atacáveis por recurso.

Em crítica ao termo “efeito suspensivo” José Carlos Barbosa Moreira170 disserta:

Aliás a expressão “efeito suspensivo” é, de certo modo, equívoca, porque se presta a fazer supor que só com a interposição do recurso passem a ficar tolhidos os efeitos da decisão, como se até esse momento estivessem eles a menifestar-se normalmente. Na realidade, o contrário é que se verifica: mesmo antes de interposto o recurso, a decisão, pelo simples fato de estar-lhe sujeita, é ato ainda ineficaz, e a interposição apenas prolonga semelhante ineficácia, que cessaria se não se interpusesse o recurso.

José Miguel Garcia Medina e Teresa Arruda Alvim Wambier ressaltam, outrossim, que a suspensividade, ao contrário do que se imagina, não está relacionada à interposição do recurso, propriamente dita, mas sim a atribuição de efeito suspensivo ao recurso pelo texto da lei. “Nos casos dos recursos que, em regra tem efeito suspensivo, publicada a decisão recorrível, ela não produzirá efeitos que lhe são próprios e imediatos.”171

170 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Op cit. p. 255.

171 MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de impugnação. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2011. p. 114.

Porém não se pode deixar de ressaltar que o texto legal, por vezes, autoriza que ao magistrado seja possível atribuir, ou não, efeito suspensivo ao recurso (ope iudicis). Nestas espécies há a verdadeira suspensividade. Em outras palavras, ao ser publicada a decisão, esta produz seus imediatos efeitos. Interposto recurso, ela permanecerá produzindo efeitos até que a suspensividade dê-se por autorização do juízo ad quem.

A suspensividade, ainda, não está relacionada, exclusivamente, com a executividade da decisão. Ora, as decisões cujas tutelas contempladas sejam as constitutivas e declaratórias também terão sua eficácia suspensa, quando atacáveis por meio de recurso.

Por fim, no que se refere a este efeito, vale destacar as razões a justificar a previsão legal, ou não do efeito suspensivo, a determinados recursos legais. Nesse sentido, manifestaram-se Marinoni e Arenhart172 em sua obra:

É preciso notar que o chamado efeito suspensivo deve ser pensado como algo que deve conciliar dois pólos: o da segurança – evitando que a decisão impugnada produza efeitos na pendência de recurso que pode revertê-la, e o da tempestividade – que objetiva impedir que o tempo do processo prejudique a parte que tem razão, e assim estimular a interposição de recursos sem qualquer fundamento. Se o efeito suspensivo privilegia a segurança, sua não previsão serve para dar ênfase à necessidade de tempestividade. São as circunstâncias de direito substancial que devem iluminar a eventual dispensa do efeito suspensivo. Porém, como muitas vezes é necessário considerar as particularidades do caso concreto, costuma-se também deixar ao juiz a possibilidade de conferir efeito suspensivo ao recurso.

Cassio Scarpinella Bueno, no entanto, ressalta que diante de um “modelo constitucional de direito processual civil” as regras relativas à concessão automática, ou não, de efeito suspensivo aos recursos devem ser flexibilizadas em prol de um objetivo maior de eficácia da tutela jurisdicional. “A segurança jurídica” que dá sustentação, não há porque duvidar disto, ao “efeito

172 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de Processo Civil: Processo de conhecimento. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 517.

suspensivo”, deve ceder espaço, consoante às peculiaridades de cada caso concreto, a outros princípios do “modelo constitucional do direito processual civil”, tais como os destacados.”173

Apesar da aparente rigidez decorrente de alguns dispositivos do Código de Processo Civil e que são estudadas no seu devido lugar - [...] - , o melhor entendimento é o de que cabe ao magistrado, consoante as peculiaridades de cada caso concreto, modificar o efeito suspensivo abstratamente previsto pelo legislador, concedendo-o quando a lei não o previu e, inversamente, retirando-o em casos que a lei o concebeu, negando, consequentemente, executividade imediata a decisão.174

Estas colocações ressaltam a importância do papel do juiz na efetividade da prestação da tutela jurisdicional oferecida. O artigo 558, do Código de Processo Civil, com sua redação, veio viabilizar sua atuação ao dispor que: “O relator poderá, a requerimento do agravante, nos casos de prisão civil, adjudicação, remição de bens, levantamento de dinheiro sem caução idônea e em outros casos dos quais possa resultar lesão grave e de difícil reparação, sendo relevante a fundamentação, suspender o cumprimento da decisão até o pronunciamento definitivo da turma ou câmara” e, ainda mais,

com o parágrafo único, deste mesmo artigo, que ampliou esta possibilidade às hipóteses em que a lei expressamente retira o efeito suspensivo do recurso de apelação, por exemplo.

A opção legislativa de nosso Código de Processo Cível é, assim, a de que ao juiz condutor do processo seja dado o poder de gerir os efeitos das decisões, de maneira a melhor garantir efetividade à tutela jurisdicional prestada.

173 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de Direito Processual Civil. Recursos. Processos e incidentes nos tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas de controle das decisões judiciais. São Paulo: Saraiva, 2012. p.109.

3.3.3. Efeito Regressivo

O efeito regressivo consiste na possibilidade do juiz prolator da decisão impugnada rever sua própria decisão. Nas palavras de Cássio Scarpinella Bueno175: “é dado ao próprio juiz de interposição do recurso julgá-lo.”

Este efeito assume grande importância para o presente estudo, na medida em que o parágrafo único, do artigo 527, do Código de Processo Civil, torna irrecorrível a decisão que converte o agravo de instrumento em agravo retido, bem como concede ou denega efeito suspensivo ou antecipa os efeitos da tutela recursal, salvo se o relator a reconsiderar.

O efeito regressivo pode, assim, ser utilizado como espelho da conduta dos relatores nestas hipóteses, independentemente de fatos novos, por exemplo. Tal questão, no entanto, será mais bem explicitada no capítulo 6, item 6.4, do presente trabalho.

3.3.4. Efeito Devolutivo

O efeito devolutivo consiste na entrega da reapreciação da matéria ao órgão competente para julgamento do recurso. Nas lições de Nelson Nery Jr.176 o efeito devolutivo consiste no efeito natural de todo e qualquer recurso, justamente por resultar na entrega da matéria impugnada a uma nova apreciação do órgão ad quem.

175 BUENO, Cassio Scarpinella. Efeitos dos recursos. In. Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis e Assuntos Afins (66-90). Volume 10. Coordenação de NERY, Nelson Jr.; e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 77.

176 NERY, Nelson Jr. Teoria geral dos recursos. 6ª ed. Atualizada, ampliada e reformulada. São

Alguns doutrinadores divergem quanto à necessidade de ser a revisão atribuída a órgão hierarquicamente superior, para fins de presença da devolutividade.177 Tal discussão deve aqui ser afastada, porquanto conforme já demonstrado no Capítulo 1, deste estudo, entende-se presente o duplo grau de jurisdição ainda quando a revisão dá-se por órgão de mesma hierarquia, concluindo por consequência lógica, estar presente a devolutividade todas as vezes que se tratar de forma recursal178.

Sendo o recurso uma extensão do próprio direito de ação, os princípios que regem este instituto também se estendem àquele. O efeito devolutivo é uma extensão do próprio princípio dispositivo. “Se, em regra, o juiz somente presta a tutela jurisdicional mediante provocação das partes (CPC, art. 2º), e se a prestação jurisdicional encontrará seu limite no pedido formulado pelo autor (CPC, arts. 128 e 460), assim também o recurso interposto devolve ao órgão julgador ad quem apenas o conhecimento da matéria que tiver sido objeto do recurso.”179

Pode-se afirmar que o pedido de nova decisão é que fixa os limites da devolutividade do recurso. Como afirma Nelson Nery Jr180:

Da mesma forma que somente se admite a dedução da pretensão genérica em juízo nos casos expressos em lei (CPC 286), o recurso não pode ser interposto de forma genérica. O recorrente deve indicar as razões pelas quais pretende ver reformada ou anulada a decisão impugnada e fazer pedido de nova decisão. Somente assim poderá o órgão ad quem apreciar o mérito do recurso, já que é o recorrente quem delimita o âmbito da devolutividade do recurso.

177 Como exemplo de doutrinador que acredita inexistir efeito devolutivo quando não há

alteração do órgão julgador é possível citar José Carlos Barbosa Moreira. (MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. Exposição sistemática do procedimento. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 123.)

178 Nesse sentido: NERY, Nelson Jr. Teoria Geral dos Recursos. 6ª ed. Atualizada, ampliada e

reformulada. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 431.

179 MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de impugnação. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2011. p. 110.

180 NERY, Nelson Jr. Teoria geral dos recursos. 6ª ed. Atualizada, ampliada e reformulada. São

Tal afirmativa nos remete a extensão do efeito devolutivo recursal.

A extensão do efeito devolutivo significa precisar o que se submete, por força do recurso, ao julgamento do órgão ad

quem. A extensão do efeito devolutivo determina-se pela

extensão da impugnação: tantum devolutum quantum

appellatum. O recurso não devolve ao tribunal o conhecimento

da matéria estranha ao âmbito do julgamento (decisão) a quo. Só é devolvido o conhecimento da matéria impugnada (CPC, art. 515). Sobre o tema, convém ressaltar, as normas que cuidam da apelação funcionam como regra geral (CPC, arts. 515 a 517). A extensão do efeito devolutivo determina objeto

litigioso, a questão principal do procedimento recursal. Trata-se

de sua dimensão horizontal.181

Cassio Scarpinella Bueno182 trata da extensão do efeito devolutivo como uma questão de quantificação.

A extensão do efeito devolutivo relaciona-se com a ideia do que é e do que não é impugnado pelo recorrente. Trata-se, portanto, da quantidade de matéria questionada em sede recursal e que será, consequentemente, apreciada pelo órgão

ad quem.

O artigo 515, §1º, do Código de Processo Civil trata especificamente desta denominada extensão: “Serão, porém, objeto de apreciação e julgamento pelo tribunal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro.”

Juntamente a extensão do efeito devolutivo coloca-se o que José Miguel Garcia Medina e Teresa Arruda Alvim Wambier183 denominam de efeito translativo dos recursos. Este decorre de imposição da própria lei.

181 DIDIER, Fredie Jr., CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. Volume III. Salvador: JusPodium, 2011. p. 85.

182 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de Direito Processual Civil. Recursos. Processos e incidentes nos tribunais. Sucedâneos recursais: técnicas de controle de decisões jurisdicionais. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 113.

183 MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de impugnação. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2011. p. 112-113.

Há hipóteses, contudo, em que, em virtude de expressa disposição legal, fica autorizado o órgão ad quem a julgar fora do que consta das razões ou contrarrazões do recurso. Tal circunstância, ao contrário do que se dá com o efeito devolutivo, decorre do princípio inquisitório, em virtude do qual, em situações determinadas em lei, pode o órgão judicial agir e pronunciar-se de ofício, independentemente de pedido ou a requerimento da parte ou interessado. Dá-se, no caso, o denominado efeito translativo, que ocorre, p. ex., nas hipóteses dos arts. 267, §3º, e 301, §4º, do CPC.

Nelson Nery Jr.184 melhor esclarecendo esta translatividade afirma:

O poder dado pela lei ao juiz para, na instância recursal, examinar de ofício as questões de ordem pública não arguidas pelas partes não se insere no conceito de feito devolutivo em sentido estrito, já que isso se dá pela atuação do princípio inquisitório e não pela sua antítese, que é o princípio dispositivo, de que é corolário o efeito devolutivo dos recursos. Mesmo porque, efeito devolutivo pressupõe ato comissivo de interposição do recurso não podendo ser caracterizado quando há omissão da parte ou interessado sobre determinada questão não referida nas razões ou contra-razões de recurso.

Por tais razões, Nelson Nery Jr. tratou da translatividade como efeito à parte dos recursos.

Cassio Scarpinella Bueno185 aponta outra razão que afasta a

translatividade das regras gerais da devolutividade: a proibição da reformatio in

pejus.

Aqui, diferentemente do que se dá nos casos do efeito devolutivo, que se prende ao princípio dispositivo, isto é, a pedido do recorrente que dê condições de reforma para uma decisão em detrimento do recorrido, não se pode conceber em

184 NERY, Nelson Jr. Teoria geral dos recursos. 6ª ed. Atualizada, ampliada e reformulada. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 484.

185 BUENO, Cassio Scarpinella. Efeitos dos recursos. In. Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins (66-90). Volume 10. Coordenação de NERY, Nelson Jr; e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 85.

que consistiria uma piora de situação – a “reforma para pior” -, nos casos em que ao juízo é dado atuar de ofício, isto é, sem provocação nenhuma.

Apesar de tais considerações, esse efeito translativo é tratado por alguns doutrinadores como a dimensão vertical do efeito devolutivo, traduzindo- se em profundidade deste efeito.

Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha186, imbuídos das lições de Nelson Nery Jr. afirmam:

Nelson Nery Jr. denomina de efeito translativo aquilo que Barbosa Moreira identifica como profundidade do efeito devolutivo e acrescenta: sempre que o tribunal puder apreciar uma questão fora dos limites impostos pelo recurso, estar-se-á diante de uma manifestação deste efeito (razão pela qual ele inclui a remessa das questões de ordem pública à apreciação do ad quem, manifestando-se ou não o recorrente sobre elas, como exemplo do efeito translativo).

Explicitando sobre a profundidade do efeito devolutivo Marinoni e Arenhart187:

Se todavia, de um lado, o tribunal fica vinculado ao pedido de nova decisão formulado pelo recorrente, de outro, quanto aos fundamentos desse “pedido”, é livre para examinar a todos, ainda que não hajam sido expressamente referidos nas razões do recurso interposto (efeito devolutivo em profundidade). Observe-se que o pedido de nova decisão pode ter inúmeros fundamentos – (...) - , mas o recorrente pode servir-se de todos ou apenas de alguns deles. Entretanto, ainda que a parte não tenha alegado, nas razões de seu recurso, todos os