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1. INTRODUÇÃO

2.3. EMPREENDEDORISMO CRIATIVO

Por ser a discussão sobre empreendedorismo criativo recente, não existe conceituação definitiva a respeito. Propomos aqui um cercamento teórico ao tema, construto que buscaremos definir por meio da pesquisa empírica aqui realizada. Por ora e baseados nas observações e sínteses realizadas até o momento, definimos Empreendedorismo Criativo como a atividade empreendedora que se dá no universo da Indústria Criativa por meio de mercados em redes sociais (POTTS et al., 2008), cujas ações são mediadas por plataformas digitais (PARKER; VAN ALSTYNE; CHOUDARY, 2016).

São poucas as publicações que diretamente definem o empreendedorismo criativo. Essas estão limitadas a sites, sendo que abordamos aqui apenas duas, de publicação internacional e qualificadas por associação a órgãos legitimadores. Para o British Council (), referência em assuntos relacionados à Economia Criativa, o empreendedor criativo pode ser definido como:

Alguém que trabalha no setor criativo que é capaz de demonstrar o sucesso comercial nos termos clássicos do crescimento do negócio (lucro, participação de mercado, funcionários) e / ou em termos de reputação (criatividade, qualidade e estética) entre seus pares.

Alguém que trabalha no setor criativo que desenvolveu uma empresa social ou não lucrativa bem-sucedida (em termos de impacto e alcance) neste setor.

Alguém que trabalha no setor criativo que mostrou liderança na indústria, defendendo seu desenvolvimento em seu país.

Alguém que trabalha no setor criativo que desenvolveu iniciativas (exposições, feiras, festivais etc.) que desenvolvem e desenvolvem o mercado desse setor em seu país (BRITISH COUNCIL POLAND, 2016).

Apontam como qualidades de um Empreendedor Criativo 1) a habilidade empreendedora; 2) a capacidade de inovação no desenvolvimento de novos modelos de

negócio; 3) a habilidade de liderança, seu potencial para modificar o setor de atuação; 4) consciência e conhecimento do mercado; e 5) perspectivas internacionais e capacidade de criar redes de contatos em nível de Reino Unido e internacional (BRITISH COUNCIL POLAND, 2016). Como habilidade empreendedora, enfatizam a capacidade de avaliar e enfrentar riscos, habilidades corporativas e interpessoais. Bastante ênfase é dada para a auto iniciativa e capacidade de liderança, assim como conhecimento de mercado e networking. Estas características vão ao encontro das características do empreendedor tradicional (DORNELAS; SPINELLI; ADAMS, 2014; MUZYKA; BIRLEY, 2001), com exceção da paixão por seu setor criativo, que vai ao encontro do discurso colocado por Howkins (2012), que enfatiza a palavra “paixão” quando falando na atuação empreendedora na Economia Criativa.

Recentemente, foi lançado o site Creative Entrepreneurs (2017), plataforma de referências para empreendedores nos setores artísticos. O site, parte de iniciativa do governo britânico para fomento do empreendedorismo criativo (SNOW, 2017), define o Empreendedor Criativo a partir da perspectiva do DCMS (2008), ligada à produção de propriedade intelectual, sendo o Empreendedor Criativo definido como

- o fundador de uma empresa lucrativa cuja produção é o produto único da imaginação humana, também conhecida como propriedade intelectual

- uma pessoa que cria um negócio rentável de nos trazer alegria, iluminação, beleza, uma jornada através da gama de emoções humanas e outras coisas, algoritmos e robôs não podem fazer (CREATIVE ENTREPRENEUS, 2017)

A plataforma continua sua definição de empreendedorismo criativo com um manifesto publicado no site (CREATIVE ENTREPRENEUS, 2017), seguindo a linha de Howkins (2012) no que tange à paixão pela carreira e setor de atuação. O texto, que delimita características específicas do Empreendedor Criativo, coloca esse como diferente do empreendedor tradicional, principalmente, por sua escolha por um estilo de vida divergente, que preza por satisfação pessoal em detrimento de lucro financeiro:

Empreendedores criativos são diferentes. Muitas vezes, eles são principalmente motivados por uma ideia criativa, não uma recompensa financeira. O tamanho dos empreendimentos que eles criam tem um alcance mais amplo, muitos deles menores que em outros setores. Eles funcionam de forma diferente, com ciclos econômicos e modelos de negócios menos previsíveis com base em fatores subjetivos como o gosto e a inteligência emocional.

Maiores oportunidades e liberdade os aguardam. Se mais pessoas assumissem o controle do potencial comercial de suas ideias criativas, teriam mais sucesso e liberdade criativa do que jamais sonharam.

Eles estão no ponto do futuro. Onde a tecnologia é sobre automação - fazendo tudo o mesmo - a criatividade é sobre fazer tudo de forma diferente - é o que os algoritmos não podem fazer.

A unidade traz força. As coisas boas acontecem quando pessoas criativas e ideias colidem. Reunir todos juntos nas indústrias criativas para falar sobre o empreendedorismo para entender e aprender uns com os outros e sentir parte de um ‘todo’ maior torna cada um mais forte.

As artes britânicas apoiadas por políticas públicas são o yin do nosso yang. Nós não poderíamos fazer o que fazemos sem eles. Eles são a incubadora do talento e ideias que alimentam o lado comercial - além de melhorar a nossa vida (CREATIVE ENTREPRENEUS, 2017).

Tais definições ajudam a salientar o fato de que, diferente do empreendedorismo clássico onde o sucesso do negócio é balizado pelos termos clássicos no crescimento de negócios - especificamente capital econômico -, no empreendedorismo criativo os capitais social, cultural e simbólico (BOURDIEU, 1984, 2007) são não apenas indicadores de sucesso do negócio, mas também fator de produção do ativo criativo e de atribuição de valor por parte do consumidor.

Quanto à escolha, por parte de criativos, pelo empreendedorismo, estudos apontam que tal escolha está fortemente associada ao estilo de vida (MAFFESOLI, 1998) proposto e possibilitado pela ação empreendedora, sendo motivado predominantemente por escolhas pessoais visando: a) auto-emprego; b) equilíbrio entre trabalho e vida; c) controle do próprio tempo; d) habitação fora de grandes centros; e) busca por qualidade de vida (CHASTON, 2008; EIKHOF; HAUNSCHILD, 2006; MCCARTHY, 2008; PETERS et al., 2009). A escolha pela habitação fora de grandes centros, movimento possibilitado pelo avanço das TICs, ressoa com as colocações de Castells (2016) e Bendassolli et al. (2009) sobre o impacto de TICs no novo espaço industrial. Partimos, então, do pressuposto de que a atuação no âmbito do empreendedorismo criativo está pautada pela escolha por um estilo de vida criativo, questão que abordamos na seção 7, O caderno dourado.

A partir da necessidade de conhecimento do campo de estudos sobre empreendedorismo criativo em nível mundial, realizamos mapeamento sistemático da produção científica acerca do tema Empreendedorismo Criativo indexado na base de dados SCOPUS (SILVEIRA-NUNES; MONTARDO; PINHEIRO, 2017). Os resultados refletem não apenas o crescimento da produção científica sobre Indústria Criativa, como apontado por Pinheiro et al (2015), mas também da produção sobre o tema Empreendedorismo Criativo.

Do ponto de vista quantitativo, os resultados apontam como melhor nomenclatura para referência ao tema Empreendedorismo na Indústria Criativa, por estarem disponíveis mais resultados associados a este jogo de termos-filtro. A predominância das áreas Negócios,

Administração e Contabilidade e Ciências Sociais confirma o lugar de proeminência dos campos Administração e Comunicação nos estudos relacionados ao tema (PINHEIRO et al., 2015). Também, validamos a relevância de futuros estudos, tendo em vista a escassez e o tangível crescimento da produção de conhecimento associado ao tema.

Apesar desses resultados, escolhemos utilizar aqui o termo empreendedorismo criativo, por: 1) ser o termo descrito por Howkins (2012); 2) por ser esta a terminologia comumente adotada no mercado nacional; e 3) por tal terminologia fazer alusão ao empreendedor cultural, atuante no ambiente da Indústria Cultural e posicionado na intersecção entre empreendedorismo, arte e economia (SWEDBERG, 2006).

Portanto, tomamos como Empreendedorismo Criativo a prática da criação de empreendimentos que tem como matéria prima a criatividade e o capital intelectual, baseado na construção e exploração de redes sociais, e cuja atuação se dá mediada por plataformas digitais. Essa forma de empreender objetiva a criação e captura de valor a partir de oportunidades identificadas, tem à frente o empreendedor responsável pela organização/operação e por assumir os riscos associados, e cujos índices de sucesso podem estar aliados aos termos da economia clássica e/ou criativa. Esse empreendimento pode partir do empreendedor artesão que o faz a partir de seus conhecimentos prévios, ou da identificação de oportunidade pelo empreendedor oportunista, ou de ator identificado em qualquer posição no continuum entre os dois pontos. Porém, em função de observações realizadas em estudo-piloto apresentado no Capítulo 6 e anteriormente publicado como resumo expandido (SILVEIRA-NUNES; MONTARDO, 2017), e reflexões sobre estas observações, acreditamos haver maior identificação do empreendedor criativo que propomos estudar com o padrão artesão deste

continuum, sendo que os atores observados empreendem a partir de seus conhecimentos prévios

e experiência técnica. Acreditamos também que estes empreendedores podem deslocar-se, como ilustrado pela Figura 3 abaixo, em direção ao extremo oportunista através de momentos pontuais de educação empreendedora.

Figura 3 – Possíveis deslocamentos no continuum do estilo do empreendedor

FONTE: elaborado pela autora (2018).

Outro fator importante a ser analisado, também apontado pelo estudo-piloto, é a formação de redes sociais e sua centralidade na ação empreendedora que propomos analisar. Pelos resultados observados até o momento, concluímos que as redes sociais formadas pelas empreendedoras configuram-se como redes estratégicas, articulações que buscam fortalecimento através de parcerias entre empreendimentos. É a esse campo de estudos que nos voltamos agora, construindo quadro teórico a partir de levantamento bibliográfico.