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Capítulo III – Enquadramento Metodológico: Travessia pelas Experiências e

3.3. Entrevistas Individuais

Como se referiu, esta pesquisa fez recurso à discussão focalizada em grupo como método principal tendo as entrevistas a principal finalidade de colmatar algumas lacunas a nível de informação e, desse modo, podermos desenvolver um trabalho mais sustendado. Compreendemos então que a utilização de entrevistas individuais, mesmo que como método secundário, beneficiaria este trabalho, dando a oportunidade de desenvolver alguns temas que não foram tão debatidos no decorrer da discussão focalizada em grupo e trabalhar mais profundamente a história de vida de cada um. Esta ideia é corroborada por Amado quando este afirma que “a entrevista é um dos mais poderosos meios para se chegar ao entendimento dos seres humanos e para a obtenção de informações nos mais diversos campos” (2017: 207).

Assim sendo, na atualidade, a entrevista, enquanto método, assume um número variado de formas e pode ser classificada de diferentes modos (Amado, 2017). Amado (2017), apresenta um conjunto de classificações para esta metodologia: a entrevista estruturada, que aborda um tema restrito e, por esse motivo, as perguntas são fechadas e estandardizadas, não existindo flexibilidade no processo; a entrevista semiestruturada, em que as questões são colocadas numa ordem lógica, tendo em conta o que o investigador pretende obter, sendo que a interação permite a liberdade de resposta por parte do entrevistado; a entrevista não-estruturada, que parte de um grande tema, e procura entendê-lo, através de questões que derivam da própria interação, não existindo categorias prévias e delimitadoras; e a entrevista informal, que pode também ser descrita como uma conversação. Estas quatro formas de entrevista obrigam,

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incontestavelmente, a uma adaptação do investigador, cabendo a este, enquanto moderador, orientar a sua entrevista de acordo com os seus objetivos.

Após a exposição e entendimento das diferentes formas de entrevista, podemos dizer que, no decorrer deste projeto, utilizamos entrevistas semi-estruturadas. A escolha desta forma de entrevista deveu-se ao facto de termos previamente pensado nas informações que queríamos obter, contudo tem-se em conta que “se eu escuto, é porque um outro fala e é responsável pelo aparecimento, pela emergência de um gesto, de um sentido, de uma significação, de uma palavra” (Berger, 2009: 190). Assim sendo, tencionamos que os nossos entrevistados usufruíssem de alguma liberdade e flexibilidade nas suas respostas, acreditando que isso iria trazer-nos discursos mais completos, expressivos e significativos.

Uma vez que utilizei entrevistas semi-estruturadas, no ponto seguinte, irei debruçar-me de modo mais aprofundado sobre esta forma de entrevista.

3.3.2.

Entrevistas Semi-Estruturadas

Segundo Amado (2017), a entrevista semi-estruturada tem como finalidade responder a três pressupostos: deve ser utilizada como meio de recolha de informação, deve respeitar os objetivos da investigação, para experimentar e apontar hipóteses e deve ser utilizada em conjunto com outros métodos.

Para desenvolver este tipo de entrevista é necessário ter em atenção um variado número de aspetos e uma exaustiva preparação de modo garantir a validade da mesma (Amado, 2017). As características das pessoas que iremos entrevistar são um dos aspetos a ter em conta, isto é, “deve tratar-se de pessoas que pela sua experiência de vida quotidiana, pelas suas responsabilidades, estatuto, etc., estejam envolvidas ou em contacto muito próximo com o problema que se quer estudar” (Amado, 2019: 214). Nesta pesquisa, foram realizadas três entrevistas a três dos seis elementos participantes da discussão focalizada em grupo. Optamos por entrevistar os três elementos surdos com implante coclear por assumirmos que, uma vez que contactam com a realidade do implante diariamente, possuem a proximidade necessária para abordar o tema. A experiência com essa realidade pareceu-nos benéfica para aprofundarmos questões de identidade e podermos complementar a informação obtida com discussão focalizada em grupo.

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Outro aspeto essencial é a elaboração do guião de entrevista. Segundo Amado (2017), o guião resulta de uma exaustiva preparação para a entrevista e nele deve conter a formulação do problema, os objetivos que se pretende alcançar, as questões orientadoras numa ordem lógica para o investigador e perguntas de recurso, para serem utilizadas caso o entrevistado não desenvolva a sua resposta e, por esse motivo, não permita ao investigador extrair o grau de explicitação pretendido. A elaboração deste guião deve ser minuciosa de modo a conseguirmos criar um referencial organizado e não um questionário exaustivo (Amado, 2017).

Como acima mencionado, as diferentes fomas de entrevista obrigam a uma diferente forma de condução. Vários autores apresentam um conjunto de aspetos a ter em atenção aquando da condução de uma entrevista semi-estruturada. Amado (2017) reuniu todos esses pontos numa listagem simples e precisa. Desse modo, o investigador/moderador da entrevista deve, de uma forma geral, assumir o papel de ouvinte, mostrando-se disposto a aprender, utilizando frequentemente sinais verbais e não verbais de reforço e evitando dirigir a entrevista, criando assim um laço de confiança com o entrevistado. Não deve também, de forma alguma, influenciar o entrevistado, mantendo sempre uma postura neutral e deve possibilitar o alargamento dos temas pré propostos, não restringindo a conversa. O investigador/moderador deve ainda esclarecer o entrevistado e verificar se este entende o que está a ser dito ou pedido. Por último, devem também ser tomadas algumas notas, de forma discreta, que servirão de auxilio aquando a transcrição e análise da entrevista.

Desta forma, e tendo como base as aprendizagens adquiridas ao longo do mestrado em ciências da educação e as leituras realizadas, elaboramos os guiões de entrevista, procurando obdecer a todos os objetivos acima elencados. Nas três entrevistas foi, mais uma vez, utilizado a gravação de áudio e vídeo e contou-se com a presença de uma intérprete de língua gestual portuguesa, por todos os motivos já acima enunciados. No decorrer das entrevistas procurou-se, enquanto moderadora, assumir um papel neutral, ouvindo com atenção o entrevistado, manifestando através da expressão facial e corporal o total interesse e a compreensão do que estava a ser dito, não interrompendo o discurso e tentando, sempre que necessário, de uma forma educada e paciente, pedir a clarificação ou o alargamento de algum tema que estava a ser desenvolvido pelo entrevistado. Após a realização das entrevistas, foi feita a transcrição das mesmas, do mesmo modo que já havia sito feita a transcrição da discussão focalizada em grupo.

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o decorrer desta viagem pela metodologia, com contributos de diversos autores, foi possível clarificar os seus princípios e procedimentos e compreender quais as vantagens e desvantagens na sua utilização. Contudo é importante ter em atenção que poucas são as investigações na área da surdez que utilizam a discussão focalizada em grupo. Por esta razão torna-se necessário ponderar a sua aplicação e compreender a necessidade de adequar e adaptar este método à realidade Surda. Procurei trazer esse contributo com este trabalho, evidenciando também que esta metodologia foi essencial para a construção da perceção e entendimento do tema e para a riqueza dos dados que recolhemos. Deste modo, as barreiras que encontramos e as adequações que conseguimos produzir foram cruciais para este estudo, tendo uma influência positiva para a investigação com um grupo constituído por participantes surdos.

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