• Nenhum resultado encontrado

A etapa de exportação da Extensão Rural “Modelo USA”: o caso do Brasil

Olivo Dambrós

produção 12 como forma de integração da unidade, preconiza uma visão

3. Trajetória da Extensão Rural convencional: “principais etapas”

3.3 A etapa de exportação da Extensão Rural “Modelo USA”: o caso do Brasil

Esta etapa corresponde ao período que vai do ano 1945 e se estende até meados de 1960. Reconhecida pelos próprios americanos pela eficiência de seu serviço de Extensão como instrumento para levar modernização à agricultura. Aquele país não mede esforços para

- 113 -

―exportar‖ o seu modelo para os outros países, principalmente da América Latina. Para isso, conta com o apoio de organizações internacionais de cooperação e desenvolvimento (FAO, OCDE, USAID, etc.) que desempenham importante papel nessa mercantilização.

O modelo predominante, neste período, foi o clássico que consistia em transferir os resultados da pesquisa aos extensionistas e estes aos agricultores, que eram considerados como ―receptores‖ das novas técnicas. No Brasil, o modelo foi desenvolvido com entusiasmo no sentido de persuadir os agricultores a utilizarem estas técnicas vindas de fora (FONSECA, 1985).

Com o fim da segunda Guerra Mundial, dá-se início a Guerra Fria15,

liderada pelos maiores países vencedores - URSS e EUA - que tinham como objetivo exercer o controle ideológico e comercial sobre os países subdesenvolvidos. Na América Latina, a campanha anticomunista passou a ser um dos aspectos importantes do expansionismo ideológico Norte Americano, induzindo lideranças a acreditarem que os negócios que lhes ofereciam era a melhor solução para gerar empregos, acumulação de capital e controlar as ameaças da subversão comunista (FONSECA, 1985, p. 63).

No Brasil, as relações com os americanos se intensificaram, a partir de 1947, com visitas recíprocas entre os presidentes dos Estados Unidos e do Brasil para comemorar a vitória da Segunda Guerra (PEIXOTO, 2008). Durante estas visitas e comemorações, muitos acordos foram sendo estabelecidos. Entre estes acordos, estava a oferta de bolsas para brasileiros estudarem naquele país, bem como, intercâmbios de professores, principalmente de lá para cá. Nesta celebração de alianças surge a Missão Rockfeller no Brasil que funda a primeira Associação de Crédito e Assistência Rural (ACAR), no Estado de Minas Gerais.

15Com a paranóia anticomunista dos EUA em relação a URSS, inicia-se uma

corrida armamentista entre as duas principais potências mundiais, assim este período (Pós – Segunda Guerra) é denominado de Guerra Fria.

- 114 -

A opção por Minas Gerais deve-se ao fato de que Nelson Rockfeller, assistente do presidente Roosevelt, em visita ao Rio de janeiro, no final de 1947, para participar de uma conferência, com 400 empresários, teria perguntado o que significava aquele amontoado de barracas (favelas), nos morros/encostas do Rio de Janeiro. Informado por assessores de que naquelas ―barracas horríveis‖ moravam, na sua maioria, migrantes provenientes de Minas Gerais e do Nordeste, teria ele ficado sensibilizado com o fato de como que um estado tão rico, como Minas Gerais, sofresse um êxodo tão intenso.

Foi a partir dessa ―sensibilização social‖ que Nelson Rockfeller teria proposto a criação de uma instituição que, imediatamente, implantasse o modelo americano de produção como a, grande e talvez a única, saída para melhorar a produtividade agrícola e, consequentemente, melhorar a qualidade de vida daquela gente, como afirma Fonseca:

Embora a compreensão fosse real do ponto de vista econômico, a solução seguia a lógica liberal de não tratar problemas estruturais como a distribuição da terra e o êxodo rural e, sob a visão das elites, resolver o problema, unicamente, através da produção (FONSECA, 1985, p.71).

Em 06 de dezembro de 1948, sem que se tenham notícias de ter havido reações em contrário naquele momento, foi assinado convênio entre o Governo de Minas Gerais e a Associação Internacional Americana para o Desenvolvimento Social e Econômico (AIA). A partir desse ato, foi criada, também, a Associação de Crédito e Assistência Rural daquele Estado e que serviria, conforme declaração do próprio Rockfeller, como ―teste para um arrojado empreendimento da AIA no Brasil‖.

Sob os mesmos moldes da ―Farm Securit Administration‖, criada pelo Presidente Roosevelt para recuperar os agricultores após a grande crise de 1930, acreditava-se que um programa de assistência rural e crédito supervisionado, como aquele, poderia aumentar a produção e

- 115 -

resolver os problemas dos agricultores de Minas Gerais. No entanto, como afirma Fonseca:

É importante pensar se haveria alguma semelhança entre a agricultura e os agricultores dos Estados Unidos e a agricultura e os agricultores de Minas Gerais. Se haveria alguma semelhança entre a situação rural americana e a mineira. Considerava-se o homem rural como um sujeito tímido e a margem do progresso, carente de tudo. Havia, na opinião dos coordenadores e extensionistas da ETA, a necessidade de substituir a maneira tradicional e primitiva da família viver e trabalhar tradicionalmente, por métodos modernos e práticos (FONSECA, 1985, p. 78).

Como afirma Fonseca (1985), nestas circunstâncias, acreditava-se que, pelo abandono dos padrões de produção passados de geração em geração, o camponês evoluía para o desempenho do papel de grande fazendeiro capitalista, fugindo da realidade e adotando um modelo de total dependência externa.

Considerava-se o homem rural um ‗verdadeiro Jéca; desnutrido, ignorante, doente, isolado e anônimo e relacionava essas carências com o baixo nível econômico‘. Acreditava-se de que este estado de carências não se devia a fatores histórico-estruturais, mas a sua ignorância e marginalidade das conquistas técnicas científicas da sociedade urbana industrial (FONSECA, 1985, p. 79).

Entretanto, o que antes era um sistema equilibrado de desenvolvimento, com produção para o consumo e com pouca dependência de fora, torna-se um sistema consumidor de insumos produzidos pela indústria, cumprindo, exatamente, com os pressupostos da oligarquia que apregoava a superação do atraso, como havia sido feita lá nos Estados Unidos, ainda no início do século XX (SEVILLA GUZMÁN, 2000).

A experiência do crédito supervisionado, associado à Assistência Técnica, foi adotada, apenas, para os países chamados de

- 116 -

subdesenvolvidos (FONSECA, 1985, p. 82). Lá nos Estados Unidos, os agricultores se valiam das transações bancárias, mas o crédito não era associado à Assistência Técnica. O instrumento inicial do extensionismo associado ao crédito supervisionado ocorreu no Brasil, tornando-se a primeira experiência mundial em que a Extensão Rural se vinculou ao crédito.

Após a assinatura da parceria entre AIA16e o Governo de Minas, um

grupo de, não mais que uma dúzia, de especialistas brasileiros e americanos instalou-se em algumas cidades do centro e Sul daquele estado. Iniciavam-se as atividades de campo com equipes técnicas formadas por um agrônomo e uma supervisora doméstica (um homem, voltado para a disseminação de técnicas de produção e uma mulher, dedicada à economia doméstica). A equipe montada num Jipe tinha, como principal finalidade, levar crédito, assistência técnica e ensino coletivo às comunidades rurais. Além de financiar a tecnificação da produção, o crédito, também, podia ser utilizado para reformas e benefícios no domicílio rural.

A base da ação extensionista deste período, um pouco além dos anos 1960, era a família. Por isso, também, denominado como de

Assistencialismo familiar ou humanista assistencialista (BRACAGIOLI

NETO, 2004), cujo objetivo era persuadir o chefe, a mulher e os filhos a usarem recursos técnicos para melhorar a produtividade e, a partir dela, melhorar o bem estar da casa.

De forma complementar, as economistas domésticas, através da organização de Grupos do Lar, e dos Clubes 4-S (para os jovens), difundiam conhecimentos sobre saúde, alimentação, saneamento, abastecimento de água, e apoiavam as mulheres nas suas atividades domésticas (costura, alimentação, confecção de móveis, colchões, cuidados com as crianças). Já os homens

16Criada pela Fundação Rockfeller, a American Internacional Association (AIA)

teve um papel de grande expressão na História da Extensão Rural do país. Muitos autores estudaram o papel da AIA, da Família Rockfeller e suas influências na ATER brasileira, dentre eles destaco: Bergamasco (1983); Luppi, s/d; Figueiredo (1984); Mussoi (1988); Fonseca (1985); Queda (1987) e Oliveira (1999).

- 117 -

focavam mais suas ações na produção, aumento da produtividade e no crédito. Essa ‗dobradinha‘ no trabalho se manteve até recentemente: os técnicos (homens) tratando das questões da produção agrícola, e as extensionistas sociais (mulheres) atendendo às questões referentes ao âmbito doméstico-familiar. Esse trabalho passou por diferentes fases, que não cabe aqui detalhar. É importante lembrar, porém, que durante todo o período da Revolução Verde (final da década de sessenta até recentemente), trabalhou-se com a perspectiva de ‗profissionalizar‘ e ‗modernizar‘ o meio rural, tanto do ponto de vista da produção agrícola, quanto no chamado desenvolvimento de comunidades (SILIPRANDI, 2002, p.40).

Entretanto, mesmo com um trabalho junto às famílias e as comunidades rurais, o propósito era a divulgação de dados de experimentos já comprovados, independente se essa era a demanda e se essas seriam as técnicas mais adequadas àquela realidade.

A partir da experiência que se consolidava em Minas Gerais, começaram a se firmar convênios semelhantes em outros estados. ANCAR (Pernambuco, Bahia e Ceará), em 1954; ASCAR (Rio Grande do Sul) e ANCAR (Rio Grande do Norte e Paraíba), em 1955; ACARESC (Santa Catarina), em 1956; ACARPA (Paraná), em 1956; ACARES (Espírito Santo), em 1957; ACAR (Rio de Janeiro, Goiás, Maranhão, Pará, Amazonas e Distrito Federal), entre 1958 e 1966; ARCAMAT (Mato Grosso), em 1965 e, em 1956, foi criada a Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural (ABCAR). Em 1974, já existiam 23 ACAR constituídas (PEIXOTO, 2008).

Em todo o processo de criação dessas associações nos Estados, assim como nos convênios com a USAID, Fundação Ford, Fundação Rockfeller e outros que foram implementados os serviços de extensão rural, na fase inicial do processo, havia presença de técnicos Americanos (PEIXOTO, 2008).

- 118 -