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CAPÍTULO 4. O FINANCIAMENTO POLÍTICO E A CORRUPÇÃO

4.2. Financiamento político e corrupção pela perspectiva dos candidatos

Como tem sido estudado, o financiamento tem impacto sobre a competição política, aumentando as chances de votação em partidos e candidatos. Porém, pode-se imaginar que a intensidade da relação é variável. Em alguns casos, os eleitores são fiéis a determinados partidos em função de disputas eleitorais de longa data. Nesses contextos, a alocação de recursos provocará menos impactos do que naqueles com eleitores que facilmente migram de um partido para outro. Também é razoável esperar que o financiamento tenha importância diferenciada. Os recursos podem importar pouco até chegar a um ponto crítico que permite desenvolver uma campanha para ganhar a eleição. Também é razoável esperar que, a partir de certo ponto, mais recursos não signifiquem mais votos, especialmente em casos de reeleição.

Além dessa diferença na intensidade da relação entre dinheiro e voto, outro problema apontado por Speck é a causalidade da relação. A simples regra “quanto mais dinheiro, mais votos” sugere que o dinheiro produz os votos, uma vez que permite uma campanha mais sofisticada, resultando em mais influência sobre o comportamento eleitoral dos cidadãos154. Talvez menos evidente seja a possibilidade de candidatos com mais chance de se eleger atraírem mais recursos. No caso, estar-se-ia diante de uma espécie de efeito

153 SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. A inconstitucionalidade do financiamento de

campanha por empresas e o financiamento democrático de campanha. In: A OAB e a reforma política

democrática / organizadores: Aldo Arantes, Cezar Britto, Cláudio Pereira de Souza Neto e Marcello Lavenère. – Brasília : OAB, Conselho Federal, 2014, p. 29-30.

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SPECK, BRUNO WILHELM . O financiamento político e a corrupção no Brasil. In: Rita de Cassia Biason. (Org.). Temas de corrupção política no Brasil. 1ed.São Paulo: Balão Editorial, 2012, v. 1, p. 77.

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inverso, em que o sucesso eleitoral esperado produz mais financiamento. Finalmente, poder- se-ia explicar a relação entre financiamento e sucesso eleitoral por uma variável exógena que impacta tanto sobre votos como sobre doações.

Um dos possíveis fatores é o capital político dos candidatos, uma vez que a realidade tem demonstrado que políticos com mais estrada na competição provavelmente têm mais chance nos dois campos: a disputa por votos e a por dinheiro. Os doadores têm escolhido os candidatos com maior chance de êxito no pleito eleitoral, com vistas a um “investimento mais seguro”, já com vistas à obtenção de facilidades por meio de corrupção. Reflexo disso é que as maiores montas de doações são concentradas entre os candidatos mais bem colocados no resultado dos pleitos.

Desse modo, a regulação do financiamento de partidos políticos e campanhas eleitorais torna-se uma ferramenta importante para moldar, sob uma perspectiva de curto prazo, a competição política e influenciar, em um horizonte temporal mais longo, o desenvolvimento do sistema partidário. Tanto a regulação de acesso aos recursos privados como a concessão de recursos públicos terão um profundo impacto sobre as condições de competição entre diferentes partidos políticos e candidatos. Quanto à regulação das doações privadas, a medida que causa maior impacto sobre as condições de competição é a limitação dos recursos de campanha a tetos máximos iguais, que pode ser implementada por meio da definição do tempo da campanha eleitoral, da restrição dos recursos que podem ser utilizados ou mais claramente da definição de um teto de gastos máximos para todos os partidos ou candidatos.

A alocação de subsídios públicos também influencia as chances eleitorais dos candidatos e partidos. No caso, a possibilidade de moldar o sistema partidário é mais ampla. Dependendo do modelo de regulação, o financiamento de partidos e eleições favorece partidos grandes ou pequenos; promove a consolidação do sistema partidário existente ou incentiva novos partidos a entrarem na arena; pode também aumentar ou diminuir a competitividade política. A alocação dos recursos públicos pode também influenciar a relação entre diferentes âmbitos intrapartidários, fortalecendo os diretórios centrais ou regionais, os candidatos ou os partidos, as bancadas no parlamento ou a organização partidária propriamente dita, fora da ocupação de cargos públicos.

Similar à perspectiva cidadã, a avaliação do financiamento pela ótica dos partidos e candidatos competindo por votos nos leva a alguns dilemas normativos. Uma das dificuldades é definir o padrão de uma distribuição justa e equilibrada dos recursos financeiros entre os candidatos. Alguns sistemas de regulação dos recursos para partidos baseiam-se na distribuição igualitária dos recursos. Seria justo que todos os competidores tivessem o mesmo volume de recursos disponíveis. Sistemas que seguem essa filosofia estabelecem tetos máximos para os gastos em campanhas e/ou alocam recursos públicos iguais para todos os candidatos ou partidos. Nessa concepção, assim como na perspectiva dos cidadãos, o financiamento é visto como externo ao processo eleitoral, influenciando-o indevidamente. O objetivo da regulação é a distribuição igual dos recursos, minimizando a distorção.

Em outra concepção, o financiamento é parte e resultado da competição política. Os candidatos com maior apoio na sociedade ou os partidos que tiveram sucesso eleitoral no passado deverão receber mais recursos. Seguindo essa filosofia da proporcionalidade, partidos menores ou novos partidos recebem menos apoio financeiro. O financiamento é um elemento intrínseco ao processo eleitoral. Quem tiver mais capital político e mais chance de ganhar terá mais acesso ao financiamento de sua campanha. A regulação do acesso aos recursos privados não tenta desfazer a capacidade desigual de mobilizar recursos financeiros. Adicionalmente, os recursos públicos são alocados proporcionalmente ao desempenho dos partidos em questão. Os critérios de alocação podem incluir os votos na eleição anterior ou na corrente, o número de filiados do partido ou a complementação de contribuições privadas com recursos públicos, o sistema de matching funds.