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CAPÍTULO 2. CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS DO VELHO INSTITUCIONALISMO

2.1 ESCOLA HISTÓRICA ALEMÃ E SUA CONTRIBUIÇÃO AO

2.1.1 Gustav Schomller

A influência intelectual de Schmoller e da Escola Histórica Alemã se estendeu por todo o mundo, desde o Movimento Progressista nos Estados Unidos até os reformadores sociais no Japão Meiji. E a partir dos anos 1980 há um resgate de sua contribuição com respaldo maior

24 Para um aprofundamento epistemológico das distintas fases da Escola Histórica Alemã, ver Riha (1985), Betz (1988), Grimmer-Solem (2003), Shionoya (2005) e Senn (2005).

na economia heterodoxa, especialmente nas áreas desenvolvimentista, comportamental, evolucionário e neo-institucional da economia.

Gustav von Schmoller é considerado o pai da “Nova Escola Histórica Alemã”.

Defendeu que as reformas sociais deveriam ser conduzidas por um ilustre soberano em oposição tanto ao liberalismo inglês como o socialismo. Todo estudo comparativo em economia política deveria ser centrado nas instituições e nos órgãos25, juntamente com as condições naturais e técnicas de organização. Ainda para o autor, seriam exemplos de instituições a propriedade, a escravidão, a servidão, o matrimônio, o mercado, a moeda e a liberdade industrial. Deste modo, uma instituição seria um conjunto de hábitos e regras de moral, de costume e de direito que foram criados com objetivos comuns, que se sustentam entre eles e que constituem um sistema.

É importante frisar, de forma sintética, o contexto político, econômico e social da Alemanha ao tempo dos trabalhos intelectuais de Schmoller. Além de se tornar uma nação recente, o país estava em transição de uma sociedade eminentemente rural para uma potência industrial e econômica. A rápida mudança estrutural trouxe consigo consequências como desemprego em massa, escassez de moradias, precárias condições de trabalho para as novas classes baixas, além da gradual dissolução da antiga classe média formada por artesãos e proprietários rurais frente à industrialização e massificação da produção, somada à concentração de terras e à pauperização daquela camada social resultante da abertura dos mercados agrícolas.

Schmoller parte da teoria de que quanto mais a sociedade se torna complexa, mais numerosos e diversos seriam os órgãos sociais aos quais o homem poderia ser membro e, indefinidamente, pertencer por um tempo ou por uma fração de seus interesses. Para o autor, internamente aos órgãos são impostas relações de dominação, de dependência e de cooperação.

Entretanto, existiriam órgãos cuja autoridade iria além dos indivíduos e se manteriam para além deles, ou seja, teriam uma longa duração. Do ponto de vista metodológico, Schmoller sustenta que ao confrontar a sociedade, a ordem e o Estado, as instituições não deveriam ser consideradas menores que os indivíduos (CHAVANCE, 2018).

O Estado social desejável seria aquele em que as instituições não seriam uma barreira, mas um estímulo no qual, dada a interação daquelas com o livre jogo das forças individuais, haveria uma complementação através de uma reciprocidade, ou seja, as instituições, para

25 Chavance (2018) chama atenção que este termo já se aproximava muito à noção de “organizações” que os institucionalistas adotariam em seu corpo teórico.

Schmoller, não impediriam a liberdade de movimento, e sim o impulsionariam o desenvolvimento desejável. Para o autor, portanto, há uma visão positiva das instituições que se tornaram, ao longo da experiência de vários séculos, métodos objetivos que articula o trato racional com as relações práticas (SHIONOYA, 1995).

Schmoller discordava e combatia as ideias dos "liberais de Manchester" e do socialismo de Marx e Lassalle26, cujas aspirações revolucionárias, segundo o autor, seriam inúteis para compreender a situação dos trabalhadores alemães na modernidade (RODRIGUES DA CUNHA, 2014). Schmoller possuía, como base argumentativa teórica, uma nova concepção histórico-filosófica da ética-moral que enfatizava a necessidade de um Estado socialmente ativo. E a partir dessa base, sua preocupação ao longo de sua vida se deu em torno da economia e da política social como maneiras de resolver os entraves impostos pela rápida industrialização e urbanização europeias (CHAVANCE, 2018)

Algumas antigas ideias e peculiaridades político-culturais nutriam a visão de mundo e o pensamento de parte da classe média alemã: da burocracia estatal prussiana e subserviência dos funcionários do Estado ao poder oficial, até o temor das revoltas populares e o processo de industrialização que os conduziriam à modernidade. Dada a fluidez com que as vicissitudes daquele tempo operavam, fez-se necessária uma análise coerente com as demandas sociais emergentes, haja visto que, tanto a corrente de pensamento neoclássico, quanto o materialismo radical das ideias socialistas, pareciam não encontrar solução e compreender os problemas sociais daquela realidade no curto prazo.

Portanto, o papel do Estado como agente ativo era o que distinguia os membros da

"Nova" Escola Histórica Alemã dentre alguns contemporâneos do pensamento histórico e econômico. Era o Estado, organizador da economia, que possuiria o objetivo de beneficiar o bem comum, através do estabelecimento de uma base moral para as ações do setor privado.

Ademais, o processo econômico não seria mais visto como cíclico ou historicamente repetível, e sim como orgânico-social e evolutivo. Ao contrário da tradição britânica clássica27, Schmoller

26 Ambos autores contribuíram para a construção da teoria de que os salários dos trabalhadores tendiam ao nível de subsistência, entretanto divergiam na compreensão do papel do Estado. Enquanto Marx interpretou o Estado como estrutura de poder e expressão burguesa cuja função seria preservar as estruturas de classe existentes, Lassalle considerou o Estado como entidade independente das alianças de classe e como instrumento de justiça, essencial para a concretização do socialismo. Em suma, a diferença principal entre os críticos consistia no programa de ação, isto é, na captura ou não do Estado como ferramenta necessária a instauração do socialismo (RIHA, 1985).

27 Tendo como principais pensadores Thomas Robert Malthus (1766-1834), David Ricardo (1772-1823) e John Stuart Mill (1806-1873).

defendia que a evolução histórica das instituições deveria estar no centro da ciência econômica focada em costumes, leis e moral28. Para seus críticos, sua teleologia seria um caso de holismo metodológico, isto é, sua interpretação proposta estaria isenta da acusação de baralhar fatos com valores ou de cometer um determinismo histórico otimista a partir do credo no continuado progresso do homem e da sociedade (SHIONOYA, 2005).

No entanto, Schmoller rejeitava a derivação de ideais universais a partir da abstração de algumas premissas a todos os fenômenos e da introdução arbitrária de julgamentos éticos na economia a partir da prova do equívoco científico creditada à razão ética. O autor visava compreender a ação humana não empiricamente apreensível, pressupondo a existência de tendências e fins gerais que poderiam dar luz à ação dos homens e ao entendimento por parte do cientista social, economista ou historiador.

Schumpeter critica quatro aspectos do pensamento de Schmoller que, em sua opinião, não havia recebido devida atenção. Para o crítico, Schmoller e sua Escola Histórica buscavam:

a reforma social; o "espírito científico" que os faziam criticar as hipóteses clássicas do indivíduo; a completa oposição ao isolamento dos fenômenos econômicos, e; a busca pela compreensão ou coerência orgânica das coisas. A crítica de Schumpeter se centra na incongruência das críticas da EHA às teorias clássicas e a postura política da escola, como se houvesse um respeito máximo pelo fato histórico e a vontade de torná-lo efetivo por si só. O crítico aponta também que distinção entre a EHA e as outras escolas e pensadores se dá no escopo de trabalho daquela por possuir um baixo nível de teoria econômica e uma falta de respeito por seus próprios valores, e; uma importância excessiva do Estado e baixa importância a todo o restante. Por fim, Schumpeter entendia que o economista de base schmolleriana era na verdade um sociólogo histórico (SCHUMPETER, 2006).