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Hiperglicemia – Um Factor de Risco Comum às Complicações

No documento DoençA PerioDontAL e DiAbetes MeLLitus (páginas 41-45)

– Um Factor de Risco Comum às Complicações Diabéticas

Uma associação consistente entre a hiperglicemia e a incidência e progres- são das complicações microvasculares e macrovasculares tem sido admitida

em doentes com diabetes tipo 1 ou com diabetes tipo 2136;137, havendo dados

científicos sugestivos de que uma melhoria do controlo metabólico em doen- tes com diabetes tipo 2 se acompanha de uma tendência para a redução de risco das complicações diabéticas138.

Diversos autores7;109;132;139, encontraram dados sugestivos de que a doença pe-

riodontal deve ser incluída entre as complicações da diabetes, e também

Katz140 verificou uma forte associação entre um nível elevado de glicose no

soro e a doença periodontal grave. Todavia, as relações entre a diabetes tipo 1 ou tipo 2 e a doença periodontal não são claras, embora tenham sido inten- sivamente estudadas7;31;109;141;142.

O papel desempenhado pela hiperglicemia na patogénese das complica- ções diabéticas não se encontra ainda suficientemente esclarecido e, até à

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data, mecanismos etiopatogénicos têm sido propostos para explicar as com- plicações mais importantes da diabetes (retinopatia, nefropatia, neuropatia e anormalidades circulatórias). Entre os dois mecanismos possíveis, o primeiro é acumulação de sorbitol nos tecidos, em consequência duma redução da gli-

cose a sorbitol pela enzima aldose-reductose14. O sorbitol é considerado uma

toxina para os tecidos e tem sido implicado na maior parte das complicações

da diabetes143. Outro mecanismo, como consequência bem estabelecida da

hiperglicemia e que goza de uma maior preferência entre os autores, é a gli-

cação não enzimática e oxidação das proteínas e lipideos14.

1.3.1. Produtos finais da glicação avançada

A glicação não enzimática das proteínas e lipideos tem, como consequência, a acumulação de produtos finais de glicação avançada (AGE). A glicação proteica com formação dos AGE deve-se a uma adição não enzimática de hexoses às proteínas, incluindo o colagénio, hemoglobina, albumina do plas-

ma, proteínas do cristalino e lipoproteínas, alterando a sua função144. Os AGE

são comuns às diferentes complicações orgânicas diabéticas144-146, tendo-se

demonstrado que estão envolvidos em alterações tecidulares do periodon-

to e que estão presentes na gengiva de doentes com diabetes147. Podemos

concluir que o controlo metabólico da diabetes, isto é, o controlo glicémico dentro de certos limites, pode prevenir a hiperglicemia e, consequentemente,

as complicações da diabetes148. Dada a importância dos AGE na patogénese

das complicações diabéticas e porque nestas se inclui a doença periodon- tal139, a glicação não enzimática das proteínas será objecto de posteriores

considerações e análise aprofundada em 2.5, a propósito da relação bidirec- cional entre a diabetes e a doença periodontal.

1.3.2. Função diminuída dos leucócitos polimorfonucleares

Uma função diminuída dos PMN foi verificada em doentes com diabetes113,

tendo ainda sido verificado que concentrações elevadas de glicose têm um efeito adverso na função dos PMN, o que pode contribuir para alterar as de- fesas do hospedeiro149.

Aproximadamente 1011 PMN são produzidos diariamente mas esta quantida-

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ta referir que, em condições normais, cerca de 90% dos PMN se encontram na medula óssea e, numa quantidade aproximada de 50%, sofrem um processo

de apoptose e não chegam a entrar na corrente sanguínea151. A vida média

dos leucócitos libertados na circulação varia entre um e quatro dias150;152. A

mobilização dos neutrófilos não estimulados para a circulação a partir da me- dula é controlada por diversos factores tais como a citocina interleucina 1 (IL-1) e o Factor de Necrose Tumoral alfa (TNF-α) e assim, face a uma infecção, vão

constituir a primeira linha de defesa151. O papel de protecção exercido pelos

leucócitos PMN resulta da sua capacidade para prevenir o estabelecimen-

to da placa bacteriana subgengival e sua proliferação153. Porém, quando as

bactérias possuem virulência que lhes permite escapar à acção dos PMN ou os PMN do hospedeiro são disfuncionais, os doentes têm um risco claramente aumentado para a periodontite109, o que ocorre, mais frequentemente, nas

situações de disfunção generalizada dos PMN. Há um conjunto de situações que se caracterizam por disfunções de PMN quanto ao seu número e funções:

síndrome de ChediaK-Higashi154, síndrome da hipermunoglobulina E155, síndro-

me de Kostman156, síndrome de Felty157, e ainda a síndrome de Papillon-Lefèvre

e a síndrome de Down, entre outras condições referidas por Deas, Mackey e MacDonell151.

Alguns indivíduos podem apresentar uma função anormal dos PMN apenas para certas bactérias específicas como foi demonstrado em doentes com periodontite juvenil, podendo esta ser apenas transitória7;109.

Segundo Cutler158, uma diminuição da função dos leucócitos PMN em doentes

diabéticos acompanha-se de redução da quimiotaxia e fagocitose também

por uma menor acção anti-bacteriana sobre a P. gingivalis. Porém,outros auto-

res35 não encontraram uma diminuição significativa da função dos neutrófilos,

designadamente em relação à quimiotaxia, fagocitose e efeito bactericida, quando estudaram adolescentes japoneses com diabetes. Este resultado ve-

rificado na investigação de Nishimura e colaboradores35 poderá ser devido

não à baixa idade da população estudada, mas às diferenças hereditárias envolvidas na quimiotaxia dos PMN159.

1.3.3. Outros mecanismos possíveis

A hiperglicemia, per se, e uma resposta inflamatória exagerada podem alterar

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verificaram que as espiroquetas da flora subgengival eram mais frequentes nas bolsas periodontais dos diabéticos tipo 1 mal controlados que nos dia- béticos com a glicemia controlada, mesmo em relação a sítios saudáveis do periodonto. Todavia, outros autores verificaram que não existiam diferenças entre doentes diabéticos e os controlos quando estudaram bactérias patogé- nicas para o periodonto, designadamente as P. gingivalis e A. actinomycete- mscomitans15.

Como foi referido anteriormente (2.3.), as relações entre a diabetes e a doen- ça periodontal não se encontram ainda suficientemente esclarecidas, em- bora da maior parte dos estudos clínicos e epidemiológicos tenha resultado evidência demonstrativa de que os diabéticos tipo 1 e tipo 2 tendem a ter uma periodontite mais prevalente, mais grave e de progressão mais rápida

comparativamente com os não diabéticos31;109;117 e de que os diabéticos com

diabetes não controlada têm mais periodontite que os diabéticos controla- dos. No entanto alguns diabéticos controlados têm ainda problemas de perio-

dontite112;161. Investigações recentes sugerem potenciais mecanismos respon-

sáveis pelas associações observadas162, tendo sido referido que um aumento

dos lipideos séricos (hiperlipidemia) induzido pela diabetes pode desempe-

nhar um papel importante na produção de citocinas6. Segundo Iacopino162,

a formação dos AGE está associada à hiperglicemia em combinação com a hiperlipidemia e também a ligação dos AGE aos receptores dos macrófa-

gos pode induzir a produção de citocinas145. Por outro lado, o aumento dos

lipideos séricos, induzido pela diabetes pode interagir directamente com os neutrófilos e macrófagos163. Noack e colaboradores164 não verificaram uma

associação significativa entre uma tolerância anormal à glicose e os níveis de doença periodontal, mas a hiperlipidemia foi associada com um risco mais elevado para a periodontite, dados que foram suportados pelas investiga- ções de Cutler e colaboradores6.

Parece poder concluir-se que as complicações diabéticas resultam da com- binação de múltiplos factores (metabólicos, genéticos e outros ainda insufi- cientemente conhecidos) mas, em qualquer dos casos, não subsistem actu- almente dúvidas quanto a um papel central da hiperglicemia em todas as complicações diabéticas e de que os AGE resultam da hiperglicemia/hiper- lipidemia e estão envolvidos nas complicações, contribuindo para as altera- ções tecidulares.

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1.4. Diabetes/Doença Periodontal

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