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Importação e Absorção de Saber Tecnológico Externo

2.5 A TIVIDADES C RIADORAS DE C ONHECIMENTO

2.5.4 Importação e Absorção de Saber Tecnológico Externo

As alianças estabelecidas pelas organizações para aumentar suas aptidões podem ser para aprendizado, para fornecimento e para posicionamento em mercado. As alianças para fornecimento e para posicionamento, embora possam permitir o fluxo de conhecimento, não são voltadas para integrar aptidões. Já as alianças para aprendizado se formam com muita antecedência à emergência da inovação. São acordos antecipados e intensivos em intercâmbio de saber. Alguns são baseados em ligações informais entre a fonte de tecnologia e o receptor e, assim não seria adequado chamá-los de aliança (LEONARD-BARTON, 1998).

A aptidão tecnológica específica a ser importada é aquela essencial para cumprir a estratégia da organização. O conhecimento acumulado sobre determinada tecnologia define o grau de “familiaridade” desse saber para a companhia. Conjugando essas duas dimensões - importância estratégica e familiaridade – dispõe-se de quatro alternativas. A decisão pela importação de saber é indicada quando a organização tem pouca familiaridade com uma específica tecnologia que tem grande importância estratégica. As fontes externas são múltiplas como: companhias concorrentes ou não, universidades, fornecedores, laboratórios, clientes e consultores (LEONARD-BARTON, 1998). Para a autora, os gerentes dispõem de mecanismos para suprimento de saber que vão desde o compromisso menor de um contrato de pesquisa a outro extremo de grandes investimentos em fusões e aquisições. Continuando, afirma que só mediante aquisições de empresas, fusões e joint ventures é possível a transferência de uma tecnologia em todo seu contexto comercial envolvendo todas as dimensões da aptidão.

A importação de saber requer enorme esforço gerencial para tornar permeáveis as fronteiras da organização. Desenvolver uma aptidão a partir de fontes externas requer um conjunto de atividades como: rastreamento de oportunidades tecnológicas, identificar e usar empregados na função de sentinelas tecnológicas e atravessadores de fronteiras (boundary- spanners) e combater a síndrome do “não inventado aqui” (LEONARD-BARTON, 1988, p. 187).

As sentinelas tecnológicas têm destacado papel em manter os colegas informados sobre os acontecimentos em seu campo. Embora o suporte da tecnologia de informação possa ter automatizado parte do trabalho de sentinela, ainda assim as informações geradas requerem o filtro de sentinela humano. O papel de sentinelas é reforçado pelos atravessadores de fronteiras. São pessoas que conhecem os dois mundos: o da fonte de saber e do receptor. Tais pessoas são cuidadosamente escolhidas, pois além de empreendedores devem ter habilidades para trabalhar na interface entre duas organizações. Por isso, devem ter disposição “[...] em assumir riscos de um Ulisses ao navegar entre dupla ameaça de Cila e Caríbdis.” (LEONARD-BARTON, 1998, p. 187).

Contudo, é difícil a adoção de um novo ponto de vista científico ou método, dado que todo conhecimento e hábito ao serem adquiridos são incorporados e afundam nos estratos do subconsciente. Assim, são automaticamente reproduzidos e mesmo que tenham se tornados inadequados resistem a uma inovação mais adequada, ainda que ela em si mesma não apresente nada de particular. A reprodução continuada de hábitos e conhecimentos que já tenham perdido a utilidade torna-se grilhões, limitação estratégica (SCHUMPETER, 1988; LEONARD-BARTON, 1988). Para conceber e elaborar uma nova combinação é preciso liberdade mental afastando-se da pressão das demandas cotidianas, que é de natureza rara e peculiar. Mas o inovador se depara com a reação do meio social como impedimentos legais, políticos, ou mesmo um mero espanto com o desvio. Esse controle social pode chegar ao ostracismo e distanciamento do indivíduo (SCHUMPETER, 1988), como cita Berger (1986).

[...] uma das punições mais devastadoras à disposição de uma comunidade humana consiste em submeter um de seus membros ao opróbrio e ostracismo sistemáticos. (BERGER, 1986, p. 85)

Ainda segundo Berger (1986), os mecanismos de opróbrio e ostracismo são os preferidos de grupos que, em princípio, se opõem ao uso da violência.

Para Leonard-Barton (1988, p. 187) gerenciar o saber inclui combater a síndrome do “não foi inventado aqui (NIA)”. Essa síndrome engloba reações que vão da aversão em se adotar uma ideia de terceiro, alheia, à falta de convicção quanto ao desempenho da nova tecnologia, que pode falhar – o que é bem provável dada a natureza de incerteza da inovação. Essas resistências podem se manifestar de maneiras sutis ou não, levando à deterioração do relacionamento. Segundo a autora, a síndrome do NIA pode ser superada em situações como a de necessidade imperiosa quando sob ameaça de extinção, que leva à concentração de esforços e atribuição de responsabilidade conjunta à equipe. Mas, para Leonard-Barton a

melhor solução para essa síndrome é o antídoto da cultura organizacional. Uma cultura voltada para a urgência da inovação e que incentive as trocas com fontes externas de know- how.

O conhecimento tecnológico se torna mais valioso e desejável, do ponto de vista do desempenho em competição, quanto menos transferível for e, por isso, de difícil imitação. O conhecimento torna-se mais estratégico quando incorporam tecnologias de ponta, mais recentes e disponíveis. Ocorre que por ser novidade, o novo conhecimento pode não estar documentado e assim, depende do conhecimento tácito na mente de operadores habilidosos (LEONARD-BARTON, 1998).

A autora afirma que quando dois técnicos de duas empresas trabalham em empreendimentos conjuntos é inevitável o vazamento de conhecimentos. Assim, embora muito bem detalhados, as joint ventures não podem depender somente de acordos escritos. O conhecimento complexo como a tecnologia não se limita a racionalidade instrumental como cita Leonard-Barton (1998).

Um pesquisador que estudou 492 joint ventures observou: “Por mais astuciosas que fossem as empresas ao redigir cláusulas para proteger os direitos sobre a tecnologia, o sucesso da joint venture dependia mesmo era da confiança” (LEONARD- BARTON, 1998, p. 204).

Os usuários também são fontes de saber na medida em que têm necessidades. Contudo, não conhecem a tecnologia e assim não podem imaginar uma solução. Dessa forma, mecanismos tradicionais de pesquisa de mercado, baseados em inquirição rigorosamente estruturados são canais de informação menos valiosos para desenvolvimento de novos conceitos de produtos. A inquirição apenas captará as necessidades que o usuário for capaz de explicitar. Assim, a identificação de oportunidades de novos produtos requer um instrumento qualitativo – o “projeto empático” que é “[...] elaboração de conceitos de produtos ou serviço com base numa compreensão profunda (empática) de necessidades não expressas do usuário” (LEONARD-BARTON, 1998, p. 224, 225).

Segundo a autora, no projeto empático o usuário é observado in situ – todo o contexto em que atua e as interdependências em relação a outras pessoas, equipamentos e ambientes são observados diretamente. Isso é conduzido mediante interação direta de desenvolvedores de produtos, como engenheiros e técnicos, e o usuário do produto. Existem três principais tipos de mecanismos pelos quais a empatia pode ser induzida: intuição do desenvolvedor, expedições antropológicas e adaptação ao mercado. Alguns tecnólogos desenvolvem a

aguçada “intuição” de necessidades atuais e futuras do mercado, e por isso estão entre os responsáveis por alguns dos negócios mais bem sucedidos atualmente (LEONARD- BARTON, 1998, p. 226).

A interação desenvolvedor-usuário “[...] obviamente chega ao auge quando ambos são um só. Os tecnólogos que também são clientes potenciais dos produtos que eles produzem podem integrar numa só cabeça o potencial tecnológico e as necessidades do usuário” (LEONARD-BARTON, 1998, p. 227). Para a autora, expedições antropológicas são maneiras menos usuais, mas talvez mais promissoras para adquirir profundo conhecimento do universo do usuário. Assim como fazem os antropólogos, os desenvolvedores imergem no ambiente do usuário e assim podem observar diretamente suas práticas. Essas expedições podem despertar alguma animosidade como no caso da observação de membros de uma equipe de socorro que atendem a chamados de emergência, como revela Leonard-Barton (1998).

A princípio os paramédicos se mostraram céticos, explicando aos projetistas que eles seguiam rigidamente procedimentos que podiam muito bem ser descritos e demonstrados sem a presença efetiva de pacientes. Mesmo assim, permitiram a filmagem. [...] Nas situações de emergência, com vidas em jogo, os paramédicos de fato violaram muitas de suas próprias regras de comportamento. Quando os procedimentos normais ou certos empregos do equipamento pudessem retardar o atendimento, os paramédicos improvisavam.” (LEONARD-BARTON, 1998, p. 234)

O reverso das aptidões estratégicas são as limitações, pois assim como as pessoas, as empresas também não podem ser competentes em tudo. Nem sempre as condições sob as quais os gerentes experimentaram êxito são mantidas, ou permanecem relevantes no futuro. Diante de ambiente de negócios mutante, os gerentes se veem diante da necessidade de ir de encontro àquilo que um dia foi o sustentáculo da empresa. São as limitações das aptidões estratégicas, assunto do próximo tópico.