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A não inserção dos advérbios no ponto de referência contextual, mais especificamente na inferência pela referência temporal, justifica-se pelo fato de não serem cotemporais ao dado variável Na inferência pela

S R F TINHA SAÍDO dez horas tempo de fala

23 A não inserção dos advérbios no ponto de referência contextual, mais especificamente na inferência pela referência temporal, justifica-se pelo fato de não serem cotemporais ao dado variável Na inferência pela

referência temporal, a especificação adverbial cobre o dado variável e faz com que uma outra situação seja inferida como ponto de referência. No ponto de referência adverbial, o próprio advérbio é apresentado como ponto de referência e não se sobrepõe ao dado variável.

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(66) Bem, voltei lá pro hospital e durante um, dois, três, no quarto dia, a menina já TINHA VOLTADO a barriga, ao normal, já estava evacuando normalmente, e foi indo, foi indo, até que ela

saiu do hospital (FLP 23, L1288)

Neste exemplo, o ponto de referência é a expressão adverbial no quarto dia. Percebemos, pela organização estrutural e semântica do enunciado, que tinha voltado ocorreu antes do quarto dia. Por essa razão, o exemplo (66) pode ser categorizado como tendo ponto de referência adverbial. No caso, a expressão adverbial não se sobrepõe ao dado variável.

3.3 - Conclusões parciais

Nesta seção, discutimos a noção de ponto de referência, diferenciando-a de referência temporal entendida esta última como a caracterização do tempo a partir do momento de fala (existindo três referências temporais: o passado, o presente e o futuro). Já o ponto de referência é um segmento representado por um verbo, pelo contexto ou mais raramente por um advérbio com o qual uma situação (no nosso caso, codificada pelos pretéritos perfeito e mais-que-perfeito) está vinculada.

Categorizamos nossos dados de modo a organizar uma tipologia para pontos de referência. Naturalmente, não se trata de uma tipologia geral, antes, constitui-se numa proposta inicial baseada nos dados analisados. Tal categorização se mostra útil em nosso estudo em pelo menos dois aspectos: quanto a um melhor entendimento da noção de ponto de referência, e quanto à possível influência dos diferentes tipos de ponto de referência na escolha das variantes para codificar um tempo passado que é anterior a outro tempo também passado.

Neste capítulo, detalham-se as etapas percorridas na delimitação da variável em estudo, apresenta-se a caracterização dos informantes e do corpus analisado, descrevem-se sucintamente os passos da análise quantitativa realizada e os grupos de fatores controlados.

Inicialmente, para demonstrar que as formas verbais de pretérito mais-que- perfeito e perfeito compõem um “envelope de variação”, traçamos o percurso metodológico que nos permitiu, por um lado, delimitar criteriosamente as variantes em estudo caracterizando seu contexto de uso, e, por outro, descartar possíveis formas concorrentes à variação.

1 - A DELIMITAÇÃO DA VARIÁVEL

Muitas dúvidas surgiram durante o período de levantamento de dados para a análise. Cada ocorrência passível de candidatar-se como variante era exaustivamente observada e freqüentemente nos deparávamos com casos problemáticos e duvidosos. Grande parte das incertezas decorria da natureza do fenômeno investigado.

Embora a observação empírica inicial da variação tenha se dado a partir de formas concretas de codificação gramatical, a saber, o uso alternado do pretérito mais- que-perfeito e do pretérito perfeito, o reconhecimento da função discursiva foi determinante para a delimitação da variável. Na análise, seguimos, então, a direção Função -> Forma. Partimos de uma função geral: ‘anterioridade a um ponto de referência passado’, e não de formas concretas de codificação gramatical. Essa opção teórico-metodológica nos deixaria, entretanto, muito à mercê de nossas intuições, caso não dispuséssemos de critérios os mais objetivos possíveis para a operacionalização do fenômeno em estudo. Daí a decisão de estabelecermos algumas restrições que permitissem filtrar com uma margem razoável de segurança os dados para a análise.

84 Como trabalhamos com uma função complexa, fomos restringindo passo-a- passo os eventuais candidatos ao envelope da variação. Nesta seção, apresentamos quatro restrições que foram observadas para a delimitação da variável em estudo: a restrição relacional, aspectual, da contra-seqüencialidade e da substituição.

1.1 - A restrição relacional

Os dados foram, primeiramente, selecionados a partir de um diagrama temporal, em que se estabelece uma relação, um vínculo de anterioridade entre a situação que representa o fenômeno em estudo e um outro tempo passado - que se constitui em ponto de referência para a primeira, conforme representação abaixo:

(D

--- S---R--- F--- (situação) (ponto de referência) (tempo de feia)

Imposta essa restrição, foram excluídos da análise: casos de passado que representam posterioridade a um ponto de referência passado, anterioridade relativamente ao tempo de fala e habitualidade. Esses casos são ilustrados a seguir.

1.1.1 - Posterioridade a um tempo de referência passado

Nesta classe, encaixam-se as situações que se localizam à direita do ponto de referência. Embora os dois pontos temporais sejam passados em relação ao tempo de fala, o tempo da situação analisada é posterior ao ponto de referência, conforme se observa no diagrama:

(2)

---r.--- s---F--- (ponto de referência) (situação) (tempo de fala)

diagramas (1) e (2). Já que privilegiamos como dado de análise a ocorrência de uma situação antes do ponto de referência, os casos que se comportam como (2) não fizeram parte do corpus analisado. Assim, nesta etapa, foram excluídos da análise o futuro do pretérito do indicativo e o pretérito imperfeito do subjuntivo, respectivamente, exemplificados abaixo.

(3) Ele faiou que não MEXERIA na poupança. (FLP 07, L592) --- -r.--- —s---F—---

falou MEXERIA

(4) Aí, o médico disse que talvez TIVESSE solução o problema dele... (FLP, Fabiana) --- „r--- ~S--- F---

disse TIVESSE

Cada um dos exemplos acima representa duas situações passadas anteriores ao tempo de fala, em que a segunda (mexeria/tivesse) se caracteriza como acontecimento hipotético e posterior à primeira (falou/disse). As formas de futuro do pretérito e imperfeito do subjuntivo que codificam, respectivamente, as situações posteriores nos exemplos, não podem ser incluídas em uma análise que pressupõe uma relação de anterioridade de um tempo passado com um ponto de referência também passado.

Esta restrição relacional exclui também casos de pretérito mais-que-perfeito aparente, como no exemplo:

(5) Se o problema que eu tive, estivesse no INPS, eu já TINHA MORRIDO, ó, muito tempo. (FLP 16, L477)

---R_--- S---F---