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Japão, investimento e portabilidade

Um exemplo com um percurso pós-guerra bastante semelhante ao caso alemão, foi o do Japão, outro dos derrotados da Segunda Guerra.

A reconstrução e redireccionamento da economia tornaram-se a prioridade. O caminho seguido passou pela clara e objectiva definição de uma estratégia, com a economia a não ser deixada em autogestão e auto-regulação, mas a ser determinada de uma forma altamente organizada e centralizada, orientada por directivas governamentais e administrativas. A política industrial era fortemente apoiada e subsidiada pelos ministérios, com enormes apoios do MITI, 56 sendo

incentivada a participação em prémios como o G-mark 57 tendo contribuido

para a organização da actividade e da profissão de forma a incentivar e investir na produção de qualidade pelo Japão. O incentivo ao investimento foi levado a sério, não com medidas vagas e direccionais, mas estabelecendo uma estratégia objectiva de defesa do design, em vez da cópia e pirataria que ainda hoje caracterizam algumas economias asiáticas. A noção da importância da importação de know-how é demonstrada pela tradução da biografia de Raymond Loewy, um exemplo em termos processuais. O passo seguinte consistiu na sua contratação para reformulação de uma marca de tabaco japonesa, para a observação prática do seu processo de trabalho, após o enorme sucesso obtido com a imagem corporativa da Lucky Strike.

Essa consciência da importância do conhecimento era evidente no Japão, e já antes da guerra tinha sido fundamental a visita do arquitecto Bruno Taut, que proporcionou conhecimento dos movimentos europeus, nomeadamente

Deutscher Werkbund e Bauhaus.

No pós-guerra, a produção massiva mecanizada era o caminho definido, tal como na Alemanha ou na Itália, tendo em vista a exportação, e assim procurando atingir a qualidade e os standards de exigência europeus e americanos. As áreas em que se distinguiram e mais investiram foram a indústria automóvel e a electrónica, sendo particularmente importante o contributo nipónico na miniaturização e portabilidade electrónica, um pouco à imagem do que a

Braun fazia na Alemanha. Neste campo foi particularmente importante Akio

Moriti, fundador de Tokio Telecommunications Engeneering Company, mais tarde transformada na Sony. Tornou-se rapidamente numa das empresas mais importantes para a economia e desenvolvimento japonês, e também para a sua imagem de qualidade e rigor no mundo, que abriu um caminho de confiança internacional a muitas outras empresas.

Um dos investimentos foi a importação de know-how, como a tecnologia de transístores para produção de pequenos rádios que compraram à americana

Western Bell em 1953, aprendendo e adaptando os seus conceitos a novas

criações, desenvolvendo-os, evitando simplesmente copiar e evoluir pela repetição da cópia. Em vez de comprarem repetidamente modelos a empresas estrangeiras, apenas precisaram de o fazer umas poucas vezes, apreendendo os seus conceitos sem os copiarem, importando, mais do que o produto e a sua tecnologia, o conhecimento a ele subjacente.

O Japão não se limitou a importar a tecnologia e conhecimento; de certa forma acabou por importar também algum do modo de vida americano. Chamou-se

americanism 58 a esta alteração cultural. A importação dos produtos americanos

na busca da American way of life 59 acabou por originar a admiração pelos seus

conceitos e design, o que também foi importante para construir um background cultural que viria a ser fundamental para a formação da geração seguinte de designers. Mesmo após o final da ocupação em 1951, essa influência manteve-se,

contribuindo para uma mutação radical da cultura local.

O desenvolvimento da miniaturização foi bastante visível no domínio da fotografia. Nikon e Canon conseguem entrar no mercado das câmaras de pequenos formato, dominado até aí pela Hasselblad e Leica, conseguindo inicialmente a mesma qualidade e, a médio prazo, preços mais baixos. Mais tarde a miniturização de qualidade atingiu níveis mais altos de originalidade quando a

Sony lançou o primeiro rádio transístor em 1955, mas foi especialmente visível

algumas décadas mais tarde quando em 1979 lançou o Walkman, mais do que um produto, um conceito inovador de individualidade e portabilidade.

A obsessão pela poupança e aproveitamento do espaço é fácil de entender se olharmos para a realidade urbana japonesa. A afirmação nipónica deve-se muito à reacção às dificuldades do pós-guerra e à cultura hierarquicamente marcada, e que, por ausência de grandes tensões sociais, facilita a concentração na produção e na mística do trabalho. Estas características, associadas a uma forte percepção da importância do design e da sua permanente evolução, bem como a características como a alta competência tecnológica rapidamente adquirida, foram aspectos fundamentais a partir de meados do século XX. A par destas características racionais facilmente comparáveis às da indústria alemã, uma aproximação à natureza, suas formas e materiais, faz lembrar o design de rosto mais humano dos escandinavos, mas também este sempre associado à

evolução tecnológica.

Um rosto mais humano da identidade nacional é visível no banco Butterfly

(Fig. 58) de Sori Yanagi. Desenhado em 1954 para a Tendoniokko, ganhou a Medalha de Ouro na Trienal de Milão em 1957, num salto importante para afirmação internacional do design Japonês. Conjuga as formas naturais e orgânicas com a mais moderna tecnologia de moldagem de madeira em contraplacado. O modernismo europeu é familiar a Yanagi, e essa influência é clara, pois uma das questões interessantes e inovadoras do projecto é, mais do que formal, cultural, visto que não existia no Japão mobiliário para sentar. O material escolhido é também relativamente novo para o Japão, embora em

modernistas junta alguma da tradição e formas nipónicas, dos portais torii e da expressão plástica tipográfica japonesa. Formalmente é inspirada em asas de borboleta, ou mesmo na cauda de uma baleia.

No mesmo ano que Yanagi ganha o prémio, Isamu Nogushi desenha vários modelos de mesas para o Alcoa Forecast Program. De base estrutural, produzidas em alumínio reforçado e pintado.

O seu primeiro objecto foi Radio Nurse de 1937, as primeiras mesas para A. Conger Goodyear, de base com formas livres e tampo de vidro, sendo a mais conhecida das versões produzida a partir de 1944. Com formas biomórficas de referências naturais, composta por duas peças semelhantes unidas por um pino, a sua produção é extremamente barata.

O seu modelo de maior sucesso foi o IN 50.

O design do Japão é internacional, mas próprio, confrontando-se por vezes com dificuldades de afirmação no ocidente. Porém, a grande idoneidade técnica, qualidade de construção e fiabilidade colocam as suas produções ao nível dos países de topo. Do pós-guerra até hoje é um processo evolutivo, de grande competência e passos seguros.