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CAPÍTULO III – A INDISCIPLINA À LUZ DOS NORMATIVOS LEGAIS

2- Lei 30/ 2002

A lei 30/2002 de 20 de Dezembro, Estatuto do Aluno do Ensino não Superior, regulamenta o funcionamento disciplinar das escolas portuguesas. Lê-se na exposição e motivos dessa lei que

“As políticas educativas terão que recentrar o seu esforço de enquadramento, de forma a promover um melhor ambiente escolar e a fomentar o exercício de valores como o respeito, a tolerância e a liberdade, no quadro dos princípios democráticos consagrados na Constituição da República Portuguesa”.

Depreende-se daqui, que o ambiente das escolas se degradou ao longo dos tempos e que, por isso, se tornou necessário tomar medidas que impedissem que este processo continuasse em escalada. Continuando a leitura do preâmbulo, ficamos a conhecer os motivos que levaram à sua publicação. Entre eles, apontam-se as alterações verificadas nas estruturas familiares, a evolução dos meios de comunicação social, com destaque para a televisão, o aumento da imigração que introduziu na sociedade portuguesa e, consequentemente nas escolas, elementos de diferenciação social e cultural e a massificação do ensino, resultante do aumento da escolaridade obrigatória para nove anos.

“A evolução registada nas estruturas familiares, nos meios de comunicação social - com especial relevo para o papel da televisão - e na própria composição da sociedade portuguesa, com o crescente número e importância das comunidades imigrantes portadoras de contributos decisivos de diferenciação social e cultural, permite avaliar a extensão e complexidade dos desafios que se colocam à instituição escolar. Esta, paralelamente, é confrontada com o processo de massificação, decorrente do maior acesso e mobilidade no sistema educativo, do aumento da escolaridade obrigatória para nove anos e do alargamento a grupos sociais cada vez mais diferenciados.”

As consequências resultantes deste processo foram evidentes e traduziram-se numa degradação do ambiente das escolas, onde passaram a verificar-se, cada vez com mais frequência, actos de indisciplina que, em alguns casos, dão origem a atitudes violentas.

“Uma das consequências mais evidentes deste processo foi a degradação progressiva do ambiente escolar e a deterioração da autoridade dos professores. A sobrevalorização e salvaguarda dos direitos, facto em si positivo, conduziu, contudo, à falaciosa subalternização dos deveres. Este desequilíbrio originou a proliferação de práticas perturbadoras da convivência e do bom ambiente

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escolar. Actos de indisciplina, frequentemente expressos em agressividade e violência, acentuaram em muitas escolas um generalizado sentimento de insegurança e de impunidade.”

O diploma, no seu capítulo V, referente à disciplina, regulamenta os procedimentos disciplinares a adoptar pelas escolas.

Na Secção I, Infracção disciplinar, qualifica-se o conceito de infracção disciplinar.

“A violação pelo aluno de algum dos deveres previstos no artigo 15.º ou no regulamento interno da escola, em termos que se revelem perturbadores do funcionamento normal das actividades da escola ou das relações no âmbito da comunidade educativa, constitui infracção disciplinar, a qual pode levar, mediante processo disciplinar, à aplicação de medida disciplinar.” (Capítulo V, Secção I, Artigo 23.º)

A Secção II, Medidas disciplinares, aborda as finalidades das medidas disciplinares, diferenciando claramente as medidas preventivas e integradoras com vocação sancionatória e as medidas acautelatórias, preventivas e de integração.

“Quanto à matéria da disciplina, houve o cuidado de qualificar, expressa e rigorosamente, o conteúdo da infracção disciplinar. Por outro lado, em termos de medidas disciplinares, para além da sua reorganização global, passou a distinguir-se claramente entre as medidas disciplinares que, para além da sua eficácia preventiva e integradora, têm vocação sancionatória e as medidas disciplinares pensadas unicamente para prosseguirem um sentido cautelar, preventivo e de integração. Deste modo se concilia, agora sem confusões perversas, dois desideratos, cada um deles irrenunciável: a efectiva responsabilização do aluno prevaricador responsabilizável, por um lado, com a efectiva dimensão reabilitadora e integradora da escola, por outro”. ( Decreto Lei n.º 30/2002, Exposição de Motivos)

A Secção III, Competência para aplicação das medidas disciplinares, salienta o papel do professor em todo o processo, reconhecendo a necessidade de reabilitação da sua autoridade.

“Este modelo, teve, obviamente, as devidas repercussões técnico-jurídicas a nível da cumulação de medidas disciplinares e da competência disciplinar, entre outros aspectos, sendo que se entende a autoridade dos professores como um pilar estruturante da vivência escolar e das boas aprendizagens e, como tal, objecto de um processo necessário de reabilitação.” (Decreto Lei n.º 30/2002, Exposição de Motivos)

101 O artigo 38º refere a este respeito:

“O professor, no desenvolvimento do plano de trabalho da turma e no âmbito da sua autonomia pedagógica, é responsável pela regulação dos comportamentos na sala de aula, competindo-lhe a aplicação das medidas de prevenção e remediação que propiciem a realização do processo de ensino e aprendizagem num bom ambiente educativo, bem como a formação cívica dos alunos, com vista ao desenvolvimento equilibrado das suas personalidades, das suas capacidades de se relacionarem com outros, das suas plenas integrações na comunidade educativa e dos seus sentidos de responsabilidade.” (Secção III, Artigo 38.º)

Na Secção IV, Procedimento disciplinar, procurou-se agilizar o processo, tornando- o mais célere, tendo sempre em vista a reabilitação do aluno. Garante-se a transparência do processo com o acompanhamento do aluno pelo encarregado de educação em todo o processo de averiguações e audições.

“O procedimento disciplinar foi redesenhado. Preservando todas as garantias destinadas ao cabal apuramento da verdade e a permitir a audição integral do aluno arguido e do seu encarregado de educação, o processo tornou-se mais dinâmico e eficaz, pois, nos ambientes das escolas, tal é verdadeiramente decisivo para fomentar os valores inerentes à disciplina. Na execução das medidas disciplinares sublinhou-se o correcto acompanhamento do aluno, numa lógica de acentuar o sentido reabilitador.” (Decreto Lei n.º 30/2002, Exposição de Motivos)

A intervenção dos pais e encarregados de educação nos processos disciplinares é garantida pelo artigo 51º da presente lei.

“Os pais e encarregados de educação devem, no decurso de processo disciplinar que incida sobre o seu educando, contribuir para o correcto apuramento dos factos e, sendo aplicada medida disciplinar, diligenciar para que a mesma prossiga os objectivos de reforço da formação cívica do educando, com vista ao desenvolvimento equilibrado da sua personalidade, da sua capacidade de se relacionar com os outros, da sua plena integração na comunidade educativa, do seu sentido de responsabilidade e das suas aprendizagens.” (Secção IV, Artigo 51.º)

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