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CAPÍTULO I – O PAPEL DO DIREITO ELEITORAL NA CONSOLIDAÇÃO

1.2 Tratamento legal brasileiro

1.2.5 Lei 9.504/ 97 Lei das Eleições

Essa lei possui grande importância para o ordenamento jurídico brasileiro. A cada ano, era editada uma nova lei para tratar das eleições, situação que perdurou até 1997, com a edição da lei eleitoral, uma norma perene a regular todas as eleições posteriores.

105 MS Nº 26.602/07, impetrado pelo PPS; MS Nº 26.603/07 pelo PSDB; MS Nº 26.604/07, impetrado

Em seu art. 1º, ela estabelece o início das eleições, que se realizam sempre no primeiro domingo de outubro do ano eleitoral, sendo eleito o candidato que alcançar maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos (art. 2º). Explicita Medina:

São nulos os votos atribuídos a candidatos não registrados ou àqueles que tiverem sua inelegibilidade declarada antes da data da eleição. Serão também nulos os votos atribuídos a um partido político que não obteve o seu registro deferido pelo Tribunal Superior Eleitoral.106

Isso deriva do sistema de representação brasileiro, que é proporcional ao número de votos válidos obtidos por cada uma das legendas políticas. Esse artigo, ademais, deve ser interpretado junto com o art. 109, §2º, do Código Eleitoral, valendo a determinação de que o partido ou a coligação que não obtiverem número de votos igual ao quociente eleitoral107

O art. 6º da Lei Eleitoral trata da formação de coligações, possibilidade dada aos partidos políticos, desde que dentro da mesma circunscrição.

não terão eleito candidatos à Câmara dos Deputados, nem às Assembleias Legislativas, nem à Câmara Legislativa do Distrito Federal ou Câmara de Vereadores.

Questão polêmica e amplamente debatida surgiu, por exemplo, no caso da verticalização das coligações partidárias, originária da Resolução TSE nº 21.002/2002, dada como resposta à Consulta TSE nº 715/2001, formulada pelo PDT. Essa resolução estabelecia que os partidos políticos que fizessem coligação para eleição da Presidência da República não poderiam formar coligação com outros partidos políticos para eleição de governador de Estado ou do Distrito Federal, senador, deputado federal, estadual ou distrital. Entendeu o TSE que deveria haver simetria entre as coligações nacionais e regionais, decisão que modifica o exercício do direito em relação às coligações eleitorais. O direito dos partidos políticos de realizar coligações assimétricas nos três âmbitos do Estado foi limitado, mesmo sem ter havido uma previsão legislativa. Afinal, o art. 6º da Lei nº 9504/97 fixa que

106 MEDINA, Ademir Ismerin. Op. cit., p. 21.

107 Cálculo utilizado para distribuição de cadeiras no sistema de votação proporcional, definido no

[é] facultado aos partidos políticos, dentro da mesma circunscrição, celebrar coligações para eleição majoritária, proporcional, ou para ambas, podendo, neste último caso, formar-se mais de uma coligação para a eleição proporcional dentre os partidos que integram a coligação do pleito majoritário.

Não se pode inferir que esse artigo apresenta algum tipo aberto, por isso, inovou o TSE a ordem legal, sem poder fazê-lo.

Foram propostas duas ADIs – ADI nº 2.628-3, proposta pela PFL, e ADI nº 2.626-7, do PCdoB, PL, PT, PSB e PPS – perante o STF, que decidiu não conhecer dessas ações, alegando impossibilidade de controle de constitucionalidade de ato normativo secundário.

Se o STF decidiu não atacar o mérito, o TSE o fez, sendo que as questões se basearam em temas como autonomia partidária, separação de poderes, princípio eleitoral da anualidade, ou seja, todas essas noções de estatura constitucional.108

O STF, ao não acolher as ADIs, entendeu que não havia violação aos direitos constitucionais, mas uma mera interpretação de um artigo de lei. Com isso, regras importantes do processo eleitoral foram aprovadas e aplicadas no mesmo ano em que tiveram vigência, uma ofensa grave ao princípio da anualidade (art. 16 da CF/88).

A verticalização saiu vitoriosa com base no art. 17, I, da CF/88, que, no fundo, não constitui um princípio constitucional.

O Congresso Nacional, insatisfeito com essa situação, resolveu agir e promulgou a EC nº 52/2006, que alterou o § 1º do art. 17 da CF/88 e eliminou a exigência da simetria entre as coligações eleitorais, de forma definitiva.

Esse caso é mais um exemplo de ativismo judicial, que autorizou uma atuação normativa do TSE, invadindo a autonomia partidária, o princípio da anualidade e as próprias escolhas do Poder Legislativo.

108 Assim, o Min. Sepúlveda Pertence afirmou que o art. 6º da Lei nº 9.504/97 previa liberdade para que

os partidos estabelecessem suas coligações, em função de sua autonomia. O min. Ilmar Galvão aduziu que disciplina sobre processo eleitoral trata de matéria de competência exclusiva do Congresso, de acordo com o art. 22, I da CF/88, ocorrendo usurpação da competência legislativa. E o Min. Marco Aurélio tratou da indiscutível inovação trazida ao processo eleitoral, em confronto com previsão constitucional. Isso apenas para citar alguns argumentos pertinentes e com base constitucional.

Cabe destacar, ainda, o art. 23 e 24 da Lei nº 9.504/97, que abordam as doações.

A Constituição Federal estabelece que o povo é a fonte primária do poder estatal, podendo também exercer o poder por meio de representantes eleitos pelo voto direto. Dessa forma, é necessário haver um governo democrático e representativo que preserve a autonomia dos partidos e a igualdade de oportunidades de seus candidatos.

Os partidos precisam, por óbvio, de recursos financeiros para sua manutenção e para a realização de suas campanhas, e podem receber doações de pessoas físicas, sendo proibido aos partidos, nos termos da Constituição, art. 17, II, receber recursos de entidade ou governo estrangeiro.

O art. 23 da Lei nº 9.504/97 é regulamentado pelo art. 81 do mesmo diploma legal, que impõe limites às contribuições de pessoas físicas,109

Doações de pessoas jurídicas são ainda autorizadas, bem como o uso de recursos próprios dos partidos políticos, que podem se valer da comercialização de bens e serviços e usar o valor auferido nas campanhas políticas.

tentando manter a igualdade de oportunidades no pleito e lisura eleitoral.

Caso as normas de arrecadação sejam descumpridas, não haverá recebimento das quotas do Fundo Partidário (art. 25, da Lei nº 9.504/97), o que, para Cândido, é um dispositivo que “[...] comporta duas sanções. Uma, partidária, com a perda do direito ao recebimento da quota do Fundo Partidário. [...] A outra sanção é pessoal, destinando-se aos candidatos.”110

109 Em se tratando de menor, pode doar bens excluídos do usufruto e administração de seus pais, como,

por exemplo, aqueles recebidos no exercício de uma atividade profissional (art. 1.693, inc. II, do Código Civil).

Essas sanções protegem o art. 14, § 9º, da CF, garantindo eleições que fluem de forma normal e legítima, sem interferência do poder econômico,111

O mais importante é que haja transparência nessas doações. Sua falta fulmina a legitimidade das eleições no país.

além de afastar abuso de exercício de função.