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Entre os mamíferos, o recém-nascido humano é o que contém maior proporção de gordura; em média 15% do peso corporal. Isso indica que, no final da gestação, grande parte dos nutrientes transferidos para o concepto é armazenada como gordura.

Os triglicerídios não atravessam a placenta, mas os ácidos graxos livres (AGL) o fazem por difusão simples. A lipoproteína lipase (LPL), encontrada no lado materno da placenta, mas não no fetal, favorece a hidrólise dos triglicerídios no espaço interviloso.

As partículas de LDL do plasma materno se ligam a receptores específicos na MMV do sinciciotrofoblasto e são transportadas por endocitose receptor-mediada. No lisossomo do sincício, os LDL são hidrolisados por enzima, dando origem ao(s): (1) colesterol para a síntese da progesterona; (2) AGL, incluindo os essenciais, como o ácido linoleico.

No plasma materno, os AGL são transportados de duas maneiras (Figura 4.25): (1) ligados à albumina, formando o complexo albumina-AGL; (2) através dos triglicerídios (TG) existentes nas lipoproteínas maternas, em especial o VLDL, que é hidrolisado em AGL pela LPL expressa pela MMV. Os AGL alcançam o compartimento intracelular por difusão simples. Alternativamente as lipoproteínas maternas (VLDL/LDL) interagem com receptores clatrina-mediados e são internalizadas por endocitose. As vesículas são acidificadas e os receptores liberam a partícula de lipoproteína e retornam para a membrana apical. As lipoproteínas são processadas nos endossomos e nos lisossomos, e eventualmente os TG são hidrolisados pelas lipases intracelulares. Os AGL no citoplasma sincicial são transportados para o feto através da membrana plasmática basal por mecanismo ainda mal elucidado.

A síntese da passagem transplacentária é observada na Figura 4.26.

O transporte transplacentário de glicose, aminoácidos e ácidos graxos está assegurado no cenário de oxigenação adequada (Figura 4.27). Em condições fisiológicas, a placenta consome 40% do O2 e 70% da glicose fornecida pela mãe. A glicose e os aminoácidos são os principais estimuladores da insulina e do fator de crescimento insulina-símile (IGF) e, por certo, do crescimento fetal. Ademais, os aminoácidos são utilizados para a síntese proteica e contribuem para a massa muscular. Os ácidos graxos desempenham papel de precursores dos eicosanoides, componentes estruturais das membranas fetais e das bainhas de mielina. No 3o trimestre, o

armazenamento do tecido adiposo provê reserva para os ácidos graxos essenciais. O eixo endócrino inclui hormônios como cortisol, tireoxina e leptina, que modulam a diferenciação e a maturação do concepto de acordo com a disponibilidade de substrato, o que pode ter impacto significante na programação fetal.

Figura 4.24 ■ Transporte ativo de aminoácidos (AA) através da placenta, que resulta em concentração mais elevada no sangue fetal comparada à existente no sangue materno. O transporte ativo através da membrana microvilosa é energizado pela Na+,K+ ATPase. A concentração de AA no citoplasma do sinciciotrofoblasto é muito superior às existentes nos sangues materno e fetal. O transporte através da membrana plasmática basal é facilitado por transportadores específicos. (Adaptada de Jansson & Powell, 2009.)

Figura 4.25 ■ Transporte placentário de lipídios. No sangue materno há duas maiores fontes de ácidos graxos livres (AGL) que podem ser transportadas para o feto: (a) AGL ligado à albumina, formando o complexo albumina-AGL que pode interagir com a proteína de membrana de ligação ao AGL resultando na transferência do AGL através da membrana microvilosa (MMV), (b) através dos triglicerídios existentes nas lipoproteínas maternas, especialmente a lipoproteína de muito baixa densidade (VLDL), que é hidrolisada em AGL pela lipoproteína lipase (LPL) expressa na MMV. Por outro lado, as lipoproteínas maternas interagem com os receptores LDL/VLDL na MMV, resultando em endocitose e hidrólise intracelular, com liberação de AGL. Intracelularmente, os AGL são transportados por proteínas de ligação. O transporte através da membrana plasmática basal não é conhecido. (Adaptada de Jansson & Powell, 2009.)

Figura 4.26 ■ Passagem transplacentária. (Adaptada de Moore, KL. The developing human, Philadelphia, Saunders, 1973.)

Figura 4.27■ Transporte de glicose, aminoácidos e ácidos graxos. (Adaptada de Baschat, 2004.)

Trocas amnióticas

Tem-se afirmado que o líquido amniótico (LA) possibilita os movimentos do feto, protegendo a grávida dele e, desse modo, amparando o concepto dos traumatismos que atingem a mãe. O fluido amniótico favorece o equilíbrio térmico, possibilita o desenvolvimento adequado do pulmão fetal, age como barreira contra a infecção, e, ao formar-se a bolsa d’água, distribui homogeneamente a pressão resultante das metrossístoles, auxiliando, pela sua viscosidade, a expulsão fetal.

Mecanismos biológicos básicos envolvidos nas trocas de água. Não há evidência de existir transporte ativo de água ou secreção em qualquer parte do organismo. A água

atravessa as membranas em resposta somente a gradientes osmóticos ou hidrostáticos; na ausência deles, não se movimenta.

Assim, a “secreção” de água pelo tecido amniocorial simplesmente não ocorre, e sua movimentação através dessas membranas, no 3o trimestre, se fará de modo passivo ou por osmose, da cavidade amniótica para o compartimento fetal, mediante potencial de gradiente químico entre o líquido amniótico hipotônico e os fluidos fetais isotônicos.

Os mecanismos fundamentais que participam no transporte de água são:

Fluxo em massa: na presença de gradiente, a água move-se através de camadas de tecidos

porosos multicelulares, como o âmnio, por processo não difusional conhecido como fluxo em

massa. O movimento de água assim realizado depende do gradiente, mas excede o que

ocorreria por difusão simples na membrana amniótica em 100 a 200 vezes.

O movimento em massa é não difusional e é produzido sem dispêndio de energia; tampouco envolve transporte ativo. O movimento passivo de moléculas de água torna-se aumentado porque a membrana de trocas contém poros ou canais em que a água existe em forma de solvente. Ao contrário, a transferência da água através de membrana não porosa (p. ex., membrana bilipídica artificial ou celular), em resposta a gradiente osmótico ou hidrostático, ocorre em taxas equivalentes à da difusão simples

Fluxo através de membrana semipermeável: o âmnio é altamente permeável à água, mas

totalmente impérvio a muitos compostos com peso molecular acima de 1.000 (albumina). Outras substâncias menores (ureia, glicose, cloreto de sódio etc.) difundem-se rapidamente pelo âmnio, mas, ainda assim, manifestam alguma força osmótica, isto é, a membrana de trocas se comporta de modo semipermeável a esses solutos. Vale dizer que as grandes moléculas, como a albumina, exercem força osmótica ideal para a transferência de água. As moléculas pequenas se difundem celeremente através das membranas, determinando, todavia, efeito osmótico mínimo, quando comparado ao promovido pelas macromoléculas.