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6 MAIOR RETORNO ECONÔMICO

No documento Revista SÍNTESE Direito Administrativo (páginas 52-58)

Trata-se, pois, de critério inédito acolhido pelo RDC, previsto no in- ciso V do art. 18. Pretende escolher a melhor proposta baseado no maior

retorno econômico19, ou seja, o particular intenta receber parte do resultado

da economia gerada com a execução do programa de trabalho apresentado

pelo particular. Geram-se, assim, os denominados “contratos de eficiência”, que são remunerados por uma parcela de economia que a Administração Pública aufere.

Essa modalidade contratual nasce na década de setenta, momento em que todos estavam diante de uma grave crise energética, necessitando da contratação de soluções que diminuíssem o gasto neste setor. Assim, estabeleceram-se negócios jurídicos nos quais a remuneração variava de acordo com a maior economia gerada, ou seja, quando mais se reduziam os custos com energia elétrica, maior era o retorno econômico aos contra- tados. Dessa forma, certas empresas surgiram justamente para apresentar soluções de economia neste sentido. No Brasil, estes ajustes foram também chamados de “contratos de risco” ou “de performance”.

Aqui, o julgamento da melhor proposta deve levar em conta parâ- metros de economia de gastos, sendo esta a base de cálculo para a seleção da melhor proposta. Diz o art. 23 da Lei do RDC que este critério deve ser utilizado somente na celebração de contratos de eficiência, onde o parti- cular deve atingir certas metas definidas no instrumento convocatório. As propostas serão consideradas de forma a selecionar aquela que gerará a maior economia para a Administração Pública decorrente da execução do contrato.

19 Esse tipo de contratação tem larga utilização, há muito, nos Estados Unidos e no Reino Unido. Nestes ne- gócios jurídicos são estabelecidos padrões de remuneração, sendo que quanto maior for a economia gerada aos cofres públicos, maior será o ganho auferido, proporcionalmente estabelecido. Há a obrigação de que se produza um resultado em determinado prazo.

O que se quer é que o contrato a ser celebrado proporcione um me- nor dispêndio de recursos públicos, com o intuito de reduzir despesas cor-

rentes, sendo o contratado, como dito, remunerado com base em percentual da economia gerada20. Entendemos que o dispositivo do RDC, em verdade,

reduz despesas de custeio, e não aquelas de natureza corrente. Acredita-se que, aqui, há um equívoco do legislador.

Para isso, o § 3º do art. 23 estipula interessantes parâmetros para a formulação do pagamento do contratante.

Nos casos em que não for gerada a economia prevista no contrato de eficiência:

I – a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida será des- contada da remuneração da contratada;

II – se a diferença entre a economia contratada e a efetivamente obtida for superior à remuneração da contratada, será aplicada multa por inexecução contratual no valor da diferença; e

III – a contratada sujeitar-se-á, ainda, a outras sanções cabíveis caso a dife- rença entre a economia contratada e a efetivamente obtida seja superior ao limite máximo estabelecido no contrato.

Veja que esta forma de seleção da melhor proposta vincula o paga- mento para com o cumprimento de níveis de eficiência, induzindo o con- tratado a atingir melhores níveis de qualidade. O sinalagma do contrato, aqui, não é estabelecido na relação: fornecimento de um produto ou de um serviço, em contrapartida a um valor a ser recebido em troca. No critério “maior eficiência econômica”, o interessado se compromete a reduzir o déficit público, minimizando as despesas correntes (de custeio).

Nesse caso, a lei previu a possibilidade de se efetuar descontos no

pagamento do contratado, caso ele não atinja as metas a que se obrigou. A

dúvida que remanesce consiste em saber se tais descontos poderiam chegar ao patamar de nada se pagar ao contratado, porque ele não atingiu nenhu- ma das metas (sem prejuízo das outras sanções). A previsão de “pagamento zero” seria de discutível constitucionalidade, na medida em que o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal determina que a contratação sempre de- tenha “[...] cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei”. Eis o impeditivo.

Então, no contrato de performance, quando o interessado não atinge as metas fixadas no edital, será reputado inadimplente. Logo, estamos frente a uma mora qualificada, porque não basta o contratado deixar de cumprir com a economia a que se comprometeu, deve não ter alcançado os patama- res determinados no instrumento convocatório.

A diferença substancial entre o contrato de eficiência e a remuneração

variada – ambos institutos previstos no RDC – reside no fato de que, nesta, a

eficiência não é obrigatória, mas, se ocorrer, deve servir de base para que o contratado seja bonificado pecuniariamente. No contrato de eficiência, ao seu turno, o maior retorno econômico é uma obrigação inerente ao negócio jurídico, sendo um dever a ser necessariamente cumprido pelo contratado.

Por isso que se devem apresentar “propostas de trabalho” e “propos- tas de preço”, a fim de o Poder Público cotejar cada qual para a seleção do lance mais vantajoso. Além disso, diante do plano de trabalho21, o ente

estatal poderá fiscalizar com objetividade o cumprimento das metas. Entendo que se formata, aqui, um contrato com obrigação de resulta-

do, porque há sérios prejuízos ao contratante, caso ele não consiga cumprir

com a responsabilidade com que anuiu22. Há a obrigação de que se pro-

duza um resultado em determinado prazo. Resumindo: o licitante faz uma proposta de reduzir o custo mensal em determinada área. Em troca, formula uma proposta monetária de quanto quer receber por esta redução. Imagine que certa Secretaria de Educação tenha um gasto de dez milhões de reais em certo segmento durante o ano. O proponente pode formular a seguinte pretensão: ele assegura reduzir este débito de dez para oito milhões em cer- to período. Mas, para isso, cobrará a quantia de oitocentos mil reais. Veja que, neste caso, o ente estatal terá uma economia de um milhão e duzentos mil reais. Dessa maneira, o licitante deve apresentar uma proposta de tra- balho de como fará esta redução. No caso, o particular só recebe se atingir as metas a que se obrigou, enfim, se demonstrar ter angariado o resultado prometido.

A grande complexidade que envolve este critério gira justamente em torno dos riscos em se conseguir cumprir com esta redução. Muitas vezes, a minimização do déficit fica sujeito a uma álea afeta a inúmeras variantes, externas e incontroláveis. Certas externalidades não podem nem sequer ser previstas. Para isso, como se viu, o § 3º do art. 23 dá cabo de trazer regras

21 Decreto nº 7.581/2011, inciso I, alíneas a e b, do art. 37.

22 O Poder Público, então, não tem mais obrigação de controle de meios, mas de resultados. Apesar de que estes resultados devem estar categoricamente previstos no instrumento convocatório.

harmônicas a tentar compor esta contingência. Bem por isso que, ao que tudo indica, tratar-se-á de um negócio de difícil atração, por conta de se estabelecer requisitos duros ao particular.

Outra complexidade a ser enfrentada neste critério de julgamento re- side no fato de se ter a necessidade de deter um parâmetro, uma baliza a se saber o quanto de retorno se quer. Sem estes dados, não se conseguirá, por óbvio, saber o quanto o Poder Público quer deixar de gastar. Dessa forma, os dados históricos serão fundamentais para saber se a proposta não é irreal, ou seja, se há um retorno efetivo.

Vejamos um exemplo: imagine o caso de o Poder Público pretender a redução do gasto com impressão de documentos. Em certos meses do ano este montante é maior do que em outros, o que faz com que seja im- prescindível um histórico completo e suficiente, a se poder visualizar uma base de gastos global. Caso o parâmetro foque nos meses de maior gasto, os montantes de retorno econômico estarão distorcidos. Neste mesmo caso hipotético, é inexorável também segmentar o certame por grupos de con- sumidores, porque certos setores do ente contratante terão um maior ou um menor gasto com impressão, variando em períodos diversos, ou mesmo perceber as variações de despesas no decorrer dos meses. Veja o caso de uma equipe de recursos humanos, cuja impressão pode duplicar especifica- mente no final do ano, momento em que se necessita imprimir duas folhas de pagamento: a normal e aquela relativa ao décimo terceiro vencimento. Eventual pesquisa em outra unidade revelará, sem sombra de dúvidas, outra base de cálculo para o retorno econômico esperado.

CONCLUSÃO

Assim como tantas outras inovações produzidas nos últimos anos em direito administrativo, o Regime Diferenciado de Contratação necessita de um período de maturação. Apesar disso, sem sombra de dúvidas, ganha, hoje, um papel protagonista no cenário nacional. Aquele que seria um regi- me jurídico de contratações transitório e relegado a desaparecer juntamente com a entrega da última medalha dos Jogos Olímpicos de 2016 cresce e toma espaço nas relações mais triviais das contratações públicas.

Porém, não podemos nos enganar ao pensar que ele tenha chegado à fase adulta. Ao contrário, acredita-se que viva a mais pulsante adoles- cência, repleto de conflitos, dúvidas, acertos e erros, mas completamente vivo e mergulhado nas mais intensas aspirações (e contradições...) que esta fase deste ciclo da existência revela. Para tanto, apresentou-se, neste traba-

lho, uma análise crítica sobre pontos obnubilados no que se refere espe- cificamente aos critérios de seleção da melhor proposta, constante na Lei nº 12.462/2011 e mais bem detalhada no Decreto Federal nº 7.581/2011.

Assim, a fim de dar sistematicidade a tudo o que aqui se expôs, pode- mos resumir nossas conclusões nos seguintes tópicos:

• Quando se está a falar acerca dos tipos de licitação, está-se a referir acerca das regras para se escolher a melhor proposta; • O RDC estabelece uma lista taxativa (numeros clausus) de tipos

de licitação;

• O tipo a ser escolhido dependerá do objeto a ser licitado, e de- verá ser expresso no instrumento convocatório;

• O regime diferenciado estabeleceu os seguintes tipos de licita- ção que podem ser adotados: menor preço ou maior desconto, técnica e preço, melhor técnica ou conteúdo artístico, maior oferta de preço ou maior retorno econômico;

• O julgamento, no RDC, dará preferência à forma eletrônica; • Os critérios menor preço ou maior desconto visam a adquirir

produtos ou serviços com o menor gasto possível de recursos pú- blicos, de acordo com proposta remuneratória formulada pelos licitantes;

• A proposta pode vir a considerar os custos indiretos, desde que previstos de maneira objetiva no edital de abertura da licitação. Destaque para o fato de que o RDC apenas exemplificou alguns destes “custos indiretos”;

O critério menor desconto possui como base de cálculo, ou seja, como referência o preço global estimado pela Administração Pública, o qual é fixado no edital, sobre a qual se formulam pro- postas de descontos. Quem ofertar o maior, vence a disputa; • O critério de técnica e preço mescla entre os dois parâmetros

para a seleção do vencedor, sendo que o licitante formula duas propostas, uma para cada qual. É utilizado quando a contratação visa a adquirir objeto de natureza predominantemente intelec- tual ou no qual se queira adquirir inovação tecnológica ou técni- ca, ou que possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se

as vantagens e qualidades que eventualmente forem oferecidas para cada produto ou solução;

• Os critérios de melhor técnica e melhor conteúdo artístico são bastante peculiares. O primeiro deve estar ligado à obtenção de uma maior eficácia, enquanto que o segundo está vinculado à maior estética oferecida;

• Ambos devem primar, no mais possível, pela objetividade de parâmetros de discriminação da proposta vencedora;

• A comissão julgadora deverá (ato administrativo vinculado) ser composta por especialistas na área do conhecimento relativo ao objeto a ser contratado;

• O julgamento pela maior oferta de preço será utilizado no caso de contratos que resultem em receita para a Administração Pú- blica;

• A Lei nº 12.462/2011 permitiu que possa ser exigida a compro- vação do recolhimento de quantia a título de garantia, como requisito de habilitação, limitada a cinco por cento do valor ofertado. O Decreto Federal nº 7.581/2011, a seu turno, prevê que esta exigência poderá ser de até cinco por cento do valor mínimo de arrematação;

• O critério de julgamento pelo maior retorno econômico sele- ciona a proposta que apresentar o maior resultado da economia gerada com a execução do programa de trabalho apresentado pelo particular;

• Os contratos advindos deste tipo de certame são remunerados

por uma parcela de economia que a Administração Pública au- fere, porque o particular deve atingir certas metas definidas no instrumento convocatório;

• Assim, há a possibilidade de se efetuar descontos no pagamento do contratado, caso ele não atinja as metas a que se obrigou.

A Teoria da Ação Comunicativa Frente às Necessidades da

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